Percepção da imagem corporal e estado nutricional em adolescentes de escolas públicas

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a insatisfação da imagem corporal entre adolescentes do norte de Minas Gerais.

Método:

Trata-se de estudo transversal realizado com adolescentes de ambos os sexos, matriculados do sexto ao nono ano na rede pública municipal de ensino. Foi utilizado um questionário, composto por variáveis sociodemográficas e de imagem corporal, obtida por meio de uma escala de figuras de silhuetas. Foram realizadas as medidas antropométricas de peso e altura, para o cálculo do índice de massa corporal. A concordância entre a classificação do índice de massa corporal e a imagem corporal dos adolescentes foi estimada por meio do Kappa ponderado.

Resultados:

Participaram 535 adolescentes, sendo que 24,5% possuíam classificação diferente entre a imagem corporal real e ideal. O índice Kappa para a classificação da imagem corporal foi de 0,51, 0,58 e 0,32 para o total de adolescentes, meninas e meninos, respectivamente.

Conclusão:

Os adolescentes de escolas públicas possuem insatisfação da autoimagem corporal.

Descritores:
Adolescente; Imagem Corporal; Saúde do Adolescente; Estado Nutricional; Índice de Massa Corporal

ABSTRACT

Objective:

To assess body image dissatisfaction among adolescents from Northern Minas Gerais.

Method:

This is a cross-sectional study with adolescents of both sexes, enrolled in the sixth to ninth year in the municipal public education network. A questionnaire was used, composed of sociodemographic and body image variables, which was obtained through a scale of silhouette figures. The anthropometric measurements of weight and height were performed to estimate body mass index. The correlation between the classification of the body mass index and the body image of adolescents was estimated through weighted Kappa.

Results:

A total of 535 adolescents participated, and 24.5% had different classifications between the real and ideal body image. The Kappa index for the classification of body image was 0.51, 0.58 and 0.32 for the total of adolescents, girls and boys, respectively.

Conclusion:

Public school adolescents are dissatisfied with their self-body image.

Descriptors:
Adolescent; Body Image; Adolescent Health; Nutritional Status; Body Mass Index

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar la insatisfacción con la imagen corporal de los adolescentes de la región norte de Minas Gerais.

Método:

Se trata de un estudio transversal, en el cual participaron adolescentes de ambos sexos, matriculados del 6.° al 9.° año en la red pública municipal de enseñanza. Se utilizó un cuestionario, que constó de variables sociodemográficas y de imagen corporal, obtenida por medio de una escala de figuras de siluetas. Se obtuvieron las medidas antropométricas de peso y altura para estimar el índice de masa corporal. La concordancia entre la clasificación del índice de masa corporal y la imagen corporal de los adolescentes se calculó mediante el índice Kappa ponderado.

Resultados:

De los 535 adolescentes participantes, un 24,5% tenía una clasificación diferente entre la imagen corporal real y la ideal. Para la clasificación de la imagen corporal, el índice Kappa fue de 0,51, 0,58 y 0,32 para el total de adolescentes, niñas y niños, respectivamente.

Conclusión:

Los adolescentes de escuelas públicas presentaron una autoimagen insatisfecha con su cuerpo.

Descriptores:
Adolescente; Imagen Corporal; Salud del Adolescente; Estado Nutricional; Índice de Masa Corporal

INTRODUÇÃO

A adolescência é um período de rápidas alterações morfológicas e psicossociais que possui grande influência para a percepção corporal ⁽¹⁾. Entre adolescentes é cada vez mais comum o desejo e a busca constante de uma característica física diferente da real ⁽², o que pode resultar em uma insatisfação com a imagem corporal ^(3-4).

A elevada insatisfação com a imagem corporal pode ser facilitada pelo acesso aos meios midiáticos, principalmente aqueles relacionados às redes sociais, aos quais os adolescentes estão frequentemente expostos, tornando-se um grupo de risco ^(2-3,5). Há uma idealização de um corpo perfeito nas sociedades atuais, que quando não é alcançando pode gerar distúrbios da imagem corporal, além de repercussões na saúde e no comportamento dos adolescentes ^(6-8).

