Acessibilidade / Reportar erro

Perfil das violências por parceiro íntimo em Unidades de Saúde da Família

RESUMO

Objetivo:

Estimar o perfil das situações de violência por parceiros íntimos que envolvem mulheres no âmbito da Estratégia Saúde da Família do município de Nova Iguaçu (Rio de Janeiro).

Método:

Trata-se de um estudo transversal realizado em quatro unidades com amostra de 640 mulheres entre 25 e 64 anos de idade. Apreendeu-se o fenômeno das violências com auxílio do instrumento Revised Conflict Tactics Scales, validado para o Brasil. A análise estatística levou em consideração a estimação das prevalências e o cálculo dos p-valores.

Resultados:

a associação entre as situações de violências e o perfil sociodemográfico demostrou significação estatística principalmente para as variáveis tempo de estudo e condições de moradia. Idade, etnia e classe econômica demonstraram associação com alguns tipos de violência, variando em forma e gravidade.

Conclusão:

O estudo investigou o perfil das situações de violências e possibilitou reflexões quanto às abordagens adotadas pelas equipes da Estratégia Saúde da Família.

Descritores:
Violência; Violência Doméstica; Violência Contra a Mulher; Violência por Parceiro Íntimo; Saúde da Família

ABSTRACT

Objective:

To estimate the profile of intimate partner violence involving women in a scenario of Family Health Strategy in the municipality of Nova Iguaçu (Rio de Janeiro).

Method:

A transversal study was conducted in four units with a sample of 640 women between the ages of 25 to 64. The phenomena of violence was determined using the tool Revised Conflict Tactics Scales, validated for Brazil. Statistical analysis took into consideration an estimation of prevalence in the calculation of the p values.

Results:

The situations of violence and the sociodemographic profiles demonstrated a statistically significant relationship with the variables of educational level and housing conditions. Age, ethnicity and economic class demonstrated an association with certain types of violence, varying in type and severity.

Conclusion:

The study investigated the profile of these situations of violence and enabled reflection regarding the approaches adopted by the Family Health Strategy teams.

Descriptors:
Violence; Domestic Violence; Violence Against Women; Intimate Partner Violence; Family Health

RESUMEN

Objetivo:

Estimar el perfil de las situaciones de violencia por parejas íntimas que involucran mujeres en el ámbito de la Estrategia Salud de la Familia de la provincia de Nova Iguaçu (Rio de Janeiro).

Método:

Se trata de un estudio transversal realizado en cuatro unidades con muestra de 640 mujeres entre 25 y 64 años de edad. Se aprehendió el fenómeno de las violencias con auxilio del instrumento Revised Conflict Tactics Scales, validado para Brasil. El análisis estadístico llevó en consideración la estimación de las prevalencias y el cálculo de los p-valores.

Resultados:

la asociación entre las situaciones de violencias y el perfil sociodemográfico demostró significación estadística principalmente para las variables tiempo de estudio y condiciones de vivienda. Edad, etnia y clase económica demostraron asociación con algunos tipos de violencia, variando en forma y gravedad.

Conclusión:

El estudio investigó el perfil de las situaciones de violencias y posibilitó reflexiones cuanto a los enfoques adoptados por los equipos de la Estrategia Salud de la Familia.

Descriptores:
Violencia; Violencia Doméstica; Violencia Contra la Mujer; Violencia por Pareja Íntima; Salud de la Familia

INTRODUÇÃO

Os eventos violentos vêm ocupando cada vez mais espaços nas agendas de discussão na sociedade. Os debates envolvem desde a garantia de considerável tempo na mídia até as polêmicas discussões na formulação de políticas no país, incluindo, portanto, aspectos que permeiam o cotidiano das pessoas que vivenciam diretamente esses fenômenos. Certamente, um dos entraves experimentados e que impulsionam esta ampliação é a própria (in)compreensão do que são estes eventos, que possuem variações sócio-históricas conforme se modificam os hábitos e costumes, os valores e julgamentos, e a própria compreensão de sociedade(11 Domenach JM. La violencia. In: Domenach JM, Laboriti H, Joxe A, Galtung J, Senghaas D, Klineberg O, et al. La violencia y sus causas. Paris: UNESCO; 1981.). Apesar das divergências e da complexidade de adotar um único conceito que contemple as diversas formas de violências, é possível apontar para um consenso que reside na aplicação de força física ou no uso e abuso de poder, e que se traduzem em atitudes geradoras de consequências biopsíquicas, socioeconômicas e culturais para uma ou mais pessoas(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...
).

Em virtude da característica multifacetada, diversas são as práticas e expressões das violências, podendo estar presentes de modo mais explícito em espaços urbanos e institucionais, ou de forma sutil e velada nos domicílios, como nos casos de violência familiar que acometem principalmente - mas não exclusivamente - as crianças, os idosos e as mulheres(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...
). No âmbito do domicílio, muitos estudos têm se debruçado sobre as relações de conflito e de violência entre parceiros íntimos, talvez pelas inúmeras variáveis no seu nexo de causalidade, ou pelas diversas consequências diárias emútuas – para vítima e perpetrador(33 Paixão GPN, Gomes NP, Diniz NMF, Lira MOSC, Carvalho MRS, Silva RS. Women experiencing the intergenerationality of conjugal violence. Rev Latino-Am Enfermagem [Internet]. 2015 [Cited 05 Nov 2015];23(5):874-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v23n5/pt_0104-1169-rlae-23-05-00874.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v23n5/pt_0...
-44 Sousa AKA, Nogueira DA, Gradim CVC. Perfil da violência doméstica e familiar contra a mulher em um município de Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2015 Dec 19];21(4):425-31. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21n4a11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21...
).

