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Implicações do dimensionamento do pessoal de enfermagem no desempenho das competências do profissional enfermeiro

Implications of nursing staff's dimensioning in the accomplishment of professional nurse's competences

Implicaciones del dimensionamiento de personal de enfermería en el desempeño de las competencias del profesional enfermero

Resumos

Estudo exploratório-descritivo que objetivou dimensionar e avaliar a adequação do quadro de profissionais de enfermagem de um hospital universitário e refletir sobre a implicação do dimensionamento de pessoal no desempenho das competências do enfermeiro. Realizou-se a classificação diária dos clientes por instrumento apropriado e, a seguir, aplicou-se a metodologia proposta pela Resolução 293/2004 do Conselho Federal de Enfermagem, possibilitando discussão sobre a realidade institucional. Verificou-se inadequação no quantitativo da categoria enfermeiro e a necessidade de sensibilizar a equipe multiprofissional para a adoção de uma metodologia de trabalho que proporcione qualidade à assistência. Ressalta-se que o dimensionamento de pessoal gera implicações diretas no desempenho das competências do enfermeiro; portanto, um dimensionamento inadequado resulta em prejuízo na qualidade da assistência.

Enfermagem; Recursos humanos de enfermagem; Dimensionamento de pessoal; Cuidados de enfermagem


This exploratory-descriptive study aimed to measure and evaluate the adequacy of the professional nursing staff in a university hospital, and to reflect on the implications of personnel dimensioning in the performance of nurses' responsibilities. It was calculated the daily classification of patients, using appropriate instrument, and then it was applied the methodology proposed by Resolution Nº 293/2004 of the Federal Council of Nursing, enabling discussion of institutional reality. It was verified an inadequacy in the quantitative of the nurses category, and the need to sensitize the multidisciplinary team to adopt a working methodology that provides quality care. It is emphasized that the personnel dimensioning creates direct implications on the performance of nurses' responsibilities; therefore, an inappropriate personnel dimensioning results in loss in quality of care.

Nursing; Nursing Staff; Personnel dimensioning; Nursing Care


Estudio exploratorio-descriptivo que tuvo como objetivos calcular y evaluar la adecuación del cuadro de profesionales de enfermería de un hospital universitario y promover la reflexión sobre las implicaciones del dimensionamiento de personal de enfermería en el desempeño de las competencias del profesional enfermero. Se realizó la clasificación de los clientes todos los días por instrumento adecuado y, a continuación, se aplicó la metodología propuesta por la Resolución Nº 293/2004 del Consejo Federal de Enfermería, posibilitando la discusión de la realidad institucional. Se verificó inadecuación en el cuantitativo de la categoría de enfermero y la necesidad de sensibilizar el equipo multidisciplinario para adoptar métodos de trabajo que proporcionen mayor calidad a la asistencia. Señala-se que el dimensionamiento de personal de enfermería crea implicaciones directas en el desempeño de las competencias del enfermero y, cuando en inadecuación, causa una pérdida en la calidad de la asistencia.

Enfermería; Personal de enfermería; Dotación de Personal; Atención de Enfermería


PESQUISA

Implicações do dimensionamento do pessoal de enfermagem no desempenho das competências do profissional enfermeiro

Implications of nursing staff's dimensioning in the accomplishment of professional nurse's competences

Implicaciones del dimensionamiento de personal de enfermería en el desempeño de las competencias del profesional enfermero

Camila Mequi Maya; Ana Lúcia de Assis Simões

Universidade Federal do Triângulo Mineiro, Curso de Graduação em Enfermagem. Uberaba-MG, Brasil, E-mail: cmayavest@gmail.com

RESUMO

Estudo exploratório-descritivo que objetivou dimensionar e avaliar a adequação do quadro de profissionais de enfermagem de um hospital universitário e refletir sobre a implicação do dimensionamento de pessoal no desempenho das competências do enfermeiro. Realizou-se a classificação diária dos clientes por instrumento apropriado e, a seguir, aplicou-se a metodologia proposta pela Resolução 293/2004 do Conselho Federal de Enfermagem, possibilitando discussão sobre a realidade institucional. Verificou-se inadequação no quantitativo da categoria enfermeiro e a necessidade de sensibilizar a equipe multiprofissional para a adoção de uma metodologia de trabalho que proporcione qualidade à assistência. Ressalta-se que o dimensionamento de pessoal gera implicações diretas no desempenho das competências do enfermeiro; portanto, um dimensionamento inadequado resulta em prejuízo na qualidade da assistência.

