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Modelo de cuidado aos trabalhadores da Atenção Básica: Pesquisa Convergente-Assistencial

RESUMO

Objetivo:

Verificar a aplicação do Grupo Operativo como ferramenta de cuidado aos trabalhadores da Atenção Básica em saúde, com vista à constituição de assistência à saúde mental no trabalho.

Método:

Pesquisa Convergente-Assistencial como processo de investigação e trabalhadores da área da saúde como sujeitos. A estratégia de intervenção como proposta de acolhimento do sofrimento mental do trabalhador foi o Grupo Operativo.

Resultados:

Emergiram duas categorias: "Evidências do sofrimento no trabalho" e "Aprendizagem em grupo: acolhimento do grupo pelo grupo".

Considerações finais:

O uso do Grupo Operativo demonstrou ser assertivo ao proporcionar aos sujeitos um espaço de escuta das adversidades ocorridas no ambiente laboral e aprendizagem ativa da realidade, reflexão e enfrentamento dos medos básicos, desenvolvimento de um projeto pró-mudança por meio da cooperação entre os pares e aprendizagem ativa da realidade.

Descritores:
Enfermagem; Pessoal de Saúde; Pesquisa Qualitativa; Saúde Mental; Atenção Primária à Saúde

ABSTRACT

Objective:

To verify the application of the Operative Group as a care tool for the workers of Primary Health Care, with a view to the constitution of mental health care at work.

Method:

Convergent Care Research as a research process and health workers as subjects. The intervention strategy as a proposal to accommodate the mental suffering of the worker was the Operative Group.

Results:

Two categories emerged: "Evidence of Suffering at Work" and "Group Learning: Group Reception by the Group".

Final considerations:

The use of the Operative Group has been assertive in providing the subjects with a space for listening to adversities in the work environment and active learning of reality, reflection and confrontation of basic fears, development of a pro-change project through peer and active learning of reality.

Descriptors:
Nursing; Health Personnel; Qualitative Research; Mental Health; Primary Health Care

RESUMEN

Objetivo:

Verificar la aplicación del Grupo Operativo como herramienta de cuidado a los trabajadores de la Atención Básica de Salud, con miras a la constitución de asistencia a la salud mental en el trabajo.

Método:

Investigación Convergente-Asistencial como proceso de investigación, y trabajadores del área de la salud como sujetos. La estrategia de intervención como propuesta de acogida del sufrimiento mental del trabajador fue el Grupo Operativo.

Resultados:

Se plantearon dos categorías: "Evidencias del sufrimiento en el trabajo" y "Aprendizaje en grupo: acogida del grupo por el grupo".

Consideraciones finales:

El uso del Grupo Operativo demostró ser asertivo al proporcionar a los sujetos un espacio de escucha de las adversidades ocurridas en el ambiente laboral y aprendizaje activo de la realidad, reflexión y enfrentamiento de los miedos básicos; además, el desarrollo de un proyecto pro-cambio por medio de la cooperación entre los pares y el aprendizaje activo de la realidad.

Descriptores:
Enfermería; Personal de Salud; Búsqueda Cualitativa; Salud Mental; Atención Primaria de Salud

INTRODUÇÃO

O adoecimento de profissionais atuantes no setor de Saúde está cada vez mais presente no contexto dos serviços, sobretudo os vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS), tornando-se uma das principais causas de egressão no trabalho, em decorrência de prejuízos psíquicos e físicos, interferindo na qualidade de vida do trabalhador. Ressalta-se que a ocorrência frequente de doenças ocupacionais nessa população, acomete as dimensões psicossociais de forma isolada ou em comorbidades(11 Teixeira LP, Silva TASM. [Occupational diseases in nursing - When the work is sick]. Rev Pró-UniverSUS. [Internet]. 2014 [cited 2017 Sept 13]; 05(2):19-24. Available from: http://editorauss.uss.br/index.php/RPU/article/view/516/345 Portuguese.
http://editorauss.uss.br/index.php/RPU/a...
).

Na dimensão "psíquica" tem-se a prevalência de Transtorno Mental Comum (TMC) em trabalhadores da Atenção Básica (que pode chegar a 22,9%), valores elevados quando comparados a outras categorias de trabalhadores ou população comum(22 Carvalho DBD, Araújo TMD, Bernardes KO. [Common mental disorders in primary health care workers]. Rev. bras. saúde ocup. [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25];41:e17. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbso/v41/2317-6369-rbso-41-e17.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/rbso/v41/2317-6...
). Outros achados de condições doentias entre profissionais foram a presença de depressão, estresse, síndrome de Burnout, desgaste mental, ansiedade, TMC e transtornos emotivos(33 Rodrigues EP, Rodrigues US, Oliveira LdMM, Laudano RCS, Nascimento Sobrinho CL. [Prevalence of common mental disorders in nursing workers at a hospital of Bahia]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25]; 67(2):296-301. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672014000200296&lng=em Portuguese.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
). Destaca-se a depressão altamente incapacitante para o exercício da profissão, com acentuada redução de práticas laborais. Quanto aos aspectos físicos, observam-se as queixas de algia nas pernas, nas costas, parestesias em membros inferiores, rinite, insônia, lombalgia, sonolência, varizes, infecção urinária, lesão por esforços repetitivos, hipertensão arterial sistêmica e alergias(33 Rodrigues EP, Rodrigues US, Oliveira LdMM, Laudano RCS, Nascimento Sobrinho CL. [Prevalence of common mental disorders in nursing workers at a hospital of Bahia]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25]; 67(2):296-301. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672014000200296&lng=em Portuguese.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

Como fatores desencadeantes de queixas ou do processo de adoecimento, nota-se sobrecarga do serviço, excesso de atividades com esforços contínuos, ambiente que levam ao estresse, incerteza no serviço, precárias condições de trabalho e ausência de apoio financeiro. Este último com impacto negativo nos recursos pessoais a serem aplicados na reabilitação da saúde e na melhoria de condições de vida do trabalhador(44 Mascarenhas CHM, Prado FO, Fernandes MH, Boery EM, Sena ELS. [Quality of life in workers of the health area: a systematic review]. Rev Saúde Pública Paraná [Internet]. 2013 Dez; 14(1/2):[10 p.] [cited 2017 Sep 25]. Available from: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/espacoparasaude/article/view/9974/pdf_5 Portuguese.
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php...
). Com o mesmo peso preditivo, têm-se as vivências de pressão sofrida no ambiente laboral(55 Santana LL, Sarquis LMM, Miranda FMA, Kalinke LP, Felli VEA, Mininel VA. Health indicators of workers of the hospital area. Rev Bras Enferm [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25]; 69(1):30-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n1/en_0034-7167-reben-69-01-0030.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n1/en_...
).

