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Idoso e demanda de cuidador: proposta de classificação da necessidade de cuidado

RESUMO

Objetivo:

Propor uma classificação da necessidade de cuidado de pessoas idosas por meio da identificação de suas demandas funcionais.

Método:

Estudo transversal realizado no município de São Paulo, no ano de 2006, com 1413 idosos (≥ 60 anos) participantes do Estudo SABE (Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento). Para classificação da necessidade de cuidado foram utilizados o método de Escalonamento de Guttman e a frequência de ajuda requerida pelo idoso.

Resultados:

A hierarquização das atividades de vida diária apresentou boa consistência interna (α=0,92) e satisfatórios coeficientes de reprodutibilidade (98%), de escalabilidade (84%) e de reprodutibilidade mínima marginal (87%). Categorizou-se a necessidade de cuidado em: sem necessidade (não necessita de cuidador), necessidade mínima (demanda cuidador esporadicamente), necessidade moderada (requer cuidador intermitente) e necessidade máxima (demanda cuidador em tempo integral).

Conclusão:

Esta classificação possibilitará a identificação de idosos demandantes de auxílio nas atividades cotidianas e direcionará os profissionais de saúde na elaboração de uma linha de cuidados.

Descritores:
Idoso; Idoso Fragilizado; Atividades Cotidianas; Cuidadores; Enfermagem Geriátrica

ABSTRACT

Objective:

To propose a care need classification for elderly people by identifying their functional demands.

Method:

Cross-sectional study carried out in São Paulo, in 2006, with 1,413 elderly (≥ 60 years old), participants in the Health, Well-being and Aging study (SABE – Saúde, Bem Estar e Envelhecimento). For the care need classification, we used the Guttman Scaling method e the frequency of assistance required by the elderly.

Results:

The hierarchy of activities of daily living had good internal consistency (α = 0.92) and satisfactory coefficients of reproducibility (98%), scalability (84%) and minimum marginal reproducibility (87%). Care need was categorized into: no need (requires no caregiver), minimum need (requires caregiver sporadically), moderate need (requires caregiver intermittently) and maximum need (requires full-time caregiver).

Conclusion:

This classification will allow identifying elderly that need assistance in everyday activities and will orientante health professionals in the development of a line of care.

Descriptors:
Elderly; Frail Elderly; Everyday Activities; Caregivers; Geriatric Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Proponer una clasificación de la necesidad de cuidado de las personas ancianas mediante la identificación de sus demandas funcionales.

Método:

Estudio transversal realizado en el municipio de São Paulo, en el año del 2006, con 1413 ancianos (≥ 60 años) participantes en el Estudio SABE (Salud, Bienestar y Envejecimiento). Para clasificación de la necesidad de cuidado se utilizaron el método de Escalamiento de Guttman y la frecuencia de ayuda requerida por el anciano.

Resultados:

La jerarquización de las actividades de la vida diaria presentó buena consistencia interna (α=0,92) y satisfactorios coeficientes de reproductibilidad (98 %), de escalabilidad (84 %) y de reproductibilidad mínima marginal (87 %). Se categorizó la necesidad de cuidado en: sin necesidad (no necesita cuidador), necesidad mínima (demanda cuidador de manera ocasional), necesidad moderada (requiere cuidador intermitente) y necesidad máxima (demanda cuidador en tiempo integral).

Conclusión:

Esta clasificación permitirá identificar a los ancianos que demandan ayuda en las actividades cotidianas y orientará a los profesionales de salud en la elaboración de una línea de cuidados.

Descriptores:
Anciano; Anciano Fragilizado; Actividades Diarias; Cuidadores; Enfermería Geriátrica

INTRODUÇÃO

O crescente envelhecimento da população brasileira, resultado de alterações demográficas, e as consequentes mudanças epidemiológicas decorrentes ocasionaram a expansão das doenças e agravos crônicos acompanhados ou não por situações de maior dependência entre os indivíduos. Essas crescentes demandas constituem um grande desafio para as políticas públicas (em especial as sociais e de saúde), por estarem associadas a uma reorganização na provisão dos cuidados oferecidos diante das significativas alterações nas estruturas familiares e das peculiaridades assistenciais relativas às pessoas idosas em um país, ainda, com muitas desigualdades(11 Brasil. Ministério da Saúde. Diretrizes para o cuidado das pessoas idosas no SUS: proposta de modelo de atenção integral. Ministério da Saúde: Brasília; 2014.).