No que diz respeito especificamente à violência perpetrada contra as mulheres, que chega à ordem de 90% deste público, muito saber já se tem acumulado, sobretudo sobre os seus impactos gerados e os gatilhos disparadores dos atos abusivos - que ocasionam desde consequências físicas e psíquicas até dificuldades de utilização dos serviços de saúde(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...
,55 Piosiadlo LCM, Fonseca RMGS, Gessner R. Subordination of gender: reflecting on the vulnerability to domestic violence against women. Esc Anna Nery Rev Enferm[Internet]. 2014 [cited 2015 Nov 13];18(4):728-33. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v18n4/1414-8145-ean-18-04-0728.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ean/v18n4/1414-...
). Embora não seja consenso, alguns eventos vinculados aos abusos perpetrados contra as mulheres já foram mapeados, sendo frequentemente associados a tentativas de punição por atos que o parceiro julga como transgressões às regras tradicionalmente impostas na família, e que muitas vezes são amparadas pela dependência financeira, emocional e por fragilidades no suporte social de algumas vítimas(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...
).

Com base nessas informações, o país tem apresentado um conjunto de estratégias que viabilizam a constante (re)formulação de políticas públicas e de atuação intersetorial, conforme previsto pela Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Segundo este documento, ao menos quatro grandes eixos devem permear o manejo de situações abusivas no país: prevenção, assistência, enfrentamento e combate, e acesso e garantia de direitos. Desse modo, ações que prevejam intervenções educativas e culturais que combatam os padrões sexistas e a visão tradicional de gênero, garantam autonomia e produção de liberdades entre as mulheres, bem como o cumprimento efetivo das punições previstas na Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 7 de agosto de 2006), e o fortalecimento de uma rede ampliada de atenção e proteção – envolvendo os setores de saúde, assistência social, educação, justiça, entre outros – devem ser encorajadas e ampliadas cada vez mais na sociedade(66 Brasil. Política nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres. Brasília: Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres[Internet]. 2011[cited 2016 Mar 30]. Available from: http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/publicacoes/2011/politica-nacional
http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/...
). Tais ações devem incluir diretamente os três níveis de saúde pública no trabalho permanente com estas mulheres.

Nesta conjuntura, especial destaque tem sido conferido aos equipamentos de base comunitária, como é o caso da Estratégia Saúde da Família, seja por sua dinâmica de funcionamento pautada pelos princípios da Vigilância em Saúde – e da produção de informação para a ação -, seja pela possibilidade de atuação in loco, contemplando os níveis micro, meso e macrossociais envolvidos nos fenômenos das violências. Contudo, percebe-se que, apesar da ampliação da cobertura destes serviços, ainda se faz necessário avançar na captação e manejo destes casos. Baseia-se esta inferência na já conhecida subnumeração e subnotificação de casos de abusos, cujas vítimas por vezes frequentam os serviços sem o devido reconhecimento profissional, o que gera uma lacuna e barreira nos atendimentos; tais fatos se fazem presentes no cotidiano das equipes de saúde(77 Moreira TNF Martins CL, Feuerwerker LCM, Schraiber LB. The foundation of care: Family Health Program teams dealing with domestic violence situations. Saude Soc [Internet]. 2014 [cited 2015 Sep 9];23(3):814-27. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/0104-1290-sausoc-23-3-0814.pdf
http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/01...
).

Ampliar o olhar para além da posição de vítima de um ator também parece imprescindível para avançar nas ações de controle deste fenômeno. Alguns trabalhos já têm apontado nesta direção, principalmente por inferirem a possibilidade de perdas no processo de cuidado familiar diante da inobservância da violência enquanto uma entidade cíclica e bidirecional, e também pelo reconhecimento de que todos os envolvidos sofrem nestas situações: avítima, o perpetrador ou os demais atores que compõem o núcleo familiar(88 Rafael RMR, Moura ATMS. Violência contra a mulher ou mulheres em situação de violência? Uma análise sobre a prevalência do fenômeno. J Bras Psiquiatr [Internet]. 2014 [cited 2014 Jan 31];63(2):149-53. Available from: http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n2/0047-2085-jbpsiq-63-2-0149.pdf
http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n2/00...
-99 Carvalho-Barreto A, Bucher-Maluschke JSNF, Almeida PC, DeSouza E. Desenvolvimento humano e violência de gênero: uma integração bioecológica. Psicol Reflex Crit [Internet]. 2009 [cited 2015 Dec 17];22(1):86-92. Available from: http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pdf
http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pd...
). Nesse sentido, uma reflexão profunda sobre o perfil das mulheres envolvidas em situações de violência parece cada vez mais necessária, a fim de agregar novos olhares para o conhecimento já produzido.

OBJETIVO

Estimar o perfil das situações de violência por parceiros íntimos que envolvem mulheres no âmbito da Estratégia Saúde da Família do município de Nova Iguaçu (Rio de Janeiro).

MÉTODO

Aspectos éticos

Os preceitos éticos de pesquisas que envolvem seres humanos foram respeitados, conforme determina a Resolução do Conselho Nacional de Saúde de número 466/2012. O projeto foi apreciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Pedro Ernesto, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, tendo sido aprovado. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, foram esclarecidos sobre os objetivos, riscos e benefícios do estudo e tiveram garantidos o anonimato, a privacidade e a possibilidade de se retirarem do estudo a qualquer momento, sem prejuízos. Tendo em vista a especificidade do objeto deste manuscrito, o trabalho também respeitou integralmente as recomendações éticas de estudos que envolvem situações de violência(1010 Rafael RMR, Moura ATMS. Considerações éticas sobre pesquisas com mulheres em situa- ções de violência. Rev Bras Enferm [Internet]. 2013[cited 2014 Jul 10];66(2):287-90. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v66n2/21.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reben/v66n2/21....
).

Desenho, local de estudo e período

Trata-se de um estudo observacional, do tipo transversal, realizado com base nos dados coletados pelo projeto “Barreiras na busca pelo rastreio de lesões precursoras do câncer do colo uterino: um estudo sobre as relações da violência íntima da Saúde da Família”.

