Educação permanente em unidade neonatal a partir de círculos de cultura

RESUMO

Objetivo:

identificar os fatores que dificultam e facilitam o trabalho da equipe de enfermagem em unidade neonatal e conhecer as demandas de educação permanente descritas pela equipe de enfermagem, emergentes do cotidiano da assistência.

Método:

estudo qualitativo que seguiu os passos preconizados pelo “Método Paulo Freire” realizado com 29 profissionais da equipe de enfermagem de uma unidade neonatal de um hospital universitário. Foram realizados três círculos de cultura para a identificação dos temas geradores.

Resultados:

Os temas gerados foram organizados de acordo com as questões abordadas nas entrevistas e durante os círculos de cultura, sendo destacados quatro temas: falta de rotinas; treinamento; melhorar a convivência da equipe e melhorar o processo de gestão.

Considerações finais:

O estudo possibilitou conhecer os fatores que dificultam e facilitam o cotidiano da prática dos profissionais de enfermagem mediante identificação dos temas geradores emergentes dos círculos de cultura que favoreceram a reflexão crítica do grupo, gerando subsídios para a elaboração coletiva do programa de educação permanente em unidade neonatal.

Descritores:
Educação Continuada; Tecnologia Educacional; Enfermagem Neonatal; Enfermagem; Neonatologia

ABSTRACT

Objective:

to identify the factors that hinder and facilitate the work of the nursing team in a neonatal unit and to know the demands of Permanent Education described by the nursing team, emerging from the daily care.

Method:

qualitative study that followed the steps recommended by the “Paulo Freire's Method” carried out with 29 professionals of the nursing team of a neonatal unit of a university hospital. Three Culture Circles were carried out to identify the generating themes.

Results:

The themes generated were organized according to the issues covered in the interviews and during the Culture Circles, with four themes being highlighted: lack of routines; training; improvement of coexistence of the team and improvement of management process.

Final considerations:

The study made it possible to know the factors that hinder and facilitate the routine practice of nursing professionals by identifying the emergent themes of the Culture Circles that favored the critical reflection of the group, generating subsidies for the collective elaboration of the Permanent Education program in neonatal unit.

Descriptors:
Education, Continuing; Educational Technology; Neonatal Nursing; Nursing; Neonatology

RESUMEN

Objetivo:

identificar los factores que dificultan y facilitan el trabajo del equipo de enfermería en unidad neonatal y conocer las demandas de educación permanente descritas por el equipo de enfermería, emergentes del cotidiano de la asistencia.

Método:

estudio cualitativo que siguió los pasos preconizados por el “Método Paulo Freire” realizado con 29 profesionales del equipo de enfermería de una unidad neonatal de un hospital universitario. Fueron realizados tres círculos de cultura para la identificación de los temas generadores.

Resultados:

Los temas generados fueron organizados según las cuestiones abordadas en las entrevistas y durante los círculos de cultura, siendo destacados cuatro temas: falta de rutinas; formación; mejorar la convivencia del equipo y mejorar el proceso de gestión.

Consideraciones finales:

El estudio posibilitó conocer los factores que dificultan y facilitan el cotidiano de la práctica de los profesionales de enfermería mediante la identificación de los temas generadores emergentes de los círculos de cultura que favorecieron la reflexión crítica del grupo, generando subsidios para la elaboración colectiva del programa de educación permanente en unidad neonatal.

Descriptores:
Educación Continua; Tecnología Educacional; Enfermería Neonatal; Enfermería; Neonatología

INTRODUÇÃO

A assistência de enfermagem à criança e ao neonato é algo complexo que envolve, além da execução adequada das técnicas de enfermagem, competências do enfermeiro que vão desde o conhecimento sobre as patologias mais frequentes, em cada período do desenvolvimento, até as necessidades sociais e emocionais da criança e sua família. Com isso, a atuação da equipe de enfermagem requer um contínuo processo de atualização que demanda um conjunto de estratégias pedagógicas, considerando as demandas e necessidades emergentes do cotidiano do processo de trabalho na unidade neonatal.