Desvela-se, assim, um contexto hostil; de excessivas responsabilidades; pouco tempo para planejamento; severas cobranças de resoluções; insatisfação com a profissão; desprestígio profissional; baixa remuneração; duplas jornadas diárias; dificuldades de convivência entre a equipe; alta demanda psicológica; situação temporária de emprego; ausência de autonomia diante do serviço prestado; e diminuição da produtividade(22 Carvalho DBD, Araújo TMD, Bernardes KO. [Common mental disorders in primary health care workers]. Rev. bras. saúde ocup. [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25];41:e17. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbso/v41/2317-6369-rbso-41-e17.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/rbso/v41/2317-6...
). Sobretudo, as demandas e desafios postos para os profissionais, acerca dos conceitos proposto pelo SUS(66 Doniec K, Dall'Alba R, King L. Austerity threatens universal health coverage in Brazil. Lancet [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25]; 387(1):1603-4. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27597461
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2759...
) que nem sempre têm ressonância com a formação profissional.

Torna-se de suma importância o acolhimento ao sofrimento mental de profissionais, pois é notório o estresse excessivo na equipe de saúde, a exaustão emocional e física. São diversos os fatores macrossociais que corroboram com tal situação, inerentes aos processos históricos construídos na relação da infraestrutura organizacional do SUS e da fragilidade de ações que acolham profissionais da Atenção Básica (AB). Entre esses, considera-se aqueles que emergem da interação profissional-comunidade, com elevada demanda de relações interpessoais, mobilizando mais sofrimento pelo contato direto com desigualdade social e dificuldades na busca de atenção às necessidades de saúde; outros estão no âmbito macro com a precariedade acerca do SUS, quanto a sua operacionalização fragmentada, cortes de recursos e ameaças de desmonte. No entanto, desconsidera-se o contexto macro e focaliza-se maior cobrança sobre o profissional de saúde, para que se utilize de técnicas complexas como meios de superação dos desafios propostos no cotidiano, ocasionando angústia, afastamento e se tornando submissa a profissão(77 Carvalho BG, Peduzzi M, Ayres JRCM. [Concepções e tipologia de conflitos entre trabalhadores e gerentes no contexto da atenção básica no Sistema Único de Saúde (SUS). Cad Saúde Pública [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25];30(7):1453-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v30n7/0102-311X-csp-30-7-1453.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/csp/v30n7/0102-...
).

OBJETIVO

Verificar a aplicação do Grupo Operativo como ferramenta de cuidado aos trabalhadores da Atenção Básica à Saúde, com vista à constituição de assistência à saúde mental no trabalho.

MÉTODO

Aspectos éticos

A pesquisa derivou de um projeto matriz intitulado "Análise da Atenção em Saúde Mental e constituição da rede no Sistema Único de Saúde no Sudeste Goiano", foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de Goiás, em atenção à Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 466/2012. Todos os sujeitos assinaram Termo de Consentimento Livre Esclarecido.

Tipo de estudo

Adotou-se a Pesquisa Convergente-Assistencial (PCA), considerada como pesquisa de natureza qualitativa com grande afinidade às práticas de Atenção à Saúde(88 Rocha PK, Prado MLd, Silva DMGVd. [Convergent Care Research: use in developing models of nursing care]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2012 [cited 2017 Sep 25] ;65(6):1019-25. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v65n6/a19v65n6.pdf Portuguese.
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), afinada com a pesquisa-ação em que o pesquisador tem imersão no cenário investigado e intervém para transformar a situação(99 Paim L, Trentini M, Madureira VSF, Stamm M. [Converging care research approach and its application in nursing settings]. Cogitare Enferm [Internet]. 2008 [cited 2017 Sep 25];13(3):380-6. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/12990/8775 Portuguese.
http://revistas.ufpr.br/cogitare/article...
).

Referencial teórico-metodológico

Cabe destacar utilizou nesta investigação o referencial teórico de Grupo Operativo (GO) para substituir a etapa de intervenção da realidade, considerando sua condição de mobilização interna e ressignificação das relações consigo, com o outro e com o contexto(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.), o momento de sua ocorrência foi descrito dentre as etapas da PCA nos próximos parágrafos.

Procedimentos metodológicos

O processo de investigação aborda uma dada realidade e os sujeitos envolvidos, avançando-se com uma intervenção nesse contexto, propondo-se a constituição de saberes e fazeres em Saúde, sobretudo em Enfermagem. A construção teórica de assistência à saúde é o que visa a PCA, para tanto, requer um caminho com cinco etapas bem delineadas, que se inter-relacionam e se retroalimentam, a saber: concepção, instrumentação, perscrutação, análise e interpretação(99 Paim L, Trentini M, Madureira VSF, Stamm M. [Converging care research approach and its application in nursing settings]. Cogitare Enferm [Internet]. 2008 [cited 2017 Sep 25];13(3):380-6. Available from: http://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/12990/8775 Portuguese.
http://revistas.ufpr.br/cogitare/article...
).

Cenário de estudo

O cenário do estudo compôs a fase de concepção, segundo a PCA, e desenvolveu-se a partir do projeto de pesquisa mobilizado pela relação de docentes da área de Saúde Mental de uma Universidade Federal com a gestão da Atenção Básica (AB) da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) em um Município de médio porte e de relevância econômica e social na região Central do Brasil. O problema de investigação deu-se pela necessidade de acolhimento da equipe de profissionais atuantes na AB, uma vez que a queixa da gestão era de que a equipe apresentava fragilidade das relações, conflitos e desmotivação.

A partir do problema exposto definiu-se o tema e estudou-se o que já fora publicado a respeito. Assim, prosseguiu-se para a segunda fase da PCA, a instrumentação. Por se tratar do envolvimento de um grupo de pesquisa que já atuava na região, pensou-se em um projeto ampliado com foco na Atenção à Saúde Mental, em que um dos objetivos abrangeu aspectos de saúde mental do trabalhador.

Fonte de dados

Trabalhou-se no planejamento do projeto de pesquisa com a escolha da metodologia PCA que contemplaria uma intervenção e construção de conhecimento na área de Atenção à Saúde. Definiu-se como intervenção a realização de GO para acolhimento das relações interpessoais no trabalho em saúde na AB e abordagem da tecnologia de grupos como ferramenta na gestão com pessoas. Para tanto, elegeu-se como sujeito de pesquisa profissionais de nível superior que atuassem na AB do município, independentemente do tempo ou tipo de vínculo. Foram excluídos os que estavam afastados no período de realização do GO.

