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Cuidado de enfermagem às pessoas atendidas na emergência por tentativa de suicídio

RESUMO

Objetivo:

analisar o cuidado de enfermagem às pessoas atendidas na emergência por tentativa de suicídio na percepção da equipe de enfermagem.

Método:

estudo exploratório e descritivo, de abordagem qualitativa, desenvolvido a partir de entrevista semiestruturada com oito enfermeiros e oito técnicos de enfermagem do serviço de emergência de um hospital universitário do Sul do Brasil. A análise dos dados ocorreu por meio de análise de conteúdo.

Resultados:

emergiram três categorias: cuidados de enfermagem à pessoa que tentou suicídio; o serviço de emergência adulto como cenário de práticas em saúde mental; e necessidades relacionadas à educação permanente em saúde mental.

Considerações finais:

iniciativas potencializadoras de boas práticas de cuidados em saúde mental ainda são tímidas e carecem de incentivo no serviço de saúde. Urge pensar em mudanças na cultura da assistência do serviço de emergência, sobretudo para garantir o alcance de ações de atenção psicossocial.

Descritores:
Tentativa de Suicídio; Cuidados de Enfermagem; Emergências; Saúde Mental; Acolhimento

ABSTRACT

Objective:

to analyze the nursing care to people admitted in emergency for attempted suicide in the perception of the nursing staff.

Method:

descriptive and exploratory study, of qualitative approach, developed from semi-structured interviews with eight nurses and eight nursing technicians of the emergency service of a University Hospital in south Brazil. Data analysis was performed through content analysis.

Results:

three categories emerged: nursing care to the person who attempted suicide; the adult emergency service as a scenario of mental health practices; and permanent education-related needs in mental health

Final considerations:

initiatives capable to potentialize good practices in mental health care are still incipient and lack encouragement in the health service. There is an urgent need to think about changes in the care culture of the emergency service, especially to ensure the scope of psychosocial care actions.

Descriptors:
Attempted Suicide; Nursing Care; Emergencies; Mental Health; Patient Reception

RESUMEN

Objetivo:

analizar el cuidado de enfermería a las personas atendidas en la emergencia por intento de suicidio en la percepción del equipo de enfermería.

Método:

estudio exploratorio y descriptivo, de abordaje cualitativo, desarrollado a partir de entrevista semiestructurada con ocho enfermeros y ocho técnicos de enfermería del servicio de emergencia de un hospital universitario del sur de Brasil. El análisis de los datos ocurrió por medio de análisis de contenido.

Resultados:

surgieron tres categorías: cuidados de enfermería a la persona que intentó suicidio; el servicio de emergencia adulto como escenario de prácticas en salud mental; y necesidades relacionadas con la educación permanente en salud mental.

Consideraciones finales:

las iniciativas impulsoras de buenas prácticas de atención de salud mental todavía son tímidas y carecen de incentivo en el servicio de salud. Es urgente pensar en cambios en la cultura de la asistencia del servicio de emergencia, sobre todo para garantizar el alcance de acciones de atención psicosocial.

Descriptores:
Intento de Suicidio; Atención de Enfermería; Urgencias Médicas; Salud Mental; Acogimiento

INTRODUÇÃO

A ideação suicida é constituída em momentos ou comportamentos, geralmente iniciando com ameaça de suicídio, seguida por tentativa e, por fim, pela consumação do ato de autoextermínio. Suicídio é mais do que o desfecho de um comportamento pessoal, passando a ser um problema sociocultural e psicossocial. Devido a suas características multifacetadas, o suicídio é um evento que deve ser enfrentado por meio de iniciativas interdisciplinares e intersetoriais que englobem as áreas da saúde, iniciativas governamentais e não governamentais(11 Wallauer A, Maliska ME. Suicídio: um desafio para os profissionais da saúde. Florianópolis: Editora Pandion; 2012.).

O número de mortes por suicídio cresce a cada ano, chegando a cerca de 1 milhão. No Brasil, o suicídio encontra-se entre as dez maiores causas de morte, registrando-se no ano de 2015 mais de onze mil suicídios, o que representa, em média, trinta e uma mortes por dia, apresentando-se entre as três principais causas de morte na faixa etária entre 15 e 44 anos. Para cada uma dessas mortes, aproximadamente cinco a seis pessoas próximas são afetadas e têm alguma consequência de fundo emocional, social ou econômico(22 Botega NJ. Suicidal behavior: epidemiology. Psicol Usp[Internet]. 2014[cited 2016 May 05];25(3):231-6. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103-6564-pusp-25-03-0231.pdf
http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103...

3 Gutierrez BAO. Assistência hospitalar na tentativa de suicídio. Psicol USP[Internet]. 2014[cited 2016 May 05];25(3):262-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103-6564-pusp-25-03-0262.pdf
http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103...
-44 Brasil. Ministério da Saúde. Datasus. Sistema de Informação sobre Mortalidade-SIM[Internet]. 2015[cited 2016 May 05]. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br
http://tabnet.datasus.gov.br...
).