O cenário eleito para realização do estudo foi o município de Nova Iguaçu, na região metropolitana do estado do Rio de Janeiro, que apresenta Índice de Desenvolvimento Humano médio e uma população de aproximadamente 800 mil pessoas. O cenário, que se apresenta como um importante ator político e econômico para o Estado, tanto por seu franco desenvolvimento nos últimos anos como por apresentar uma população economicamente ativa na região, expressa similaridades demográficas com a maior parte dos municípios da região, o que tende a fortalecer a validade externa do estudo.

A escolha do município se deu pelo reconhecido e elevado número de violências íntimas que envolvem as famílias, especialmente as mulheres, fato frequentemente apontado pelas mídias sociais. Considerando-se o princípio que as regiões centrais das cidades possuem melhor acesso às informações e aos equipamentos sociais, o estudo se desenvolveu no principal setor de planejamento da localidade: o centro, especificamente em quatro unidades de saúde, totalizando nove equipes de saúde da família e uma população coberta de 26 mil pessoas.

Amostra e critérios de inclusão

Com base na compreensão de que a população do estudo é finita, uma vez que se trata de uma população adstrita pelas equipes de saúde, a amostra foi calculada admitindo-se um erro amostral de 5% e Intervalo de Confiança a 95%, atingindo-se o tamanho amostral de 640 mulheres. Utilizando-se de técnica de amostragem não probabilística, as mulheres presentes nas salas de espera das unidades de saúde foram recrutadas por oportunidade, aplicando-se uma folha de elegibilidade com os seguintes critérios de inclusão: ter idade entre 25 e 64 anos, ser residente e cadastrada nas equipes de saúde da família e manter relacionamento íntimo há pelo menos um ano.

Protocolo do estudo

Realizou-se um estudo-piloto com o objetivo de avaliar o desenho metodológico e orientar os entrevistadores quanto à aplicação dos instrumentos de estudo e abordagem das respondentes. Esta fase se desenvolveu em região próxima da área pesquisada, totalizando 120 entrevistas (cerca de 20% da amostra total). Soma-se a isto o fato de que os entrevistadores receberam manuais instrutivos sobre o instrumento de estudo, padronizando-se as técnicas utilizadas nas entrevistas face a face. A coleta de dados se desenvolveu durante 8 meses, em ambientes privativos dentro das unidades de saúde, com término em junho de 2013. Houve auxílio de quatro profissionais de enfermagem do sexo feminino da rede municipal, porém sem vínculo com as unidades nas quais este estudo foi desenvolvido, a fim de preservar as informações prestadas pelas participantes. Foram realizadas em média quatro entrevistas por dia, com duração de 30 a 40 minutos cada.

O instrumento da pesquisa foi composto por um questionário estruturado e multidimensional que contemplou as dimensões do modelo teórico-conceitual proposto no Projeto. Este artigo utilizou itens presentes em duas dimensões: a caracterização sociodemográfica e o perfil das violências entre parceiros íntimos. A primeira dimensão foi constituída por características sociodemográficas das entrevistadas, utilizando-se de itens da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD(1111 Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Critérios de Classificação Econômica Brasil[Internet]. 2011[cited 2011 Apr 27]. Available from: www.abep.org
www.abep.org...
). Para a estimação das classes socioeconômicas, utilizou-se o instrumento “Critérios de Classificação Econômica”, proposto pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa - ABEP(1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: questionário da pesquisa. Rio de Janeiro: IBGE; 2011). Este instrumento prevê a classificação econômica com base na avaliação da estrutura do domicílio, bens e serviços utilizados e escolaridade do chefe da família, sendo este último referido pela respondente, resultando em estratos de classes que variam de A (a mais elevada) a E (a mais baixa). A situação ambiental de moradia foi investigada por um conjunto de seis variáveis que possibilitam classificar como “boa” ou “má” a condição de residência das respondentes, conforme propuseram Reichenheim e Harpham(1313 Reichenheim ME, Harpham T. Perfil intra-comunitário da deficiência nutricional: um estudo de crianças abaixo de 5 anos numa comunidade de baixa renda do Rio de Janeiro. Rev Saúde Pública [Internet]. 1990[cited 2014 Jul 10];24(1):69-79. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v24n1/11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rsp/v24n1/11.pd...
).

As variáveis de interesse – a violência por parceiro íntimo e suas classificações – foram analisadas com o auxílio do instrumento “Revised Confict Tactics Scales (CTS2)”, validado e adaptado transculturalmente para uso no Brasil por Moraes, Hasselmmann, Reichenheim(1414 Moraes CL, Hasselmann MH, Reichenheim ME. Adaptação transcultural para o português do instrumento "Revised Conflict Tactics Scales (CTS2)" utilizado para identificar violência entre casais. Cad Saúde Pública [Internet]. 2002[cited 2014 Jul 10];18(1):163-76. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v18n1/8153.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v18n1/8153....
). O instrumento, que se baseia na Teoria do Conflito e considera o fenômeno das violências íntimas como resultado emergente das relações íntimas e intrafamiliares, permite tipificar o evento em violência psicológica (com oito itens de avaliação), física (12 itens) e coerção sexual (sete itens), assim como classificar os tipos de violência como grave e menor(1515 Straus M. Handbook for the Conflict Tactics Scales (CTS). Durham, Family Research Laboratory, University of New Hampshire; 2000.). Em um recordatório de 12 meses, considerou-se violência quando presente ao menos um dos itens avaliados em cada escala, usando como base a violência por parceiro íntimo contra a mulher e a situação da mulher como perpetradora de violência.

Análise dos resultados e estatística

Para a construção do banco de dados, utilizou-se o software Epidata versão 3.1, realizando-se dupla digitação em 10% dos instrumentos de coleta. Já o preparo, o processamento e as análises estatísticas foram realizados com auxílio do software Stata na versão SE 12.0. Foram feitas análises bivariadas entre o desfecho e as variáveis independentes de interesse, calculando-se as respectivas prevalências, e os p-valores por meio do teste exato de Fisher. Os resultados foram considerados estatisticamente significantes quando os p-valores foram inferiores a 0,05 e limítrofes quando no intervalo entre 0,05 e menor que 0,01.