Quando elaboradas de forma conjunta, as estratégias pedagógicas valorizam a subjetividade e a historicidade do ser humano inserido naquela realidade, estimulando o diálogo e a reflexão crítica, o desenvolvimento da autoestima, o resgate dos projetos de vida, o crescimento profissional, a motivação para novas aprendizagens e conquistas pessoais por meio da práxis criadora, conscientizando-se de que cada momento oportuniza criar e recriar novos conhecimentos de si e dos outros⁽¹⁾.

Entretanto, para que as demandas educacionais se materializem, é necessário que o profissional coloque a si, o paciente e a família como sujeitos desejantes, capazes de provocar incertezas e inquietações, em um movimento dialógico e reflexivo sobre a realidade, buscando acionar um conjunto de conhecimentos para intervir nas situações vivenciadas⁽²⁾.

Esse movimento de ação-reflexão-ação torna cada profissional sujeito, dinâmico nas questões vivenciadas no cotidiano do processo de trabalho e, de forma dialógica, surgem demandas que expressam o pensamento coletivo, a partir do olhar de cada um. Neste sentido, a educação permanente pode servir de caminho para a emancipação e autonomia do profissional, pois promove um encontro entre o trabalho e a formação, ou seja, é no trabalho e para o trabalho que o processo de educação permanente se dá, permitindo a aplicação e a relevância dos conteúdos e tecnologias estabelecidas⁽³⁾.

A busca de diálogo entre os pares e a reflexão constante sobre o cotidiano torna cada profissional sujeito dinâmico e reflexivo. Assim, pensar nos problemas ou nas dificuldades cotidianas no processo de trabalho e torná-los coletivos pode favorecer o debate na equipe e provocar uma ruptura no modelo assistencial fechado, produzindo novos olhares e novos (re)direcionamentos em relação ao processo de trabalho.

O exercício de uma prática educativa crítica constitui uma forma de intervenção no mundo, comprometida com o princípio de democracia que rejeita qualquer forma de discriminação, dominação e integra uma atitude de inovação e renovação, na crença de que é possível mudar. A escolha por desenvolver um Círculo de Cultura visa ensejar uma vivência participativa com ênfase no diálogo, o que possibilita a reflexão-ação na elaboração coletiva de uma proposta sistematizada para uma educação em saúde emancipatória⁽¹⁾.

Uma vez que, em todas as áreas do conhecimento, a busca por um processo educativo contínuo tem sido uma constante, as atividades de educação permanente, se efetivamente desenvolvidas e direcionadas para a construção coletiva de conhecimentos, constituem-se em uma das formas de promover e melhorar as competências técnico-científicas, culturais, políticas, éticas e humanísticas dos trabalhadores da saúde.

A Educação Permanente em Saúde (EPS), enquanto uma das estratégias de reorganização do Sistema único de Saúde (SUS), uma vez incorporada na cultura da instituição, pressupõe o desenvolvimento de práticas educativas focadas na resolução de problemas concretos. Refere-se à relação entre profissionais de saúde e destes com outras áreas, mantendo o foco das ações no usuário e considerando também a necessidade de se aplicar saberes profissionais específicos importantes para um cuidado responsável^(4-5).

Nesse sentido, a EPS, enquanto educação para o trabalho precisa ser entendida como uma diretriz qualificadora da gestão de equipes, de serviços e do desenvolvimento de trabalhadores em saúde, cuja principal motivação deve ser os diversos problemas identificados nas práticas dos serviços de saúde, que só poderia acontecer a partir de uma tomada de consciência desse trabalhador como sujeito capaz de pensar e agir no trabalho⁽⁶⁾.

Mas para isso, entende-se que a gestão do processo de educação permanente deve ser pautada pelo diálogo e argumentação, no sentido de despertar no trabalhador a consciência crítica sobre o cotidiano do seu trabalho e do mundo em que vive que não pode ser alienado e desumano⁽⁷⁾.