A vigilância do indicador de satisfação da imagem corporal é necessária, já que o adolescente pode perceber o próprio corpo diferente do seu tamanho, formato e peso real. Tal comportamento, conforme a sua magnitude, pode contribuir para a ocorrência de distúrbios alimentares ^(2,4,7 e transtornos mentais ⁽⁹, com comprometimento das suas relações sociais ⁽² e da qualidade de vida. Esses transtornos podem se manifestar através da insatisfação com a imagem corporal e até de pensamentos e atitudes suicidas ⁽³⁾. Nesse sentido, a insatisfação da imagem corporal pode ser um fator de risco para o desenvolvimento de psicopatologias e como mediador da relação entre estado nutricional e saúde emocional ^(3,9).

Considerando os resultados negativos na saúde, é importante conhecer a insatisfação corporal entre jovens. Para tanto, os profissionais de saúde e de educação precisam estar atentos a mudanças de comportamentos relacionados à busca do modelo de corpo estereotipado, uma vez que comumente elas iniciam-se na infância e adolescência. A avaliação da insatisfação corporal pode ser realizada pela escala de silhuetas, que nos últimos anos, é uma das técnicas mais usadas em estudos populacionais, devido ao seu modo prático de aplicação. O instrumento consiste em desenhos (silhuetas) de figuras humanas e oferece informações acerca da percepção da imagem corporal ⁽¹⁰⁾. A abordagem inicial é fundamental para o direcionamento ao serviço de saúde especializado, que permitirá o diagnóstico precoce e, por conseguinte, o prognóstico para os adolescentes ^(9,11).

O conhecimento da insatisfação da imagem corporal entre adolescentes de diferentes contextos é necessário, já que a percepção da imagem corporal pode ser influenciada pela condição socioeconômica e cultural ^(3-8,12). Desse modo, o levantamento de dados regionais pode contribuir para o direcionamento de medidas de políticas públicas para promoção da saúde do adolescente que considerem essa questão.

OBJETIVO

Avaliar a associação entre a insatisfação da autoimagem corporal e o estado nutricional entre adolescentes do norte de Minas Gerais.

MÉTODO

Aspectos éticos

A pesquisa respeitou os princípios éticos referentes às pesquisas que envolvem seres humanos. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), protocolo nº 3016. Utilizou-se o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi assinado pelo responsável legal do adolescente, autorizando a sua participação. Todos os adolescentes assinaram o Termo de Assentimento, em que explicitam sua anuência em participar da pesquisa.

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de estudo transversal, realizado com adolescentes de ambos os sexos, matriculados na rede pública municipal de ensino do município de Montes Claros no norte de Minas Gerais. A coleta de dados foi efetuada no segundo semestre de 2011.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

O tamanho amostral foi definido por meio de cálculo para populações finitas, baseando-se nos seguintes critérios:

1. número total de alunos – 6269 alunos de ensino fundamental, matriculados do sexto ao nono ano de escolas da zona urbana do município;

2. nível de confiança de 95%; c) erro amostral de 5%; d) fator de correção para o desenho amostral (“deff”) igual a 1,5; e) prevalência de insatisfação corporal de 26%, considerando dados de estudos com adolescentes no estado ⁽¹³⁾. Foi também estabelecido um acréscimo de 20% no tamanho amostral para compensar possíveis perdas (taxa de não-resposta). Estimou-se a participação de no mínimo 510 adolescentes.

A seleção da amostra foi do tipo probabilística por conglomerados. No primeiro estágio foi realizada a seleção das escolas, por meio de método de seleção com probabilidades proporcionais ao tamanho. No segundo foi realizada a seleção das turmas por amostragem aleatória simples. Em cada uma das turmas selecionadas, todos os adolescentes foram convidados a responder o questionário da pesquisa.