RESULTADOS

Os registros da fase de coleta de dados revelaram ausência de perdas amostrais e 3% de recusas, representando 20 sujeitos. A caracterização da amostra evidenciou predomínio de mulheres na faixa etária de 30 a 49 anos (50,4%), pretas e pardas (56,1%), casadas (55,5%), com tempo de estudo de 8 anos (57,8%), de classe média/classe C (70,7%) e com boas condições de moradia (84,4%). As violências íntimas perpetradas contra as mulheres nos últimos 12 meses apresentaram prevalências de 21,0%, 90,6% e 39,1%, respectivamente nas formas de abusos físicos, psicológicos e sexuais. As situações de violência que envolviam as mulheres apresentaram, na mesma ordem de abusos, as seguintes prevalências: 28,6%, 92,2%, 39,9%.

As tabelas 1 e 2 demonstram a tipificação e a gravidade das violências íntimas perpetradas contra as mulheres por estrato sociodemográfico. Chama-se atenção para o tempo de estudo, que se demonstrou estatisticamente significante em todas as formas de violência e que também possui íntima relação com a gravidade dos atos. As condições de moradia e a gravidade das violências também guardaram relações estatísticas.

Tabela 1
Perfil das usuárias da Estratégia Saúde da Família vítimas de violência por parceiro íntimo, Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Brasil, 2013
Tabela 2
Perfil das usuárias da Estratégia Saúde da Família vítimas de violência por parceiro íntimo, segundo os tipos e a gravidade, Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Brasil, 2013

As tabelas 3 e 4 demonstram, respectivamente, o perfil sociodemográfico dos tipos e da gravidade de situações de violência que envolvem as mulheres, ou seja, quando a mulher é vítima ou perpetradora dos abusos. No que se refere à forma do ato abusivo, destaca-se a variável tempo de estudo, que se demonstrou estatisticamente significante em todas as relações estudadas. Já em relação à gravidade do ato, faz-se necessário considerar, principalmente, as variáveis de situação conjugal, classe econômica e condições de moradia.

Tabela 3
Perfil das usuárias da Estratégia Saúde da Família perpetradoras de violência contra parceiros íntimos, Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Brasil, 2013
Tabela 4
Perfil das usuárias da Estratégia Saúde da Família perpetradoras de violência contra parceiros íntimos, segundo os tipos e a gravidade, Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Brasil, 2013

DISCUSSÃO

A análise possibilitou reconhecer o perfil das usuárias dos serviços da Estratégia Saúde da Família na tentativa de melhor estudar as características que envolvem o complexo fenômeno das violências, aproximando a reflexão teórica do cotidiano de trabalho destas equipes. Acredita-se que mesmo com as possíveis diferenças entre as mensurações dos diversos estudos, certo padrão vem sendo estabelecido, o que torna as reflexões aqui produzidas perfeitamente aplicáveis a cenários com características semelhantes. A opção de utilizar entrevistadoras do sexo feminino e que não possuíssem vínculo direto com as mulheres participantes do estudo também parece ter gerado bons resultados, dado o baixo percentual de recusas, mesmo diante da abordagem de um tema que gera estigma e resistências de debate por quem o vivencia. O exaustivo esclarecimento sobre os objetivos do trabalho, os benefícios esperados e o controle dos riscos vinculados à pesquisa, por meio da coleta de informações em ambiente privativo, também parece ter colaborado para estes bons resultados, além de garantir as recomendações e reflexões sobre pesquisas que envolvem esta temática(1010 Rafael RMR, Moura ATMS. Considerações éticas sobre pesquisas com mulheres em situa- ções de violência. Rev Bras Enferm [Internet]. 2013[cited 2014 Jul 10];66(2):287-90. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v66n2/21.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reben/v66n2/21....
).

No campo dos estudos sobre violências é possível distinguir múltiplas práticas de abuso que se somam ao longo do tempo, demonstrando um caráter plural e reforçando a dificuldade de determinar precisamente a prevalência do evento. Comumente o fenômeno apresenta sobreposição de suas formas, ou seja, a mesma vítima pode sofrer, em diferentes tempos ou de maneira concomitante, os três tipos de abuso, o que agrava o processo de conflito e os danos ocasionados(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...
). No entanto, apesar dessas dificuldades para o estabelecimento de valores comuns, a elevada magnitude das violências apresentadas neste estudo acompanha a literatura nacional, principalmente no que se refere às formas física e psicológica(1616 Taquette SR. Violência contra a mulher adolescente: revisão de estudos epidemiológicos brasileiros publicados entre 2006 e 2011. Adolesc Saude [Internet].2015[cited 2015 Dec 17];12(1):66-77. Available from: http://www.adolescenciaesaude.com/audiencia_pdf.asp?aid2=478&nomeArquivo=v12n1a10.pdf
ttp://www.adolescenciaesaude.com/audienc...
).

Entretanto, é importante destacar que o acentuado relato de abuso sexual destoa do estado atual do conhecimento já produzido sobre a matéria, sobretudo em ambientes domésticos de grandes centros urbanos. Nesse aspecto, épossível refletir sobre ao menos dois pontos: o primeiro é a própria dificuldade da geração de consensos pela adoção de distintos desenhos e instrumentos para a avaliação deste constructo, o que invariavelmente produz diferentes mensurações. O outro ponto pode residir na compreensão e aceitação dos indivíduos sobre os abusos sexuais. Acredita-se que o quantitativo elevado desta forma de violência também guarde relações com a naturalização desta prática durante as relações conjugais tradicionais(1717 Porto RTS, Bispo Junior JP, Lima EC. Violência doméstica e sexual no âmbito da Estratégia de Saúde da Família: atuação profissional e barreiras para o enfrentamento. Physis [Internet]. 2014[cited 2015 Dec 17];24(3):787-807. Available from: http://www.scielo.br/pdf/physis/v24n3/0103-7331-physis-24-03-00787.pdf
http://www.scielo.br/pdf/physis/v24n3/01...
).