No que diz respeito à assistência de enfermagem em unidades neonatais, o processo de trabalho é complexo, exige estrutura física em conformidade com padrões técnicos, materiais de qualidade, equipe treinada e atualizada, além de habilidade em lidar com famílias de diversas culturas e, mesmo com todos esses elementos, ainda não há garantias de um processo de trabalho capaz de gerar qualidade no cuidado prestado⁽⁴⁾.

OBJETIVO

Identificar os fatores que dificultam e facilitam o trabalho da equipe de enfermagem em unidade neonatal e conhecer as demandas de educação permanente descritas pela equipe de enfermagem emergentes do cotidiano da assistência.

MÉTODO

Aspectos éticos

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa da instituição e foi aprovado. Todos os participantes foram esclarecidos quanto aos objetivos do estudo e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme preconiza a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde/MS.

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo qualitativo, que seguiu os passos preconizados pelo Método Paulo Freire⁽⁸⁾, o qual é ativo e marcado pela dialogicidade, seguindo etapas sistematizadas, que são: a) Investigação Temática - com investigação dos principais temas, questões, assuntos da realidade que vão constituir os temas geradores a serem problematizados; b) Codificação e Descodificação - os temas geradores são codificados e descodificados, buscando o seu significado social, a consciência do vivido; e o c) Desvelamento Crítico - em que há o enfrentamento da realidade, onde os homens ou exteriorizam sua visão de mundo, expondo situações limites na dinâmica de sua realidade, ou se calam, gerando um silêncio temático que pode expressar a opressão da situação limite a qual já se adaptaram. Nesta fase ocorre a redução temática, onde os temas são cindidos, buscando os núcleos fundamentais, ou seja, unidades de aprendizagens com sequências estabelecidas entre si, voltando-se a ele em sua totalidade para melhor conhecê-lo⁽⁹⁾.

Procedimentos metodológicos

O estudo foi desenvolvido no período de junho a outubro de 2013 com 29 profissionais da equipe enfermagem cujos critérios de inclusão foram: profissionais de enfermagem, entre enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, ambos os sexos, atuantes na unidade de neonatologia, com vínculo empregatício; e de exclusão: profissionais de férias, afastados e/ou deslocados do setor no período de coleta de dados.

Cenário do estudo

O estudo foi desenvolvido na unidade neonatal de um hospital universitário no Estado do Rio de Janeiro.

Coleta e organização dos dados

A produção de dados ocorreu inicialmente por meio de observações registradas em diário de campo e, posteriormente, entrevistas semiestruturadas individuais antes da realização dos círculos de cultura. Todas as entrevistas foram gravadas em mídia digital, identificadas pela palavra “participante” seguido do número de sequência de realização e, transcritas na íntegra, pelo próprio pesquisador.

A partir da análise das entrevistas, foram registradas todas as temáticas e ações geradas que emergiram das entrevistas, seguida da elaboração de uma primeira listagem estruturada de acordo com as questões apresentadas nas entrevistas para posterior apreciação nos Círculos de Cultura, cujos encontros com os participantes aconteceram na sala de repouso de enfermagem da unidade, geralmente à tarde, com duração média de 40 minutos, como sugerido e agendado previamente pelos participantes, devido ao menor movimento na unidade, o que favorecia a participação dos mesmos.

Foram realizados três Círculos de Cultura, em que todos os profissionais tiveram a oportunidade de participar com média de 15 pessoas por círculo, conforme agendamento prévio, visando identificar a rede temática, ou seja, os conteúdos necessários para compreensão e análise da realidade local; redução temática em que foram levantados os conteúdos que cada um trabalharia dentro do programa; e programação das atividades que iriam compor o programa de educação permanente elaborado.