Coleta e organização dos dados

Os dados foram obtidos em sincronia com a fase de instrumentação decisões metodológicas foram tomadas. A primeira foi em relação à tecnologia de realização do GO, conduzida pelo referencial teórico-metodológico de Pichon-Rivière(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.). Os grupos foram planejados com apoio da SMS, que concedeu o espaço físico e a liberação do profissional para participação no horário da atividade laboral. Os grupos foram realizados em dez encontros, durante o período de 28 de agosto a 25 de setembro do ano de 2015, com média de duração duas horas cada.

No primeiro GO, realizou-se o objetivo do contrato(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.) em que se estabeleceram as normas, horários, objetivo e operacionalização do projeto de intervenção. Para identificação da condição de saúde mental dos participantes, aplicou-se o instrumento Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) que rastreia um grupo de transtornos mentais não psicóticos, como insônia, fadiga referida, irritabilidade, esquecimento, déficit de concentração e depressão. São 20 questões com respostas sim vs. não e o escore positivo para probabilidade de TMC é de ≥ a sete respostas sim. Com validação no Brasil, divulgando na avaliação das condições mentais de trabalhadores no âmbito da AB(1111 Costa AG, Ludermir AB. [Common mental disorders and social support in a rural community in Zona da Mata, Pernambuco State, Brazil]. Cad. Saúde Pública [Internet]. 2005 [cited 2017 Sep 25]; 21(1):73-79. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n1/09.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n1/09.pd...
), como em outros setores(1212 Guirado GMP, Pereira NMP. [Use of the Self-Reporting Questionnaire (SQR-20) for determination of physical and psycho-emotional symptoms in employees of a metallurgical industry located at Vale do Paraíba - Sao Paulo state - Brazil]. Cad Saúde Coletiva [Internet].2016 [cited 2017 Sep 25];24(1):92-8. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v24n1/1414-462X-cadsc-24-1-92.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v24n1/141...
). Tais achados corroboraram na construção dos GO de intervenção.

Os demais GO seguiram a estrutura de intervenção de 30 minutos prévios, com disparador temático, mobilizador da sessão, leitura da crônica do grupo anterior, desenvolvimento da sessão e encerramento. Ressalta-se que nesta última etapa havia a construção coletiva dos pontos mais relevantes discutidos durante o desenvolvimento. Os dez GO contaram com a coordenação da pesquisadora e de dois observadores alunos de graduação, todos com experiência no referencial teórico-metodológico de GO. As observações eram realizadas em cadernos de campo e a sessão gravada em áudio. Esse material compôs informações para realização das crônicas, que são síntese do setting grupal.

Etapas do trabalho em Grupo Operativo

Esse momento correspondeu à fase de perscrutação dessa PAC. Estabeleceram-se os temas dos dez GO e das estratégias que conduziram as sessões, considerando-se os resultados do SRQ-20. Desta, emergiu o material empírico que fora analisado na sequência. Cabe ressaltar que após cada sessão, uma análise do setting grupal era realizada para a confecção da crônica, a qual auxiliava no processo de análise da fase seguinte. Igualmente orientou a elaboração dos temas disparadores dos GO subsequentes, isto é, cada sessão foi norteada por temas elaborados durante o processo de intervenção, demonstrando as características de retroalimentação, flexibilidade e de continuidade ente os encontros. No quadro 1, têm-se os temas e as estratégias de mobilização das discussões. Como identificação, utilizou-se a letra G para identificar o 'grupo' e a numeração sequenciada em algarismos arábicos para indicar o número da sessão com o título disparador do encontro.

Quadro 1
Temas disparadores aplicados no Grupos Operativos realizados com os profissionais, Região Central, Brasil

Análise e interpretação dos dados

A fase de análise e interpretação dos dados ocorreu simultaneamente à realização dos GO. Primeiro as sessões eram transcritas na íntegra, passavam pela análise de abertura do grupo, desenvolvimento do setting grupal, principais aspectos explorados e encerramento (tais observações compõem tradicionalmente uma crônica). Para o processo de pré-análise, utilizou-se a análise de conteúdo temático(1313 Bardin L. Análise de conteúdo: Edições 70; 2009.280 p.) que sumariamente consiste nas etapas de pré-análise identificada pela leitura flutuante com exploração do material e constituição do corpus da pesquisa. Prosseguiu-se com o desprendimento das Unidades de Registros (UR), seu agrupamento e formulação das hipóteses precursoras das categorias temáticas. A codificação das UR em G1, G2, G3... representando o GO, seguidas de P1, P2, P3... representando o profissional participante. Do processo de análise temática, emergiram duas categorias: "evidências do sofrimento no trabalho" e "aprendizagem em grupo: o acolhimento do grupo pelo grupo". Feita a organização do material, realizou-se as inferências e interpretações dos dados.

RESULTADOS

Os sujeitos participantes do estudo foram em sua maioria mulheres (96,2%) (SD 3,7, IC 95% 88,5-100), com média de idade de 31,65 anos (SD 35,57, IC 95% 30,31-33,00), 19 (73,1%) eram enfermeiros, 2 (7,7%) nutricionistas, 2 (7,7%) médicos, 2 (7,7%) psicólogos, 1 (3,8%) dentista. A média em meses de tempo de profissão foi de 87,48 (SD 50,96, IC 95% 69,56-108,59). A prevalência de probabilidade de TMC foi de 42,3% (IC 95% 23,1-61,5).

Categorias

A primeira categoria temática: "evidências do sofrimento no trabalho", foi percebida ao longo dos dez GO que reforçaram a necessidade de acolhimento das adversidades do cotidiano do trabalho na AB e que podem justificar em parte o sofrimento mental de cada trabalhador, em especial para o grupo pesquisado. Esse agrupamento de UR emergiu do processo de análise que identificou aspectos do sofrimento nas relações com a gestão e a política administrativa local, e de demandas frustradas no cotidiano do trabalho.