Como é possível observar, a violência sexual esteve presente de modo predominante em mulheres casadas, sobretudo sob forma de abusos menores – como nos casos de coerção sexual que envolvem ou não a força física, ou nos casos de práticas que intimidam a parceira a fazer sexo sem a utilização de preservativos - e que possivelmente não são percebidas como abusos pelos parceiros(44 Sousa AKA, Nogueira DA, Gradim CVC. Perfil da violência doméstica e familiar contra a mulher em um município de Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2015 Dec 19];21(4):425-31. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21n4a11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21...
). A própria visão tradicional de gênero, também introjetada como natural em muitas culturas, acaba por apoiar e legitimar este tipo de prática nas relações conjugais, especialmente em relacionamentos com vínculos tradicionais, o que imputa à mulher o risco de assumir uma posição submissa durante as relações sexuais. A perpetuação destes abusos, muitas vezes de modo intergeracional, acaba por imprimir certo grau de invisibilidade a este tipo de violência, especialmente na forma de coerção sexual menor(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...

3 Paixão GPN, Gomes NP, Diniz NMF, Lira MOSC, Carvalho MRS, Silva RS. Women experiencing the intergenerationality of conjugal violence. Rev Latino-Am Enfermagem [Internet]. 2015 [Cited 05 Nov 2015];23(5):874-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v23n5/pt_0104-1169-rlae-23-05-00874.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v23n5/pt_0...
-44 Sousa AKA, Nogueira DA, Gradim CVC. Perfil da violência doméstica e familiar contra a mulher em um município de Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2015 Dec 19];21(4):425-31. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21n4a11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21...
).

Por outro lado, a prevalência de violência física apresentou quase duas vezes menos chances de ocorrer em mulheres casadas, embora tenha sido predominante entre negras. Acredita-se que este perfil possa estar associado a uma nova forma de lidar com as situações de conflito em tempos de Lei Maria da Penha, que prevê o julgamento de crimes contra a mulher em juizados especializados, ampliando a punição e o combate às violências contra este grupo. As penas, que se tornaram mais rígidas, podem ter auxiliado no movimento de reduzir a prevalência da violência física, jáque as marcas são muitas vezes aparentes e de fácil detecção. Uma possível hipótese explicativa para este achado pode ter sido a transferência destas agressões para os abusos psicológicose atémesmo sexuais, eventos de difícil captação e tradicionalmente velados e negados no ambiente doméstico(88 Rafael RMR, Moura ATMS. Violência contra a mulher ou mulheres em situação de violência? Uma análise sobre a prevalência do fenômeno. J Bras Psiquiatr [Internet]. 2014 [cited 2014 Jan 31];63(2):149-53. Available from: http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n2/0047-2085-jbpsiq-63-2-0149.pdf
http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n2/00...
).

A relação entre idade e violência sexual também é aspecto convergente entre os resultados deste estudo e de outros relatados na literatura. Observa-se que a magnitude da violência sexual foi predominante na faixa etária compreendida entre 30 e 59 anos. Há certo movimento no sentido de associar a redução da violência sexual no casamento em mulheres mais velhas, principalmente por acreditar que existe diminuição no limiar de tolerância das vítimas às regras impostas no ambiente doméstico(1818 World Health Organization. WHO multi-country study on women's health and domestic violence against women: summary report of initial results on prevalence, health outcomes and women's responses[Internet]. Geneva: WHO; 2005[Cited: 2015 Jul 21]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43310/1/9241593512_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
). No entanto, esta variável não apresentou significância estatística nas demais relações. Acredita-se que esses resultados tenham sido influenciados por outros fatores não controlados neste estudo, em virtude do delineamento metodológico adotado.

O menor tempo de estudo e as condições de moradia também foram fatores associados às relações violentas contra as mulheres nas formas física, psicológica ou sexual. É possível reforçar tais achados com a associação entre os eventos abusivos e as menores classes econômicas, especialmente a classe média(44 Sousa AKA, Nogueira DA, Gradim CVC. Perfil da violência doméstica e familiar contra a mulher em um município de Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2015 Dec 19];21(4):425-31. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21n4a11.pdf
http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21...
,1919 Ferreira MF, Moraes CL, Reichenheim ME, Verly Junior E, Marques ES, Salles-Costa R. Effect of physical intimate partner violence on body mass index in low-income adult women. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015[cited 2015 Dec 17];31(1):161-72. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n1/pt_0102-311X-csp-31-01-00161.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n1/pt_01...
-2020 Lindner SR, Coelho EBS, Bolsoni CC, Rojas PF, Boing AF. Prevalência de violência física por parceiro íntimo em homens e mulheres de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil: estudo de base populacional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015[cited 2015 Dec 17];31(4):815-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n4/0102-311X-csp-31-04-00815.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n4/0102-...
). Acredita-se que as relações assimétricas entre os parceiros, como nos casos de diferenças de renda e tempo de estudo, possam contribuir para perda de autonomia e aumento da dependência da mulher, sobretudo em sociedades em que a cultura do patriarcado corrobora para a sustentação do homem como provedor e da mulher como a ele submissa. Soma-se a isto o fato de que características que inibem o desenvolvimento humano, como no caso de um menor tempo de estudo, podem afetar diretamente as relações interpessoais, propiciando a organização de dinâmicas familiares que utilizam as agressões como forma de resolução de conflitos(1818 World Health Organization. WHO multi-country study on women's health and domestic violence against women: summary report of initial results on prevalence, health outcomes and women's responses[Internet]. Geneva: WHO; 2005[Cited: 2015 Jul 21]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43310/1/9241593512_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
).