Análise dos dados

O itinerário da pesquisa seguiu três etapas: a investigação temática (extraídos da vivência dos profissionais. Fase da descoberta do universo vocabular, palavras ou temas extraídos do cotidiano da prática dos participantes nos Círculos de Cultura); tematização (fase de ampliação sobre o conhecimento e tomada de consciência, na qual se buscou contextualizar e dar significados aos temas geradores); e o desvelamento crítico (análise preliminar dos conteúdos extraídos da codificação para enxergar os processos, buscando conhecer a fundo a realidade das coisas).

RESULTADOS

Elementos dificultadores e facilitadores do cotidiano da prática das equipes de enfermagem na unidade neonatal

A identificação dos temas geradores ocorreu a partir da análise das entrevistas e dos registros das observações em diário de campo. Os temas gerados foram organizados, de acordo com as questões realizadas durante as entrevistas. A partir da análise da questão “o que facilita ou dificulta o cotidiano de trabalho na unidade” o pesquisador aplicou as fases do itinerário da pesquisa.

Tema Gerador Prioritário: falta de rotinas

O tema foi gerado nas entrevistas e mantido em todos os Círculos de Cultura, sendo codificado como: falta de diretrizes que normatizem as atividades de enfermagem.

A equipe de enfermagem naquele momento tentava se adaptar às mudanças decorrentes de obras de ampliação da unidade na instituição e alguns participantes destacaram a importância das rotinas para sincronia e foco do trabalho em equipe:

Facilitador para mim é de ser um trabalho pautado em rotinas de ser uma área específica, isso me facilita demais porque eu não sou nem um pouco generalista eu tenho que trabalhar com base num foco, numa área determinada então a questão de ter rotinas ser especialista são os grandes os facilitadores. (Participante 18)

No momento a falta de uma rotina especifica para que todo mundo faça do mesmo jeito a mesma língua trabalhar da mesma forma, a gente percebe como existem várias pessoas com ideias, um traz ideia, eu só tenho a ideia da equipe o que eu trabalho. (Participante 12)

A especificidade da unidade demanda vários procedimentos técnicos exaustivos e que colocam sempre o saber fazer do profissional em questão e aliado ao fato da velocidade com que se desenvolvem as tecnologias. A rotina surge como elemento norteador e facilitador e por muitos considerados como elo entre as equipes.

Desvelamento crítico para o tema: indicação de elaboração de um manual de enfermagem para Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

Tema Gerador Prioritário: treinamento

O treinamento foi associado com outros temas geradores, como: falta de treinamento, treinamento prioritário, conhecimento, saber o que fazer e falta de habilidade técnica, equipe especializada. Foi codificado como sendo a necessidade de receber informações e treinamentos práticos, ampliando o conhecimento.

O facilitador é o conhecimento que eu estou adquirindo aqui, porque aqui está sendo mesmo uma escola, realmente estou aprendendo muito no dia a dia. (Participante 20)

Eu cheguei aqui e não sabia nada e as enfermeiras foram boas na recepção me explicaram muitas coisas, aprendi muitas coisas e isso me fez agora eu querer fazer uma pós em neonatal. (Participante 7)

A universidade dispõe de vários programas de capacitação e qualificação do servidor, mas poucos são os que privilegiam a prática, principalmente do serviço de nível médio, já que exemplos como o mestrado profissional e especializações são acessíveis aos servidores com formação superior da instituição, sem ônus.

Entretanto, de acordo com o que os participantes descreveram nos Círculos de Cultura, o treinamento pode acontecer em qualquer momento:

Em algumas situações você pode ser treinado para aquilo, você tem exatamente que saber o que fazer para não ficar batendo cabeça e perdendo tempo de um profissional com outro. Eu acho que aqui deveria ter um treinamento específico. (Participante 3)

Aí fiquei em treinamento um mês durante o dia, aí ela me orientou como comprar o livro, a mexer na incubadora, não só ela mais a equipe inteira. Aí eu comecei a comprar livros, ver artigos porque me interessei, mas fiz um treinamento que foi muito bom. (Participante 5)

Desvelamento crítico do tema gerador: elaboração de um programa de treinamento que privilegia a prática associada ao conhecimento científico.