Descritores: Enfermagem; Recursos humanos de enfermagem; Dimensionamento de pessoal; Cuidados de enfermagem.

ABSTRACT

This exploratory-descriptive study aimed to measure and evaluate the adequacy of the professional nursing staff in a university hospital, and to reflect on the implications of personnel dimensioning in the performance of nurses' responsibilities. It was calculated the daily classification of patients, using appropriate instrument, and then it was applied the methodology proposed by Resolution Nº 293/2004 of the Federal Council of Nursing, enabling discussion of institutional reality. It was verified an inadequacy in the quantitative of the nurses category, and the need to sensitize the multidisciplinary team to adopt a working methodology that provides quality care. It is emphasized that the personnel dimensioning creates direct implications on the performance of nurses' responsibilities; therefore, an inappropriate personnel dimensioning results in loss in quality of care.

Key words: Nursing; Nursing Staff; Personnel dimensioning; Nursing Care.

RESUMEN

Estudio exploratorio-descriptivo que tuvo como objetivos calcular y evaluar la adecuación del cuadro de profesionales de enfermería de un hospital universitario y promover la reflexión sobre las implicaciones del dimensionamiento de personal de enfermería en el desempeño de las competencias del profesional enfermero. Se realizó la clasificación de los clientes todos los días por instrumento adecuado y, a continuación, se aplicó la metodología propuesta por la Resolución Nº 293/2004 del Consejo Federal de Enfermería, posibilitando la discusión de la realidad institucional. Se verificó inadecuación en el cuantitativo de la categoría de enfermero y la necesidad de sensibilizar el equipo multidisciplinario para adoptar métodos de trabajo que proporcionen mayor calidad a la asistencia. Señala-se que el dimensionamiento de personal de enfermería crea implicaciones directas en el desempeño de las competencias del enfermero y, cuando en inadecuación, causa una pérdida en la calidad de la asistencia.

Palabras clave: Enfermería; Personal de enfermería; Dotación de Personal; Atención de Enfermería.

INTRODUÇÃO

Sabe-se que os hospitais universitários têm relevante importância no processo educacional e na melhoria das condições de saúde da população. Trata-se de uma organização complexa, em que são demandados diferentes tipos de tecnologia (leve, leve-dura e dura) e há a formação de identidades profissionais e reconhecimento social(1).

Destaca-se que a atenção hospitalar é efetivada pela conjugação do trabalho de vários profissionais, quando ações, procedimentos, rotinas e saberes complementam-se, constituindo o processo de cuidado em saúde(1).

Nesse contexto, ressalta-se a participação do Serviço de Enfermagem que, por suas características próprias, tem sido institucionalizado como um espaço de cuidado singular e específico, capaz de promover a agregação, a integração e a mobilização dos diferentes processos organizacionais(2).

No que concerne à assistência de enfermagem, um trabalho realizado por profissionais de diferentes categorias, as atividades encontram-se descritas no Decreto nº 94.406/87, que regulamenta a Lei nº 7.498 de 25 de junho de 1986, que trata do exercício profissional da enfermagem(3).

Por sua vez, as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Enfermagem(4) definem competências e habilidades próprias do profissional enfermeiro. Desta forma, são competências gerais do enfermeiro: exercer a atenção à saúde, desenvolvendo ações de prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde; avaliar, sistematizar e decidir a conduta de enfermagem mais apropriada para cada indivíduo; manter-se com comunicação acessível, segura e precisa; assumir posição de liderança diante da equipe multiprofissional e da comunidade; estar apto a administrar e gerenciar recursos, profissionais e informações; e estar em constante processo de aprendizado, proporcionando conhecimento à equipe e para si(4).