Por outro lado, parece importante observar que as situações de violência que envolvem as mulheres – ou seja, quando a mulher também foi perpetradora de abusos – apresentaram um perfil de ocorrência similar ao padrão identificado nas vítimas. Com o devido cuidado para não reforçar a violação de direitos, amplamente praticada contra as mulheres, e tampouco cometer novos atos – mesmo que discursivos – de violência contra a mulher, é importante compreender que existe um certo grau de bidirecionalidade neste complexo fenômeno. Desse modo, mesmo considerando que o homem seja o principal agressor no ambiente doméstico, é válido reconhecer que a mulher também pode ocupar o papel de perpetradora dos abusos, principalmente nas formas física e psicológica. Alguns trabalhos sugerem que tais eventos possam ser desencadeados por uma situação de reatividade da vítima diante das constantes agressões sofridas, o que corrobora a necessidade de entendimento deste fenômeno como gerador de sofrimento cíclico e interdependente(22 Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
http://www.opas.org.br/wp-content/upload...
,99 Carvalho-Barreto A, Bucher-Maluschke JSNF, Almeida PC, DeSouza E. Desenvolvimento humano e violência de gênero: uma integração bioecológica. Psicol Reflex Crit [Internet]. 2009 [cited 2015 Dec 17];22(1):86-92. Available from: http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pdf
http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pd...
).

Para o efetivo controle deste complexo fenômeno não basta a caracterização da vítima, sendo esta ação considerada parcial e voltada apenas ao olhar dos atores presentes nestas relações. Talvez uma reflexão mais ampla se faça necessária, uma vez que em alguns casos o abusador é a única referência da mulher, e vice-versa, sendo este também o único ator de suporte social. Acredita-se que quanto mais imprevisível se torne a rotina de abusos domiciliares, menores as chances da mulher mobilizar recursos psicológicos e sociais para romper o ciclo de violência, adaptando-se cada vez mais a esta relação, e por vezes reagindo(99 Carvalho-Barreto A, Bucher-Maluschke JSNF, Almeida PC, DeSouza E. Desenvolvimento humano e violência de gênero: uma integração bioecológica. Psicol Reflex Crit [Internet]. 2009 [cited 2015 Dec 17];22(1):86-92. Available from: http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pdf
http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pd...
,1818 World Health Organization. WHO multi-country study on women's health and domestic violence against women: summary report of initial results on prevalence, health outcomes and women's responses[Internet]. Geneva: WHO; 2005[Cited: 2015 Jul 21]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43310/1/9241593512_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
).

Embora não seja tarefa fácil, compreender e trabalhar o contexto familiar parece um desafio a ser enfrentado pelas equipes de saúde. Por sua possibilidade de atuação territorial, melhor compreensão da dinâmica familiar e comunitária e diversas possibilidades de ações que interrompam o ciclo de sofrimento gerado pelas violências entre parceiros íntimos, a superação de um modelo de atuação pautado em aspectos exclusivamente biológicos é meta a ser perseguida pelas equipes de Atenção Primária, sobretudo pela Estratégia Saúde da Família. Entretanto, inúmeros autores demonstram que o cuidado à mulher encontra-se muitas vezes limitado aos aspectos técnicos, invisibilizando o fenômeno das violências. O desconhecimento das diversas formas de apresentação do fenômeno e a compreensão das várias concepções – que são socialmente e historicamente construídas – tendem a trazer implicações para as equipes, imputando riscos de negação da detecção e do manejo destes casos(2121 Freitas WMF, Oliveira MHB, Silva ATMC. Concepções dos profissionais da atenção básica à saúde acerca da abordagem da violência doméstica contra a mulher no processo de trabalho: necessidades (in)visíveis. Saúde Debate [Internet]. 2013[cited 2016 Nov 13];37(98):457-66. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v37n98/a09v37n98.pdf
http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v37n98/a09...
).

Compreender que o manejo é possível por meio de uma conjugação de saberes pode ser elemento de amparo às novas práticas de enfrentamento do fenômeno. Estudo recente propõe um modelo de combate e atenção às mulheres vítimas de violência baseado nos princípios da confidencialidade, privacidade, respeito à autonomia das mulheres e manutenção da segurança. Também propõe que os cuidados sejam prestados com base em alguns elementos fundamentais: o conhecimento sobre os cuidados clínicos e os encaminhamentos implicados aos diversos pontos da rede de atenção, a consciência sobre as questões de gênero e igualdade, as atitudes voltadas à ausência de julgamento, a empatia, as habilidades para o atendimento emergencial e longitudinal aos danos físicos e psicológicos e a compreensão dos diversos contextos para construção de redes de apoio(2222 Garcia-Moreno C, Hegarty K, D'Oliveira AFL, Kaziol-MacLain J, Colombini M, Feder G. The health-systems response to violence against women. Lancet[Internet]. 2015[cited 2016 Mar 30]; 385(9977):1567-79. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25467583
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2546...
).

Descortinar esses eventos na comunidade e prestar assistência qualificada às mulheres certamente exige articulação entre saberes e práticas que extrapolam os muros do setor saúde, requerendo novos posicionamentos profissionais para uma prática colaborativa e intersetorial com outros segmentos da sociedade. Pensar que as ações protocolares, comuns ao manejo clínico de algumas doenças, não se coadunam com a assistência às situações de violência pode contribuir para a manutenção de sua invisibilidade por muitos profissionais. Em contrapartida, aliar forças com o sistema judiciário mediante a adoção de práticas que reprimam novos casos e constituição de uma rede protetiva baseada nas características do território, em parceria com os Centros de Referência Especializados em Assistência Social (CREAS) e demais equipamentos previstos pela Política Nacional de Assistência Social, pode conferir novo sentido aos planos assistenciais das equipes de saúde(66 Brasil. Política nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres. Brasília: Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres[Internet]. 2011[cited 2016 Mar 30]. Available from: http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/publicacoes/2011/politica-nacional
http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/...
,2323 Brasil. Política Nacional de Assistência Social. Brasília: Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome [Internet]. 2005. [cited 2016 Nov 13]. Available from: http://www.sesc.com.br/mesabrasil/doc/Pol%C3%ADtica-Nacional.pdf
http://www.sesc.com.br/mesabrasil/doc/Po...
-2424 Moreira TNF, Martins CL, Feuerwerker LCM, Schraiber LB. A construção do cuidado: o atendimento às situações de violência doméstica por equips de Saúde da Família. Saúde Soc [Internet]. 2014 [cited 2016 Nov 13];23(3):814-27. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/0104-1290-sausoc-23-3-0814.pdf
http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/01...
). A sinergia dessas estratégias de base territorial pode, sobretudo, permitir uma assistência qualificada a toda família – a vítima, o perpetrador e todos aqueles que vivem direta ou indiretamente a multiplicidade de expressões dos eventos abusivos.