Tema Gerador Prioritário: melhorar a convivência da equipe

A questão da convivência como tema gerador emergiu nas entrevistas e foi ratificado em todos os Círculos de Cultura, sendo associada aos temas: falta de integração entre as equipes de enfermagem, valorização do conhecimento do profissional de enfermagem, falta de reuniões, mau humor, gostarem do que faz e ter prazer em trabalhar, humanização. Foi codificado pela equipe como necessidade de bom relacionamento e integração durante as atividades. Isso foi identificado nas falas dos participantes:

Como facilitador a integração da equipe uma vez que você tendo uma equipe integrada com todos envolvidos isso é um facilitador. (Participante 25)

A equipe multiprofissional também voltada para mesma área é um grande facilitador porque todos que trabalham comigo me dão suporte e eu a eles porque isso tudo é uma troca. Todos têm um só foco. Isso é um grande facilitador. (Participante 18)

Portanto, o tema gerador prioritário, melhorar a convivência da equipe é necessário para elaboração de um programa de educação permanente.

O Desvelamento crítico do tema gerador promove ações que favorecem o diálogo e a integração dos membros da equipe em momentos dentro e fora do ambiente de trabalho.

Tema Gerador: melhorar o processo de gestão

O tema foi identificado nas entrevistas e permaneceu durante as discussões no Círculo de Cultura. Teve como temas associados à falta de pessoal para trabalhar: o excesso de barulho, a falta de comunicação com outros setores e serviços do hospital, a desvalorização do serviço de enfermagem, o excesso de pessoas no setor, a falta de reuniões com o grupo por parte da chefia e de informação sobre o que acontece fora do setor.

Foi codificado como dificuldade de gestão do serviço de enfermagem, em nível setorial, da gerência e direção por falta de rotinas e metas a serem seguidas e atingidas para melhorar o serviço, como descrito nas falas:

Você entendeu o que acabamos de falar? Enquanto não organizar tudo, não dá para pensar em cursos. (Participante 12)

E primeiro a gente tem que criar um padrão com normas estabelecidas pelo grupo e tem que estar no papel, um manual específico da unidade com os POPs com tudo, desde as partes administrativas até as partes práticas. A partir desse material já bem estruturado bem fundamentado a gente pode começar isso. Eu acho que pode começar com grupos de estudo ou um grupo especifico por cada assunto. Enfim é a gente começar a trabalhar na aplicação mesmo, no passo a passo do nosso trabalho. (Participante 18)

Em relação ao quantitativo de pessoal, o hospital universitário possui um déficit em todos os setores. Por ser um órgão público do Governo Federal, o mesmo segue regras de reposição de profissionais e, atualmente, possui um quadro com cerca de cem profissionais em contrato temporário de no máximo dois anos, o que acarreta mudanças constantes nas equipes, gerando estresse adaptativo.

Entendendo que o processo de gestão deve estar inserido no programa de educação permanente, o tema gerador melhorar o processo de gestão foi considerado prioritário.

Desvelamento crítico do tema gerador: indicações de criar uma agenda de reuniões com as equipes do setor envolvendo os níveis de gestão da diretoria de enfermagem. Manter a equipe atualizada sobre as políticas institucionais.

DISCUSSÃO

A comissão de Educação Permanente da instituição vem trabalhando com Procedimento Operacional Padrão (POP) com a lógica de que o mesmo apresenta diretrizes técnicas e normativas elaboradas, levando-se em conta a realidade do local, o que pode ser considerado como uma tecnologia da informação e, dessa forma, constitui caráter estratégico para a disseminação global do conhecimento⁽¹⁰⁾.

Pode-se dizer que, frente aos pilares da educação para o século XXI, as rotinas, se emergentes do cotidiano da prática constituem um aprender a conhecer, pois há participação dos profissionais na construção do conhecimento para que, o aprender a fazer⁽¹¹⁾, seja base de outro pilar. Depreende-se, assim, que a falta de rotinas emerge como um tema gerador, sendo necessária a construção coletiva de rotinas no programa de educação permanente. As atividades práticas, quando privilegiadas nas ações educativas, favorecem a reflexão compartilhada e sistemática⁽¹²⁾. Aprender a fazer, embora dissociável do conhecer, não deve ser uma ação restritiva ao mundo do trabalho, mas precisa também construir os modos de seus instrumentos de feitura⁽⁹⁾.