Eu acho que não é um problema só nosso, ...a nossa saúde é muito prejudicada por política, isso atrapalha o bom desenvolvimento de si, ...eu acho que o SUS é um modelo exemplar de saúde, se ele funcionasse , se fosse valorizado no Brasil, ...aí quem leva na tarraqueta , é só o paciente e nós... (G5:P1)

Quando você está agindo bem, ninguém reconhece, ninguém vem elogiar, só para chamar atenção, reclamam de você, ... reconhecimento nunca, mais crítica sempre, nós reconhecemos, sabemos quando agimos certo, só que queremos que o outro também veja isso. (G4/P8)

Comparo a Enfermagem a uma vaca, dá o leite, a carne, e quando não presta mais, vai lá e a abate e, ainda te come né! Eu me sinto como uma vaca mais, fazendo o que mandam fazer, acomodada, comendo, engordando. (G9:P1)

Muitas vezes, o paciente chega com o pedido de mamografia e, já voltou muitas vezes e não tem como, não tem vaga, o problema não é dele, é também meu, é tudo em cima da equipe de enfermagem. Outro exemplo: o vidro está quebrado há 30 dias, e quando o ladrão entra, sou eu que tenho que ficar fazendo boletim de ocorrência, isso me angustia. O que mais me angustia é que o meu serviço não me traz um pingo de prazer, eu vou amarrada, eu vou porque tem que ir, eu não tenho prazer de trabalhar, como eu já tive, em outras situações, que hoje não são o que eu estou vivenciando. (G9:P7)

Manda fazer uma escala, ai vai te corta, pra uma campanha de vacina, ai eu liguei para minhas agentes e, elas foram trabalhar pra mim, porque senão eu teria trabalhado igual uma burra de carga. (G4:P5)

Primeiro, acho que não pode ter telhado de vidro, que se um chega atrasado, e eu chego também, o que eu vou falar pra ele? Eu posso e ele não? Nós dois temos que fazer oito horas. Estão jogando na unidade, pessoas que não sabem mexer em nada, que não são preparadas, eles são cargos comissionados, os padrinhos deles são os prefeitos, ... (G5:P4)

Eu fiquei doente e pedi pra sai, por causa de cargo comissionado, uma reunião que eu tive, todo mundo pedindo pra eu ficar... por isso eu falo isso é hierarquia de poder, e eu estou hoje desencantada com a Enfermagem, você tem vínculo com a comunidade, e não adianta, eu também sou concursada, ai eu pedi outro tipo de serviço, não deixaram, hierarquia de poder você não tem opinião. (G5:P6)

É típico da gestão do município, um atrapalhando o outro, ao invés de um ajudar o outro pela cidade, mas não , um atrapalhando o outro. (G6:P11)

É complicado mesmo, porque tem sempre essa coisa debatendo no interior de nós mesmos, pois recém - formado é mais difícil, fica aquela dúvida , é responsabilidade. (G3: P8)

Peguei minha licença Premium, e depois fiquei cinco anos jogada, eu peguei uma antipatia da Enfermagem, eu adorava acordar cedo para trabalhar, até que me deixaram em outra unidade básica, por três meses, mas meu Deus ... um dia eu vi uma menina estagiando e falei: você é fraca da cabeça fazer um curso desse, vou te contar minha vida, sentei com ela e contei, e falei você quer isso pra você? Troca de curso. (G5:P5)

... como profissional da saúde, sua casa pode estar de avesso que você tem que estar bem, nossa missão é bem difícil, tem que tentar ajudar o outro, entender, às vezes fazemos um pré-julgamento. A questão da casa que eu fiz, eu estava vendo ontem na televisão, o menino da Síria, eu construí um lar, uma família aqui dentro, tá um tempo complicado, que nós que estamos na saúde não tentarmos ajudar o próximo, quem vai ajudar? Eu estou começando agora, mas é um trabalho difícil realmente. (G4:P10)

... a pressão do dia a dia é muito grande, mas não sei onde vamos parar, nós trabalhamos no SUS, a maioria da população depende do SUS, e qual será o futuro da saúde pública? O sistema de saúde não tem investimento adequado, não tem concursos para efetivar os trabalhadores. O será de nós sem a atenção à saúde, estão acabando com o SUS, e digo nós, trabalhadores e população. (G5:P6)

É desesperador ver o SUS ser minado em recursos e em pessoas ... (G5:P7)

A segunda categoria "Aprendizagem em grupo: o acolhimento do grupo pelo grupo", foi constituída pelas expressões de saltos qualitativos pelos integrantes do grupo, promovido por elaboração de algumas dificuldades de conflitos, reflexões sobre a prática em saúde e o próprio comportamento do contexto grupal. As UR que configuram essa categoria são as seguintes:

Ninguém quer falar, então eu vou falar, ninguém estava querendo contar uma história, a sua história, expor algo de sua vida pessoal, outras pessoas tiveram que forçar o colega a fazer, e depois que começou por livre espontânea pressão , ai todo mundo foi interagindo, eu estou sentindo receio no grupo, que o pessoal tá com medo de falar, do que vai falar, falar o que não deveria, ou então , falar alguma verdade para alguém , ou então tá querendo se fechar mesmo. (G7: P3)

A minha expectativa é lembrar sempre o que eu formei pra ser, eu formei pra eu ser diferente, e fazer a diferença, e eu não estou fazendo, depois desse grupo eu pretendo voltar a ser o que eu formei pra ser. (G8:P2)

Eu também achei muito bom porque eu vi que não sou a pior pessoa do mundo, que não sofro sozinha, ... fiquei mais próximas de pessoas que não tinha muito proximidade e eu vou sentir muita falta, porque eu conto nos dedos os dias de sexta para chegar nas reuniões. (G10:P9)

Eu também vou sentir muito falta, me dá muita vontade de chorar. Vou sentir falta do aprendizado, pois nos aproximou, assim antes de falar que eu não conheço ninguém, eu conheço todo mundo eu estou aqui por todo mundo, só eu de nutricionista eu achei bom todo mundo trabalhando em equipe e, sentirei falta. (G10: P10)

Quando vocês propuseram o grupo, eu pensei, o que vamos fazer? Mas agora, depois eu quero agradecer todos vocês por colaborarem na minha vida e na dos meus colegas... (G10: P7)

Nos sentimos muito abandonadas nesse último tempo, não tem encontro, não tem união, não tem nada e, assim da parte de vocês da universidade, você quer mesmo que seja um trabalho diferente, só de vocês ouvirem as nossas dificuldades, todo mundo reclama, mas vocês não, vocês nos ouvem, estávamos nos sentindo abandonados, ... uma forma de amenizar um pouco o abandono, todos estamos carentes aqui. (G10: P5)

Eu peguei o jornal de política, e comecei a pensar em coisas ruins, foi bem fácil rasgar [referindo-se a atividade do grupo], pensei nos problemas, questão nacional, violência, saúde, a gente vem observando na insatisfação, frustração, em questão da profissão, reconhecimento, mas como profissional da saúde temos que nos reorganizar. (G4:P10)

Ainda mais na profissão que escolhemos que é lidar com pessoal, acabamos levamos isso, mesmo mantendo distante, traz coisas boas, e coisas ruins, dias saímos carregados, pesados, e tem dias que trazemos coisas boas, felizes. Acabamos refletindo o que somos na vida, no meio sou eu, e por fora um pouco de cada um. (G3:P1)