O cuidado envolve sentimentos, ações e atitude moral, sendo que os dois últimos visam aliviar, satisfazer, confortar e apoiar aqueles que necessitam de cuidado, enquanto as emoções (sentimentos) reforçam os laços interpessoais e os vínculos com diferentes estruturas sociais e culturais(22 Hirata H, Guimarães NA. Introdução. In: Hirata H, Guimarães NA. Cuidado e cuidadoras: as várias faces do trabalho do care. São Paulo: Editora Atlas; 2012. p.1-11.). Assim, o processo de cuidar pode ser compreendido como um fenômeno intencional e essencial à vida, sendo as necessidades dos indivíduos a principal condição que antecede o cuidado(33 Vale EG, Pagliuca LMF. Construção de um conceito de cuidado de enfermagem: contribuição para o ensino de graduação. Rev Bras Enferm [Internet]. 2011[cited 2017 Jan 05];64(1):106-13. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v64n1/v64n1a16.pdf
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).

A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI), em sua reedição em 2006, estabeleceu como eixo norteador da estruturação dos serviços assistenciais direcionados a esse grupo a avaliação da capacidade funcional, visto que esta determina o nível de independência dessas pessoas para a execução de suas atividades cotidianas e, consequentemente, a demanda assistencial requerida(44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528 de 19 de outubro de 2006. Dispõe atualização da Política Nacional de Saúde do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília; 2006.). Quando a necessidade de ajuda for superior à capacidade de autocuidado das pessoas idosas, será necessário o auxílio de outra pessoa a quem se denomina “cuidador”(55 Duarte YAO, Berzins MAVS, Giacomin KC. Política Nacional do Idoso: as lacunas da lei a questão dos cuidadores. In: Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC. (Eds. ). Política Nacional do Idoso: velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p.457-78.).

Tradicionalmente, os cuidadores eram referidos como “formais” ou “informais”, no entanto, a denominação mais acertada refere-se a “cuidadores familiares/agregados” e “cuidadores profissionais”, com a ressalva de que “cuidador em nosso meio ainda é uma ocupação, embora já tenha sido aprovado como profissão no Senado Federal em 2012(55 Duarte YAO, Berzins MAVS, Giacomin KC. Política Nacional do Idoso: as lacunas da lei a questão dos cuidadores. In: Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC. (Eds. ). Política Nacional do Idoso: velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p.457-78.). O que os diferencia são os vínculos afetivos, laços familiares, presença ou não de remuneração ou capacitação para o exercício da atividade(55 Duarte YAO, Berzins MAVS, Giacomin KC. Política Nacional do Idoso: as lacunas da lei a questão dos cuidadores. In: Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC. (Eds. ). Política Nacional do Idoso: velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p.457-78.-66 Roth DL, Fredman L, Haley WE. Informal caregiving and its impact on health: a reappraisal from population-based studies. Gerontologist [Internet]. 2015[cited 2017 Jan 05];55(2):309-19. Available from: https://doi.org/10.1093/geront/gnu177
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).

Estudos sobre cuidadores familiares mostram que, ainda atualmente, a maioria pertence ao sexo feminino, possui vínculos familiares com a pessoa idosa (em especial cônjuges e filhas), é constituída por adultos maduros ou em processo de envelhecimento e refere prestar cuidados contínuos ou intermitentes(77 Neri AL. Famílias cuidadoras: problemas e desafios. In: Souza DN, Rua MS, coordenadoras. Cuidadores informais de pessoas idosas: caminhos de mudança. Aveiro: UA Editora; 2013. p.38-43.). Dependendo da demanda requerida pela pessoa idosa em termos assistenciais, a prestação de cuidado pode vir a exigir do cuidador uma reestruturação de vida, no sentido de alterar costumes, rotinas, hábitos(88 Duarte YAO, Costa PR, Nunes DP, Lebrão ML. Quem são, como se sentem e com que suporte contam os cuidadores de idosos dependentes no Brasil: evidências do Estudo SABE. In: Souza DN, Rua MS, coordenadoras. Cuidadores informais de Pessoas idosas: caminhos de Mudança. Aveiro: UA Editora ; 2013. p.70-5.), o que nem sempre é simples ou fácil, podendo ser acompanhada por sentimentos de tensão e angústia levando, inclusive, à sobrecarga(99 Loureiro LSN, Fernandes MGM, Nóbrega MML, Rodrigues RAP. Sobrecarga em cuidadores familiares de idosos: associação com características do idoso e demanda de cuidado. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014[cited 2017 Jan 05];67(2):227-32. Available from: http://dx.doi.org/10.5935/0034-7167.20140030
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). Em tais circunstâncias, o cuidador pode, por um lado, ignorar suas próprias necessidades ou, por outro, negligenciar o cuidado daqueles por quem é responsável.

A provisão de cuidado, no entanto, é uma responsabilidade legalmente compartilhada entre Estado, sociedade e família, conforme previsto na Constituição Federal, na PNSPI e no Estatuto do Idoso(44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528 de 19 de outubro de 2006. Dispõe atualização da Política Nacional de Saúde do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília; 2006.,1010 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado; 1988.-1111 Brasil. Lei nº. 10.741 de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília 1 out. 2003.). Em alguns países desenvolvidos, onde a população idosa é mais prevalente, há uma reestruturação assistencial compartilhada entre Estado, família e sociedade, de forma a fornecer cuidados de longa duração e apoio social com vistas a garantir algum suporte à pessoa idosa mais dependente.