Nesse sentido, é importante estabelecer uma articulação dos gestores de enfermagem com o setor de educação permanente na instituição para o planejamento das ações educativas e das metodologias utilizadas em cada uma delas, no sentido de potencializar os resultados e incentivar os funcionários, que se beneficiam dessas ações, para a melhoria crescente da qualidade da assistência⁽¹³⁾.

O treinamento, quando associado ao conhecer, constitui tema gerador para o programa de educação permanente e atende ao pilar da educação para o século XXI, aprender a fazer, ou aprender a aprender a fazer⁽¹⁰⁾. Em uma análise dos pilares para educação no século XXI, conviver é a própria essência da obra de Paulo Freire, já que é centrada no diálogo e sua existência necessita de dois seres dialogantes. As ações de educação permanente se caracterizam pela reflexão coletiva dos problemas e das demandas, a partir dos quais podem ser planejadas as necessidades de intervenção político-educativa⁽¹⁰⁾.

Os enfoques educativos para educação permanente e os estudos sobre as organizações ajudam a compreender a aprendizagem no trabalho e os intercâmbios que facilitam ou impedem as mudanças nas organizações. Essa linha de entendimento se faz, porque as organizações operam por meio de rotinas e normas que precisam ser incorporadas na análise desse processo educativo⁽¹⁴⁾.

Os hospitais são instituições com histórias interiorizadas por seus profissionais e o trabalho na saúde é delimitado por regulamentos públicos. O trabalho em saúde representa um contexto de aprendizagem explícita e implícita em que a análise das suposições aceitas ou questionadas promoverá mudanças ou perpetuará as rotinas e, enquanto a educação permanente continuar orientada por grupos de mesmo interesse, é normal que não se discutam as rotinas⁽¹⁵⁾.

A educação permanente pode operar níveis distintos de aprendizagens, o nível I- quando busca extinguir ou adquirir hábitos; o nível II- ao refletir sobre situações críticas ou sobre a prática diferente entre os profissionais, despertando a conscientização de necessidade de mudança; e nível III- quando a partir da reflexão, interpreta o contexto da organização que permite a possibilidade de mudanças⁽¹⁶⁾.

Os Círculos de Cultura aconteceram na unidade do cotidiano da prática e objetivaram refletir sobre os temas gerados até que fossem significativos à contextualização da realidade. Foram identificadas, nos temas geradores, ações indicadas e ações já realizadas pela equipe de enfermagem para a construção do programa de educação permanente para a unidade neonatal do hospital universitário.

O Círculo constituiu um espaço de encontro e descoberta do outro como sujeito, com aspirações, sentimentos e vivências que precisam ser desveladas a partir do diálogo no grupo, da participação nas discussões, da troca de conhecimentos e experiências. Além disso, promove a dialogicidade no processo de construção de um saber coletivo, compartilhado e contextualizado⁽¹⁷⁾.

A Educação Permanente em saúde tem como objeto de transformação o processo de trabalho, ou seja, ela parte da reflexão sobre o que está acontecendo no serviço e o que precisa ser transformado. “É a educação no trabalho pelo trabalho e para o trabalho, quando se tem por finalidade, melhorar a saúde da população”⁽¹⁸⁾.

A implantação do programa de educação permanente de enfermagem para a unidade neonatal da instituição teve a finalidade de contribuir para o processo educacional dos profissionais de enfermagem da unidade, promovendo a melhoria contínua do processo de trabalho na prestação da assistência à criança e à família. Assim, a Educação Permanente, além de propiciar a atualização técnica dos profissionais de saúde, possibilita também analisar, criticamente, o processo de trabalho, identificando seus pontos de estrangulamento, elaborando estratégias adequadas para sua superação.