As mesmas diretrizes apontam algumas habilidades específicas do enfermeiro e entre elas estão a atuação como sujeito na formação de recursos humanos; intervenção no processo de saúde-doença, priorizando a qualidade da assistência/cuidado de enfermagem e a sua integralidade; garantia da compatibilidade entre cuidados de enfermagem prestados e as diferentes necessidades de cada indivíduo, família e grupos da comunidade; e, por fim, reconhecer-se como agente importante na determinação da dinâmica de trabalho institucional(4).

Em consonância com as Diretrizes Curriculares, o Decreto de Lei nº 94.406/87, referido anteriormente, regulamenta o exercício da Enfermagem, incumbindo ao enfermeiro, privativamente, as funções de planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços de assistência de enfermagem e, como integrante de uma equipe, a participação na elaboração, a execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde(3). Cabe ainda destacar que a American Nurses Association coloca a avaliação da qualidade e da efetividade do cuidado prestado ao cliente como responsabilidades do enfermeiro(5).

No entanto, durante a graduação, foi possível observar que o desempenho de algumas competências designadas ao profissional enfermeiro, na prática, não ocorre de forma satisfatória, provocando assim um flagrante comprometimento na qualidade da assistência e um distanciamento do preconizado pela academia, pela legislação e pela literatura científica.

Estudos publicados em 2005 corroboram esta observação ao afirmarem que "a atuação do enfermeiro nem sempre está direcionada ao atendimento das necessidades do cliente, e sim à realização de ações não inerentes à enfermagem"(6); e, ainda, que, "apesar de ser o profissional qualificado e capacitado legalmente para desenvolver uma assistência integral aos pacientes, observa-se que presta assistência sem sistematização e de forma fragmentada"(7).

Estes dados motivaram a busca pela compreensão dos aspectos que de fato contribuem para o prejuízo da assistência de enfermagem na instituição estudada, tendo como hipótese principal as dificuldades relacionadas ao quantitativo de recursos humanos na equipe de enfermagem.

Assim, pelo papel que representa o Serviço de Enfermagem nas instituições hospitalares e, ainda, considerando que seu quadro de pessoal normalmente constitui a força de trabalho mais numerosa no hospital, impõe-se a necessidade de se refletir sobre a adequação dos recursos humanos na Enfermagem. Neste estudo, optou-se por destacar o aspecto quantitativo do quadro de pessoal de enfermagem em uma instituição hospitalar, com o intuito de ponderar sobre suas implicações no desempenho das competências do profissional enfermeiro.

Tendo em vista esses aspectos, foram determinados os seguintes objetivos para este estudo: dimensionar e avaliar a adequação do quadro de profissionais de enfermagem de um hospital universitário, segundo a Resolução 293/2004 do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN); e refletir sobre as implicações do dimensionamento de pessoal no desempenho das competências do enfermeiro.

METODOLOGIA

Estudo exploratório-descritivo, realizado no Hospital de Clínicas da Universidade Federal Triângulo Mineiro (HC/UFTM), instituição de alta complexidade, que atende à população local e regional, sendo referência para 27 municípios da macrorregião do Triângulo Sul. Dispõe, atualmente, de 290 leitos conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS). Estruturalmente, foi construído em forma de 'H' e se divide em quatro blocos que comportam as especialidades de Ginecologia e Obstetrícia, Neurologia, Ortopedia, Clínicas Cirúrgica, Médica e Pediátrica, Doenças Infecto parasitárias, Hematologia, além de possuir unidades de Pronto-socorro adulto e pediátrico, Centro de Terapia Intensiva composto por unidades neonatal-pediátrica, adulta e coronária, Unidade de Terapia Renal Substitutiva, Centro de Quimioterapia, Hospital-dia Clínico e Pronto-atendimento oftalmológico. Agregam-se ainda três ambulatórios, um centro de reabilitação e unidades de realização de exames de alta complexidade.