Na Holanda, por exemplo, familiares e voluntários são considerados os principais provedores de cuidado, no entanto, o Estado custeia serviços temporários para substituir tais cuidadores em períodos mais curtos ou mais extensos, garantindo, assim, seu descanso formal. Na Suécia, o Estado é o principal financiador e provedor de cuidadores formais(1212 Glucksmann M. Rumo a uma sociologia econômica do trabalho do care: comparando configurações em quatro países europeus. In: Hirata H, Guimarães NA. Cuidado e cuidadoras: as várias faces do trabalho do care. São Paulo: Editora Atlas; 2012. p.63-78). No Brasil, ainda não existem políticas de cuidado de longa duração estabelecidas. As famílias, em sua expressiva maioria, assumem a tarefa de cuidar. Embora existam associações comunitárias e serviços de assistência domiciliária (públicos e privados), que, de alguma forma, colaboram na prestação da assistência, não substituem os primeiros e, na ausência dos mesmos, tais programas não podem ser implementados(1313 Guimarães NA, Hirata HS, Sugita K. Cuidado e cuidadoras: o trabalho do care no Brasil, França e Japão. In: Hirata H, Guimarães NA. Cuidado e cuidadoras: as várias faces do trabalho do care. São Paulo: Editora Atlas ; 2012. p.79-102.).

Deve-se compreender que discorrer sobre demanda de cuidado não significa falar de uma coisa única. Tal demanda pode ser estratificada de mínima a total, dependendo da avaliação da pessoa idosa. Em nosso meio, no entanto, ainda não está claramente estabelecida a estratificação de tais cuidados e sua relação com a necessidade de um cuidador, embora existam vários instrumentos que estabeleçam o grau de dependência do idoso. A classificação da necessidade de ajuda das pessoas idosas para o desenvolvimento de suas atividades cotidianas mostra-se útil, pois contribui na determinação objetiva dos cuidados demandados para um cuidador auxiliando as famílias na reorganização de sua dinâmica assistencial e os serviços e profissionais, direcionando suas ações, de forma a torná-las mais efetivas e resolutivas. Esse tipo de classificação pode, ainda, favorecer a organização das políticas assistenciais direcionadas a esse grupo, uma vez que colabora na construção de uma linha de cuidado específica às demandas evidenciadas, levando em consideração todos os recursos identificados a fim de garantir a melhor qualidade de vida da pessoa idosa e de seu entorno.

OBJETIVO

Propor uma classificação da necessidade de cuidado das pessoas idosas por meio da identificação de suas demandas funcionais.

MÉTODO

Aspectos éticos

O Estudo SABE (Saúde, Bem-estar e Envelhecimento) teve início em 2000, como um estudo multicêntrico na América Latina e no Caribe. Para que pudesse ser desenvolvido, foi submetido e aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). A partir de 2006 e, em média a cada cinco anos (2010, 2015), os idosos do estudo foram localizados, novamente entrevistados e novas coortes introduzidas (indivíduos com 60 a 64 anos). Em cada um destes momentos, o estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (COEP) da Faculdade Saúde Pública da Universidade de São Paulo

Desenho, local do estudo e período

Este artigo é parte do Estudo SABE e trata-se de um estudo transversal que utilizou a base de dados coletada no ano de 2006 com amostra de população idosa residente no município de São Paulo.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

O Estudo SABE é um estudo longitudinal de múltiplas coortes, que teve início no ano de 2000, quando foram entrevistados 2.143 indivíduos ≥ 60 anos (coorte A), de ambos os sexos, não institucionalizados, selecionados por amostragem probabilística. O detalhamento do desenho amostral está descrito em publicação anterior(1414 Lebrão ML, Laurenti R. Saúde, bem-estar e envelhecimento: o estudo SABE no Município de São Paulo. Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2005[cited 2017 Jan 05];8(2):127-41. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2005000200005
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). Em 2006, os idosos da coorte A foram localizados, novamente entrevistados (n=1.115) e, nesse momento, foi acrescentada a coorte B, uma nova amostra probabilística da população de 60 e 64 anos naquele ano (n= 298), perfazendo um total de 1.413 idosos. O mesmo se repetiu em 2010, quando os indivíduos das coortes A e B foram localizados, novamente entrevistados (n=990) e nova coorte (coorte C) de 60 a 64 anos de idade adicionada (n= 355), totalizando 1.345 idosos.

Para o presente estudo, utilizou-se a base de dados de 2006, com 1.413 idosos entrevistados, os quais representavam a população idosa daquele ano, residentes na zona urbana no município de São Paulo.