A capacitação em serviço é uma estratégia que viabiliza oportunidades de autoconhecimento, pela análise pessoal e reflexiva, capaz de despertar no trabalhador a preocupação e o interesse pela mudança no cotidiano da prática. Porém, para que isso ocorra o processo educacional deve ser contínuo, crítico e implicar numa práxis capaz de ultrapassar as barreiras organizacionais para atingir o íntimo de cada trabalhador, motivando-o para melhores resultados⁽¹⁰⁾.

Diante disso, a educação permanente, pautada na pedagogia dialógica, se fundamentou na maior integração interpessoal durante os encontros nos círculos de cultura, contribuindo, assim, para a melhoria das relações no cotidiano do trabalho, gerando o prazer no mesmo.

Limitações do estudo

Dentre os desafios metodológicos do estudo, destacou-se o momento institucional de obras na unidade neonatal para ampliação da planta física, o que implicou em revisão do itinerário de pesquisa e alcance dos objetivos. Além disso, houve redução da equipe de enfermagem atuante no setor de neonatologia, entretanto foi acordado no grupo discutir com a chefia do setor um cronograma de atividades para dar prosseguimento às discussões suscitadas no estudo como forma de desenvolvimento de educação permanente na unidade, após o término das obras, com os demais profissionais da equipe que estavam deslocados do setor. Assim, embora o estudo tenha sido realizado com parte dos profissionais da equipe de enfermagem da unidade, o que pode ser considerado uma limitação desta pesquisa, os resultados encontrados podem fundamentar outros estudos que ampliem as discussões sobre educação permanente de enfermagem em unidade neonatal e demais setores no contexto hospitalar.

Contribuições para a área da enfermagem

O estudo espera ensejar novas pesquisas acerca de educação permanente, visando melhoria crescente da qualidade da assistência de enfermagem a partir da compreensão do contexto que envolve a prática da equipe de enfermagem em unidade de neonatologia. O estudo proporcionou um espaço de encontro entre os profissionais de enfermagem da unidade, favorecendo a interação que pode contribuir para a melhoria das relações no cotidiano do trabalho e favorecer as atividades desenvolvidas de forma integrada, sob um olhar mais crítico e contextualizado no processo de trabalho e nas possibilidades de mudanças de forma coletiva.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo possibilitou conhecer os fatores que dificultam e facilitam o cotidiano da prática dos profissionais de enfermagem mediante identificação dos temas geradores emergentes dos Círculos de Cultura que favoreceram a reflexão crítica do grupo, fornecendo subsídios para a elaboração coletiva do programa de educação permanente em unidade neonatal.

Foram destacados nos resultados, quatro temas geradores: falta de rotinas; treinamento; melhorar a convivência da equipe e melhorar o processo de gestão. Cabe ressaltar que o estudo buscou contribuir com o serviço na organização de estratégias de efetivação da educação permanente para todo o hospital, pois a proposta apresentada poderá nortear outras iniciativas no contexto da educação permanente nas demais unidades da instituição.

Nesse sentido, destacam-se como contribuições do estudo promover momentos de reflexão do cotidiano da prática aos profissionais de enfermagem, despertando neles a necessidade de expressarem suas ideias, seus conflitos, suas culturas e seus contextos por meio do diálogo com o outro em um espaço de reflexão-ação-reflexão contínuo e dinâmico. Com isso, a realização da pesquisa em si, em suas etapas, representou uma perspectiva para desenvolvimento de um programa de educação permanente na Enfermagem.