Constituíram critérios de inclusão para a pesquisa: idade entre 10 e 19 anos, conforme limites cronológicos da adolescência definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e apresentar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado. Foram excluídos do estudo os adolescentes que entregaram os questionários incompletos, as gestantes e aqueles que tinham deficiências (físicas ou mentais).

Variáveis do estudo

A coleta de dados foi realizada no ambiente escolar durante o período de aula dos adolescentes, por pesquisadores devidamente capacitados. Os adolescentes foram avaliados quanto às características sociodemográficas, estado nutricional e de imagem corporal. Em uma sala reservada na escola o aluno recebeu um questionário autoaplicável composto por variáveis sociodemográficas: gênero, idade, série, turno de aula, nível socioeconômico e escolaridade dos pais. Realizou a aferição das medidas antropométricas de peso e estatura, conforme o Protocolo de Orientações para a Coleta e Análise de Dados Antropométricos em Serviços de Saúde do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) ⁽¹⁴⁾.

O peso corporal foi aferido por meio de balança portátil digital (Marte®) com capacidade máxima para 199,95kg, capacidade mínima de 1kg e precisão de 50g, com os adolescentes vestindo roupas leves, descalços e sem agasalhos. Eles ficaram em posição ortostática, com os braços estendidos ao longo do corpo, ombros descontraídos e mantendo a cabeça erguida e olhando para frente. A estatura foi aferida com o auxílio de um estadiômetro vertical (Altura exata®), com escala numérica bilateral de 35-213cm e resolução de 0,1cm. Para aferição da estatura os adolescentes estavam descalços, com os calcanhares juntos, em posição ereta, encostados na parede e com a cabeça no Plano de Frankfurt. Com base nas medidas antropométricas de peso e estatura foi calculado o Índice de Massa Corpórea (IMC). Mediram-se o peso e a estatura em duplicata e o valor médio obtido para cada participante foi usado para calcular o IMC para idade (em escores Z) a fim de avaliar o estado nutricional. Os cálculos foram realizados com a utilização do software Diet Pró®. Os adolescentes foram classificados quanto ao estado nutricional considerando os pontos de corte: baixo peso (escore Z < -2), eutrófico (escore Z entre -2 e +1) e sobrepeso (escore Z < +1) ⁽¹⁵⁾.

As informações referentes à imagem corporal foram obtidas por uma autoavaliação, utilizando-se a escala de figuras de silhuetas para adolescentes ⁽¹⁶ e validada no Brasil ⁽¹⁷ (Figura 1).

Figura 1
Escala de silhuetas

Para a análise, foram estabelecidos os critérios: baixo peso (silhueta 1); eutrófico (silhuetas 2-5); e excesso de peso (silhuetas 6-9) ⁽¹⁸⁾. A insatisfação com a imagem corporal foi estabelecida considerando-se a diferença de percepção entre a silhueta percebida e a desejada. Para avaliação da imagem corporal, subtraiu-se a aparência corporal real da aparência corporal ideal. Quando a variação era igual a zero, classificava-se como satisfeita; e se diferente de zero, classificava-se como insatisfeita. Caso a diferença fosse positiva, era uma insatisfação pelo excesso de peso; e, quando negativa, uma insatisfação pela magreza ⁽¹⁹⁾.

Análise dos resultados e estatística

Na análise dos dados foi utilizado o software estatístico SPSS®, versão 19.0 para Windows. Realizou-se a estatística descritiva por meio da freqüência absoluta e relativa. Para verificar as associações entre as variáveis estudadas utilizou-se o teste testes qui-quadrado (χ²), adotando-se um nível de significância de 5%.