Protocolo do estudo

Nas coortes de 2006, os dados foram coletados entre março de 2006 e dezembro de 2007, por meio de entrevista domiciliar, mediante aplicação de questionário específico, realizada por equipe treinada. O questionário continha dados sobre condições de vida, estado de saúde, avaliação antropométrica e testes de desempenho físico da pessoa idosa. Publicação anterior descreve com detalhes o trabalho de campo para a coleta de dados(1515 Nazario CL. Trabalho de campo para a coleta de dados. In: Lebrão ML, Duarte YAO. O Projeto SABE no município de São Paulo. Brasília: Organização Pan-Americana de Saúde; 2003. p.59-68.).

Neste estudo, necessidade de cuidado foi definida como a demanda da pessoa idosa em requerer auxílio para a realização das atividades de vida diária devido à presença de comprometimento funcional.

Avaliou-se o desempenho funcional do idoso por meio do relato de dificuldade na realização das atividades básicas (ABVDs) e instrumentais de vida diária (AIVDs). As ABVDs avaliadas foram: tomar banho, vestir-se, ir ao banheiro, transferir-se (deitar e levantar da cama/cadeira), locomover-se (atravessar um cômodo caminhando), realizar higiene pessoal (lavar e secar as mãos, escovar os dentes, pentear o cabelo, barbear-se e/ou maquiar-se) e comer utilizando um prato pronto colocado à sua frente. As AIVDs consideradas foram: preparar refeições quentes, administrar a própria medicação, fazer compras, cuidar das próprias finanças, utilizar o telefone, realizar tarefas domésticas leves e pesadas e utilizar meios de transporte.

Estudos anteriores apontam perda funcional hierarquizada na população idosa(1616 Ferrucci L, Guralnik JM, Cecchi F, Marchionni N, Salani B, Kasper J, et al. Constant hierarchic patterns of physical functioning across seven populations in five countries. Gerontol [Internet]. 1998[cited 2017 Jan 05];38(3):286-94. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9640848
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9640...
-1717 Ramos LR, Perracini M, Rosa TE, Kalache A. Significance and management of disability among urban elderly residents in Brazil. J Cross Cult Gerontol [Internet]. 1993[cited 2017 Jan 05];8(4):313-23. Available from: https://dx.doi.org/10.1007/BF00972560
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). Assim, o declínio funcional iniciar-se-ia pelas tarefas mais complexas, progredindo hierarquicamente até comprometer a execução daquelas menos complexas, ocasionando maior nível de dependência. Para essa avaliação, utilizou-se o Escalonamento proposto por Guttman relacionando-o ao desempenho funcional referido pelas pessoas idosas avaliadas. A construção da escala hierárquica ocorreu por meio de um ordenamento das respostas segundo a frequência de seu aparecimento. Assim, a resposta a um item selecionado incorpora a ideia da resposta a um item anterior a ele na escala. Isso deve obedecer a uma lógica e, caso contrário, será classificada como “erro”(1818 Guttman L. The basis of scalogram analisy. In: Stouffer SA. Measurement and prediction. New York: Princeton Universtiy Press; 1950. p.60-90.).

No presente estudo, a utilização do método de Escalonamento de Guttman permitiu a seguinte interpretação: um idoso que refere dificuldade em realizar uma atividade posicionada em nível inferior na escala e, portanto, uma atividade que apresenta menor frequência de dificuldade, possivelmente não deve conseguir realizar todas as outras atividades posicionadas acima desta na escala, uma vez que apresentam maior frequência de dificuldade referida. Da mesma maneira, quem não refere dificuldade em uma atividade posicionada no alto da escala (atividades com maior proporção de pessoas que referiram tal dificuldade), possivelmente conseguirá realizar as atividades posicionadas em níveis inferiores da escala (atividades com menores proporções de pessoas que referiram tal dificuldade)(1616 Ferrucci L, Guralnik JM, Cecchi F, Marchionni N, Salani B, Kasper J, et al. Constant hierarchic patterns of physical functioning across seven populations in five countries. Gerontol [Internet]. 1998[cited 2017 Jan 05];38(3):286-94. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9640848
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,1818 Guttman L. The basis of scalogram analisy. In: Stouffer SA. Measurement and prediction. New York: Princeton Universtiy Press; 1950. p.60-90.).

Com base nesse pressuposto, fez-se a hierarquização das dificuldades referidas no desempenho das atividades de vida diária, cujo resultado se traduz em um retrato do grau de comprometimento do estado funcional das pessoas idosas com repercussão direta na necessidade de auxílio de outra pessoa, de acordo com a frequência para oferta desse cuidado.

