Acessibilidade / Reportar erro

Desafios históricos da enfermagem à luz do pensamento bioético

Historical challenges of nursing through bioethical issues

Desafíos históricos de la enfermería a la luz del pensamiento bioético

Resumos

Reflexão teórica sobre a bioética do cuidar, a partir da perspectiva histórica do cuidado em saúde e suas contribuições para a ampliação da produção de conhecimentos em Enfermagem, como proposta de intervenção mais humana e democrática no exercício do cuidar; através de conceitos baseados no respeito à pessoa humana, na formação de profissional comprometido com realidade social. A enfermagem como profissão priorizou os avanços técnico-científicos, em detrimento ao cuidado humanizado, decorrentes das demandas impostas pelo mundo capitalista. Neste sentido, se coloca como desafio a sistematização do cuidado, o que possibilitará a melhoria da qualidade de vida da clientela, sendo necessário para isto o estabelecimento de interlocuções de saberes com outros profissionais, consolidando a legitimidade da enfermagem como profissão.

Bioética; Saúde; Enfermagem


This is a theoretical discussion of the bioethics of care from the historical perspective of health care and its contribution to the expansion of knowledge roduction in Nursing, which is presented as a proposal for a more humane and democratic action in the exercise of care through the formulation of new concepts based on respect for human dignity, unselfishness and knowledge autonomy discussed in the theories of nursing. Nursing has been seen as a profession on the rise due to the care for the individual on his/her complete existential dimension where bioethical discussions are signs of new ways of integrating actions and other health professionals who take care of the solutions for the conflicts experienced in the day to day care in hospital services.

Bioethics; Health; Nursing


Reflexión teórica sobre la bioética del cuidar, a partir de la perspectiva histórica del cuidado en salud y sus contribuciones para la ampliación de la producción de conocimientos en Enfermería, como propuesta de intervención más humana y democrática en el ejercicio del cuidar, a través de los conceptos basados en el respeto de la persona humana en la formación del profesional comprometido con la realidad social. La enfermería como profesión priorizó los avances técnico-científicos en detrimento al cuidado humanizado, como consecuencia de las demandas impuestas por el mundo capitalista. En este sentido, se coloca como desafío la sistematización del cuidado, lo que posibilita la mejoría de la calidad de vida de la clientela siendo necesario para esto el establecimiento de interlocutores de saberes con otros profesionales, consolidando la legitimidad de la enfermería como profesión.

Bioética; Salud; Enfermería


REFLEXÃO

Desafios históricos da enfermagem à luz do pensamento bioético

Historical challenges of nursing through bioethical issues

Desafíos históricos de la enfermería a la luz del pensamiento bioético

Marylane Viana Silva; Maria do Livramento Fortes Figueiredo

Universidade Federal do Piauí. Departamento de Enfermagem. Programa de Pós-graduação Mestrado em Enfermagem. Núcelo de Estudos e Pesquisas sobre Mulher e Relações de Gênero. Teresina, PI

Autor correspondente Autor correspondente Marylane Viana Silva. Rua Desembargador João Pereira, 4177. Cond. Jardins do São Cristovão Bl. F Apto. 404. Bairro Santa Isabel. CEP 94147-502. Teresina, PI. E-mail: marylaneveloso@hotmail.com

RESUMO

Reflexão teórica sobre a bioética do cuidar, a partir da perspectiva histórica do cuidado em saúde e suas contribuições para a ampliação da produção de conhecimentos em Enfermagem, como proposta de intervenção mais humana e democrática no exercício do cuidar; através de conceitos baseados no respeito à pessoa humana, na formação de profissional comprometido com realidade social. A enfermagem como profissão priorizou os avanços técnico-científicos, em detrimento ao cuidado humanizado, decorrentes das demandas impostas pelo mundo capitalista. Neste sentido, se coloca como desafio a sistematização do cuidado, o que possibilitará a melhoria da qualidade de vida da clientela, sendo necessário para isto o estabelecimento de interlocuções de saberes com outros profissionais, consolidando a legitimidade da enfermagem como profissão.

Descritores: Bioética; Saúde; Enfermagem.