Os dados foram coletados nas clínicas Cirúrgica e Médica. A escolha destas unidades deveu-se ao fato de que apresentam heterogeneidade em relação à complexidade dos cuidados requeridos. Ressalta-se que estas unidades são destinadas à internação de pessoas de ambos os sexos, maiores de 14 anos, tendo, respectivamente, 54 e 47 leitos.

O projeto desta pesquisa, Protocolo nº 1337, foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos da UFTM e segue os preceitos da Resolução 196/1996, que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos.

Para avaliar a adequação do quadro de profissionais de enfermagem, fez-se necessário realizar o dimensionamento do número de profissionais necessários para a assistência de enfermagem nas Unidades de Internação do HC/UFTM; assim, optou-se por utilizar a metodologia de cálculo de pessoal apresentada na Resolução 293/2004 – COFEN(8). Esta Resolução preconiza que, para um dimensionamento adequado, deve ser considerada a necessidade dos clientes em relação aos cuidados de enfermagem.

Para a classificação dos clientes internados nas clínicas citadas, quanto ao grau de complexidade dos cuidados demandados, após realização de estudo piloto, optou-se por utilizar o instrumento de Perroca do ano de 1996(9) por melhor se adequar à realidade da instituição escolhida.

Este instrumento(9) é constituído por 13 indicadores críticos de cuidados de enfermagem demandados pelo cliente: Estado Mental e Nível de Consciência, Oxigenação, Sinais Vitais, Nutrição e Hidratação, Motilidade, Locomoção, Cuidado Corporal, Eliminações, Terapêutica, Educação à Saúde, Comportamento, Comunicação e Integridade Cutâneo-Mucosa. Com base nestes indicadores e de acordo com a opção que melhor representa o seu estado em relação à assistência de enfermagem, o cliente recebe uma pontuação que definirá a categoria de cuidados adequada à situação, ou seja, cuidados mínimos, cuidados intermediários, cuidados semi-intensivos e cuidados intensivos(10).

A coleta de dados foi realizada por um grupo composto por acadêmicos de Enfermagem e enfermeiros previamente orientados, e desenvolveu-se diariamente, ao longo de dois meses, mediante observação sistemática de todos os clientes internados nas clínicas, com o intuito de acompanhar e avaliar a necessidade de cuidados de enfermagem durante o período das internações.

Depois de realizada a classificação dos clientes em relação à complexidade da assistência de enfermagem e constatado o número de profissionais (enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem) disponibilizado pela Diretoria de Enfermagem do HC/UFTM, verificou-se a existência de dois tipos de vínculo empregatício no hospital. Na instituição há profissionais contratados segundo o Regime Jurídico Único, mediante concurso público federal, e profissionais contratados pelo regime da Consolidação das Leis Trabalhistas, com jornada de trabalho de 40 e 36 horas semanais, respectivamente.

A fim de realizar o dimensionamento do quadro de pessoal de enfermagem das referidas unidades, foi calculada a média diária de clientes por categoria de cuidados e, a seguir, os dados obtidos foram aplicados na fórmula proposta pelo COFEN(8):

QP = KM x THE

Sendo,

QP (Quantitativo de Pessoal): o número de profissionais da equipe de enfermagem necessários na Unidade de Internação.

KM (Constante de Marinho): o coeficiente deduzido em função dos dias da semana, da jornada semanal de trabalho e do índice de segurança técnica da instituição. Uma vez que encontramos em nossa instituição dois tipos de vínculo empregatício, como descrito anteriormente, realizamos nossos cálculos considerando duas constantes KM(36h) e KM(40h).

THE (Total de Horas de Enfermagem): o somatório das horas de enfermagem necessárias para assistir os clientes hospitalizados com demanda de cuidados mínimos, intermediários, semi-intensivos e intensivos.