Estabeleceu-se a necessidade de cuidado de acordo com a frequência de ajuda requerida pelo idoso para a execução da atividade avaliada (dificuldade referida). Para determinar a frequência de ajuda requerida, considerou-se o tempo requerido em horas/dia ou dias/semana utilizado em estudos que avaliaram a demanda de cuidados de idosos em serviços de longa duração(1919 Instituto de Mayores y Servicios Sociales (IMSERSO). Atención a las personas em situación de dependencia em España: Libro Blanco. Madrid; Observatorio de Personas Mayores: Madrid; 2004.-2020 Alemanha. Ministério da Saúde da Alemanha. Report by the advisory board to review the definition of the need for long-term care [Internet]. 2009[cited 2017 Jan 05]. Available from: http://www.bmg.bund.de/fileadmin/redaktion/pdf_english/Report_by_the_advisory_board_to_review_the_definition_of_the_need_for_long-term_care.pdf
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). Neste estudo, adotou-se a frequência para cada atividade em número de vezes ao dia ou na semana (Quadro 1).

Quadro 1
Estimativa de frequência de ajuda para realização das atividades de vida diária

Análise dos resultados e estatística

A análise da relação hierárquica das atividades foi avaliada em dois passos. O primeiro determinou se estavam relacionadas entre si por meio da consistência interna. A consistência interna foi obtida pelo Coeficiente Alfa de Cronbach, adotando-se como referência valor de alfa superior a 0,70(2121 Streiner DL, Norman GR. Health measurement scales. 3rd ed. Oxford: Oxford University Press; 2003.). O segundo passo foi testar a hierarquia das atividades de vida diária por meio dos Coeficientes de Reprodutibilidade (CR), Reprodutibilidade Marginal Mínima (RMM) e Escalabilidade (CE).

O CR mede o grau de adequação da distribuição dos itens da escala em relação aos padrões de uma escala ideal. Este coeficiente é calculado com base no número total de erros e total de respostas apresentados pelos indivíduos. Consideram-se erros as respostas apresentadas pelos indivíduos que não condizem com o padrão definido para escalonamento. O CR proposto por Guttman(1818 Guttman L. The basis of scalogram analisy. In: Stouffer SA. Measurement and prediction. New York: Princeton Universtiy Press; 1950. p.60-90.) como desejável corresponderia a um valor superior a 0,90 (90%) e um erro igual ou menor que 0,10 (10%). Se os resultados obtidos forem inferiores aos estabelecidos, supõe-se que a escala obtida não aceita a lógica da hierarquia, ou seja, a hierarquização não é confirmada.

Já a RMM avalia o pior coeficiente de reprodutibilidade, ou seja, no caso de todos os indivíduos apresentarem erros em todas as questões. A RMM é calculada com base no número de erros em cada item (cada atividade) e total de respostas em cada item. O CE é uma medida do máximo por cento da reprodutibilidade associado à escalabilidade após o ajuste da assimetria dos dados. Coeficientes com valores a partir de 0,60 (≥ 60%) representam a melhor leitura da realidade por meio da ordenação(1818 Guttman L. The basis of scalogram analisy. In: Stouffer SA. Measurement and prediction. New York: Princeton Universtiy Press; 1950. p.60-90.).

Realizou-se o processamento dos dados do Escalonamento de Guttman no software Statistical Package for the Social Sciences for Windows– SPSS 20.0 ® e as demais análises foram feitas no pacote estatístico Stata® versão 11.

RESULTADOS

Dos 1.413 idosos avaliados, 59,4% eram do sexo feminino, 58,7% tinham entre 60 a 69 anos, 57,4% referiram a presença de companheiro(a), 38,6% mencionaram ter de quatro a sete anos de escolaridade e 55,1% relataram não ter renda suficiente para as suas necessidades. Mais da metade da população (55,0%) referiu presença simultânea de duas ou mais doenças crônicas, sendo as mais prevalentes hipertensão arterial (62,7%) e doença osteoarticular (33,1%).

A primeira avaliação referente ao Escalonamento de Guttman (identificar se as atividades se relacionavam entre si) encontrou índice satisfatório (α=0,92).

Entre esses idosos avaliados, a hierarquia da proporção da dificuldade nas atividades cotidianas foi: realizar tarefas domésticas pesadas (28,8%), administrar as próprias finanças (25,0%), utilizar transporte (22,7%), fazer compras (17,4%), realizar tarefas leves (13,2%), utilizar o telefone (12,4%), tomar o próprio medicamento (11,3%), vestir-se (9,1%), transferir-se (8,8%), preparar refeição (7,2%), tomar banho (6,2%), ir ao banheiro (5,8%), realizar higiene pessoal (4,6%), locomover-se (3,6%) e comer (2,9%) (Figura 1).

Figura 1
Distribuição (%) dos idosos segundo a presença das dificuldades nas atividades de vida diária de idosos, São Paulo, Brasil, 2006 (N=1413)

Figura 2
Descrição dos níveis da necessidade de cuidado de acordo com o comprometimento nas atividades básicas e instrumentais de vida diária e estimativa de frequência de cuidado

Essa escala apresentou coeficiente de reprodutibilidade (CR) igual a 98%, probabilidade de erro de 2%, coeficiente de escalabilidade de 84% e reprodutibilidade mínima marginal de 87%. Tendo em vista que os índices encontrados foram muito satisfatórios, procedeu-se à classificação da necessidade de cuidado.

