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Pesquisa qualitativa em saúde: uma abordagem reflexiva

A pesquisa qualitativa possibilita o desenvolvimento do conhecimento em Saúde, porque trabalha com fenômenos complexos, cuja totalidade, para além da profundidade, tem a dependência da intensidade. Para Minayo, o objetivo da pesquisa qualitativa é explicitar dados, indicadores, tendências verificadas e/ou construir modelos teóricos aplicáveis à prática. Portanto, a sua finalidade volta-se ao estudo da história, das representações, das relações, das crenças, das percepções e das opiniões, representando o resultado das interpretações que os sujeitos constroem a respeito da produção e reprodução de suas vidas(11 Minayo MCS. Sampling and saturation in qualitative research: consensuses and controversies. Rev Pesqui Qualit [Internet]. 2017[cited 2019 Apr 02];5(7):1-12. Available from: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=2204111
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).

As pesquisas qualitativas e quantitativas são de natureza diversa, mas complementam-se. Uma trata da magnitude dos fenômenos e a outra da sua intensidade. Uma procura o que se repete e pode ser tratada na sua homogeneidade e a outra, as singularidades e os significados(22 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo: Hucitec, 2008.). Numa abordagem reflexiva, Taquette instiga que as pesquisas qualitativas na área da Saúde desenvolvem-se, porém de forma ainda tímida frente ao seu potencial. No âmbito internacional, a pesquisa qualitativa destaca-se como produtora de conhecimentos que subsidiam a prática clínica de enfermeiros(33 Minayo MCS, Costa AP. Técnicas que fazem uso da palavra, do olhar e da empatia. Pesquisa qualitativa em ação. Portugal: Ludomedia, 2019.), por ser apropriada para a compreensão de fenômenos dentro do seu contexto de intervenção, estabelecendo ligações entre conceitos, representações, crenças e comportamentos, respeitando a intersubjetividade. Observa-se, ainda, como é contraditória a pouca produtividade de estudos utilizando a abordagem qualitativa como método.

Diante desse desafio estabelecido, ou seja, o desenvolvimento de pesquisas qualitativas capazes de situar essa natureza de pesquisa num patamar apto a convergir paralelamente às pesquisas quantitativas, ainda hegemônicas no meio da Saúde, estabelece para nós, pesquisadores, traduzir expressivamente as potencialidades da investigação qualitativa às possibilidades de maior acesso a editais de fomento à pesquisa e a um aumento da publicação em periódicos.

Nesse sentido, esta edição reúne artigos oriundos do Congresso Ibero-Americano em Pesquisa Qualitativa (CIAIQ) realizado em Fortaleza-Brasil, no ano de 2018, na procura de uma maior visibilidade à pesquisa qualitativa na área da Saúde. Apresenta estudos que abordam a percepção dos pesquisadores acerca do desenvolvimento de investigação em Saúde, na perspectiva qualitativa, recorrendo a diferentes referenciais e técnicas de abordagem e de análise, em distintos cenários de práticas. Assim, desvelam o objeto, os objetivos, os referenciais teóricos do método e as formas de aproximação com o objeto na perspectiva qualitativa.

Um livro recente aborda a análise de dados na pesquisa qualitativa em Saúde e salienta que as técnicas de análise de dados advogam que fazer ciência é trabalhar simultaneamente com teoria, método e técnicas, numa perspectiva em que esse tripé se condicione mutuamente. Ainda, alertam que o modo de fazer depende do que o objeto demanda, e a resposta ao objeto depende da assertividade das perguntas, dos instrumentos e das estratégias utilizadas na colheita dos dados/achados(44 Taquette SR. Análise de dados de pesquisa qualitativa em saúde. In: Congresso Ibero Americano de Investigação Qualitativa, 5, 2016, Porto. Porto: CIAIQ, 2016. p. 1111-20.).

Esta afirmação subjaz que a investigação qualitativa é um campo inter e transdisciplinar que atravessa as humanidades, as ciências sociais e as ciências da natureza, crentes de que o diálogo entre a teoria e a práxis, a ciência – métodos e técnicas, e o desenvolvimento humano multidimensional, exige olhares disciplinares diferentes, porque a compreensão de realidades complexas, dificilmente é apreendida a partir de um único prisma. Deixamos esta reflexão sobre o lugar e o espaço da investigação qualitativa na clínica em Enfermagem.

A divulgação da pesquisa qualitativa permeou e ainda permeia as publicações científicas na Saúde. Possivelmente, pela própria definição do “Ser Enfermeiro” ou do significado da Enfermagem e dos padrões de conhecimento necessários para uma prática clínica de qualidade e segurança, vale a pena refletir sobre a ‘ciência de Enfermagem’ e os métodos de investigação que a desenvolvem e suportam a tomada de decisão clínica dos profissionais que empoderam os cidadãos para a autonomia e responsabilização pelas transições que vivenciam e são sensíveis à intervenção de Enfermagem. Essa intervenção é complexa e está sempre em interação com uma multiplicidade de fatores difíceis de mensurar e replicar, porque a experiência humana no processo saúde-doença, bem como as necessidades, dificuldades e expetativas são individuais, com expressão sempre na primeira pessoa.

REFERENCES

  • 1
    Minayo MCS. Sampling and saturation in qualitative research: consensuses and controversies. Rev Pesqui Qualit [Internet]. 2017[cited 2019 Apr 02];5(7):1-12. Available from: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=2204111
    » https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=2204111
  • 2
    Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo: Hucitec, 2008.
  • 3
    Minayo MCS, Costa AP. Técnicas que fazem uso da palavra, do olhar e da empatia. Pesquisa qualitativa em ação. Portugal: Ludomedia, 2019.
  • 4
    Taquette SR. Análise de dados de pesquisa qualitativa em saúde. In: Congresso Ibero Americano de Investigação Qualitativa, 5, 2016, Porto. Porto: CIAIQ, 2016. p. 1111-20.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2019
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