Componentes da teoria social de aprendizagem numa ferramenta para ensino na Enfermagem

Componentes de la teoría de aprendizaje social en una herramienta para la enseñanza en Enfermería

RESUMO

Objetivo:

identificar componentes fundamentais da teoria social de aprendizagem numa ferramenta computacional para auxílio ao ensino do processo de raciocínio para elaboração do diagnóstico de enfermagem.

Método:

estudo qualitativo que analisou o discurso, coletado por meio de grupo focal, de 18 professores e estudantes de duas escolas de enfermagem brasileiras.

Resultados:

os temas foram agrupados em quatro categorias relacionadas aos componentes da teoria e em 13 subcategorias.

Conclusão:

o significado da aprendizagem pode ser ampliado pela didática do professor e evidenciado pela relação entre a sistematização e o raciocínio; para aprender fazendo são necessários pré-requisitos e um processo de motivação e capacitação, que também é inerente à aprendizagem pela formação de identidade no grupo; no sentimento de pertencimento a um determinado grupo tornaram-se visíveis aspectos relacionados à profissão em detrimento do pertencimento a uma comunidade de prática de aprendizagem.

Descritores:
Pesquisa em Educação de Enfermagem; Processos de Enfermagem; Prática do Docente de Enfermagem; Informática em Enfermagem

RESUMEN

Objetivo:

identificar composición fundamental de la teoría social de aprendizaje en una herramienta computacional para el auxilio a la ensenanza del proceso de raciocinio para elaboración del diagnóstico de enfermería.

Método:

fue realizado un estudio calificativo, lo cual analizó el discurso, colectado por medio del grupo foco, con 18 maestros y estudiantes de dos escuelas de enfermería brasilenas.

Resultados:

los temas fueron agrupados en cuatro categorías relacionadas a los componentes de la teoría y en 13 subcategorías.

Conclusión:

el significado de la aprendizaje puede ser ampliado por la didáctica del maestro y por la relación en medio de sistematización y el raciocinio; para aprendizaje haciendo son necesarios requisitos previos y uno proceso de motivación y capacitación, además, también es inherente el aprendizaje por la formación de identidad en el grupo; con sentido de pertenencia a un determinado grupo se hicieron visibles aspectos relacionados a la profesión en detrimento de suya pertenencia a una comunidad de práctica del aprendizaje.

Palabras clave:
Investigación en Educación de Enfermería; Procesos de Enfermería; Práctica del Docente de Enfermería; Informática Aplicada a la Enfermería

ABSTRACT

Objective:

to identify key components of the social learning theory in a computational tool to aid in teaching the reasoning process for the preparation of a nursing diagnosis.

Method:

qualitative study that analyzed the statements collected through a focus group of 18 teachers and students from two Brazilian nursing schools.

Results:

the themes were grouped into four categories related to the components of the theory and into 13 subcategories.

Conclusion:

the meaning of learning can be extended by the teacher's didactics and corroborated by the relationship between systematization and reasoning. To learn by doing, some prerequisites are required as is a process of motivation and qualification, which are also inherent to learning by forming an identity in the group. In the feeling of belonging to a particular group, aspects related to the profession become visible as opposed to the aspects of belonging to a community of practice of learning.

Key words:
Nursing Education Research; Nursing Processes; Nursing Faculty Practice; Nursing Informatics

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, o processo educacional passou por modificações que incluem a presença constante de tecnologias digitais. O ensino na enfermagem não ficou alheio a este movimento, identificando-se na literatura exemplos de estratégias pedagógicas que utilizam recursos virtuais para auxílio ao ensino-aprendizagem de seus conteúdos^(1-3).

A aprendizagem é um processo em que o estudante elabora seus saberes por meio de interações estabelecidas com o professor. Ao inserir tecnologias digitais no ensino, o professor deve estar disposto a oferecer conexões para atividades apresentadas aos estudantes, disponibilizando múltiplas informações e percursos, estimulando-os a contribuir neste processo⁽⁴⁾. Sendo assim, softwares educativos construídos para potencializar a aprendizagem e o trabalho docente pressupõem interatividade e organização baseada em teorias e metodologias pedagógicas compatíveis com os princípios apresentados⁽⁴⁾.