Na média mundial, as pessoas tentam suicídio vinte vezes mais do que de fato o consumam. Após a primeira tentativa, o risco de nova tentativa aumenta em até cem vezes e, proporcionalmente, também o número de tentativas em um intervalo de tempo(22 Botega NJ. Suicidal behavior: epidemiology. Psicol Usp[Internet]. 2014[cited 2016 May 05];25(3):231-6. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103-6564-pusp-25-03-0231.pdf
http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103...
). Com a alta incidência e reincidência de tentativas de suicídio, as equipes de saúde que prestam atendimento às urgências e emergências têm contato direto com essa população de risco, desempenhando importante papel desde o acolhimento, na intervenção e prevenção do suicídio, podendo estabelecer vínculos interpessoais com o paciente, possibilitando uma melhor aceitação e adesão ao tratamento(55 Vidal CAL, Gontijo ECDM, Lima LA. Attempted suicide: prognostic factors and estimated excess mortality. Cad Saúde Pública[Internet]. 2013[cited 2016 May 12];29(1):175-87. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v29n1/20.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v29n1/20.pd...
).

A Política Nacional de Atenção a Urgência visa garantir a universalidade, equidade e integralidade no atendimento às urgências. Destarte, o acolhimento à pessoa que tentou suicídio, bem como a suas famílias, deve se basear na integralidade das ações de cuidado, atenção e solidariedade, bem como no respeito ao exercício pleno de sua cidadania(11 Wallauer A, Maliska ME. Suicídio: um desafio para os profissionais da saúde. Florianópolis: Editora Pandion; 2012.,66 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Atenção às Urgências[Internet]. Brasília: MS; 2006[cited 2016 May 12]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_atencao_urgencias_3ed.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

O profissional de enfermagem do serviço de emergência costuma ser o primeiro contato do paciente com o sistema de saúde após uma tentativa de suicídio ou episódio de autolesão. A avaliação e gestão adequadas desses pacientes são fundamentais para prevenir futuros comportamentos suicidas. Porém, os profissionais frequentemente têm uma atitude negativa perante esses pacientes, com falta de habilidades interpessoais para atendê-los e, ainda, por avaliação inadequada. Assim, faz-se necessária a compreensão de como a equipe de enfermagem percebe o cuidado prestado às pessoas quando de tentativa de suicídio em uma emergência adulto(77 Carmona-Navarro MC, Pichardo-Martinez, MC. Attitudes of nursing professionals towards suicidal behavior: influence of emotional intelligence. Rev Latino-Am Enferm[Internet]. 2012[cited 2016 May 12];20(6):1161-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n6/19.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n6/19.p...
).

A promoção de um ambiente de cuidado que seja seguro e favorável a sua plena recuperação é condição indispensável no exercício do cuidado integral em saúde mental. O primeiro passo é a escuta qualificada, mas ela não pode estar imersa em um discurso preconceituoso repleto de julgamentos. Deve-se levar em consideração que nem sempre a pessoa está disposta a expressar ou exteriorizar o que realmente sente, surgindo assim um novo desafio para o profissional da saúde, que se constitui na observação atenta da realidade de quem é atendido e na escuta do silêncio, quando a pessoa não está disposta a falar(88 Pitta AMF, Coutinho DM, Rocha CCM. Direitos humanos nos Centros de Atenção Psicossocial do Nordeste do Brasil: um estudo avaliativo, tendo como referência o QualityRights-WHO. Saúde Debate[Internet]. 2015[cited 2016 Apr 12];39(106):760-71. Available from: http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n106/0103-1104-sdeb-39-106-00760.pdf
http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n106/01...
).

A abordagem desse tema é uma tarefa complexa, mas de suma importância, tendo em vista a necessidade de se pesquisar meios de prevenir esse ato e proporcionar às pessoas que tentam suicídio e a suas famílias uma assistência que seja digna e de qualidade. Assim, o presente estudo foi pautado a partir da seguinte pergunta de pesquisa: como ocorre o cuidado de enfermagem às pessoas atendidas na emergência por tentativa de suicídio na percepção da equipe de enfermagem?

OBJETIVO

Analisar o cuidado de enfermagem às pessoas atendidas na emergência por tentativa de suicídio na percepção da equipe de enfermagem.

MÉTODO

Aspectos éticos

Esta pesquisa segue o proposto nas diretrizes estabelecidas pela Resolução n. 466 de 2012 do Conselho Nacional de Saúde(99 Brasil. Plenário do Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 11 de janeiro de 2012 que dispõem da aprovação de diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos[Internet]. 2012[cited 2016 Apr 12]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
), com aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina e parecer emitido em 24 de agosto de 2015. Antes de iniciar o processo de coleta de dados, os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O anonimato foi garantido pela codificação alfanumérica dos entrevistados, conforme o exemplo: E1, E2… (enfermeiros), e T1, T2… (técnicos de enfermagem).