Assim, o THE foi obtido a partir da seguinte fórmula:

THE = [(NMPCMin x HECMin) + (NMPCInter x HECInter) + (NMPCSI x HECSI) + (NMPCInten x HECInten)]

O NMP é o número médio diário de clientes por categoria de cuidados e HE é o número de horas de enfermagem, por leitos, nas 24 horas, por categoria de cuidados. Desta forma,

- 3,8 horas de enfermagem, por cliente, na assistência mínima ou autocuidado;

- 5,6 horas de enfermagem, por cliente, na assistência intermediária;

- 9,4 horas de enfermagem, por cliente, na assistência semi-intensiva;

- 17,9 horas de enfermagem, por cliente, na assistência intensiva.

A partir de então, foram distribuídos os resultados encontrados segundo a categoria profissional (auxiliares, técnicos e enfermeiros) e a jornada de trabalho (manhã, tarde e noite)(11). Realizou-se a análise estatística descritiva dos dados obtidos e organizados em tabelas e gráficos, estabelecendo-se um paralelo entre o número médio de profissionais lotados atualmente na Diretoria de Enfermagem do hospital e os valores encontrados com a metodologia de dimensionamento de pessoal proposta pelo COFEN(8). As categorias profissionais foram distribuídas de acordo com o grupo de pacientes de maior prevalência seguindo os parâmetros mínimos apresentados pela legislação(8).

Os dados encontrados serviram de subsídio para a reflexão sobre a implicação do dimensionamento de pessoal no desempenho das competências do enfermeiro, bem como sobre a real necessidade de se adequar o número de pessoal de enfermagem na instituição, na busca da melhor qualidade da assistência e da humanização da saúde, tanto em relação ao cliente assistido, como em relação ao profissional enfermeiro, que merece exercer suas competências e habilidades em ambiente e condições dignas de trabalho.

RESULTADOS

O trabalho de enfermagem divide-se em diversos processos como cuidar/assistir, administrar/gerenciar, pesquisar e ensinar. Dentre estes, nota-se que o profissional enfermeiro dedica-se mais ao cuidar e ao gerenciar(12). No desempenho de suas competências gerenciais, ele também é importante agente na formação de recursos humanos e, desta forma, precisa avaliar a composição quantitativa e qualitativa de sua equipe, de acordo com as necessidades de sua clientela, para que seja possível a realização do cuidado com a melhor qualidade.

Foram realizadas, no período de coleta de dados, 4.373 avaliações de clientes internados nas clínicas Médica e Cirúrgica, sendo a maioria classificada com necessidade de cuidados mínimos. A análise dos dados referentes ao quadro de profissionais das unidades de Clínica Médica e Cirúrgica do HC/UFTM evidencia que ambos os setores apresentam-se em desacordo com os cálculos de dimensionamento de pessoal propostos pela Resolução 293/2004 do COFEN(8), como demonstrado a seguir.

Tabela 1

Tabela 2

DISCUSSÃO

Os resultados demonstraram que em ambas as unidades o número total de funcionários que compõe a equipe de enfermagem está dentro dos valores esperados. No entanto, ao se observar a categoria 'enfermeiros', notam-se valores que correspondem a aproximadamente um terço do número esperado para cada uma das unidades. Obviamente, este número reduzido de profissionais resulta em sobrecarga de trabalho e acúmulo de tarefas para os enfermeiros.

É oportuno, ainda, destacar que a metodologia para o cálculo do total de horas de enfermagem considera o tempo despendido para o cuidado direto do cliente, levando-se em conta a realização dos procedimentos técnicos; assim, não estão contempladas as atividades de planejamento da assistência, as atividades educativas e as atividades administrativas e burocráticas desempenhadas pelo enfermeiro(13).