O presente estudo utiliza o protótipo de uma ferramenta computacional cujo propósito é auxiliar o ensino do processo de raciocínio do estudante para elaboração do diagnóstico de enfermagem (DE). A ferramenta agrega conteúdo de um método utilizado nos ambientes da graduação, pós-graduação e educação permanente^(5-6)estabelecido em passos representados pelas telas do software, a saber: a partir de um caso simulado proposto pelo professor, o estudante seleciona informações relevantes; indica os problemas e potencialidades e os relaciona às necessidades de saúde; identifica focos da prática de enfermagem e os respectivos julgamentos; elabora os DE com uso da Classificação Internacional para as Práticas de Enfermagem (CIPE^®); estabelece resultados de enfermagem; e escolhe intervenções de enfermagem para os DE prioritários⁽⁶⁾.

Algumas funcionalidades foram planejadas para a ferramenta, dentre elas o estudante estabelece comunidades de prática (CoP) com o grupo da própria disciplina e o professor acompanha a evolução do aprendizado dos estudantes se envolvendo na CoP ou por meio de relatórios que possibilitam avaliar as dificuldades ou facilidades, individuais e grupais, no processo de resolução dos estudos de casos propostos.

As CoP são constituídas por um grupo com interesse em comum, cuja participação proporciona significado à experiência e, consequentemente, o aprendizado. Três elementos são necessários para definir uma CoP: o tema (domínio) sobre o qual a comunidade fala, a interação/relação entre as pessoas de forma a existir como comunidade e a própria prática⁽⁷⁾.

No desenvolvimento da ferramenta computacional tomou-se como referência a teoria social de aprendizagem (TSA)⁽⁷⁾, que reúne novos conceitos, caracterizando mudança na perspectiva dos modelos de ensino em ambientes virtuais de aprendizagem, incluindo as CoP. A TSA entende os adultos como sujeitos da aprendizagem, que é conduzida de uma forma integral não apenas direcionada ao desenvolvimento de competências e habilidades do indivíduo, atribuindo um processo de participação⁽⁷⁾. A teoria relaciona quatro componentes fundamentais para a aprendizagem: o significado, que exprime a necessidade de dar sentido para o que se aprende; a prática, que revela a vivência do "aprender fazendo"; a comunidade, que expõe a aprendizagem construindo um sentimento de pertença; e a identidade, que apresenta aspectos relacionados à aprendizagem como processo de construção ou transformação de identidade pessoal⁽⁷⁾.

No contexto apresentado a pesquisa pretendeu responder a seguinte questão norteadora: Os componentes fundamentais da teoria social de aprendizagem são identificados pelos utilizadores do protótipo da uma ferramenta computacional?

O objetivo do estudo consistiu em identificar como se apresentam os componentes fundamentais da teoria social de aprendizagem numa ferramenta computacional para auxílio ao ensino do processo de raciocínio para elaboração do diagnóstico de enfermagem.

MÉTODO

Estudo de abordagem qualitativa, realizado em duas escolas de enfermagem, sendo uma instituição filantrópica, situada na capital do estado do Paraná, e outra pública situada na capital do estado de São Paulo. O universo previsto foi de 24 participantes, sendo 12 estudantes e 12 professores do curso de graduação em enfermagem, divididos igualmente entre as escolas.

Foram incluídos estudantes do último ano da graduação e excluídos os que no período da coleta estavam afastados para tratamento de saúde; apresentavam pendências em disciplinas de prática clínica e os transferidos de outras instituições no último ano. Foram incluídos professores de disciplinas de prática ou estágio clínico; responsáveis pelo ensino de prática clínica hospitalar ou em saúde coletiva, por mais de três anos; mestres ou doutores na área de enfermagem ou da educação; e excluídos aqueles com duplo vínculo em instituição formadora e que não utilizavam linguagens de DE na sua prática docente. Dado que o número de estudantes e docentes que respeitavam os critérios foi superior ao delimitado inicialmente, foi realizado sorteio aleatório.

Anterior à coleta de dados os participantes experimentaram o protótipo, momento em que avaliaram a usabilidade, a navegabilidade e o potencial de algumas funcionalidades.