Eu tenho até que pedir desculpa pois acho que reclamei demais, infelizmente, tudo que aconteceu comigo foi próprio do grupo, quando eu quis desabafar vocês sempre me escutaram. Eu já até comecei a fazer com as minhas amigas na reunião de segunda feira como estamos fazendo aqui hoje, estou muito desmotivada não quero falar pois só reclamo. Os grupos que eu coordeno melhoraram muito, mas nunca tinha feito como aqui, segunda feira já fiz... eu só não tenho o observador, tenho que arrumar o observador, mas pra mim foi muito bom, enriquecedor, muito obrigada a você e desculpa qualquer coisa e desculpa pelo desabafo. (G2:P6)

DISCUSSÃO

Em relação à prevalência de possibilidade de TMC encontrada nesta investigação, foi mais elevada do que as relatadas por estudos com a população geral atendida em AB (de 31,47% a 41,6 %)(1111 Costa AG, Ludermir AB. [Common mental disorders and social support in a rural community in Zona da Mata, Pernambuco State, Brazil]. Cad. Saúde Pública [Internet]. 2005 [cited 2017 Sep 25]; 21(1):73-79. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n1/09.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n1/09.pd...
,1414 Lucchese R, Vera I, Benício PR, Silva AdFd, Munari DB, Fortuna CM. Use of the operative group in health care: an integrative review. Cogitare Enferm [Internet] 2014 Out-Dez [cited 2017 Sep 25];19(4):762-71. Available from: http://www.revenf.bvs.br/pdf/ce/v19n4/en_24.pdf
http://www.revenf.bvs.br/pdf/ce/v19n4/en...
-1515 Borges TL, Hegadoren KM, Miasso AI. Transtornos mentais comuns e uso de psicofármacos em mulheres atendidas em unidades básicas de saúde em um centro urbano brasileiro. Rev Panam Salud Publica [Internet]. 2015 [cited 2017 July 27]; 38(3):195-201. Available from: https://www.scielosp.org/pdf/rpsp/2015.v38n3/195-201/pt
https://www.scielosp.org/pdf/rpsp/2015.v...
). Um estudo realizado com profissionais de enfermagem em um hospital identificou a probabilidade de TMC de 35,0%(33 Rodrigues EP, Rodrigues US, Oliveira LdMM, Laudano RCS, Nascimento Sobrinho CL. [Prevalence of common mental disorders in nursing workers at a hospital of Bahia]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25]; 67(2):296-301. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672014000200296&lng=em Portuguese.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
), o que aponta que a possibilidade de TMC entre trabalhadores em saúde e uma realidade a ser enfrentada, seja qual for a complexidade de atenção, considerava-se a vulnerabilidade ao adoecimento por depressão, ansiedade e transtornos somatotrópicos(33 Rodrigues EP, Rodrigues US, Oliveira LdMM, Laudano RCS, Nascimento Sobrinho CL. [Prevalence of common mental disorders in nursing workers at a hospital of Bahia]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25]; 67(2):296-301. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672014000200296&lng=em Portuguese.
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,1111 Costa AG, Ludermir AB. [Common mental disorders and social support in a rural community in Zona da Mata, Pernambuco State, Brazil]. Cad. Saúde Pública [Internet]. 2005 [cited 2017 Sep 25]; 21(1):73-79. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n1/09.pdf Portuguese.
http://www.scielo.br/pdf/csp/v21n1/09.pd...
). Lembrando que o TMC demonstrou-se forte preditor para outras patologias específicas da ocupação laboral, como a Síndrome de Burnout(1616 Silveira SLM, Câmara SG, Amazarray MR. [Burnout predictors in health professionals of primary care of Porto Alegre/RS, Brazil]. Cad Saúde Coletiva. [Internet]. 2014 [cited 2017 July 27];22(4):386-92. Available from: http://www.scielo.br/pdf/cadsc/v22n4/1414-462X-cadsc-22-04-00386.pdf Portuguese.
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).

As causas do adoecimento no trabalho podem ser múltiplas e, sem a pretensão em esgotar o assunto, destacam-se algumas condições que poderiam ter corroborado com esta situação, por meio do que revelaram os sujeitos da pesquisa. A insatisfação foi fortemente relatada e, a exemplo de outro estudo, a ausência de reconhecimento mobilizou sentimentos de sofrimento, reforçando negativamente as ações exercidas no dia a dia. O aumento da frustração conduz um fazer em saúde penoso, cansativo e desagradável, desgastando as relações consigo e com o outro(1717 Dalri RCM, Silva LA, Mendes AMOC, Robazzi MLCC. Carga horária de trabalho dos enfermeiros e sua relação com as reações fisiológicas do estresse. Rev Lat Am Enfermagem [Internet].2014; 22(6):959-965. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v22n6/pt_0104-1169-rlae-22-06-00959.pdf
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).

A grande prevalência de insatisfação no trabalho na área da Saúde ocorre pelo reflexo da dificuldade de convivência em equipe, grandes demandas de fazeres, baixa remuneração, ausência de reconhecimento profissional, precariedade de materiais para exercer o trabalho, padrões de serviço fora da realidade do mesmo, falta de estímulos, ausência de interação com outros serviços, desinteresse de colegas, má administração entre outros(1717 Dalri RCM, Silva LA, Mendes AMOC, Robazzi MLCC. Carga horária de trabalho dos enfermeiros e sua relação com as reações fisiológicas do estresse. Rev Lat Am Enfermagem [Internet].2014; 22(6):959-965. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v22n6/pt_0104-1169-rlae-22-06-00959.pdf
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). Os resultados provenientes do trabalho pouco são determinados por aquele que o executa, sendo muito mais condicionado por demandas externas, o que o faz uma atividade que nem sempre promove a realização e satisfação pessoal e social(1818 Fabris F. A noção de tarefa, pré-tarefa e trabalho na teoria de E. Pichon-Rivière. Cad Psicol Soc Trab [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25];17:111-7. Available from: https://revistas.usp.br/cpst/article/view/80639/84290 Portuguese
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).

Aspectos da gestão também foram abordados, como a convivência com os cargos comissionados e gestores que não estão qualificados para exercer a função para qual são nomeados, devido às influências políticas e cargos apadrinhados, sem nenhum preparo ou habilidades técnicas, o que dificulta o trabalho e deixam os profissionais insatisfeitos e indignados, refletindo no desprazer no ambiente laboral, perda do sentido e resolução das ações em saúde(1919 Trindade LL, Pires DEP. Implicações dos modelos assistenciais da atenção básica nas cargas de trabalho dos profissionais de saúde. Texto Contexto Enferm [Internet].2013 [cited 2017 Sep 25];22(1):36-42. Available from: http://www.redalyc.org/pdf/714/71425827010.pdf
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). As dissonâncias entre as ideias do sistema de saúde com a realidade do dia a dia na AB se refletem na desmotivação, e também são relacionadas às taxas de rotatividade e conflitos com a chefia. Cria-se, então, um ambiente de trabalho de insegurança sobre que é realizado, com a sensação de perda de controle das atividades que realizam(22 Carvalho DBD, Araújo TMD, Bernardes KO. [Common mental disorders in primary health care workers]. Rev. bras. saúde ocup. [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25];41:e17. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbso/v41/2317-6369-rbso-41-e17.pdf Portuguese.
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).