Tipo de estudo e procedimentos metodológicos

Estudo exploratório e descritivo, de abordagem qualitativa. A coleta dos dados ocorreu por meio de entrevista semiestruturada com oito enfermeiros e oito técnicos de enfermagem que atuam no serviço de emergência adulto de um Hospital Universitário (HU) do Sul do Brasil. O critério de inclusão foi integrar a equipe de enfermagem da referida unidade de emergência, já o critério de exclusão foi estar afastado ou ausente do trabalho no período de coleta de dados.

Para a seleção dos participantes foi utilizada a técnica de ‘bola de neve’ (snowball), na qual os participantes iniciais de um estudo indicam novos participantes que por sua vez indicam novos participantes e assim sucessivamente, até que seja alcançado o objetivo proposto. O ponto de saturação é atingido quando os novos entrevistados passam a repetir os conteúdos já obtidos em entrevistas anteriores, sem acrescentar novas informações relevantes à pesquisa. Portanto, a snowball é uma técnica que utiliza cadeias de referência, ou seja, uma espécie de rede em que a pesquisa culmina com as entrevistas(1010 Baldin N, Munhoz EMB. Snowball (Bola de neve): uma técnica metodológica para pesquisa em educação ambiental comunitária. Educere[Internet]. 2011[cited 2016 May 17];329-41. Available from: http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/4398_2342.pdf
http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/43...
).

Coleta e organização dos dados

As entrevistas foram realizadas individualmente no espaço físico da emergência adulto do HU, em um consultório multiprofissional, a partir do agendamento prévio com os envolvidos, utilizando um roteiro como guia orientador. Todas as falas foram gravadas por meio de gravador de voz, transcritas na íntegra para a análise dos dados e devolvidas aos participantes para validação do conteúdo após a transcrição. A coleta de dados ocorreu no período de agosto de 2015 a maio de 2016.

Análise dos dados

Os dados foram avaliados por meio de análise de conteúdo. Procedeu-se com as seguintes etapas da fase interpretativa: ordenação dos dados, em que foi feita leitura do material e organização dos relatos na ordem em que foram obtidos; e classificação dos dados, incluindo: categorização inicial, na qual foi possível apreender as ideias centrais das entrevistas, reordenação dos dados empíricos de acordo com características que possuam relação entre si e análise final, na qual os dados foram articulados com a sustentação teórica e com a resposta da questão de pesquisa com base nos objetivos propostos(1111 Minayo MCS, (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.).

RESULTADOS

Ao verificar o perfil dos entrevistados, constatou-se que as idades variaram entre 23 e 36 anos, sendo seis do sexo feminino e dois do sexo masculino. O tempo de atuação no serviço de emergência geral era de dois a nove anos. Dentre os oito enfermeiros respondentes, quatro tinham curso de mestrado concluído ou em andamento, e um tinha curso de doutorado concluído. Já dentre os oito técnicos de enfermagem, quatro deles possuíam graduação concluída, sendo três em enfermagem. Por fim, todos os oito enfermeiros tinham dedicação exclusiva ao HU, ao contrário dos oito técnicos de enfermagem, que possuíam outros vínculos empregatícios.

A partir da análise dos dados, emergiram três categorias, quais sejam: cuidados de enfermagem à pessoa que tentou suicídio; o serviço de emergência adulto como cenário de práticas em saúde mental; e necessidades relacionadas à educação permanente em saúde mental.

Categoria 1: Cuidados de enfermagem à pessoa que tentou suicídio

Com relação ao cuidado clínico, um enfermeiro menciona que:

A gente faz a parte clínica. A parte da enfermagem psiquiátrica realmente é um pouco ignorada e acabamos não fazendo. Os cuidados que a gente tenta fazer aqui é dar apoio para a família, que muitas vezes chega bem desestruturada, pelo menos até a psicologia entrar. É uma fraqueza mesmo, pois cuidamos mais da parte orgânica do paciente. (E1)

Devido ao pouco entendimento dos aspectos subjetivos envolvidos em uma tentativa de suicídio, a reação negativa da equipe de saúde frente à pessoa suicida pode ser prejudicial na prestação do cuidado, conforme depoimentos a seguir:

Eu sinto que nós, como enfermeiros, temos um déficit para atender essas pessoas. Eu não me sinto muito preparada, sabe? E como a gente tem um profissional [psicólogo] que tem uma formação específica para isso, acaba que o enfermeiro não assume esse cuidado. Então eu vejo que praticamos um cuidado mais técnico, mais clínico. (E5)

Aqui não tem preparo, então acho que o nosso atendimento não é bom. A gente só faz ali a parte de cuidado técnico, o restante quem faz mesmo é o serviço social e o pessoal da psicologia, a enfermagem faz o mínimo. (E2)

Alguns entrevistados não visualizam o enfoque psicológico como trabalho inerente à equipe de enfermagem, pois citam que essa atividade tem sido realizada por outras profissões no setor (psicologia e medicina) e que a enfermagem aborda apenas as questões mais técnicas do cuidado ou de estabilização física do paciente em estado agudo:

Praticamos o conforto. Não abordamos o porquê ele [o paciente] fez isso, não temos essa abordagem. Isso é mais para o serviço de psicologia e da medicina, não é? A enfermagem não entra tanto nessa parte, porque nós ficamos mais nos cuidados mesmo. (TE5)

Na emergência existe uma dinâmica muito grande. Então não existe um tempo específico para que você construa um relacionamento ou uma relação com aquele paciente específico. Quando esse paciente chega a gente aborda principalmente a questão da intoxicação, então ele recebe todo o tratamento e a parte da investigação, da questão de humor, ela não é feita pelo enfermeiro aqui na emergência por conta das demandas de trabalho que a gente tem e porque a gente tem um profissional da psicologia. Então essa investigação psicológica sobre essa pessoa e o que motivou essa tentativa de suicídio ela fica mais a critério do psicólogo. (E4)

Para outros entrevistados, há uma orientação do processo de trabalho por meio da Sistematização da Assistência de Enfermagem (histórico, diagnóstico, planejamento, implementação e avaliação), e os cuidados prestados estão mais relacionados a medidas de suporte, controle hemodinâmico, neurológico, higiene e conforto, sinais vitais, segurança do paciente, vigilância e solicitação de outras áreas – como o Centro de Informações Toxicológicas (CIT) e a psicologia/psiquiatria –, conforme mencionam dois participantes:

A gente geralmente verifica os sinais vitais, o nível de consciência, controle de diurese, uma certa vigilância a gente acaba exercendo… Mantemos a grade elevada para que ele não caia. E os procedimentos vão surgindo conforme a medicina vai solicitando. (TE2)

Geralmente chega desacordado, a gente coloca na maca, monitora, verifica sinais vitais, pergunta para quem trouxe se foi feito alguma lavagem, o que tomou, quanto que tomou. A gente chama o CIT, que vem fazer a avaliação, e geralmente são eles que prescrevem o que vai ser feito dependendo das drogas que tomou. O cuidado de enfermagem é isso… Fazer uma avaliação neurológica bem-feita, fazer um exame físico adequado, fazer um controle de hemodinâmica para ver se o paciente não está fazendo uma lesão renal. Quando tem psicólogo, a gente também já chama. Coletamos exames, medicamos se precisar, puncionamos um acesso caso fique muito agitado. E vamos avaliando o nível de consciência até a hora que melhorar bem. (E2)

Outros procedimentos informados pelos entrevistados são: classificação de risco, punção calibrosa, elevação das grades, sondagens, controle de diurese, coleta de amostras biológicas, monitorização cardíaca, verificação de sinais vitais (PA, FC, FR, SpO2, T), lavagem gástrica quando necessário, testes neurológicos, se possível a solicitação de um acompanhante por tempo integral (vigilância), contenção física quando necessário, administração de medicamentos, cuidados de higiene e encaminhamentos para exames.

Categoria 2: O serviço de emergência adulto como cenário de práticas em saúde mental

A equipe de enfermagem aponta que é preciso melhorar a abordagem à pessoa que tenta suicídio, de modo a extrapolar o cuidado essencialmente técnico, porém apontaram a fragilidade em relação ao ambiente, que de acordo com eles não é apropriado para receber um paciente com essa demanda:

O ambiente às vezes é tumultuado, então a gente deixa de prestar uma escuta melhor, um acolhimento melhor, tanto pra ele quanto para a família, em virtude das outras demandas que a gente tem. Então acho que se tivesse uma estrutura melhor esse paciente não teria como às vezes se evadir, como acontece, e a gente conseguiria monitorar melhor, ficar mais vigilante com certas questões… e aqui não tem como. (E6)

Na emergência a gente vê aquelas coisas de manter o ambiente tranquilo, seguro, um espaço adequado. Só que a gente sabe que na emergência isso não é tão viável assim, a gente não dispõe de um espaço físico compatível para essas orientações. (TE2)

A sobrecarga de trabalho é relatada como um dificultador na prestação de cuidados em saúde mental, como no relato que segue:

Em primeiro lugar a gente não consegue fazer abordagem porque não tem preparação psicológica para isso. A gente tenta [prestar um cuidado em saúde mental adequado] mas é tudo muito rápido, é sempre tudo com muita pressa, a gente é sobrecarregada já com outras coisas técnicas e não consegue focar nessa parte…. Porque é um enfermeiro para trinta, às vezes tem trinta pacientes ali e tu tens que saber o que eles são e o que estão fazendo. Tem dias que a gente não consegue nem fazer um histórico decente. (E2)

Também apontam déficits relacionados ao cuidado integral, justificado na rotina estabelecida em serviços de emergência. Nos depoimentos a seguir, os participantes referem algumas das dificuldades vividas pelos trabalhadores de enfermagem ao prestar o cuidado de enfermagem a pessoas em sofrimento psíquico:

Aqui na emergência a gente não consegue fazer um acompanhamento, eu penso que o cuidado integral não é feito. Temos um cuidado mais fragmentado, porque é mais imediatista, a gente faz o que precisa ser feito naquele momento. Depois a psicologia geralmente assume essa questão de ver os cuidados em saúde mental e fazer um encaminhamento para esse paciente. (E5)

O enfermeiro até consegue conversar um pouco, mas é muita gente aqui, é muito fluxo. Então acredito que a atenção não seja completa, plena, acaba sempre deixando para o psicólogo ou assistente social. Eu tento sempre, quando eu passo as visitas, conversar um pouquinho com esse paciente, mas é complicado devido à demanda e a todo mundo te chamando. (E3)

Às vezes, não conseguir realizar o cuidado de enfermagem do modo como gostariam e desenvolver o trabalho promovendo a integralidade também pode ser motivo de sofrimento aos próprios profissionais de saúde, que percebem suas limitações e que não possuem governabilidade sobre elas, conforme depoimentos a seguir:

Aqui a gente tem uma demanda muito grande e poucos funcionários. Se a gente tivesse mais funcionários, pode ser que o atendimento a esse tipo de paciente fosse melhor. É tão corrido, às vezes a gente não consegue parar para ouvir a pessoa. (TE3)

Eu faço meu cuidado baseado em conhecimento científico, mas, às vezes, mesmo sabendo que é mais adequado eu não faço aquilo que é o mais adequado, não porque eu não saiba o que tem que fazer, mas porque a dinâmica de trabalho não me permite, e o processo de trabalho me impossibilita. (E7)

A gente deveria ter um ambiente melhor para esse paciente. Às vezes é um paciente com ideação suicida, que ainda tem ideação e fica em uma maca no meio do corredor, na frente de todo mundo. Ou às vezes é um paciente que precisa ficar mais reservado e fica no corredor. Penso que essa questão ambiental influencia muito para o paciente. (E8)

O serviço mencionado não dispõe de profissionais da psicologia e psiquiatria todos os dias da semana, em todos os turnos. Nos relatos que seguem, os participantes mencionam a importância de a equipe de enfermagem abordar o cuidado em saúde mental na ausência dos demais profissionais, mas identificam a equipe multiprofissional (psicólogo/assistente social) como necessária para que esse cuidado ocorra. Destaca-se ainda a percepção de uma relação de separação de funções estabelecida entre os diferentes profissionais.

Com certeza se a gente pudesse abordar [cuidado em saúde mental] seria ótimo, porque nem sempre a gente tem psicólogo. Final de semana não tem, e acontece muito, e aí a gente passa para o serviço social, que também já consegue ter uma outra visão. Eu estou aqui para isso e vou fazer o melhor que eu puder. Mas a hora que eu posso delegar essa atividade para o psicólogo, eu passo para frente. Então a gente tenta fugir um pouco daquilo que não é o perfil da gente, entende? (E2)

A gente faz a nossa abordagem, não faz a abordagem no paciente. A medicina faz a abordagem dela e então passa para a psicologia. A gente acaba ficando só com os cuidados de enfermagem e sabendo mais ou menos o que aconteceu. (TE5)

Categoria 3: necessidades relacionadas à educação permanente em saúde mental

Os entrevistados também apontam a necessidade de uma preparação melhor para o cuidado em saúde mental, seja na instituição de ensino, seja por meio de educação em serviço. Ressaltam em suas entrevistas a importância de capacitações para abordar as questões relacionadas aos cuidados às pessoas no campo da saúde mental, como apresentado nos relatos:

Deveria ter mais capacitação. Talvez um trabalho mais junto da psicologia. Trazer para o pessoal quais são os tipos de intoxicação, quais são os tipos de urgência que tem aqui. E não só a parte clínica do que acontece com o paciente, também a parte de atendimento, a parte psicológica, a parte do “depois” ou até mesmo a parte administrativa. Várias faces de um atendimento! Trazer a equipe para formar, de fato, uma equipe! Mais treinada, mais coesa. Eu acho que talvez essa parte de capacitação iria ajudar. (TE1)

Está bem longe do que deveria ser o adequado pela falta de preparo dos profissionais. Na graduação a questão da saúde mental precisa ser melhor trabalhada. Eu fiz graduação e não tivemos estágio nem em CAPS [Centro de Atenção Psicossocial] ou [hospital psiquiátrico]. Foi só em unidade básica de saúde, que a demanda é diferente, e a gente não chega a atender um paciente em crise. (TE4)

Aqui existe uma demanda real e até mesmo expressiva. Precisam ser capacitados os profissionais para fazer esse atendimento. E é uma coisa que a gente não vê, eu estou aqui há 6 anos e nunca vi abrir nenhuma capacitação com essa demanda de saúde mental, com foco em emergência. É uma coisa que realmente não tem. (TE4)

Após apontar as fragilidades do cuidado desenvolvido na unidade, alguns entrevistados idealizaram situações que deveriam ocorrer, desejos que gostariam que fossem concretizados e enfrentamentos cotidianos para a mudança dessa situação:

O sistema de saúde hoje trabalha em uma lógica que não funciona, que é fragmentada, onde os pontos de atenção da rede não se comunicam. Então ninguém assume essa pessoa [que tentou suicídio], ela fica solta nesse sistema, porque o ideal seria que esse paciente saísse daqui tendo uma referência, não só um papel que dissesse “agora você vai para o CAPS” ou “agora você vai para a atenção básica”. (E5)

Entretanto, alguns profissionais entrevistados acreditam que uma emergência de um hospital geral não é o local adequado para receber e tratar o paciente de saúde mental e que, sempre que possível e dependendo do grau de gravidade, ele deve ser transferido para o hospital psiquiátrico ou para outro atendimento especializado na área, refutando os pressupostos da Reforma Psiquiátrica, como apresentado nos relatos que seguem:

Os pacientes em surto são encaminhados para o [hospital psiquiátrico]. Tem que ser, não tem como. Lá eles ficam internados, chegam a ficar três, quatro dias internados sem receber visitas, sem nada. Assim que tem que ser. Então falta muita informação da família, porque a família não tem nem que trazer para cá, que é um hospital geral. Não sei, acham que o HU é tudo, que o HU tem tudo, mas o HU não tem tudo! Eles deveriam saber: ‘olha, vai lá no [hospital psiquiátrico], lá é porta aberta, tem emergência lá’. As pessoas não sabem, são mal informadas. (E2)

Teve essa reforma [Reforma Psiquiátrica] já faz alguns anos, e fecharam vários manicômios. Eu não sei até que ponto isso foi interessante. Foi bom porque as pessoas não ficam mais confinadas, mas não tem uma referência para onde ela vai, essa referência está perdida. Aqui a gente só tem o [hospital psiquiátrico]. Acredito que o ideal seria que tivesse um local exclusivo para esses pacientes irem, que atenda paciente psiquiátrico, 24 horas, com equipe preparada. O CAPS tem equipe, uma equipe para acolher, para acolher a família, com preparo. (E2)

A grande falha no serviço, no sistema, aqui dentro principalmente, é a forma de ser internado: o paciente [psiquiátrico] com essa condição na mesma situação de um paciente que de repente quebrou um braço, e são coisas completamente diferentes. (E4)

É um paciente que, se tivesse uma emergência psiquiátrica, a gente poderia atendê-lo melhor. Visto as outras demandas que a gente tem, nem sempre consegue dar esse aporte psicológico da maneira ideal, ter tempo para parar, conversar, acolher. É um paciente que demanda muitos cuidados, principalmente vigilância e orientação da família. (E6)

DISCUSSÃO

O cuidado de enfermagem prestado às pessoas atendidas na emergência por tentativa de suicídio tem sido apresentado com enfoque mais biológico, no qual se dissocia a parte física da parte psicológica. Os profissionais da equipe de enfermagem compreendem que essa dissociação é uma limitação no cuidado, mas que algumas circunstâncias inerentes ao decorrer da jornada de trabalho não permitem a efetivação de um cuidado humanizado e integral.

Os enfrentamentos diários apontados tanto justificam essa prática de cuidado biologicista quanto dificultam sua superação: a sobrecarga de trabalho, a dinâmica e rotatividade da unidade, o despreparo como resultado de uma formação deficiente em saúde mental, a falta de apoio institucional tanto no âmbito de capacitações quanto no de educação permanente, o modelo biomédico hegemônico na instituição, a natureza do serviço de emergência com estrutura física limitada e organizada para ofertar um atendimento focado na estabilização (biológica) de pacientes.

No entanto, os entrevistados mencionam que buscam realizar o melhor cuidado com base na Política de Atenção às Urgências, que objetiva o acolhimento com classificação de risco e resolutividade, articulando e integrando os equipamentos de saúde e ampliando e qualificando o acesso humanizado e integral aos usuários em situação de urgência/emergência nos serviços de saúde(66 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Atenção às Urgências[Internet]. Brasília: MS; 2006[cited 2016 May 12]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_atencao_urgencias_3ed.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Para que o cuidado supere o enfoque técnico, são necessários também o cuidado psicológico e a observação contínua de pacientes e familiares, com a intenção de priorizar a comunicação em acordo à escuta qualificada, por tratar-se muitas vezes de pacientes inseguros. É importante frisar que todas as pessoas que tentaram suicídio devem receber atenção profissional devido à fragilidade emocional em que se encontram. A equipe de emergência tem como competência salvar vidas, devendo levar em consideração não somente o aspecto físico como também os aspectos psicológicos envolvidos no processo de cuidar(1212 Sá ACA, Medeiros MFN, Diniz ERS, Silva MLN, Medeiros SS. Percepções dos profissionais de enfermagem acerca do cuidar do paciente suicida. FIEP Bull[Internet]. 2012[cited 2016 Apr 12];82(2). Available from: http://www.fiepbulletin.net/index.php/fiepbulletin/article/view/2408/4503
http://www.fiepbulletin.net/index.php/fi...
-1313 Bird T. Suicide prevention in the non-psychiatric hospital setting: a nurse education process[Tese]. Boise City (Idaho): Boise State University; 2017[cited 2017 Jul 04]. 78p. Available from: http://scholarworks.boisestate.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1012&context=dnp
http://scholarworks.boisestate.edu/cgi/v...
).