Limitações do estudo

Tendo em vista que os estudos transversais avaliam ao mesmo tempo o desfecho e a exposição, em única mensuração, é importante considerar que a análise dos resultados ora apresentada não pretende estabelecer causalidade entre as variáveis estudadas. Outro aspecto que merece atenção é o fato do estudo ter coletado informações exclusivamente na região central do município, o que pode ter gerado divergências na prevalência do evento em regiões mais periféricas. Desse modo, a interpretação e generalização dessas informações devem ser realizadas à luz de tais limitações metodológicas, considerando a possibilidade de subnumeração dos casos.

Contribuições para a área de políticas públicas

O debate sobre o perfil das situações de violência que envolvem mulheres contribui para o aprofundamento da discussão sobre esta matéria, agregando elementos que visam subsidiar estratégias mais próximas da realidade experimentada na comunidade. A superação da visão restrita da vítima também é ponto que suscita reflexões sobre a (re)formulação de ações de controle deste fenômeno pelas equipes da Estratégia Saúde da Família. Acredita-se que a mobilização dos recursos tecnológicos presentes na Estratégia, como as ações da vigilância em saúde e a promoção de práticas intersetoriais, possa garantir sobremaneira a detecção, o manejo e o acompanhamento das famílias em situação de vulnerabilidade e com processo de violência instituído. A articulação com outras instituições e equipamentos sociais presentes no território constitui ponto fundamental e viável no cotidiano destas equipes, por oferecer novas possibilidades para o enfretamento do fenômeno e emancipação dos atores envolvidos.

CONCLUSÃO

A elevada magnitude de abusos encontrada neste estudo pode ser decorrente da amostra estudada. Acredita-se que os dados refletem somente uma realidade subestimada, própria de situações que envolvem o medo das participantes em revelar as agressões. No entanto, foi possível perceber algumas variáveis relacionadas a uma maior vulnerabilidade para as situações de violência, tais como faixa etária de 30 a 59 anos, menor tempo de estudo, baixos estratos socioeconômicos e más condições de moradia. As agressões físicas foram mais comuns em mulheres não casadas e negras. Já no caso das violências sexuais, especialmente sob forma de coerção sexual menor, estas foram mais presentes em mulheres com relacionamentos conjugais tradicionais (por exemplo, casadas) Perfil similar foi encontrado nos casos em que a mulher também participou como perpetradora do fenômeno, sugerindo a bidirecionalidade da violência, conforme já assinalado por alguns atores. Acredita-se que o reconhecimento deste perfil possa auxiliar na formulação e reflexão sobre estratégias emancipatórias, e que reconheçam o sofrimento mútuo e a interdependência dos atores, a fim de trabalhar o núcleo familiar por meio de ações mais protagonistas e com menos julgamento.

  • FOMENTO
    Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ).