Com base na hierarquização das atividades, os idosos do estudo foram classificados de acordo com os níveis de necessidade de cuidado. A elaboração dos níveis considerou a frequência de auxílio e o tempo de permanência do cuidador na prestação dos cuidados, da seguinte forma:

a) Sem necessidade: idoso não necessita de ajuda de outra pessoa, pois não refere dificuldade para execução nas ABVDs ou AIVDs.

b)Necessidade mínima: idoso requer um cuidador esporádico, ou seja, semanalmente para auxiliar na realização de pelo menos uma das seguintes atividades: tarefas pesadas, cuidar das finanças, utilizar transporte, fazer compras, realizar tarefas leves e utilizar telefone. Nesse nível, o idoso não apresenta dificuldade em outras atividades.

c) Necessidade moderada: a pessoa idosa necessita de ajuda diária para realizar as atividades e requer a presença de um cuidador presencial, porém não em tempo integral, apenas no momento de realização da(s) atividade(s). Nesse caso, o idoso relatará dificuldade para o desenvolvimento de pelo menos uma das atividades (tomar medicamentos, vestir-se, transferir-se e preparar refeições); também pode ter referido dificuldade em algumas das atividades como: realizar tarefas pesadas, cuidar das finanças, utilizar transporte, fazer compras, realizar tarefas leves e utilizar telefone. Nesse nível, o idoso não relata dificuldade para tomar banho, ir ao banheiro, realizar higiene pessoal, locomover-se e comer.

d)Necessidade máxima: O idoso necessita de um cuidador presencial em tempo integral, pois apresenta dificuldade para o desenvolvimento de pelo menos uma das seguintes atividades: tomar banho, ir ao banheiro, realizar higiene pessoal, locomover-se e comer. Também pode relatar comprometimento em algumas das atividades como: realizar tarefas pesadas, cuidar das finanças, utilizar transporte, fazer compras, realizar tarefas leves e utilizar telefone, tomar medicamentos, vestir-se, transferir-se e preparar refeições.

De acordo com essa classificação, 53,3% dos idosos avaliados mostraram-se independentes para o cuidado, 26,7% apresentavam necessidade mínima, 10,5% necessidade moderada e 9,4% necessidade máxima (Figura 3).

Figura 3
Distribuição (%) dos idosos segundo a necessidade de cuidado, São Paulo, Estudo SABE, 2006. (N=1413)

DISCUSSÃO

Primeiramente, identificou-se, na hierarquização das dificuldades referidas para o desempenho das atividades de vida diária, que o comprometimento funcional inicia-se pelas AIVDs e, em seguida, ABVDs. Esse dado corrobora resultados de outros estudos(1717 Ramos LR, Perracini M, Rosa TE, Kalache A. Significance and management of disability among urban elderly residents in Brazil. J Cross Cult Gerontol [Internet]. 1993[cited 2017 Jan 05];8(4):313-23. Available from: https://dx.doi.org/10.1007/BF00972560
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,2222 Finlaysona M, Mallinsonb T, Barbosac VM. Activities of daily living (ADL) and instrumental activities of daily living (IADL) items were stable over time in a longitudinal study on aging. J Clin Epidemiol [Internet]. 2005[cited 2017 Jan 05];58(4):338-49. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15862719
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1586...
-2323 Torres MV. Hierarquização de incapacidade funcional de idosos no município de São Paulo: uma análise longitudinal [Dissertação]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo; 2009.) e aponta que, durante o processo de envelhecimento, a perda das habilidades para o desenvolvimento dessas atividades ocorre primeiramente naquelas consideradas mais complexas, evoluindo para as mais simples(2424 Moraes EM. Atenção à saúde do Idoso: aspectos Conceituais. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2012.).

Em relação aos índices da escala de Guttman, observaram-se coeficientes satisfatórios, o que confirma a hierarquização de perda funcional das atividades de vida diária consideradas. Estudos observaram alta intercorrelação (alpha de Cronbach acima de 0,70) entre as variáveis de medidas funcionais, apontando a unidimensionalidade(1717 Ramos LR, Perracini M, Rosa TE, Kalache A. Significance and management of disability among urban elderly residents in Brazil. J Cross Cult Gerontol [Internet]. 1993[cited 2017 Jan 05];8(4):313-23. Available from: https://dx.doi.org/10.1007/BF00972560
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,2323 Torres MV. Hierarquização de incapacidade funcional de idosos no município de São Paulo: uma análise longitudinal [Dissertação]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo; 2009.).

A estratificação da necessidade de cuidado em níveis permite identificar os grupos demandantes de auxílio de outra pessoa e a frequência desse cuidado, o que, por sua vez, possibilita estabelecer ações que norteiem os cuidadores na prestação da assistência de forma sistematizada com o intuito de prevenir a piora da incapacidade.