Porém, conforme observado nos resultados, a prática diária do atendimento prestado às pessoas que tentam suicídio nas unidades de urgência, na maioria das vezes, é tumultuada e demanda grande atenção de toda equipe de saúde. Os profissionais que ali se encontram direcionam sua atenção primária aos cuidados de suporte vital, protelando o atendimento psicológico a esse paciente, bem como à família do indivíduo que tentou suicídio(1414 Buriola AA, Arnauts I, Decesaro MN, Oliveira MLF, Marcon SS. Nursing assistance to a family of a member who attempted suicide. Esc Anna Nery Rev Enferm[Internet]. 2011[cited 2016 May 12];15(4):710-6. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v15n4/a08v15n4.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ean/v15n4/a08v1...
).

Tal ideia de fragmentação da atenção nos serviços de emergência em detrimento da atenção integral à saúde precisa ser abandonada. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define saúde como sendo um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e que não consiste apenas na ausência de doenças(1515 World Health Organization-WHO. Constitution of the World Health Organization. Basic Documents. 1946. Genebra: WHO.). Desse modo, o conceito de saúde busca entender o ser humano como um ser biopsicossocial, ou seja, biológico, social e psicológico, devendo então ser acolhido levando em conta esses aspectos.

O cuidado em saúde mental envolve questões pessoais, sociais, emocionais e financeiras, relacionadas ao adoecimento mental. Tal cuidado envolve uma demanda de atenção que nem sempre é efetivada, devido a inúmeras dificuldades vivenciadas tanto pelos pacientes quanto pelos profissionais e pela sociedade. Dentre elas, apontam-se a escassez de recursos, a inadequação da assistência profissional, a estigmatização, a violação de direitos dos doentes, entre outros fatores(1616 Cardoso L, Galera SAF. Mental health care today. Rev Esc Enferm USP[Internet]. 2011[cited 2016 Apr 12];45(3):687-91. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n3/en_v45n3a20.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n3/en...
).

O atendimento humanizado ao paciente é aquele em que há a permeabilidade do técnico e do não técnico. Para que seja possível uma sabedoria prática, é necessária a abertura de interesse em escutar o outro e em encontrar-se com o outro. Na maioria das vezes, a primeira dificuldade encontrada no pronto-socorro de um hospital é a insensibilidade da equipe de saúde quanto aos aspectos emocionais do paciente que tentou suicídio(11 Wallauer A, Maliska ME. Suicídio: um desafio para os profissionais da saúde. Florianópolis: Editora Pandion; 2012.).

Assim, existem alguns comportamentos indispensáveis de que a enfermagem pode se apropriar ao atender a pessoa que tentou suicídio ou que possui ideação suicida, a saber: ouvir atentamente, ser empático, passar mensagens não verbais de aceitação, expressar respeito pela opinião do outro, conversar honestamente, mostrar preocupação e focar nos sentimentos da pessoa. A simples interação com o paciente tem um grande potencial para acalmar, prevenir ou minimizar a agressão e a intensidade dos sintomas. Ainda, a equipe deve tentar estabelecer um vínculo de confiança desde o começo, enquanto, por outro lado, a ideia de que o paciente tentou suicídio para manipular os outros deve ser abandonada(1717 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Prevenção do Suicídio: manual dirigido a profissionais das equipes de saúde mental[Internet]. 2006[cited 2016 Apr 12]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_editoracao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
-1818 Haris B, Beurmann R, Fagien S, Shatell MM. Patients’ experiences of psychiatric care in emergency departments: a secondary analysis. Int Emerg Nurs[Internet]. 2016[cited 2017 Jul 04];26:14-9. Available from: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1755599X15000932
http://www.sciencedirect.com/science/art...
).

A realidade da emergência hospitalar, por vezes caótica, pode ser um obstáculo na humanização do atendimento à pessoa em sofrimento psíquico. A equipe de saúde, em sua formação acadêmica, aprende a cuidar do corpo orgânico com menos ênfase nas questões emocionais e comportamentais de saúde mental, o que se reflete em sua atuação no campo de trabalho, em que a equipe cuida do corpo físico doente e, muitas vezes, não observa os aspectos emocionais(33 Gutierrez BAO. Assistência hospitalar na tentativa de suicídio. Psicol USP[Internet]. 2014[cited 2016 May 05];25(3):262-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103-6564-pusp-25-03-0262.pdf
http://www.scielo.br/pdf/pusp/v25n3/0103...
).

