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Capacitação participativa de pré-natalistas para a promoção do aleitamento materno

Participatory training of prenatal care professionals for breastfeeding promotion

Capacitación participativa de profesionales de prenatal para la promoción de la lactancia materna

Resumos

O compromisso com a promoção e apoio ao aleitamento materno justificou a realização da capacitação dos profissionais de saúde que atendem o pré-natal na atenção básica. Trata-se de um estudo qualitativo exploratório com base nos pressupostos da pesquisa participante. Os objetivos foram identificar as temáticas sobre aleitamento materno e relatar as ações e estratégias propostas durante os encontros. Os dados foram registrados em diários de campo e a análise, segundo a categorização de dados. Os achados evidenciaram a falta de atualização dos profissionais e de padronização nas suas condutas. A pesquisa oportunizou a discussão das políticas e programas implantados pela gestão, buscando alternativas dentro do contexto das usuárias e trabalhadores envolvidos na atenção pré-natal.

Pré-natal; Aleitamento materno; Capacitação; Formação de recursos humanos


The commitment with the promotion and support of breastfeeding justified the training of professionals that give prenatal care in primary health. This is a exploratory, qualitative study, based on the assumptions of participant research. It aimed to identify the thematics about breastfeeding and report the actions and strategies proposed during the meetings. Data was registraded in a field diary and analysis was done according to the categorization of data. Discussion of findings showed the lack of professionals update and lack of standardization in their conducts. The research gave the oportunity to discuss the politics and programms that were implanted by the government management, searching for alternatives inside the context of the users and workers that are involved with prenatal care.

Prenatal care; Breastfeeding; Training; Human resourses formation


El compromiso con la promoción y apoyo a la lactancia materna justificó la realización de la capacitación de los profesionales de salud que atienden al prenatal en la atención básica. Se trata de un estudio cualitativo exploratorio, con base en los presupuestos de la pesquisa participante. Los objetivos fueron identificar las temáticas acerca de la lactancia materna y relatar las acciones y estrategias propuestas durante los encuentros. Los datos fueron registrados en diarios de campo y el análisis, según la categorización de datos. Los resultados evidenciaron la falta de actualización de los profesionales y de estandarización en sus conductas. La pesquisa dio oportunidad a la discusión de políticas y programas implantados por la gestión, buscando alternativas dentro del contexto de las usuarias y trabajadores envueltos en la atención prenatal.

Prenatal; Lactancia materna; Capacitación; Formación de recursos humanos


PESQUISA

Capacitação participativa de pré-natalistas para a promoção do aleitamento materno

Participatory training of prenatal care professionals for breastfeeding promotion

Capacitación participativa de profesionales de prenatal para la promoción de la lactancia materna

Ana Lucia de Lourenzi Bonilha; Joice Moreira Schmalfuss; Virgínia Leismann Moretto; Jussara Mendes Lipinski; Mariana Bello Porciuncula

Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Porto Alegre, RS

Autor correspondente Autor correspondente Joice Moreira Schmalfuss Rua São Manoel, 963. Bairro Santa Cecília CEP: 90620-110. Porto Alegre,RS E-mail: joicemschmalfuss@gmail.com

RESUMO

O compromisso com a promoção e apoio ao aleitamento materno justificou a realização da capacitação dos profissionais de saúde que atendem o pré-natal na atenção básica. Trata-se de um estudo qualitativo exploratório com base nos pressupostos da pesquisa participante. Os objetivos foram identificar as temáticas sobre aleitamento materno e relatar as ações e estratégias propostas durante os encontros. Os dados foram registrados em diários de campo e a análise, segundo a categorização de dados. Os achados evidenciaram a falta de atualização dos profissionais e de padronização nas suas condutas. A pesquisa oportunizou a discussão das políticas e programas implantados pela gestão, buscando alternativas dentro do contexto das usuárias e trabalhadores envolvidos na atenção pré-natal.

Descritores: Pré-natal; Aleitamento materno; Capacitação; Formação de recursos humanos.