RESULTADOS

Participaram do estudo 535 adolescentes, sendo 68,0% (n = 364) do sexo feminino e 32,0% (n = 171) do sexo masculino, com idade entre 11 e 17 anos. Aproximadamente 90% dos adolescentes frequentavam o turno matutino de aula e estavam distribuídos entre o 6º e 9º ano. Quanto à situação socioeconômica, observou-se que 36,3% (n = 194) das famílias possuíam renda superior a um salário mínimo. A maioria dos pais tinha menos que sete anos de escolaridade. Em relação ao IMC, verificou-se que 75,3%, 6,2% e 18,5% dos adolescentes foram classificados como eutróficos, desnutridos e excesso de peso, respectivamente. Quanto à imagem corporal, verificou-se que 60,4% dos adolescentes foram classificados como satisfeitos e 39,6% como não satisfeitos (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização de adolescentes de escolas públicas municipais (N = 535), Montes Claros, Minas Gerais, Brasil, 2015

Variáveis	n	%
Sexo
Feminino	364	68,0
Masculino	171	32,0
Idade (anos)
11 - 12	130	24,3
13 - 14	307	57,4
15 - 17	98	18,3
Série
6ª	187	35,0
7ª	115	21,5
8ª	138	25,8
9ª	95	17,8
Turno
Manhã	480	89,7
Tarde	55	10,3
Renda familiar em SM*
≤ 1 SM	341	63,7
> 1 SM	194	36,3
Escolaridade pai/responsável (anos)
> 8	203	37,9
5 - 7	220	41,1
0 - 4	112	21,0
Estado nutricional
Baixo peso	33	6,2
Eutrófico	403	75,3
Excesso de peso	99	18,5
Imagem corporal
Satisfeito	323	60,4
Não satisfeito	212	39,6

• Nota:
• ^*
  SM = Salários Mínimos: valor vigente na ocasião da pesquisa de R$ 788,00.

Na análise da distribuição dos jovens por sexo e imagem corporal, observou-se uma maior prevalência de não satisfeito para o sexo feminino (42,9%), com diferenças estatisticamente significativas quanto ao sexo (p = 0,026) (Figura 2).

Figura 2
Distribuição dos jovens por sexo e satisfação com a imagem corporal

Na análise do grau de satisfação com a imagem corporal entre os sexos, verificou-se uma associação significativa (p < 0,001). O sexo masculino apresentou maior proporção de insatisfação por déficit de peso (18,1%), enquanto o sexo feminino por excesso de peso (32,2%) (Tabela 2).

Tabela 2
Associação entre o sexo e o grau de satisfação com a imagem corporal, Montes Claros, Minas Gerais, Brasil, 2015

Sex	Classificação da satisfação da imagem corporal
	Insatisfeito por déficit de peso	Satisfeito	Insatisfeito por excesso de peso
Feminino	39 (10,7)	208 (57,1)	117 (32,2)
Masculino	31 (18,1)	115 (67,3)	25 (14,6)

• Nota: P < 0,001.

Nesse estudo, observou-se associação estatisticamente significativa (p < 0,001) entre o estado nutricional e a imagem corporal dos adolescentes avaliados. Verificou-se que os adolescentes com baixo peso e excesso de peso, 81,8% e 59,6%, respectivamente, estavam insatisfeitos com imagem corporal. Entre os adolescentes com peso adequado, a maior proporção se classificou como satisfeitos (68,7%) (Tabela 3).

Tabela 3
Associação entre o estado nutricional e a satisfação com a imagem corporal

Estadonutricional	Classificação da satisfação da imagem corporal
	Satisfeito	Não satisfeito
Baixo peso	06 (18,2)	27 (81,8)
Eutrófico	277 (68,7)	126 (31,3)
Excesso de peso	40 (40,4)	59 (59,6)

• Nota: P < 0,001.