Idosos com necessidade mínima de cuidado são aqueles que demandariam um cuidador esporadicamente, ou seja, uma pessoa cujo auxílio seria para a execução de pelo menos uma das atividades como realizar tarefas pesadas ou leves, cuidar das finanças, utilizar transporte, fazer compras e utilizar telefone. Essas atividades são consideradas complexas por necessitarem, para sua execução, de múltiplas funções cognitivas como memória, função executiva e linguagem(2424 Moraes EM. Atenção à saúde do Idoso: aspectos Conceituais. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2012.). No entanto, quando comprometidas, não requerem um cuidador presencial diariamente, mas apenas uma reorganização da dinâmica da casa da pessoa idosa.

O “uso do telefone” envolve o ato de ligar e receber ligações e, nesse sentido, o idoso pode apresentar dificuldades, em especial no ato de ligar, devido às tecnologias existentes nos aparelhos. Alguma pessoa pode auxiliá-lo, orientando-o sobre o manuseio do aparelho ou sugerindo a adoção de aparelhos adaptados para garantir a realização dessa atividade. Optou-se por incluir essa atividade na classificação da necessidade mínima pelo fato de o idoso demandar auxílio quando houver a atividade em momentos esporádicos durante o dia. Tal classificação não subestima o cuidado para com essa atividade, uma vez que se trata de um meio de comunicação para o idoso e favorece o convívio social. Além disso, o uso do telefone possibilita que ele acesse diversos serviços, dentre eles os de saúde, para fins de marcação de consultas e solicitação de atendimento de emergência(2323 Torres MV. Hierarquização de incapacidade funcional de idosos no município de São Paulo: uma análise longitudinal [Dissertação]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo; 2009.,2525 Levine DM, Lipsitz SR, Linder JA. Trends in seniors’ use of digital health technology in the United States, 2011-2014. JAMA [Internet]. 2016[cited 2017 Jan 05];316(5):538-40. Available from: https://dx.doi.org/10.1001/jama.2016.9124
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).

A categoria necessidade moderada de cuidado sinaliza para a demanda de um cuidador intermitente, ou seja, pelo menos uma vez ao dia. Incluem-se aqui as atividades como tomar medicamentos, vestir-se, transferir-se e preparar as refeições quentes. A atividade manejo da própria medicação requer planejamento, organização e execução do procedimento. Assim, a responsabilidade pela gestão dos medicamentos dos idosos é dos cuidadores. Para que essa atividade seja realizada com segurança e eficiência, os enfermeiros são a principal fonte de informação, capacitação e apoio aos cuidadores(2626 Gillespie R, Mullan J, Harrison L. Managing medications: the role of informal caregivers of older adults and people living with dementia: a review of the literature. J Clin Nurs [Internet]. 2014[cited 2017 Jan 05]; 23(23-24):3296-308. Available from: https://dx.doi.org/10.1111/jocn.12519
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), que podem ser instruídos a organizarem as medicações de acordo com o horário e formas de administração e orientados sobre possíveis adaptações para a execução da atividade. Assim, o cuidador pode orientar e auxiliar o idoso na gestão de seus medicamentos, embora isso não demande sua permanência contínua para prestar essa assistência.

O “preparo das refeições quentes” é uma atividade que está relacionada ao comportamento alimentar e a questões culturais, no entanto, quando o idoso requer auxílio para tanto, não é necessária a presença de um cuidador em tempo integral para executá-la. Já a atividade “vestir-se” exige força de membros superiores e inferiores, flexibilidade, coordenação motora fina, equilíbrio, de modo que, quando comprometida, pode sinalizar um avanço no grau da dependência(2727 Alexandre TS, Corona LP, Nunes DP, Santos JL, Duarte YA, Lebrão ML. Gender differences in incidence and determinants of disability in activities of daily living among elderly individuals: SABE study. Arch Gerontol Geriatr [Internet]. 2012[cited 2017 Jan 05];55(2):431-7. Available from: https://dx.doi.org/10.1016/j.archger.2012.04.001
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), mas, também, não demanda um cuidador em tempo integral.

Idosos com necessidade máxima de cuidado requerem a presença de um cuidador em tempo contínuo para atender às suas demandas pelo menos três vezes ao dia. As atividades sinalizadoras dessa necessidade foram tomar banho, ir ao banheiro, realizar higiene pessoal, locomover-se e comer, por requererem assistência contínua e supervisão.

Das atividades apontadas, somente tomar banho pode ser realizada uma vez ao dia ou de acordo com os aspectos culturais dos idosos, no entanto, optou-se por mantê-la para caracterizar a dependência mais significativa, uma vez que estudos apontam se tratar de uma atividade norteadora de incapacidade em estágios mais avançados. Ademais, a dificuldade para tomar banho é determinante da morbidade, da mortalidade e da necessidade de serviços de ajuda domiciliar em pessoas idosas(2828 Gill TM, Han L, Allore HG. Bath aids and the subsequent development of bathing disability in community-living older persons. J Am Geriatr Soc [Internet]. 2007[cited 2017 Jan 05];55(11):1757-63. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2778072/pdf/nihms154892.pdf
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).