REFERENCES

• ¹
  Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43ª ed. São Paulo: Paz e Terra; 2011.
• ²
  Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 1996 GM//MS. Política Nacional de Educação Permanente. Brasília (DF): MS; 2007.
• ³
  Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente em saúde - Pólos de educação permanente em saúde. Brasília (DF): MS ; 2004.
• ⁴
  Fonseca LMM, Leite AM, Mello DF, Silva MAI, Lima RAG, Scochi CGS. [Educational technology in health: contributions for pediatric and neonatal nursing]. Esc Anna Nery Rev Enferm [Internet]. 2011 [cited 2014 Mar 10]; 15(1):190-6. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v15n1/27.pdf Portuguese
  » http://www.scielo.br/pdf/ean/v15n1/27.pdf Portuguese
• ⁵
  Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 198 GM/ MS. Política Nacional de Educação Permanente. Brasília (DF): MS; 2004.
• ⁶
  Ceccim RB, Feuerwerker LCM. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Physis [Internet]. 2004 [cited 2014 Mar 20]; 14(1):41-65. Available from: http://hdl.handle.net/10183/27642
  » http://hdl.handle.net/10183/27642
• ⁷
  Marques PA. O processo de trabalho em uma unidade de terapia intensiva neonatal: conhecendo as redes e desatando os nós [Dissertação]. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro; 2009.165f.
• ⁸
  Freire P. Pedagogia do oprimido. 50ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2011.
• ⁹
  Heidemann IBS, Boehs AE, Wosny AMi, Stulp KP. [Theoretical, conceptual and methodological incorporation of the educator Paulo Freire in research]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2010 [cited 2014 Mar 10]; 63(3):416-20. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v63n3/a11v63n3.pdf Portuguese
  » http://www.scielo.br/pdf/reben/v63n3/a11v63n3.pdf Portuguese
• ¹⁰
  Fernandes RMC. [Continuing education in social worker labor situations]. Trab Educ Saúde [Internet]. 2012 [cited 2014 Mar 20]; 10(3):481-505. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v10n3/a08v10n3.pdf Portuguese
  » http://www.scielo.br/pdf/tes/v10n3/a08v10n3.pdf Portuguese
• ¹¹
  Delors J, (Coord.). Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. Brasília; 2010.
• ¹²
  Azevedo PCB, Azevedo PCM, Fernandes SR. Construção de site na internet sobre aperfeiçoamento permanente em enfermagem: contribuição para a educação continuada. Enferm Global [Internet]. 2010 [cited 2014 Mar 20]; 1(19):1-8. Available from: http://scielo.isciii.es/pdf/eg/n19/pt_miscelanea2.pdf
  » http://scielo.isciii.es/pdf/eg/n19/pt_miscelanea2.pdf
• ¹³
  Simões TR, Vannuchi MTO, Rossaneis MA, Silva LG, Haddad MCL, Jenal S. [Continuing education as conceived by nurses in a high-complexity philanthropic hospital]. Rev Enferm UERJ [Internet]. 2013 [cited 2014 Mar 20]; 21(5):642-7. Available from: http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/enfermagemuerj/article/view/10042/7827 Portuguese
  » http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/enfermagemuerj/article/view/10042/7827 Portuguese
• ¹⁴
  Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Política Nacional de educação Permanente em Saúde. Brasília: MS; 2009.
• ¹⁵
  Cotrim-Guimarães IMA. Programa de Educação Permanente e Continuada da Equipe de Enfermagem da Clínica Médica do Hospital Universitário Clemente de Faria: análise e proposições [Dissertação]. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca; 2009.
• ¹⁶
  Sarreta FO. Educação permanente em saúde para os trabalhadores do SUS. São Paulo: UNESP; 2009.
• ¹⁷
  Monteiro EMLM, Vieira NFC. [Health education based on culture circles]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2010 [cited 2014 Mar 20]; 63(3):397-403. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v63n3/a08v63n3.pdf
  » http://www.scielo.br/pdf/reben/v63n3/a08v63n3.pdf
• ¹⁸
  Roecker S, Budó MLD, Marcon SS. The educational work of nurses in the Family Health Strategy: difficulties and perspectives on change. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2012 [cited 2014 Mar 23]; 46(3):641-49. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n3/en_16.pdf
  » http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v46n3/en_16.pdf

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  2018

Histórico

• Recebido
  17 Dez 2016
• Aceito
  02 Nov 2017