REFERENCES

  • 1
    Domenach JM. La violencia. In: Domenach JM, Laboriti H, Joxe A, Galtung J, Senghaas D, Klineberg O, et al. La violencia y sus causas. Paris: UNESCO; 1981.
  • 2
    Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi A, Lozano R (Eds.). Relatório mundial sobre violência e saúde[Internet]. Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2002[cited 2015 Oct 21]. Available from: http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
    » http://www.opas.org.br/wp-content/uploads/2015/09/relatorio-mundial-violencia-saude.pdf
  • 3
    Paixão GPN, Gomes NP, Diniz NMF, Lira MOSC, Carvalho MRS, Silva RS. Women experiencing the intergenerationality of conjugal violence. Rev Latino-Am Enfermagem [Internet]. 2015 [Cited 05 Nov 2015];23(5):874-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v23n5/pt_0104-1169-rlae-23-05-00874.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rlae/v23n5/pt_0104-1169-rlae-23-05-00874.pdf
  • 4
    Sousa AKA, Nogueira DA, Gradim CVC. Perfil da violência doméstica e familiar contra a mulher em um município de Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2015 Dec 19];21(4):425-31. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21n4a11.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v21n4/v21n4a11.pdf
  • 5
    Piosiadlo LCM, Fonseca RMGS, Gessner R. Subordination of gender: reflecting on the vulnerability to domestic violence against women. Esc Anna Nery Rev Enferm[Internet]. 2014 [cited 2015 Nov 13];18(4):728-33. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v18n4/1414-8145-ean-18-04-0728.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/ean/v18n4/1414-8145-ean-18-04-0728.pdf
  • 6
    Brasil. Política nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres. Brasília: Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres[Internet]. 2011[cited 2016 Mar 30]. Available from: http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/publicacoes/2011/politica-nacional
    » http://www.spm.gov.br/sobre/publicacoes/publicacoes/2011/politica-nacional
  • 7
    Moreira TNF Martins CL, Feuerwerker LCM, Schraiber LB. The foundation of care: Family Health Program teams dealing with domestic violence situations. Saude Soc [Internet]. 2014 [cited 2015 Sep 9];23(3):814-27. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/0104-1290-sausoc-23-3-0814.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/0104-1290-sausoc-23-3-0814.pdf
  • 8
    Rafael RMR, Moura ATMS. Violência contra a mulher ou mulheres em situação de violência? Uma análise sobre a prevalência do fenômeno. J Bras Psiquiatr [Internet]. 2014 [cited 2014 Jan 31];63(2):149-53. Available from: http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n2/0047-2085-jbpsiq-63-2-0149.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/jbpsiq/v63n2/0047-2085-jbpsiq-63-2-0149.pdf
  • 9
    Carvalho-Barreto A, Bucher-Maluschke JSNF, Almeida PC, DeSouza E. Desenvolvimento humano e violência de gênero: uma integração bioecológica. Psicol Reflex Crit [Internet]. 2009 [cited 2015 Dec 17];22(1):86-92. Available from: http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/prc/v22n1/12.pdf
  • 10
    Rafael RMR, Moura ATMS. Considerações éticas sobre pesquisas com mulheres em situa- ções de violência. Rev Bras Enferm [Internet]. 2013[cited 2014 Jul 10];66(2):287-90. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v66n2/21.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/reben/v66n2/21.pdf
  • 11
    Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Critérios de Classificação Econômica Brasil[Internet]. 2011[cited 2011 Apr 27]. Available from: www.abep.org
    » www.abep.org
  • 12
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: questionário da pesquisa. Rio de Janeiro: IBGE; 2011
  • 13
    Reichenheim ME, Harpham T. Perfil intra-comunitário da deficiência nutricional: um estudo de crianças abaixo de 5 anos numa comunidade de baixa renda do Rio de Janeiro. Rev Saúde Pública [Internet]. 1990[cited 2014 Jul 10];24(1):69-79. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v24n1/11.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rsp/v24n1/11.pdf
  • 14
    Moraes CL, Hasselmann MH, Reichenheim ME. Adaptação transcultural para o português do instrumento "Revised Conflict Tactics Scales (CTS2)" utilizado para identificar violência entre casais. Cad Saúde Pública [Internet]. 2002[cited 2014 Jul 10];18(1):163-76. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v18n1/8153.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/csp/v18n1/8153.pdf
  • 15
    Straus M. Handbook for the Conflict Tactics Scales (CTS). Durham, Family Research Laboratory, University of New Hampshire; 2000.
  • 16
    Taquette SR. Violência contra a mulher adolescente: revisão de estudos epidemiológicos brasileiros publicados entre 2006 e 2011. Adolesc Saude [Internet].2015[cited 2015 Dec 17];12(1):66-77. Available from: http://www.adolescenciaesaude.com/audiencia_pdf.asp?aid2=478&nomeArquivo=v12n1a10.pdf
    » ttp://www.adolescenciaesaude.com/audiencia_pdf.asp?aid2=478&nomeArquivo=v12n1a10.pdf
  • 17
    Porto RTS, Bispo Junior JP, Lima EC. Violência doméstica e sexual no âmbito da Estratégia de Saúde da Família: atuação profissional e barreiras para o enfrentamento. Physis [Internet]. 2014[cited 2015 Dec 17];24(3):787-807. Available from: http://www.scielo.br/pdf/physis/v24n3/0103-7331-physis-24-03-00787.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/physis/v24n3/0103-7331-physis-24-03-00787.pdf
  • 18
    World Health Organization. WHO multi-country study on women's health and domestic violence against women: summary report of initial results on prevalence, health outcomes and women's responses[Internet]. Geneva: WHO; 2005[Cited: 2015 Jul 21]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43310/1/9241593512_eng.pdf
    » http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43310/1/9241593512_eng.pdf
  • 19
    Ferreira MF, Moraes CL, Reichenheim ME, Verly Junior E, Marques ES, Salles-Costa R. Effect of physical intimate partner violence on body mass index in low-income adult women. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015[cited 2015 Dec 17];31(1):161-72. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n1/pt_0102-311X-csp-31-01-00161.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n1/pt_0102-311X-csp-31-01-00161.pdf
  • 20
    Lindner SR, Coelho EBS, Bolsoni CC, Rojas PF, Boing AF. Prevalência de violência física por parceiro íntimo em homens e mulheres de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil: estudo de base populacional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2015[cited 2015 Dec 17];31(4):815-26. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n4/0102-311X-csp-31-04-00815.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/csp/v31n4/0102-311X-csp-31-04-00815.pdf
  • 21
    Freitas WMF, Oliveira MHB, Silva ATMC. Concepções dos profissionais da atenção básica à saúde acerca da abordagem da violência doméstica contra a mulher no processo de trabalho: necessidades (in)visíveis. Saúde Debate [Internet]. 2013[cited 2016 Nov 13];37(98):457-66. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v37n98/a09v37n98.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v37n98/a09v37n98.pdf
  • 22
    Garcia-Moreno C, Hegarty K, D'Oliveira AFL, Kaziol-MacLain J, Colombini M, Feder G. The health-systems response to violence against women. Lancet[Internet]. 2015[cited 2016 Mar 30]; 385(9977):1567-79. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25467583
    » https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25467583
  • 23
    Brasil. Política Nacional de Assistência Social. Brasília: Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome [Internet]. 2005. [cited 2016 Nov 13]. Available from: http://www.sesc.com.br/mesabrasil/doc/Pol%C3%ADtica-Nacional.pdf
    » http://www.sesc.com.br/mesabrasil/doc/Pol%C3%ADtica-Nacional.pdf
  • 24
    Moreira TNF, Martins CL, Feuerwerker LCM, Schraiber LB. A construção do cuidado: o atendimento às situações de violência doméstica por equips de Saúde da Família. Saúde Soc [Internet]. 2014 [cited 2016 Nov 13];23(3):814-27. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/0104-1290-sausoc-23-3-0814.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v23n3/0104-1290-sausoc-23-3-0814.pdf

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    14 Jan 2016
  • Aceito
    10 Fev 2017
Associação Brasileira de Enfermagem SGA Norte Quadra 603 Conj. "B" - Av. L2 Norte 70830-102 Brasília, DF, Brasil, Tel.: (55 61) 3226-0653, Fax: (55 61) 3225-4473 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: reben@abennacional.org.br