As fragilidades na concepção teórica e operacional, somadas a conflitos pessoais pelos profissionais relativos ao ato suicida, desencadeiam uma trama de não envolvimento pessoal com esse paciente no decorrer do cuidado. Teoricamente os profissionais de enfermagem percebem a impossibilidade de separar o corpo nas dimensões biológica e psicológica. No entanto, o enfoque de trabalho deles é especialmente biológico com foco inicial na estabilização física do paciente, delegando o cuidado de saúde mental para outras profissões. Apesar de não negarem o cuidado em saúde mental, na prática ele não tem sido desenvolvido pela equipe de enfermagem.

Essa realidade elucida a relevância de contínua qualificação da equipe de enfermagem para o atendimento aos pacientes que tentam o suicídio. Numerosos estudos indicam que enfermeiros e outros profissionais de saúde recebem pouca ou nenhuma educação ou treinamento relacionado ao suicídio. Para que haja assistência qualificada é indispensável que os profissionais de enfermagem tenham preparo e habilidade técnica para o atendimento das emergências de pessoas que tentaram suicídio, realizando uma abordagem empática com competência em lidar com esse tipo de ocorrência. Porém, esses pacientes são submetidos à estigmatização e à falta de empatia, desencadeando uma diminuição na qualidade do atendimento. Faz-se necessária uma intensa política de educação permanente de âmbito institucional para toda a equipe de saúde(11 Wallauer A, Maliska ME. Suicídio: um desafio para os profissionais da saúde. Florianópolis: Editora Pandion; 2012.,1313 Bird T. Suicide prevention in the non-psychiatric hospital setting: a nurse education process[Tese]. Boise City (Idaho): Boise State University; 2017[cited 2017 Jul 04]. 78p. Available from: http://scholarworks.boisestate.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1012&context=dnp
http://scholarworks.boisestate.edu/cgi/v...
).

Por fim, outros estudos coadunam com os resultados ora apontados de que, no âmbito da saúde mental, as equipes de saúde costumam fazer distinção entre problemas mentais e físicos, o que leva à fragmentação da atenção à pessoa e à desvalorização das necessidades dos pacientes com problemas de saúde mental, revelando uma cultura influenciada por um imaginário manicomial(77 Carmona-Navarro MC, Pichardo-Martinez, MC. Attitudes of nursing professionals towards suicidal behavior: influence of emotional intelligence. Rev Latino-Am Enferm[Internet]. 2012[cited 2016 May 12];20(6):1161-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n6/19.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rlae/v20n6/19.p...
). A reforma psiquiátrica vem para romper com alguns paradigmas colocados pela sociedade, dentre os quais essa distinção entre a abordagem da equipe de saúde relacionada ao corpo físico e mental, bem como as estruturas de poder e dignidade que envolvem a prática de cuidado nesses espaços.

Limitações do estudo

As limitações deste estudo se relacionam ao número de profissionais envolvidos, bem como a especificidade do serviço de emergência estudado, podendo não representar a realidade mais ampla no que se refere ao cuidado prestado na tentativa de suicídio.

Contribuições para a área da enfermagem e saúde

É significativa a necessidade de abordar esse tema, haja vista que a taxa de mortalidade por suicídio aumentou expressivamente nos últimos anos, tornando-se um problema de saúde pública. Torna-se fundamental a compreensão dos fatores correlacionados aos motivos pelo qual a pessoa comete suicídio e às práticas de cuidado cientificamente desenvolvidas e, principalmente, humanizadas, tanto para o benefício dos usuários como para preservar a saúde de quem o cuida.

Espera-se que este estudo traga contribuições especialmente relacionadas ao reconhecimento do modo com que a enfermagem vem atuando no atendimento em saúde mental no âmbito da emergência hospitalar, sob seu próprio ponto de vista, quando se trata do contexto de atenção à saúde na tentativa de suicídio, levando a uma mudança na práxis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na percepção dos profissionais de enfermagem, a descrição do cuidado de enfermagem prestado à pessoa que tentou suicídio apresentou uma tendência essencialmente técnica. Os profissionais em discurso manifestam que se sentem afetados por obstáculos constantes na prestação do cuidado, como a sobrecarga de trabalho, a falta de apoio da instituição e o despreparo, reflexo de uma formação inicial e permanente deficiente em saúde mental. Ainda assim, relatam que buscam prestar o melhor atendimento possível, mesmo com as dificuldades.

As iniciativas que potencializam as boas práticas de cuidados em saúde mental nos hospitais gerais ainda são tímidas e carecem de incentivo. Na área de enfermagem, em especial, requerem uma mudança cultural e técnica para o desenvolvimento de ações de atenção psicossocial em todos os contextos de assistência.

Não obstante a importância dos resultados obtidos no presente estudo, considera-se relevante a realização de mais pesquisas nesta área de atenção à saúde que tem impactado o comportamento dos profissionais nos serviços de emergência hospitalar, bem como em outras áreas de atenção à saúde mental.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    05 Abr 2017
  • Aceito
    13 Set 2017
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