ABSTRACT

This is a theoretical discussion of the bioethics of care from the historical perspective of health care and its contribution to the expansion of knowledge roduction in Nursing, which is presented as a proposal for a more humane and democratic action in the exercise of care through the formulation of new concepts based on respect for human dignity, unselfishness and knowledge autonomy discussed in the theories of nursing. Nursing has been seen as a profession on the rise due to the care for the individual on his/her complete existential dimension where bioethical discussions are signs of new ways of integrating actions and other health professionals who take care of the solutions for the conflicts experienced in the day to day care in hospital services.

Key words: Bioethics, Health; Nursing.

RESUMEN

Reflexión teórica sobre la bioética del cuidar, a partir de la perspectiva histórica del cuidado en salud y sus contribuciones para la ampliación de la producción de conocimientos en Enfermería, como propuesta de intervención más humana y democrática en el ejercicio del cuidar, a través de los conceptos basados en el respeto de la persona humana en la formación del profesional comprometido con la realidad social. La enfermería como profesión priorizó los avances técnico-científicos en detrimento al cuidado humanizado, como consecuencia de las demandas impuestas por el mundo capitalista. En este sentido, se coloca como desafío la sistematización del cuidado, lo que posibilita la mejoría de la calidad de vida de la clientela siendo necesario para esto el establecimiento de interlocutores de saberes con otros profesionales, consolidando la legitimidad de la enfermería como profesión.

Descriptores: Bioética; Salud; Enfermería.

INTRODUÇÃO

A evolução histórica do ofício de enfermagem tem percorrido uma trajetória que acompanha a evolução do conhecimento humano no campo das ações de saúde e das ciências humanas, com os agravantes de vencer os desafios impostos pelos antagonismos de classe e pelos preconceitos associados às relações de gênero(1-2).

Historicamente, a enfermagem pode ser dividida em duas fases conhecidas por antiga e moderna. A primeira diz respeito às enfermeiras que eram treinadas à prática da enfermagem através de outras que dominavam essa prática no cuidar dos doentes, desenvolvendo, nesse sentido, um comportamento baseado em normas, sendo adestradas para cuidar, apenas com o mínimo preparo teórico que fundamentasse seu trabalho profissional. A segunda, caracterizada pela busca de conhecimento sistematizado, tecnicista e cientificista, pelo modelo de saúde pautado no capitalismo. Exigindo daí à formação universitária, por parte daqueles que a desejam praticar(2).

O contexto contemporâneo caracterizado pelo reordenamento econômico e por mudanças no mundo do trabalho e das novas tecnologias aponta a necessidade cada vez maior, de profissionais versáteis, críticos e comprometidos com o ambiente de trabalho; movidos pela autonomia de atitudes e pela presteza de cuidados ao cliente(3).

O objetivo deste estudo é promover uma discussão sobre os atuais desafios que a enfermagem enfrenta à luz do pensamento bioético do cuidar. Portanto, partindo de buscas de referenciais teóricos e filosóficos de diversos pensadores e autores de livros e artigos científicos, inclusive na área de Enfermagem, construiu-se esta reflexão, na perspectiva de formatar um marco conceitual capaz de iluminar as discussões a cerca do posicionamento ético humanístico que deve nortear as ações de cuidar da Enfermagem.

A BIOÉTICA DO CUIDAR E A ENFERMAGEM

Em tempos modernos, a complexidade da assistência à saúde exige dos profissionais da área, inúmeras competências para lidar com os problemas cotidianos, como também com os avanços tecnológicos que imergiram da ciência. Nessa perspectiva, o cuidar da saúde transcende o saber empírico, considerando as descobertas científicas e os mais sofisticados recursos tecnológicos(3). Mesmo que os profissionais estejam tecnicamente preparados para utilização de métodos e procedimentos inovadores, muitas vezes não conseguirão minimizar o sofrimento e a dor do ser que recebe cuidados, pois nesta prática assistencial tecnológica faltou o cuidado ético, humano e respeitoso.