ABSTRACT

The commitment with the promotion and support of breastfeeding justified the training of professionals that give prenatal care in primary health. This is a exploratory, qualitative study, based on the assumptions of participant research. It aimed to identify the thematics about breastfeeding and report the actions and strategies proposed during the meetings. Data was registraded in a field diary and analysis was done according to the categorization of data. Discussion of findings showed the lack of professionals update and lack of standardization in their conducts. The research gave the oportunity to discuss the politics and programms that were implanted by the government management, searching for alternatives inside the context of the users and workers that are involved with prenatal care.

Key words: Prenatal care; Breastfeeding; Training; Human resourses formation.

RESUMEN

El compromiso con la promoción y apoyo a la lactancia materna justificó la realización de la capacitación de los profesionales de salud que atienden al prenatal en la atención básica. Se trata de un estudio cualitativo exploratorio, con base en los presupuestos de la pesquisa participante. Los objetivos fueron identificar las temáticas acerca de la lactancia materna y relatar las acciones y estrategias propuestas durante los encuentros. Los datos fueron registrados en diarios de campo y el análisis, según la categorización de datos. Los resultados evidenciaron la falta de actualización de los profesionales y de estandarización en sus conductas. La pesquisa dio oportunidad a la discusión de políticas y programas implantados por la gestión, buscando alternativas dentro del contexto de las usuarias y trabajadores envueltos en la atención prenatal.

Descriptores: Prenatal; Lactancia materna; Capacitación; Formación de recursos humanos.

INTRODUÇÃO

Os indicadores do pré-natal da cidade de Porto Alegre demonstram a necessidade de intervenções para reverter os dados atuais, já que somente 19,5% das 18.553 gestantes cadastradas no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) realizaram de 4 a 6 consultas, no ano de 2008(1), quando o preconizado pelo Ministério da Saúde é a realização de, no mínimo, 6 consultas. Há alguns anos, os gestores buscam alternativas para qualificar a cobertura de consultas de pré-natal, mas observa-se que os tradicionais protocolos de atendimento com treinamentos elaborados e pré-estabelecidos não conseguiram melhorar esses indicadores.

Este contexto incentivou as pesquisadoras do presente estudo a desenvolver a pesquisa intitulada "A adoção de tecnologias leves para a qualificação da atenção pré-natal" com o objetivo de promover a capacitação dos profissionais que realizam a consulta de pré-natal em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do município de Porto Alegre-RS, com a inclusão de tecnologias leves e ações educativas voltadas ao atendimento das gestantes. As tecnologias leves constituem-se em tecnologias de relações do tipo produção de vínculo, escuta e acolhimento(2).

A capacitação aconteceu com a participação ativa dos pré-natalistas e das pesquisadoras, sendo que durante os encontros participativos emergiram várias necessidades dos profissionais em relação às diferentes temáticas que constituem as práticas da atenção pré-natal, dentre elas o aleitamento materno. Desta forma, este artigo trata de parte da pesquisa referida anteriormente e aborda as temáticas sobre aleitamento materno que surgiram nos encontros para a capacitação dos pré-natalistas.

A relevância de se trabalhar com amamentação justifica-se pela indiscutível importância desta prática em relação à saúde materno infantil. Os dados disponíveis em relação às taxas de aleitamento materno são provenientes de duas pesquisas realizadas nas capitais brasileiras e no Distrito Federal, sendo que a primeira aborda indicadores de aleitamento materno analisados em 1999 e, a segunda, analisa a evolução dos mesmos indicadores entre os anos de 1999 a 2008. A primeira pesquisa demonstra que a taxa de prevalência de aleitamento materno em crianças menores de 4 meses foi de 35,5% no Brasil; 41,1% na região Sul e 38,4% em Porto Alegre(3). Esse mesmo indicador mostra que, na segunda pesquisa, houve um aumento dessa taxa para 51,2% no Brasil; 53,6% na região Sul e 46,2% em Porto Alegre(4). Atualmente, a prevalência de aleitamento materno exclusivo em crianças menores de 6 meses encontra-se em 41% no Brasil; 43,9% na região Sul do Brasil e 38.2% em Porto Alegre. Já a duração mediana de aleitamento materno exclusivo no Brasil é de 54,11 dias no Brasil; 59,34 dias na região Sul e 51,84 dias em Porto Alegre(4).