Em estudo realizado em um hospital de ensino de Brasília-DF(7), cita-se que, dentre os membros da equipe de enfermagem, o enfermeiro é quem permanece menor período de tempo com o cliente, uma vez que se ocupa de atividades administrativas e burocráticas que poderiam ser delegadas a outros profissionais. Alguns exemplos destas atividades são: organizar e tramitar papéis, verificar o funcionamento de aparelhos e equipamentos, providenciando manutenção e reparo, outros problemas relacionados à infraestrutura, além de se ocupar de verificar o agendamento de exames e cirurgias(7). Neste contexto, é comum o profissional vivenciar um conflito de papéis, uma vez que, não sabe se presta assistência ou se responde às cobranças administrativas(6). Acredita-se que, caso o dimensionamento de pessoal estivesse de acordo com as necessidades de cada unidade, o profissional enfermeiro teria mais oportunidade para se organizar, executar e avaliar os planos assistenciais de saúde.

Diante de tais constatações, enfatiza-se que "O enfermeiro deve deixar de ser simples executor de tarefas ou de normas ditadas por outros profissionais, para assumir a autodeterminação de suas funções e para ajustar princípios e medidas administrativas à solução de problemas específicos de sua competência"(14).

No intuito de atender a esta condição, levanta-se a necessidade de se adotar uma metodologia de trabalho que proporcione maior qualidade à assistência e propicie maior eficiência, autonomia e cientificidade à profissão, garantindo maior valorização e reconhecimento, assim como que alerte e direcione as pessoas (profissionais de saúde, pacientes, familiares e comunidade) para uma mudança conceitual em relação ao "ser enfermeiro"(15). Ressalta-se, ainda, a importância de perceber que, sem atuar diretamente com o cliente, estes profissionais deixam de construir e demarcar o espaço intelectual e político, fundamentais para enriquecer o conhecimento e o exercício da prática profissional(16).

Durante o desenvolvimento desta pesquisa, observou-se que o quadro inadequado de funcionários da equipe de enfermagem não é o principal fator para o prejuízo da assistência na instituição, apesar de haver uma diferença significativa em relação ao estabelecido pelo Cofen. Na realidade, acredita-se que a inexistência de uma metodologia assistencial bem definida e implantada contribui para que a assistência prestada seja desorganizada e desarticulada, o que compromete sua eficácia.

Nesta perspectiva, nas últimas décadas, o processo de enfermagem tem sido recomendado como método que propicia o planejamento, a implementação e a avaliação da assistência de enfermagem. Autores de um estudo realizado em Sergipe(6) propõem o processo de enfermagem como metodologia ideal para a realização de um cuidado individualizado, centrado nas necessidades humanas básicas, assim como para a tomada de decisões nos processos gerenciais da equipe de enfermagem.

A Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) é um método de trabalho usado para sistematizar o cuidado e organizar as condições necessárias para sua execução, estreitando a relação entre enfermeira e cliente. Por este método, tornam-se necessárias conversas e visitas frequentes, para que ações sejam planejadas e as intervenções realizadas e avaliadas de forma contínua(17).

Em estudo realizado em um hospital filantrópico(18), verificou-se que os enfermeiros entendem a SAE como um processo de qualificação profissional que propicia valorização, reconhecimento e otimização da assistência de enfermagem. Evidenciaram-se ainda a sobrecarga de trabalho associada aos desvios da função e o número insuficiente de profissionais para o desempenho das atividades, como fatores que dificultam a implantação da SAE.

Nota-se que a realidade observada no presente estudo assemelha-se à encontrada no citado hospital filantrópico, uma vez que ambas as instituições vivenciam no dia-a-dia os mesmos obstáculos para a implantação desta metodologia. Entretanto, dificuldades organizacionais e estruturais não são os únicos obstáculos. Depara-se, ainda, com a necessidade de promover a sensibilização de toda a equipe multiprofissional quanto à importância da implantação do processo de enfermagem na assistência hospitalar e da participação colaborativa de todos, contribuindo, assim, para a afirmação da filosofia institucional em promover assistência e aprendizado de excelência.

Não obstante, soma-se como dificuldade especial a condição de o HC/UFTM ser um hospital universitário, conveniado ao SUS, caracterizando-se, principalmente, pela "necessidade de conciliações entre as atividades assistenciais, de ensino e pesquisa, do aumento do fluxo e gravidade dos pacientes e da dificuldade em manter a quantidade necessária do pessoal de enfermagem"(19: 327) para garantir qualidade e continuidade da assistência.