Diante destes dilemas éticos próprios dos seres humanos, tanto os profissionais, quanto os clientes/pacientes partilham de uma condição comum e inevitável que situa a bioética do cuidar no âmbito das relações humanas, circunscritas no domínio da enfermagem(4). Porém, nem sempre os profissionais se colocam na posição de pacientes, quando isto ocorre evidencia-se uma tomada de consciência, que se mostra desgastante, por exigir uma inversão de valores éticos e morais nos espaços sociais individualizados e moralmente heterogêneos(5-8).

Então como consequência desse ponto de vista, a valorização profissional se encaminha de forma urgente, equivocada e às vezes desesperadora. Gerando uma condição de sobrevivência, biologicamente, ampla, pelas inúmeras possibilidades de adiamento da morte e, baixa qualidade de vida que nos reduz mais a sobreviventes que a viventes(3).

No cenário atual de profunda pluralidade social, ao enfermeiro compete mais que um adestramento técnico de recursos de ponta e um obediente agente da equipe de saúde, mas um competente profissional-cidadão responsável por suas ações, capaz de perceber no ser cuidado, um sujeito do autocuidado e da preservação do seu meio ambiente.

A construção de um modelo mais humanizado na área de saúde pressupõe o exercício de uma ética profissional mais autônoma, comprometida com a clientela, com a comunidade e com o trabalho e muito menos com a técnica e com a doença. Isto é, a bioética do cuidar concentra sua base na promoção de saúde e muito menos no tratamento das doenças(9).

CONSCIÊNCIA MORAL, BIOÉTICA DO CUIDAR E ENFERMAGEM

O cuidar, na perspectivada bioética, traz consigo a concepção de que o cuidador precisa ter mais do que conhecimento técnico-científico, ter, sobretudo empatia pelo ato de cuidar com a responsabilização de sua prática em colocar-se no lugar do outro e de sentir-se cuidado, isto é, transcende a existência do dever de cuidar, prática ensinada em toda a história da enfermagem(8-9).

É relevante considerar que, a globalização da economia, a revolução tecnológica, a inserção ainda que tímida, mas frequente nos últimos anos, por parte de homens no exercício da enfermagem, inseriu este profissional em condições de trabalho cada vez mais adestradas, tecnicistas e, portanto, centrados no modelo biomédico(2).

No entanto, e paradoxalmente, se por um lado a inserção do homem no campo da enfermagem e a centralização das ações no modelo biomédico refletiu-se em desumanização, por outro lado ensejou a ampliação das fronteiras profissionais e necessidade de se estabelecer novas relações mútuas e múltiplas com outros profissionais, o que contribuiu para enriquecimento das ciências da saúde. Isto enfatiza o desafio da enfermagem na perspectiva da bioética do cuidar.

Contudo, considera-se pertinente que a subjetividade dos sujeitos sob seus cuidados, seja o foco principal de sua existência profissional e a utilização dos recursos tecnológicos seja um meio para fazê-lo, de forma racional e apenas complementar, não exclusivamente(3).

As Teorias de Enfermagem apontam princípios que possibilitam uma atuação profissional verdadeiramente autônoma, no entanto, ao longo de sua história, o oficio da enfermagem não galgou concretude em suas ações para torná-la profissão liberal, além de ter minimizado suas possibilidades de autonomia(10-11).

No entanto, a visão bioética do cuidar está voltada para a formação de uma consciência coletiva de responsabilização uns sobre os outros; na compreensão de que a moralidade de nossas ações deve partir desta relação de responsabilidade e da certeza de que a comunicação entre as pessoas seja de tolerância sobre as diversidades culturais que caracterizam o mundo humano a fim de solucionar os conflitos morais(7-9).

Não se pode negar a evidente influência das questões de gênero na desvalorização das profissões eminentemente femininas, tais como a enfermagem, que é frequentemente colocada numa posição hierárquica de inferioridade, porém, tanto a luta de feministas, como os princípios humanistas de igualdade e respeito aos seres humanos independente do sexo, têm atuado de forma combativa nestas desigualdades sociais e culturais, na perspectiva do alcance do respeito e da igualdade entre homens e mulheres(1,5-6).