Mesmo com uma melhora considerável dos indicadores citados, no Brasil, ações que visam à promoção do aleitamento materno na atenção básica estão sendo implementadas em nível federal, estadual e municipal, dentre elas, a Iniciativa Unidade Básica Amiga da Amamentação (IUBAAM) e a Rede Amamenta Brasil. Porém, com todo o avanço científico e com os esforços de diversos organismos nacionais (Política Nacional de Aleitamento Materno do Ministério da Saúde) e internacionais, a duração da amamentação no Brasil ainda não atingiu o recomendado pela Organização Mundial da Saúde, em especial no que se refere ao aleitamento materno exclusivo por seis meses e à amamentação complementada por até 2 anos ou mais(5).

Por isso, objetivando ampliar a compreensão acerca de como as mulheres percebem a amamentação e a atenção recebida durante o ciclo gravídico-puerperal, um estudo concluiu que o atual modelo assistencial em amamentação não foi condizente com as necessidades das gestantes(6). O mesmo estudo ainda apontou a pouca efetividade na comunicação entre gestantes e profissionais acerca do preparo para a futura amamentação como principal falha na atenção pré-natal(6). Nesse sentido, o preparo para o aleitamento materno deve acontecer a cada consulta de pré-natal, através de orientações para a gestante(7).

Tanto os serviços quanto os profissionais de saúde são responsabilizados pelo sucesso da amamentação, sendo que a informação e o apoio fornecido às mulheres devem se estender desde a atenção pré-natal, considerando o desejo da mulher de amamentar ou não, os seus medos e angústias, as suas experiências anteriores e o seu contexto de vida, que poderão influenciar diretamente no sucesso da amamentação(8).

Desta forma, os objetivos deste estudo foram identificar os temas relacionados ao aleitamento materno durante os encontros participativos com os pré-natalistas e relatar as ações e/ou estratégias propostas durante cada encontro.

MÉTODOS

Estudo qualitativo com base em pressupostos da pesquisa participante(9). Foram utilizados registros que compõem o banco de dados da pesquisa intitulada "A adoção de tecnologias leves para a qualificação da atenção pré-natal".

As capacitações para o atendimento pré-natal foram realizadas na UBS Panorama, localizada no bairro Lomba do Pinheiro, no município de Porto Alegre-RS. Aconteceram entre outubro de 2007 e outubro de 2008, totalizando nove encontros conforme a disponibilidade das profissionais. Os assuntos de cada encontro foram trabalhados de acordo com as necessidades da pesquisa e interesse das participantes.

Foram realizadas duas visitas ao Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, hospital de referência para o parto das gestantes atendidas nesta UBS. As três enfermeiras e as quatro médicas que realizam o atendimento pré-natal na UBS Panorama aceitaram participar da capacitação que aconteceu sob forma de encontros participativos entre a equipe de pesquisadoras e as participantes do estudo.

A coleta de dados foi realizada nos diários de campo provenientes da capacitação das profissionais. Os mesmos foram confeccionados coletivamente pelas pesquisadoras do estudo, no qual registraram por escrito o que foi discutido no decorrer de cada encontro e das visitas. A análise dos dados foi realizada segundo categorizações de dados(10).

Os dispositivos legais da Resolução do Conselho Nacional de Saúde de número 196/1996 foram respeitados, protegendo os direitos das participantes com relação à regulamentação das atividades de pesquisa envolvendo seres humanos(11).