Os dados foram coletados por meio da técnica de grupo focal, composto por estudantes e professores num mesmo grupo, utilizando um roteiro com questões abertas que abordavam os componentes fundamentais da aprendizagem em consonância com a TSA. Os grupos focais foram realizados em novembro de 2010, em Curitiba, e em maio de 2011, em São Paulo, sendo um encontro em cada escola. Para que o número mínimo de participantes pudesse ser representativo de forma a operacio-nalizar o grupo focal foram convidados 10 estudantes em cada cenário. Compareceram três professores e oito estudantes em Curitiba e cinco professores e dois estudantes em São Paulo, totalizando 18 participantes, cujos discursos produzidos nos grupos focais constituíram o corpus de análise.

Utilizaram-se recursos para a gravação (filmadora e gravador) e roteiro de observação. Os discursos foram transcritos literalmente, corrigidos apenas os vícios de linguagem. O corpus de análise foi trabalhado pelas fases constituintes da análise de discurso: leituras repetidas do texto; identificação dos temas e figuras; busca de ligação entre eles; identificação de harmonia ou mais de um sentido na fala dos enunciadores; e recomposição por meio de frases temáticas para categorização⁽⁸⁾; e identificação dos componentes da TSA. Optou-se por trabalhar com categorias previamente estabelecidas, ligadas aos componentes da TSA: significado da aprendizagem; a aprendizagem pela prática; a aprendizagem pela construção de identidade; e a aprendizagem pelo sentimento de pertencimento a comunidade⁽⁷⁾. Cada categoria, composta por subcategorias interpretativas foi articulada com referenciais teóricos.

Dos discursos originários dos grupos focais foram extraídos inicialmente 79 temas, os quais foram agrupados em quatro categorias analíticas relacionadas aos componentes da TSA e em 13 subcategorias (Figura 01). As subcategorias motivação e capacitação foram identificadas concomitantemente nas categorias: aprendizagem pela prática e construção de identidade.

Figura 1
Categorias e Subcategorias de análise extraídas dos discursos produzidos nos grupos focais com professores e estudantes de Enfermagem, Curitiba e São Paulo, Brasil, 2011

Esta pesquisa é parte de um projeto denominado "Avaliação de um sistema computacional para auxílio ao raciocínio diagnóstico individual e coletivo com uso da CIPE^®/CIPESC^® aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, sob o parecer nº 3309/2009. Todos os participantes foram esclarecidos sobre a pesquisa e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

Na categoria significado os participantes expressam que a capacidade para dar sentido para o que se aprende pode ser potencializada a partir da didática adotada pelo professor que ao utilizar um recurso computacional também transforma o seu modo de ensinar e, no caso da ferramenta experimentada, oferece o significado para a aprendizagem do processo de raciocínio:

[...] O próprio professor para se qualificar pode aprender usando a ferramenta, pode construir casos que levam também a raciocinar.

Nos discursos evidencia-se a relação entre a sistema-tização e o raciocínio como parte integrante do sentido da aprendizagem:

Talvez por ele (o processo de enfermagem) ser mais dinâmico [...]. Hoje em dia nós vemos que tudo corre, centraliza para sistematizar ou para operacionalizar usando a tecnologia.

[... ] Não é uma coisa que está pronta ali. Então obriga você pensar, refinar o nosso raciocínio clínico.

A categoria aprendizagem pela prática foi responsável pelo maior número de subcategorias. Os participantes destacaram que para "aprender fazendo" são necessários pré-requisitos relacionados às características do próprio recurso computacional:

[... ] se deve ter um pouco de bom senso para nós (os professores) estarmos utilizando a ferramenta quando for implantada. Para assim, [...] não burlar o raciocínio.

E às características institucionais, como a falta de incentivo da instituição, as restrições de investimento financeiro e o reconhecimento da importância da aprendizagem do raciocínio:

[... ] tem que ter acontecido um monte de coisas antes, isso tem que ser uma filosofia do serviço, uma filosofia da instituição.

Os docentes e estudantes percebem que para aprender praticando é necessário um processo de motivação e capacitação para participação em CoP:

[... ] eu acho que ela vem desestabilizar e por lenha na fogueira isso é muito bom.