A demanda excessiva de trabalho do modelo assistencial proposto pelo SUS é incompatível na maioria das vezes, com o número de profissionais, estrutura física do ambiente, equipamentos e insumos disponibilizados para a AB. Tendo como foco problemas de gestão, sendo estes predominantes paradigmas, baixa qualificação para o acolhimento da população, centralização no modelo biomédico, desorganização na rotatividade de atividades propostas para os profissionais e elevadas demandas burocráticas. Os problemas supracitados são consequência da influência político-partidária, além da intitulação inadequada de pessoas apadrinhadas para cargos de chefia(1919 Trindade LL, Pires DEP. Implicações dos modelos assistenciais da atenção básica nas cargas de trabalho dos profissionais de saúde. Texto Contexto Enferm [Internet].2013 [cited 2017 Sep 25];22(1):36-42. Available from: http://www.redalyc.org/pdf/714/71425827010.pdf
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), o que nada contribui para a consolidação dos princípios e diretrizes do SUS. Além de que ações políticas e econômicas nesse final de segunda década do século XXI vêm impondo sanções radicais aos serviços públicos, tudo em nome da recuperação do crescimento do Brasil, assim, em um cenário que a maioria da população brasileira depende do SUS para cuidar de sua saúde(66 Doniec K, Dall'Alba R, King L. Austerity threatens universal health coverage in Brazil. Lancet [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25]; 387(1):1603-4. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27597461
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) se prevê situação de mais sofrimento e adoecimento, tanto de trabalhadores da área quanto do cidadão.

Por consequente, sugere-se que conflitos, desagregação da equipe e o sofrimento de trabalhadores em saúde podem ter origem da desqualificação de gestores que não estão ou não se sentem preparados para exercerem o cargo para qual foram selecionados. Assim, não se provém de condições ótimas para o funcionamento dos serviços e das equipes, tão pouco se garante a resolutividade de problemas corriqueiros do dia a dia dos setores(22 Carvalho DBD, Araújo TMD, Bernardes KO. [Common mental disorders in primary health care workers]. Rev. bras. saúde ocup. [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25];41:e17. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbso/v41/2317-6369-rbso-41-e17.pdf Portuguese.
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,1919 Trindade LL, Pires DEP. Implicações dos modelos assistenciais da atenção básica nas cargas de trabalho dos profissionais de saúde. Texto Contexto Enferm [Internet].2013 [cited 2017 Sep 25];22(1):36-42. Available from: http://www.redalyc.org/pdf/714/71425827010.pdf
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), além de despertar sentimento de não pertença ao processo, estarem à margem e em menor valia dos projetos da gestão(1818 Fabris F. A noção de tarefa, pré-tarefa e trabalho na teoria de E. Pichon-Rivière. Cad Psicol Soc Trab [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25];17:111-7. Available from: https://revistas.usp.br/cpst/article/view/80639/84290 Portuguese
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).

Outra dimensão relatada pelos sujeitos no GO foi a dificuldade de se separar o que é pessoal do que é profissional. Trabalhadores da área da Saúde têm uma relação muito interligada entre suas vidas pessoais e o trabalho, devido à própria prática, pois lidam com emoções e vivência de momentos complexos, do indivíduo e da comunidade, que muitas vezes estão adoecidos, frágeis, enfrentando tratamentos e entraves com os sistemas nos serviços de saúde. Neste ambiente, o profissional sente-se mobilizado e se torna mais vulnerável quando adicionado a esta condição, além de ter múltiplos empregos, considerando o desgaste físico e psíquico, refletindo na baixa qualidade do serviço prestado(44 Mascarenhas CHM, Prado FO, Fernandes MH, Boery EM, Sena ELS. [Quality of life in workers of the health area: a systematic review]. Rev Saúde Pública Paraná [Internet]. 2013 Dez; 14(1/2):[10 p.] [cited 2017 Sep 25]. Available from: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/espacoparasaude/article/view/9974/pdf_5 Portuguese.
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), além de prejuízos nas relações profissionais, no acompanhamento e na avaliação cotidiana do fazer em saúde e na própria condição técnico-científica de atuação(33 Rodrigues EP, Rodrigues US, Oliveira LdMM, Laudano RCS, Nascimento Sobrinho CL. [Prevalence of common mental disorders in nursing workers at a hospital of Bahia]. Rev Bras Enferm [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25]; 67(2):296-301. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672014000200296&lng=em Portuguese.
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).

Prosseguindo, embora a média de tempo de atuação dos sujeitos tenha sido alta, durante o GO identificou-se o espaço para a manifestação da ansiedade de alguns profissionais recém-formados. Essa sensação permeou o fazer em saúde, mobilizou medos básicos diante do que não se tem domínio e experiência(2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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), ao mesmo tempo que quer enfrentar a situação e mudar(2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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). Os profissionais que acabaram de concluir a graduação recebem grandes desafios e responsabilidades, geram desconforto e, às vezes, sentimentos de incapacidade para oferecer cuidados ao outro, devido à pouca experiência. Os medos frequentes são o do erro, e a insegurança para realizar determinados procedimentos técnicos. O receio aumenta ao se deparar com as dificuldades de adaptação que a profissão trás(2121 Rezende BC, Vasconcelos RMA, Lima SS, Santos PS, Aleixo MLM. Difficulties faced by nurses in the practice of leadership in nursing: a literature review. Rev Eletrônica Gest Saúde [Internet].2013[cited 2017 Sep 25];4(2):2273-2288. Available from: http://periodicos.unb.br/index.php/rgs/article/view/22953
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). Esta situação requer atenção e espaço para acolhimento, uma vez que pode determinar tanto enfrentamentos assertivos, quanto resistência e estagnação da aprendizagem(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.).