A pesquisa obteve aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Prefeitura Municipal de Porto Alegre sob processo de número 001.051355.06.0. Foi elaborado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido conforme a resolução 196/96(11). Além disso, as autoras se comprometeram a manter a confidencialidade das informações contidas nos diários de campo, assim como, o anonimato das participantes da capacitação.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir da análise dos dados, foram identificados dois temas: o primeiro sobre a necessidade dos profissionais frente à capacitação, os quais estão contemplados em três sub-temas. O segundo tema apresenta as ações e estratégias propostas durante a capacitação.

As necessidades das profissionais frente à capacitação para o atendimento pré-natal

Atualmente, quando se fala em capacitação, muitas pessoas associam o termo como sendo um treinamento para alguma finalidade específica e, frequentemente, atribuem sinonímia aos dois. Neste sentido, a capacitação poderia ser alcançada apenas pela repetição de uma atividade, não garantindo a aprendizagem nem a reflexão acerca do que foi aprendido.

Portanto, acredita-se que não basta treinar um grupo de profissionais a fim de assegurar um melhor atendimento no pré-natal. É preciso que estes se sintam instigados e mobilizados a repensar suas condutas frente à prática diária. O pré-natal deve ser um momento de interação entre mulheres e profissionais de saúde, servindo como uma ação educativa, não somente para o fornecimento de informações sobre aspectos relacionados à gravidez, parto e cuidados com o bebê(12).

A falta de atualização das profissionais

As constantes mudanças relacionadas à prática dos profissionais de saúde tornam evidente a necessidade de atualização, a fim de que seja oferecido um atendimento adequado à população, o que fica expresso no registro do diário de campo:

Uma das profissionais disse que não orienta mais nada sobre amamentação, pois sempre ocorrem mudanças e ela se sente insegura para orientar as gestantes neste aspecto. (Encontro 3)

O sentimento de insegurança em relação ao trabalho diário de um profissional pode surgir em função da sua desatualização técnico científica. Nesse sentido, a relação saber/fazer exerce grande influência na sua prática e evita o sentimento de insegurança.

Em um dos encontros ficou registrado que os profissionais estão cientes da necessidade de atualizações para que forneçam orientações adequadas para cada caso, o que fica caracterizado:

Uma das participantes afirmou que é muito importante a atualização de todos os profissionais. (Encontro 3)

Refletindo acerca do preparo e da atuação dos profissionais na área da saúde da mulher e especificamente no aleitamento materno durante o pré-natal, um estudo identificou que existe falha dos profissionais na abordagem com as gestantes em relação à amamentação(13).

Observou-se o desconhecimento dos pré-natalistas sobre as recomendações atuais em relação ao aleitamento materno. Tal situação faz com que o profissional, muitas vezes, exponha a gestante à adoção de condutas inadequadas e desatualizadas:

Uma das profissionais disse que orienta as gestantes a colocarem peneirinha na mama durante a gravidez para ajudar a formar o bico. (Encontro 3)

Analisando a falta de atualização das profissionais em relação às orientações sobre aleitamento materno reafirmou-se que a maioria delas desconhece o que é preconizado quando informações ultrapassadas são transmitidas às mulheres. Pode-se perceber que as profissionais não acompanharam as mudanças que ocorreram ao longo do tempo, conforme segue:

Uma das profissionais disse que orienta o uso de chá preto no tratamento das fissuras das puérperas. (Encontro 3)

Uma das profissionais mencionou que a última vez que estudou algo sobre aleitamento materno foi na sua graduação, há mais de dez anos atrás. (Encontro 3)

Os profissionais de saúde carecem de capacitação técnica de modo permanente, uma vez que a maioria, após sua graduação muitas vezes não volta a se atualizar(13). Desta forma, os profissionais que estiverem preparados, atualizados e bem informados terão melhores condições de exercer o seu papel de multiplicadores da prática da amamentação a fim de promover o seu sucesso.