[... ] as pessoas têm que ser capacitadas, pois não sou eu (docente) que tenho que formular os diagnósticos[...].

No relato da vivência dos estudantes foi destacada insuficiência de estratégias de aprendizagem para o desenvolvimento do raciocínio para o DE nas disciplinas da graduação:

[...] se você (estudante) não tiver pelo menos uma noção de diagnósticos, necessidades, você não consegue achar e fazer os achados clínicos.

Deste modo, a prática com uso de ambientes virtuais foi considerada um suporte complementar a sala de aula, fazendo com que a inexperiência seja compensada por sucessivos exercícios simulados:

[...] mesmo quando vocês terminam a optativa ela não juntou tudo, você (estudante) não consegue ainda fazer o suficiente, falta um tempo a mais de prática, a ferramenta é exatamente isso.

[...] este instrumento começa do zero, você começa construindo, constrói até chegar ao final do diagnóstico, você vai construir todo o processo.

Nos discursos identificaram-se aspectos relacionados à prática do uso de padronização da linguagem como elemento da aprendizagem:

[...], pois, se cada pessoa fizer diagnósticos muito distintos alguma coisa está errada [...].

E, neste momento, houve referência à prática do processo de enfermagem:

[...] que o exame físico e a anamnese estariam complementando, não estariam sendo esquecidos, a gente teria que continuar avaliando, conversando e entrevistando.

Frases temáticas que abordaram motivação e capacitação também foram associadas ao processo de construção ou transformação de identidade pessoal:

[...] está mexendo com aquilo que estava muito cômodo [...] e isso faz com que nós permaneçamos e sejamos melhores, às vezes piores.

[...] Eu sou capaz, no fundo eu acho que sou capaz e você sempre acha, você usa uma porção de desculpas. [... ] Quando surge alguma coisa para nós testarmos, coloca em cheque. Eu tenho dúvida, eu estou fazendo aquilo que está dentro da minha disciplina, dentro do contexto de conhecimento que eu tenho.

Outro ponto identificado na aprendizagem como processo de construção de identidade é o fato de a ferramenta possibilitar contextualização social, não limitando o caso ao seu contexto psicobiológico. Desta forma, os participantes entendem a amplitude do papel da enfermagem e se identificam com ele:

[...] se eu pego os outros instrumentos que nós da enfermagem estamos acostumados, a gente não consegue ter esta visão parcial e que ao mesmo tempo é integrativa, de olhar todos: o contexto social, o contexto próprio de saúde, não esquecendo do geral, contexto socioeconômico.

Também foi destacado que a dinâmica do processo de aprendizagem promovida pela ferramenta pode contribuir para construir uma identidade de coparticipação e responsabilidade mútua pelo resultado final em busca de maior autonomia:

[... ] talvez algum exercício até com a interface do professor, mais utilizado pelo estudante, é o estudante que vai pensar[...].

[...] se o estudante quiser colocar uma meta que ele quer superar, ele consegue entender, o estudante aprende, o aprendiz.

[...] se eu como professora do curso de enfermagem não conseguir acessar o meu estudante de alguma forma que ele se prenda na minha disciplina[...], eu não vou ser verdadeira diante daquilo que ele precisa para desenvolver.

Na categoria comunidade, que expõe a aprendizagem construindo um sentimento de pertença a um determinado grupo, tornaram-se visíveis aspectos relacionados ao per-tencimento à profissão em detrimento do pertencimento a uma CoP de aprendizagem. Deste modo, as frases temáticas estabeleceram-se sobre a visibilidade do trabalho da enfermagem:

[...] eu veria que o resultado final de cada indivíduo apreendendo é que vai dar a visibilidade para a profissão.

DISCUSSÃO

Uma CoP oportuniza um ambiente adequado para os processos de ensino e de aprendizagem, mas a experiência positiva só foi realmente verificada a partir do início do funcionamento da comunidade, com o aumento dos partcipantes e utilização efetiva⁽⁹⁾. Esta reflexão estabeleceu um limite do presente estudo pois os participantes dos grupos focais não constituíram uma CoP, embora na fase de avaliação de usabi-lidade e navegabilidade do protótipo tenham compreendido tal funcionalidade.