Todos esses aspectos somados circundam a precariedade do serviço de saúde e tornam-se problemas reais para o fazer em saúde, com grande potencial para gerar sofrimento mental dos profissionais e, por vezes, ao desenvolvimento de transtornos mentais e comportamentais. Os maiores indicadores desse adoecimento é o absenteísmo dos dias de trabalho com sucessivos afastamentos das atividades(11 Teixeira LP, Silva TASM. [Occupational diseases in nursing - When the work is sick]. Rev Pró-UniverSUS. [Internet]. 2014 [cited 2017 Sept 13]; 05(2):19-24. Available from: http://editorauss.uss.br/index.php/RPU/article/view/516/345 Portuguese.
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) e redução da capacidade de exercer as atividades diárias e até mesmo a profissão do modo geral(55 Santana LL, Sarquis LMM, Miranda FMA, Kalinke LP, Felli VEA, Mininel VA. Health indicators of workers of the hospital area. Rev Bras Enferm [Internet]. 2016 [cited 2017 Sep 25]; 69(1):30-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n1/en_0034-7167-reben-69-01-0030.pdf
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).

Nesse ínterim, observa-se que ao longo das sessões de GO, os elementos do grupo ocuparam o espaço para expor suas dificuldades no trabalho e, ao ocorrê-lo, emergiram ressignificações. No setting grupal, analisou-se o desempenho dialético, permitindo a construção de vínculo entre os membros, sejam elas de edificação ou de conflitos, desde que os mesmos sejam resolvidos dentro do ambiente coletivo, possibilitando um desenvolvimento e envoltura nas relações do grupo(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.). Um grupo se faz como grupo na medida em que os indivíduos constroem vínculos uns com os outros, o outro passa a ser significativo, sendo esta uma tecnologia sofisticada de compartilhar vivências e experiências, constituídas por uma finalidade de interesses análogos.

Nesse encontro que se projeta a necessidade de mudança, o qual recruta em cada indivíduo a capacitação de reflexão e mobilização, na busca da autonomia(2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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), durante esse intercâmbio, os sujeitos transpareceram a insegurança em se exporem em grupo, tanto em relação ao cotidiano do trabalho quanto a si mesmo; momentos identificados como pré-tarefa. Quando os indivíduos subjetivamente resistiram à inserção grupal, o entrar em contato com o outro e consigo, resultando em inquietação, preocupação e receio de perda de identidade, geram-se sentimentos e um agir oposto à tarefa(1818 Fabris F. A noção de tarefa, pré-tarefa e trabalho na teoria de E. Pichon-Rivière. Cad Psicol Soc Trab [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25];17:111-7. Available from: https://revistas.usp.br/cpst/article/view/80639/84290 Portuguese
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,2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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).

Geralmente, este fenômeno se trata da antítese e antecede a tarefa, que representa a essência do trabalho em GO. Tarefa grupal é quando os integrantes do grupo se organizam em direção ao seu objetivo ou intenção, permitem-se viver além do conhecido, compartilhando suas ansiedades e buscam métodos para que as mesmas sejam anuladas ou elaboradas(1818 Fabris F. A noção de tarefa, pré-tarefa e trabalho na teoria de E. Pichon-Rivière. Cad Psicol Soc Trab [Internet]. 2014 [cited 2017 Sep 25];17:111-7. Available from: https://revistas.usp.br/cpst/article/view/80639/84290 Portuguese
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,2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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). No caso do grupo pesquisado, a resistência inicial deu-se em relação à construção da pertença, e que foi sentir-se parte do grupo, compartilhar problemas, ansiedades, modificações e aceitação mútua(2222 Dutra WH, Corrêa RM. [Operative Group as a Therapeutic-Pedagogical Instrument for Promoting Mental Health at Work]. Psicol Ciênc Prof [Internet]. 2015 [cited 2017 Sep 25];35:515-27. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pcp/v35n2/1982-3703-pcp-35-2-0515.pdf Portuguese
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).

Ainda em relação ao surgimento de sentimentos, esse se identificou com a rede transferencial, pois emergiram à superfície momentos já vividos, para que o grupo o abordasse coletivamente, constituindo um reproduzir de situações, reformulando processos de enfrentamentos pessoais e grupais, os quais interferem indiretamente na vida. Fala-se de ressignificação de posições defensivas adotadas pelo indivíduo no início do GO, relacionadas ao medo, insegurança, resistência, autoridade, domínio. No decorrer dos grupos, esta resistência é quebrada pela tarefa(2323 Almeida FH, Melo-Silva LLM, Santos MA. [Operative group with parents of young people in career choice process]. Rev SPAGESP [Internet]. 2017 [cited 2018 Sep 25];18(1):80-100. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rspagesp/v18n1/v18n1a07.pdf Portuguese.
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), devido o movimento de pró-abertura ao novo e superação das estereotipias(2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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). Torna-se ciente a sua historicidade e contextualizar seu fazer, para que seja possível a abertura de outras possibilidades, inclusive de pensar em sua realidade(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.).

Alguns fatores que foram abordados durante as sessões de GO podem se constituir como proteção pessoal e promoção da sanidade mental; um deles foi o espaço de aprendizagem, que representa o principal recurso terapêutico do GO, pois promove a aprendizagem, no sentido de que as pessoas são capazes de reconstruírem processos adoecidos no modo de vida e das relações. As condições geradas pelo GO são: ouvir, refletir e conhecer mais de si e do outro, ampliando a capacidade de cooperação, comunicação e pertinência das ações, o que permite o enfrentamento e superação das distorções da aprendizagem da realidade(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.).

O GO tem como finalidade distinguir a problemática grupal, proporcionando o diálogo, exposição da situação-problema e construção de enfrentamento, considerando as peculiaridades de cada indivíduo, enfraquecendo fatores que contribuem para a despersonalização(2424 Lucchese R, Calixto BS, Vera I, Paula NI, Veronesi CL, Fernandes CNS. [Group teaching in nursing/teaching group nursing practices guided by the Pichon-Rivière theoretical framework]. Esc Anna Nery [Internet]. 2015[cited 2017 Sep 25];19(2):212-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v19n2/1414-8145-ean-19-02-0212.pdf Portuguese.
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). Observa-se que pelas falas dos profissionais, houve reflexão sobre a própria condição e os aspectos da sua identidade foram resgatados. Nesse sentido, abordar os próprios conflitos e elaborar sentimentos, se conduziu a compreensão dos problemas alheios, melhor adaptação ao meio e a novas situações de aprendizagem(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.).