As profissionais como referência de atendimento às mulheres

No relato das participantes durante a capacitação, observou-se que as mulheres utilizam os serviços da UBS em estudo buscando principalmente por ações de proteção e recuperação. Essa procura objetiva a busca de informações que minimizem e/ou esclareçam as suas dificuldades, dúvidas, inseguranças e anseios. Isso ficou evidente quando:

Uma das participantes comentou que grande parte da população da UBS Panorama amamenta e que muitas mulheres costumam procurar ajuda com elas quando têm problemas com a amamentação. (Encontro 2)

Se a mulher que procura ajuda não for acolhida pelos profissionais de saúde, ela irá procurar a solução para os seus problemas com uma pessoa que considere como apoio/suporte para lhe fornecer tais informações(14). De acordo com o contexto de vida de cada mulher, incluindo experiências, hábitos, crenças, mitos, tabus, preconceitos e costumes, isso poderá desfavorecer o aleitamento materno e, consequentemente, favorecer o desmame precoce do bebê.

Em estudo que objetivou conhecer as crenças e as práticas da nutriz e de seus familiares sobre aleitamento materno afirmou-se que a busca de validação de crenças no aleitamento materno acontece junto a outras pessoas do convívio social e familiar da nutriz, principalmente àquelas que já tiveram as mesmas experiências e vivências(14).

Desta forma, a nutriz seleciona as crenças que julga mais adequadas para ela e para o seu bebê e, muitas vezes, não questiona se algumas dessas crenças transmitidas, principalmente pela sua família, poderão lhe trazer algum tipo de prejuízo(14). Por isso, ressalta-se que para a manutenção do aleitamento materno, é importante que o serviço de referência seja de fácil acesso e resolva com disponibilidade os problemas relacionados à amamentação(15).

Salienta-se o exposto, pois "um grande número de crianças são desmamadas por causas perfeitamente possíveis de serem resolvidas com um programa educativo de assistência"(13). Esta afirmação ratifica a importância do profissional em orientar e educar as gestantes sobre o aleitamento materno de forma efetiva, pois à medida que elas são orientadas e encorajadas com informações claras e esclarecedoras, elas criam confiança acerca do seu potencial para amamentar fazendo com que dificuldades futuras sejam minimizadas e/ou evitadas.

Da mesma forma acontece quando existe algum componente que contra-indique ou dificulte a amamentação. Nesses casos, o preparo e as orientações fornecidas desde o pré-natal são importantes para que a mulher relativize tal situação ou tenha tempo para se adaptar a uma futura condição. Visto que muitas vezes as mulheres buscam ajuda em função de uma dificuldade ou inabilidade em lidar com as questões do aleitamento, a resolução dos problemas enfrentados por elas dependerá não só dos profissionais de saúde, mas de todo o suporte que possa ser oferecido a elas.

Assim, a ação resolutiva não se reduz a uma conduta, mas, à forma como a situação é conduzida desde o seu início até o seu fim, de maneira que todos os recursos possíveis sejam utilizados a fim de satisfazer e resolver a situação do usuário que busca por um objetivo específico.

A importância de padronizar as condutas das profissionais

É importante levar em consideração que entre profissionais de uma mesma unidade de atenção pré-natal aparecem discordâncias entre o modo de agir frente a situações que podem levar à interrupção da amamentação. Assim, reforça-se a idéia de que os profissionais, enquanto em serviço, precisam de informações claras, precisas e seguras para que a promoção e apoio ao aleitamento possam acontecer de forma contínua, evitando o desmame precoce.

Essa situação poderia ser prevenida ou minimizada se toda a equipe de saúde realizasse um trabalho integrado, desde o início do pré-natal e durante todo o seguimento da puericultura. Com isso, seria mais fácil promover a implantação e a manutenção do aleitamento materno por períodos mais prolongados(16). Na UBS em estudo, a preocupação com o desmame precoce das crianças ficou evidente quando:

Uma das participantes comentou que é muito a favor da amamentação, mas que uma profissional de outra área prescreve muito leite artificial. (Encontro 1)