A consolidação da enfermagem como ciência deveu-se, também, aos aportes da corrente principialista da bioética, ao propor os princípios de autonomia, justiça, beneficência e não-maleficência. Isto, permitiu avanços importantes para superação de determinados conflitos produzidos pelo efeito indesejado das desigualdades no âmbito das relações sociais e profissionais, através da sistematização dos saberes pertinentes ao ofício, para constituir um campo profissional digno do ser humano e para o ser humano(3,10).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desafio que se apresenta ao campo da enfermagem, no início do século XXI, consiste na reconstrução de uma nova postura ética, aqui chamada de bioética do cuidar, que deve estar difuso em todo o modus vivendi e modus operandi, nas diversas áreas da atuação profissional no campo da saúde. Essa nova postura vem se identificando como urgente na sua capacidade de reinventar as relações no universo multiprofissional e destes, com os pacientes.

Portanto, a essência da ação do cuidar não está, necessariamente, situada na utilização da alta tecnologia, mas na natureza das relações humanas que caracterizam a prática da enfermagem no seu cotidiano. Nesse entendimento, os serviços de saúde e as ações que os caracterizam nos diversos fazeres profissionais, voltar-se-ão para a "pessoa com doença e não à doença da pessoa", superando o reducionismo cartesiano que ignora a dimensão emocional, social, histórica e espiritual do ser humano.

A construção do conhecimento na profissão, já não se preocupa com a reprodução de antigos modelos, mas com a construção do seu próprio saber como ciência moderna, socialmente reconhecida e legitimada com epistemologia própria, metodologias, autonomia e amplo campo de atuação, portanto, livre das relações históricas de subalternidade.

Esta realidade, emergiu de uma contínua, permanente e necessária interlocução entre os diversos saberes profissionais, que evoluíram historicamente distanciados e culturalmente indiferentes entre si, se reconhecem como elementos integrantes de um corpo profissional heterogêneo e harmônico cuja ações devem convergir para o bem estar do paciente.

Submissão: 25/01/2010 Aprovação: 27/07/2010

  • 1. Boemer MR, Sampaio MA. O exercício da enfermagem em sua dimensão bioética. Rev Latino-am Enfermagem 1997; 5(2): 33-8.
  • 2. Lima MJ. O que é enfermagem. São Paulo: Brasiliense; 2005.
  • 3. Bellato R, Galva MAM. A cidadania ética como eixos norteadores da formação do enfermeiro. Rev Bras Enferm 2003; 56(4): 429-32.
  • 4. Koerich MS, Machado RR, Costa E. Ética e bioética: para dar início à reflexão. Texto Contexto Enferm 2005; 14(1): 106-10.
  • 5. Kottow MH. Comentários sobre Bioética, vulnerabilidade e proteção. In: Garrafa V, Pessini L. Bioética: poder e injustiça. São Paulo: Loyola; 2002.
  • 6. Garrafa V, Porto D. Bioética, poder e injustiça: por uma ética de intervenção, In: Garrafa V, Pessini L. Bioética: poder e injustiça. São Paulo: Loyola; 2002.
  • 7. Diniz D,Guilhem D. O que é bioética. São Paulo: Brasiliense; 2002.
  • 8. Boff L. Saber cuidar: ética do humano - compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes; 2004.
  • 9. Zaboli ELP. Bioética do cuidar: a ênfase na dimensão relacional. Rev Estima 2003;1(1): 38-40.
  • 10. Waldow VR. Cuidar: expressão humanizadora da enfermagem. Petrópolis: Vozes; 2006.
  • 11. Horta, WA. Processo de enfermagem. São Paulo: EPU; 1979.
  • Autor correspondente
    Marylane Viana Silva.
    Rua Desembargador João Pereira, 4177. Cond. Jardins do São Cristovão Bl. F Apto. 404. Bairro Santa Isabel.
    CEP 94147-502. Teresina, PI.
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Aceito
      27 Jul 2010
    • Recebido
      25 Jan 2010
    Associação Brasileira de Enfermagem SGA Norte Quadra 603 Conj. "B" - Av. L2 Norte 70830-102 Brasília, DF, Brasil, Tel.: (55 61) 3226-0653, Fax: (55 61) 3225-4473 - Brasília - DF - Brazil
    E-mail: reben@abennacional.org.br