A reflexão individual e coletiva são fatores relevantes para o desenvolvimento dos participantes do GO, construção de vínculos e projeto de mudança e alinham-se ao processo de amadurecimento. Da mesma forma, incentiva dimensões técnicas por meio da aprendizagem e construção de conhecimento, especialmente relacionado ao trabalho em grupo, estratégia de acolhimento e escuta(2424 Lucchese R, Calixto BS, Vera I, Paula NI, Veronesi CL, Fernandes CNS. [Group teaching in nursing/teaching group nursing practices guided by the Pichon-Rivière theoretical framework]. Esc Anna Nery [Internet]. 2015[cited 2017 Sep 25];19(2):212-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v19n2/1414-8145-ean-19-02-0212.pdf Portuguese.
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). O GO se configura como estratégia assertiva para a melhoria de condições de trabalho, com indicativos no enfrentamento de sofrimento psíquico e físico no ambiente laboral(2222 Dutra WH, Corrêa RM. [Operative Group as a Therapeutic-Pedagogical Instrument for Promoting Mental Health at Work]. Psicol Ciênc Prof [Internet]. 2015 [cited 2017 Sep 25];35:515-27. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pcp/v35n2/1982-3703-pcp-35-2-0515.pdf Portuguese
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), com desdobramentos na capacidade de resolução de problemas e benefícios nas relações dos profissionais em sua de rede interacional extra grupo.

Tal fenômeno ocorre uma vez que o processo grupal provoca transformação por meio de ações dialética e dinâmica entre as forças paralisantes do medo e as que se impulsionam diante da necessidade de mudar, avançar(1010 Pichon-Riviére. O processo grupal: WMF Martins Fontes; 2009. 181 p.,2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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). Um rico ambiente que possibilita aos integrantes do grupo o desenvolvimento de esquemas para manejo de anseios próprios e do outro, beneficiando além da vida pessoal, como também da vida social(2525 Guimarães J, Carneiro TRQS. [Psychotherapeutic work in groups: different contexts]. Fragmentos Cult [Internet]. 2014[cited 2017 Sep 25]; 24(Esp):139-49. Available from: http://tede2.pucgoias.edu.br/index.php/fragmentos/article/view/3642/2132 Portuguese.
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).

A escuta terapêutica tem grande potencial de ser construída entre os participantes do grupo(2525 Guimarães J, Carneiro TRQS. [Psychotherapeutic work in groups: different contexts]. Fragmentos Cult [Internet]. 2014[cited 2017 Sep 25]; 24(Esp):139-49. Available from: http://tede2.pucgoias.edu.br/index.php/fragmentos/article/view/3642/2132 Portuguese.
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). Dar voz ao sofrimento do colega fez emergir o sentimento coletivo de não estar só, de ser acolhido, o que representou um exercício de cooperação entre os sujeitos do estudo. Muito se deu pelo fator de inclusão social do indivíduo, contextualizado na relação vincular com o próximo e/ou sociedade, refletindo em sua vida psíquica. Sendo este um modo de visualizar a realidade, seja a própria ou com o auxílio do outro, constituindo assim, uma relação de confiança entre ambos. Na interação dos membros, compartilharam-se emoções, experiências e vivências o que facilitou a interação social e grupal. Colocando em ênfase as particularidades de cada indivíduo, trabalhando uma escuta terapêutica, não só entre os coordenadores do grupo, mas também a partir dos membros, colaborando na respectiva vida e nas demais(2020 Bastos ABBI. [Pichon Rivière's Operative Groups technique and Henri Walon's approach]. Psicól inFormação [Internet]. 2010 [cited 2017 Sep 25]; 14(14):160-9. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/psicoinfo/v14n14/v14n14a10.pdf Portuguese.
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).

Limitações do estudo

As limitações do estudo foram referentes aos sujeitos e a abordagem metodológica, que refletiu uma dada realidade e não generalização dos resultados. Também, quando a sugestão de uma ferramenta de cuidado à saúde mental orientado pelo referencial de Pichon-Rivière, uma vez que requer profissionais formados com tais fundamentos, restringindo sua aplicação em outros contextos com carência nesta formação. Contudo, acredita-se na necessidade de que intervenções grupais sejam norteadas por referencias técnico-teóricos, no sentido de garantir intervenções que promovam escuta terapêutica, autonomia, reflexão crítica da realidade e aprendizagem como meios de superação.

Contribuições para a área da Saúde

O presente estudo revelou como principal achado a constituição teórico-prática de cuidado à saúde mental de profissionais trabalhadores na AB, conduzido pelo GO. Para tanto, norteou-se metodologicamente pela PCA, iniciando-se com a aplicação do instrumento de identificação de possibilidade do adoecimento de trabalhadores da AB, o SRQ-20, o qual foi reforçado pela primeira categoria temática da análise de conteúdo sobre as evidências do sofrimento mental. Também, seguindo as etapas da PCA, houve a intervenção da realidade dos sujeitos com a abordagem grupal de GO como tecnologia assertiva no acolhimento do sofrimento identificado tanto pelo SRQ-20 quanto pela análise temática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados dessa PCA reforçam a vulnerabilidade para o adoecimento mental do profissional atuante da AB e orientam a constituição de cuidado à saúde mental para os mesmos. A aplicação de GO como proposta de acolhimento do sofrimento mental do trabalhador da AB demonstrou-se assertivo, pois proporcionou aos profissionais um espaço de escuta das adversidades do dia a dia do trabalho, reflexão e enfrentamento dos medos básicos, desenvolvimento de um projeto pró-mudança por meio da cooperação entre os pares e aprendizagem ativa da realidade.

Como proposta de cuidado à saúde mental do profissional aplicando GO, destacam-se pontos de sua sistematização e operacionalização, como o estabelecimento do contrato objetivo que encaminha a pertença grupal; a compreensão da pré-tarefa grupal, como um momento de antítese inerente ao enfrentamento dos medos básicos; o trabalho centrado na tarefa como instrumento de superação dos estereótipos e elaboração de projetos pró-mudanças. Nesse meio, considera-se importante a função das devolutivas das sessões de GO anteriores, por meio das crônicas grupais, uma vez que permitiram o acompanhamento de processo de intervenção, respeitando-se o âmbito da continuidade.

Por fim, as características de elaboração dos temas de intervenção não engessados desde o início do método são destacadas, posto que correria o risco de se fundamentar apenas nos resultados do SRQ-20. Resguardando-se que no transcorrer do período, as análises das sessões tivessem espaço para abordagem nas reuniões seguintes e que o próprio movimento grupal fosse protagonista da intervenção.

Este estudo proporcionou uma contribuição teórico-prática no cuidado à saúde mental do trabalhador na AB, e os enfermeiros a esse meio se inserem como membros de uma equipe, também aponta o GO como instrumento e condução assertiva das ações multidisciplinares e com a própria comunidade atendida. Sugere-se, então, o GO como construção do cuidado à saúde mental dos trabalhadores da equipe de enfermagem.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2019

Histórico

  • Recebido
    03 Out 2017
  • Aceito
    10 Mar 2018
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