Quando os profissionais adotam condutas divergentes em relação às práticas do aleitamento, podem surgir situações de conflito entre os colegas da equipe, pois as condutas dependem de cada profissional, de acordo com o seu saber. Este fato desestimula alguns membros da equipe a orientar o que consideram correto, sendo que os prejudicados com essa conduta serão a mulher e o seu filho, como observa-se a seguir:

Uma das participantes relatou que está cansada de se contrapor à orientação alimentar fornecida por uma profissional de outra área, mas, mesmo assim, ainda continua insistindo na amamentação. (Encontro 1)

Da mesma forma que essa situação pode causar impacto na assistência prestada por uma das profissionais, é comentado em um dos encontros que uma profissional de outra área age como facilitadora acerca das questões sobre amamentação.

Uma das profissionais presentes no encontro comentou que uma profissional de outra área que trabalha com grupos de gestantes de 3º trimestre de gravidez sempre salienta nos grupos a importância da amamentação. (Encontro 1)

Mesmo assim, as diferenças em relação às informações fornecidas sobre a alimentação dos bebês pelas profissionais que realizam pré-natal e por uma profissional de outra área fizeram com que, em um dos encontros realizados, as próprias profissionais envolvidas na capacitação sugerissem uma resolução para a dificuldade encontrada. Observou-se isso quando:

O grupo levantou a proposta de convidar a profissional da outra área a participar das reuniões para que as condutas fossem discutidas com o objetivo de incrementar o tempo de aleitamento. (Encontro 1)

Chamou atenção o modo como uma das profissionais que participou dos encontros para a capacitação sentiu a sua atuação e a de outros profissionais frente às orientações dadas sobre amamentação, durante a consulta de pré-natal.

Isso pôde ser observado de acordo com o que segue:

Uma das profissionais comentou que na primeira consulta de pré-natal realizada pelas enfermeiras elas até conversam com as pacientes sobre amamentação, mas que depois as outras consultas são com as médicas. (Encontro 2)

Esta observação se deu pelo fato de que no início da capacitação as enfermeiras realizavam só a primeira consulta de pré-natal, sendo que as demais consultas sempre eram realizadas pelas médicas. Esse fato causa divergências em relação às condutas e às orientações fornecidas às gestantes sobre aleitamento materno, em cada consulta.

Com o exposto, salienta-se que o exame de mamas com as suas devidas orientações também deve ser realizado em diferentes momentos educativos e durante as consultas de pré-natal. Portanto, é um ato que deve ser executado e praticado pelos profissionais envolvidos na atenção pré-natal, independentemente do momento em que é realizado ou por quem é realizado.

Ações e estratégias propostas na capacitação

Durante os encontros para a capacitação ações e estratégias foram propostas, como: a revisão e atualização de informações sobre aleitamento materno, visitas ao hospital de referência da UBS em estudo, mudanças no atendimento pré-natal e decisão de implantação da IUBAAM.

Em cada encontro, dúvidas surgiram em relação à técnica, às orientações, às atualizações e à prática referente ao aleitamento materno. Para tanto, uma enfermeira, conselheira em aleitamento materno participou do quarto encontro realizado, no qual esclareceu e abordou vários aspectos sobre a técnica e a fisiologia da amamentação; armazenamento, estocagem e degelo do leite materno; funcionamento dos bancos de leite; fatores emocionais que influenciam na amamentação; situações que contra-indicam o aleitamento materno, entre outros.

Além desse encontro específico para esclarecer questões acerca do aleitamento materno, também foram realizadas duas visitas ao hospital de referência da UBS Panorama. As visitas favoreceram uma aproximação entre as profissionais do hospital e da UBS e possibilitaram que as participantes da capacitação visualizassem na prática as questões referentes aos bancos de leite, ao Método Canguru e aos demais programas do hospital.