Ao analisar o discurso dos participantes que indicam interferência da didática do docente no significado oferecido à aprendizagem, verifica-se que o uso de ferramentas computacionais na prática pedagógica deve ser precedido de reflexão sobre o desafio desta inovação na forma de aprender e ensinar.

Por um lado, ao docente cabe compreender as mudanças que envolvem o ensino-aprendizagem utilizando recurso computacional, buscando meios facilitadores e construindo competência técnica⁽¹⁰⁾, por outro, o investimento institucional e pessoal em capacitação é essencial, principalmente para aqueles que utilizam pela primeira vez o recurso com a finalidade de ensino⁽¹⁸⁾.

Embora desde o início deste século se evidencie o imperativo de conhecer recursos da informática e de aplicá-la no cotidiano de vida e trabalho, existe falta de contato dos enfermeiros e estudantes com a mesma e visível carência de habilidades e conhecimentos de informática, o que contribui para insegurança sobre a aplicação na prática de enfer-magem⁽¹¹⁾. Esta problemática pode ser uma das justificativas para que os participantes tenham incluído em suas falas a necessidade de motivação e de capacitação, que remetem à desestabilização sentida quando são expostos a novos instrumentais para o ensino.

Pesquisas discutem as questões da motivação e capacita-ção^(11-12) considerando que um ambiente virtual de aprendizagem constitui-se em ferramenta viável para que docentes melhorem suas práticas pedagógicas, preparem-se para conviver com estudantes nascidos na era digital e busquem transformações não apenas em suas falas, mas em suas concepções e práticas⁽¹¹⁾. Também se evidencia que antes da implementação de novas tecnologias ou métodos educacionais, os estudantes e professores deverão estar envolvidos e motivados, aspecto de fundamental importância para a organização do mecanismo didático pedagógico⁽¹²⁾.

A relação entre os temas motivação e capacitação demonstra a importância destes dois conceitos para que a aprendizagem ocorra nos espaços de prática, bem como sua relação com a transformação da identidade. Um estudo que avaliou a percepção de estudantes de enfermagem sobre uma tecnologia educacional que utiliza jogos sérios corroborou com esta afirmação ao concluir que a valorização de tais tecnologias pelos estudantes leva à reflexão para incorporação de práticas inovadoras, sendo a ferramenta motivadora de aprendizagem que exige maior conhecimento teórico, tanto do estudante como do docente⁽¹⁾.

Ao estabelecer a relação entre a sistematização e o raciocínio, como parte integrante do sentido da aprendizagem, destaca-se que esta analogia pode não estar ligada a uma experiência de CoP e sim ser uma significação incluída no processo de formação do estudante de enfermagem e dos docentes de ensino clínico. Este fato também foi discutido por uma pesquisa que concluiu que a negociação de significados não está limitada a participação específica em uma CoP, mas envolve a participação em outros fóruns em que os membros da comunidade façam parte, portanto, o significado é concen-suado entre eles, sendo contextual e único⁽¹³⁾.

A incorporação de CoP de aprendizagem, por princípio, exige diálogo e pactuação de interesses, nem sempre convergentes, entre docentes e estudantes. Os momentos de conflitos experimentados nesta prática podem contribuir positiva ou negativamente para o processo coletivo de aprendizagem⁽¹⁴⁾. Verificam-se, principalmente, nas frases relacionadas aos pré-requisitos para uso da ferramenta exemplos de situações de conflito: pessoais, das relações com o grupo ou institucionais, as quais ao serem trabalhadas em CoP são oportunidade de aprendizagem.

Outro ponto relevante, salientado pelos participantes, foi o desenvolvimento do raciocínio clínico para elaboração do DE, considerado como um desafio na enfermagem. Os professores e estudantes compreendem que quando é oferecida ao estudante de enfermagem a possibilidade de coletar e interpretar os dados do paciente, utilizando o processo de enfermagem e uma padronização de linguagem, coloca-se em destaque a real necessidade do cuidado de enfermagem.