Fica claro que a adequação dos recursos humanos é um fator primordial para que a SAE seja implementada com sucesso na instituição em estudo. Destaca-se que a determinação do quadro de profissionais em conformidade com a classificação periódica da clientela internada, segundo as necessidades de cuidados de enfermagem, favorece a implantação de metodologias de trabalho, além de motivar os profissionais a pensarem em formas de articular a assistência e, assim, cumprirem o que as Diretrizes Curriculares e o Decreto nº 94.406/87 impõem como atividades que competem ao profissional enfermeiro.

Acredita-se que, a partir de então, cada profissional terá autonomia para realizar as atividades de sua competência e, desta forma, garantirão continuidade, complementaridade e interação multiprofissional(20).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo possibilitou concluir que o quadro de pessoal de enfermagem do HC/UFTM está em desacordo com o preconizado pelo COFEN, segundo parâmetros mínimos estabelecidos. Desta forma, sugere-se que seja feita uma reflexão, por parte da Diretoria do Hospital, sobre a necessidade de se adequar o quadro de profissionais da equipe de enfermagem das unidades de Clínica Médica e Cirúrgica, especificamente no que se refere à categoria enfermeiro.

Os parâmetros mínimos da Resolução do Cofen para o dimensionamento de pessoal não consideram o fato de ser um hospital universitário e, ainda, o tempo despendido em atividades gerenciais, muito executadas nesta instituição. Destaca-se, então, a necessidade de se calcular o índice de segurança técnica do hospital, indispensável na aplicação da fórmula, para que o cálculo do dimensionamento de pessoal seja mais fidedigno à realidade em questão.

Observou-se que, nesta instituição, os enfermeiros parecem se dedicar mais às atividades gerenciais do que às assistenciais, fato este que talvez não seja diferente de outras realidades, mas que é favorável à quebra e à fragilização dos vínculos enfermeiro-paciente e enfermeiro-equipe multiprofissional. Portanto, é essencial que cada profissional realize as atividades específicas de suas competências, designe tarefas que sejam atribuições de outros membros da equipe e valorize-se profissionalmente em sua categoria e perante outros profissionais.

Faz-se necessário, ainda, adotar uma metodologia de cuidado para que a assistência seja mais bem organizada e articulada. Para isso, é preciso sensibilizar toda a equipe multiprofissional, para que se obtenha apoio, compreensão e colaboração, imprescindíveis nesse processo de reorganização do trabalho.

Uma assistência qualificada e humanizada depende de diversos fatores, os quais interferem na adoção de formas alternativas de se organizar a assistência de enfermagem, especialmente no que concerne à implantação da SAE, segundo os modelos atualmente adotados pelas instituições hospitalares.

Encerra-se esta reflexão reiterando-se a premissa de que o qualitativo e o quantitativo de pessoal devem ser compatíveis com as necessidades de cada instituição de saúde e de que é fundamental que haja um trabalho em equipe consolidado e, ainda, que cada profissional tenha condições adequadas para exercer suas atividades.

O dimensionamento de pessoal gera implicações diretas no desempenho das competências do enfermeiro e, consequentemente, provoca prejuízo na qualidade da assistência quando em desacordo com o ideal para atender a demanda da clientela assistida. Sua adequação pode ser considerada como fator motivador, importante, para o bom desempenho profissional e para a qualificação da assistência.

Submissão: 15-08-2010

Aprovação: 12-12-2011

Extraído de Pesquisa de Iniciação Científica, financiada pela FAPEMIG, intitulada "Dimensionamento de pessoal de enfermagem frente à classificação dos clientes hospitalizados em um hospital de ensino".

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2012
  • Data do Fascículo
    Out 2011

Histórico

  • Aceito
    12 Dez 2011
  • Recebido
    15 Ago 2010
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