No que tange ao atendimento pré-natal, o processo de trabalho foi reestruturado e a dinâmica do atendimento apresentou alterações. Atualmente, as profissionais dispõem de 45 minutos para a realização da primeira consulta e de 30 minutos para a realização das consultas posteriores, ao passo que no início da capacitação o tempo utilizado era de 30 e 20 minutos, respectivamente. As enfermeiras realizavam somente a primeira consulta do pré-natal, porém, atualmente as enfermeiras e as médicas realizam a consulta de forma alternada.

Finalmente, um dos aspectos mais importantes ocorridos durante a capacitação, foi o pedido de implantação da IUBAAM na UBS Panorama. Esta proposta, atualmente, encontra-se em fase de construção do conteúdo a ser trabalhado em cada encontro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sabe-se que a amamentação precisa ser um comportamento aprendido e exercitado e que mulheres e profissionais de saúde precisam ser estimulados, encorajados e apoiados a fim de manter os indicadores de amamentação em níveis ótimos.

A falta de atualização e a diferença nas condutas das profissionais que realizam pré-natal foram importantes achados desse estudo e comprovaram a necessidade de capacitação em UBS's à medida que as profissionais admitiram que existem falhas no que diz respeito ao seu próprio aprendizado e atuação.

A capacitação, através de encontros com participação ativa de todas, fez com que as profissionais verbalizassem suas inseguranças, descontentamentos, dúvidas e anseios, o que facilitou a construção em conjunto, entre pesquisadoras e participantes, de soluções viáveis a fim de melhorar ou amenizar tais situações. Desta forma, todas as sete participantes concordaram que o preparo para o aleitamento materno deve ser algo trabalhado com as gestantes desde a primeira consulta de pré-natal, tendo prosseguimento nas consultas posteriores.

As estratégias e ações adotadas a fim de promover a capacitação dessas profissionais tiveram resultados positivos e além de oportunizarem o repensar das práticas diárias das profissionais, também causaram transformações nas mesmas, fazendo com que o estímulo ao aleitamento materno fosse incorporado como parte do cotidiano profissional de cada pré-natalista. Esse fato facilitou e favoreceu o acolhimento, o estabelecimento de vínculo com as gestantes e a aproximação dessas mulheres com suas unidades de referência, bem como a adoção de ações mais efetivas dos profissionais, de modo que os mesmos apostem na promoção, incentivo e intervenção no aleitamento materno.

No atendimento pré-natal ocorreram mudanças ao longo dos encontros, demonstrando que as profissionais podem interferir e intervir de maneira positiva frente ao aleitamento materno e a sua prática diária. Isso reforçou que a busca de soluções pode ser conquistada através de pequenas mudanças.

Ressalta-se a importância da capacitação na decisão de implantação da IUBAAM na UBS e o quanto essa iniciativa trará benefícios a todos os envolvidos com a promoção e a prática do aleitamento materno, sendo um dos resultados positivos da pesquisa.

A dificuldade encontrada no presente estudo deu-se em função da adequação dos horários das profissionais para a realização dos encontros. Tal fato confirma que quando existe articulação entre os serviços e as entidades responsáveis pelo mesmo, a implantação e reformulação de estratégias são facilitadas a fim de que tal atendimento e programação sejam efetivos e aconteçam.

Finalmente, considera-se que as estratégias para a melhoria dos serviços prestados à população e para a atuação diária dos profissionais devem ser realizadas permanentemente e intermiten-temente. Além disso, a implantação dos programas de saúde e as obrigatoriedades impostas pelos gestores não podem ser rígidas e fechadas, pois cada unidade de saúde possui suas peculiaridades, sua população com seu contexto de vida, sua equipe, seu modo de trabalhar. Tais fatos justificam a necessidade de participação dos profissionais e dos usuários nesse processo com a adequação dos programas à realidade de cada serviço de saúde.

Submissão: 10/08/2009 Aprovação: 26/06/2010

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  • Autor correspondente
    Joice Moreira Schmalfuss
    Rua São Manoel, 963. Bairro Santa Cecília
    CEP: 90620-110. Porto Alegre,RS
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Recebido
      10 Ago 2009
    • Aceito
      26 Jun 2010
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