A literatura discute o fracasso do corpo docente para integrar o processo de enfermagem em experiências de aprendizagem, por vezes relacionado à presença de documentação extensa de um plano de cuidado que exige pouco pensamento crítico, diminuindo a probabilidade de utilização do DE pelo estudante após a graduação⁽¹⁵⁾. É fato que o estudante tem dificuldade para associar o conteúdo abordado dentro da sala de aula com a prática da elaboração do DE devido a informações fragmentadas e desconectadas da realidade de cuidado, e que estratégias de aprendizagem significativa embasadas pelo conhecimento teórico científico podem estimulá-los a superar esta problemática⁽¹⁶⁾.

O papel do enfermeiro diante das situações contextualizadas socialmente, ampliando suas ações para além do psicobiológi-co, foi relacionado à construção e transformação da identidade pessoal. Estudo que analisou o papel do enfermeiro no Sistema Único de Saúde, em especial na estratégia da saúde da família, destaca a enfermagem no espaço do desenvolvimento de práticas interativas e integradoras⁽¹⁷⁾. Portanto, ferramentas capazes de expor estudantes a contextos onde se discutam práticas de intervenção social e que focalizem a complexidade do processo saúde doença são importantes meios para aprendizagem e identificação do papel social da Enfermagem.

O uso da tecnologia como um mediador que permite ao professor atuar como orientador e não como condutor, tem como condição o preparo do estudante para construção partilhada do conhecimento com vistas à promoção de práticas autônomas^(18-19). Esta lógica foi reforçada pelas frases dos participantes ao entenderem que a incorporação de CoP amplia a coparticipação e responsabilidade mútua pelo resultado final como parte do processo de identidade pessoal.

Ambientes virtuais de aprendizagem exigem por um lado o abandono de postura de passividade, receptividade e dependência do estudante e por outro a disposição para aplicação de didáticas e metodologias cooperativas por parte do professor. Estas exigências podem estabelecer um conflito geracio-nal que deverá ser superado por mudança de paradigma, na perspectiva de uma educação emancipadora⁽²⁰⁾.

Na categoria comunidade, foram levantados aspectos relacionados ao pertencimento à profissão em detrimento do pertencimento a uma CoP. Trata-se de uma pesquisa que discutiu a formação de uma CoP na área do ensino da química⁽²¹⁾, onde os autores afirmam que o engajamento, a negociação e o compartilhamento de assuntos levam o grupo de estudantes à aprendizagem relacionada à sua futura profissão.

Três aspectos considerados como importantes para criação de uma CoP - o objetivo comum, o compromisso mútuo e um conjunto partilhado de conceitos, ferramentas e lingua-gem⁽²²⁾ - transparecem nas falas dos docentes e estudantes quando abordam a necessidade de mudança da prática de ensino com participação recíproca, agregando os conceitos e métodos relacionados ao processo de enfermagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisar os componentes da TSA identificados no protótipo verificou-se que a aprendizagem, pelo significado oferecido a ela, pode ser ampliada pela didática docente. Elementos como a motivação e a capacitação parecem também ser imprescindíveis para que a aprendizagem ocorra pela prática, bem como pela construção e transformação da identidade de quem utiliza a ferramenta.

O exercício do processo de enfermagem utilizando linguagem padronizada e a relação entre a sistematização das práticas de enfermagem e o raciocínio foram identificados como partes inerentes dos componentes da aprendizagem pelo significado oferecido a ela e pela prática.

Embora se identifiquem pré-requisitos pessoais e institucionais capazes de interferir no processo de aprendizagem, a análise realizada pode servir como base para o estabelecimento de uma comunidade de prática cujo objetivo comum seja o desejo do desenvolvimento do processo de raciocínio para elaboração do diagnóstico de enfermagem.

Este estudo promove reflexões sobre a importância das teorias pedagógicas para o processo de construção de ferramentas computacionais utilizadas no ensino e a necessidade de aprimoramento das competências e habilidades didático--pedagógicas para efetiva utilização de tecnologias digitais.

• Como citar este artigo:
  Cubas MR, Costa ECR, Marlucelli A, Nichiata LYI, Enembreck FS. Components of social learning theory in a tool for teaching Nursing. Rev Bras Enferm. 2015;68(5):623-9.
• FINANCIAMENTO
  O projeto matriz recebeu apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Sep-Oct 2015

Histórico

• Recebido
  13 Mar 2015
• Aceito
  18 Maio 2015