Estudos apontam que atividades como “deitar/levantar da cama/cadeira”, “pentear os cabelos” e “tomar banho” são consideradas essenciais. Assim, quando requerem ajuda para serem realizadas, a presença de outra pessoa é importante para que sejam executadas com alguma segurança e regularidade. Isso reitera que o comprometimento em tais atividades evidencia a necessidade de alguém mais permanente ao lado da pessoa idosa(2929 Ramos LR, Andreoni S, Coelho-Filho JM, Lima-Costa MF, Matos DL, Rebouças M, et al. Perguntas mínimas para rastrear dependência em atividades da vida diária em idosos. Rev Saúde Pública [Internet]. 2013[cited 2017 Jan 05];47(3):506-13. Available from: https://dx.doi.org/10.1590/S0034-8910.2013047004325
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).

O ato de alimentar-se utilizando um prato pronto colocado à sua frente é considerado uma tarefa mais simples e, por essa razão, o comprometimento em sua execução é postergado(2424 Moraes EM. Atenção à saúde do Idoso: aspectos Conceituais. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2012.). No presente estudo, tal atividade apresentou menor comprometimento referido por parte dos idosos. Sua presença indica um grau de comprometimento severo e a demanda de um cuidador contínuo. Os enfermeiros deverão orientar os cuidadores para essa atividade, com enfoque em ações que minimizem o declínio na capacidade de comer, por exemplo, mediante uso de utensílios assistivos que estimulem a independência modificada. Por outro lado, se isso não for possível, o treinamento deverá ser voltado para o ensino do reconhecimento da função cognitiva, física e dos fatores ambientais(3030 Lee KM, Song JA. Factors influencing the degree of eating ability among people with dementia. J Clin Nurs [Internet]. 2015[cited 2017 Jan 05];24(11-12):1707-17. https://dx.doi.org/10.1111/jocn.12777
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).

Importante destacar, como limitação do estudo, não ter sido possível avaliar a percepção do idoso com comprometimento funcional sobre a necessidade de ajuda, pois alguns podem apresentar a independência modificada. Essa independência ocorre quando o idoso utiliza dispositivos assistivos para desempenhar as atividades comprometidas, podendo não requerer o cuidador. Destarte, a classificação da necessidade de cuidado é subjetiva e pode ser utilizada com intuito de refletir uma abordagem centrada no paciente, a qual preconiza que as pessoas sejam vistas como responsáveis por suas necessidades de saúde.

Finalmente, essa classificação poderá identificar, por meio das atividades de vida diária, a demanda de cuidador e a frequência estimada que o mesmo terá para prestar o cuidado. Permitirá também nortear o encaminhamento para uma avaliação mais ampla das necessidades de cuidados de longa duração.

CONCLUSÃO

A elaboração da classificação da necessidade de cuidados por meio da hierarquização das atividades de vida diária e da frequência de ajuda requerida reflete a demanda do idoso por um cuidador. Destaca-se que essa hierarquia apresentou boa consistência interna e satisfatórios coeficientes de reprodutibilidade, de escalabilidade e de reprodutibilidade mínima marginal.

Importante destacar que os enfermeiros poderão identificar as demandas das pessoas idosas, potenciais cuidadores e a necessidade de suporte de cuidado por elas requerido. Esses profissionais, em parceria com os cuidadores, poderão ainda sistematizar o cuidado prestado no domicílio, com enfoque nas ações de promoção da saúde, prevenção de agravos e manutenção da capacidade funcional. Ademais, o cuidador deverá ser foco nesse processo de cuidar, uma vez que pode se sobrecarregar com as atividades atribuídas e gerar repercussões negativas na qualidade de vida e nas relações com o idoso.

Por fim, essa classificação poderá favorecer o estabelecimento de uma linha de cuidados, com base nas demandas dos idosos, levando em consideração a família e seus recursos, com vistas à adaptação e adequação das circunstâncias individuais em prol da melhoria das condições de cuidado a essa parcela vulnerável da população.

  • ERRATA

    No artigo “Idoso e demanda de cuidador: proposta de classificação da necessidade de cuidado”, com número de DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0123, publicado no periódico Revista Brasileira de Enfermagem, v71(suppl 2):897-904, na página 901, na figura 3:
    Onde se via:

    Vê-se:

  • FOMENTO
    Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

AGRADECIMENTOS

À Professora Maria Lúcia Lebrão (in memoriam), pela oportunidade de participar do Estudo SABE (Saúde, Bem-estar e Envelhecimento), do qual era coordenadora, e pelas valiosas contribuições no desenvolvimento da pesquisa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2017
  • Aceito
    11 Jun 2017
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