DISCUSSÃO

Neste estudo foi possível identificar que quase a metade dos adolescentes de escolas públicas em um município do norte de Minas Gerais apresentaram insatisfação com a imagem corporal. Uma revisão sistemática da literatura sobre imagem corporal de adolescentes com foco no uso da escala de silhuetas mostrou que as prevalências de insatisfação da imagem corporal variaram de 32,2% a 83%, com grande heterogeneidade entre os estudos ⁽¹⁰⁾. Estudo realizado com adolescentes das capitais brasileiras, observou baixa concordância entre a imagem corporal e o estado nutricional do adolescente ⁽¹⁾. Esses resultados podem estar relacionados ao fato da adolescência constituir um período crítico para o desenvolvimento da imagem corporal, devido às várias mudanças sociais, físicas e psicológicas que ocorrem nessa fase da vida ⁽¹⁹⁾. Em cidades de diferentes portes e independentemente da idade, adolescentes têm se mostrado insatisfeitos com a sua imagem corporal ^(1-6). Em adolescentes a preocupação com algum aspecto da aparência pode ter repercussões importantes em seus sentimentos e funcionalidade, o que o torna vulnerável à ocorrência de transtornos ligados à saúde mental ⁽²⁰⁾.

Em relação ao sexo, nesse estudo, concluiu-se que a maior parte das meninas apresentaram-se insatisfeitas com o excesso de peso. Estudos internacionais ^(21-22 e nacionais ^(23-24 mostram que nas meninas há mais casos de superestimação da imagem ou peso corporal. Estudo recente realizado com 2765 adolescentes na Europa ⁽²¹ concluiu que a insatisfação com a imagem corporal e o comportamento de controle de peso são questões particularmente nas meninas. Essa diferença entre a silhueta real e a ideal com maior incidência nas meninas pode resultar no diagnóstico diferencial de transtorno dismórfico corporal, já que é mais prevalente em mulheres, com início na idade entre os 15 e 30 anos ⁽⁹⁾. O padrão de beleza atualmente imposto pela mídia – valorizando a magreza – reforça essa condição, o que pode levar à adoção de dietas restritivas, independentemente da real necessidade, e contribuir para a ocorrência e manutenção do baixo peso ⁽²⁴, bem como para o comprometimento dos hábitos alimentares ⁽²⁵ e a presença de transtornos mentais ⁽⁷⁾.

Entre os meninos, a maior prevalência de insatisfação com a imagem corporal foi devido o déficit de peso. Estudo realizado no norte de Minas Gerais, observou ⁽²⁶ que 39,5% dos adolescentes do sexo masculino pesquisados desejavam aumentar o tamanho corporal. Esse dado pode ser explicado em partes pelo fato dos meninos desejarem ter corpos com maior volume muscular, possivelmente, aspirando por um corpo musculoso e mais forte ⁽⁵⁾. Outros resultados similares confirmam que as meninas, geralmente desejam diminuir a silhueta corporal – insatisfeitas com o excesso de peso, comumente observado nessa faixa etária ^(23,27 –, enquanto os meninos anseiam corpos mais fortes – insatisfeitos com a magreza ^(1,2,5,23).

Há que se considerar que a investigação sobre a opinião sobre o corpo parece ser melhor, quando comparado com a opinião sobre o peso para expressar a dimensão perceptiva da imagem corporal ^(22,28). Este pressuposto foi verificado em estudo realizado com adolescentes do Rio de Janeiro para avaliar a concordância entre diferentes indicadores de imagem corporal e índice de massa corporal. Neste sentido o uso do instrumento de silhueta corporal é apropriado para a vigilância de fatores de risco e proteção para adolescentes ⁽²⁹⁾.

Na análise de associação da imagem corporal e o estado nutricional, foi observado que a maior proporção dos adolescentes com baixo peso e excesso de peso era insatisfeita com a imagem corporal. Essa condição pode ser reflexo da exposição dos adolescentes às influências socioculturais e midiáticas, com a necessidade de atender aos padrões de beleza contemporâneos, caracterizado por uma magreza irreal para as mulheres e um corpo musculoso para os homens ⁽¹⁾. A insatisfação corporal estará associada ao IMC para mulheres e homens, de tal forma que o aumento do IMC ao longo do tempo estará associado ao aumento da insatisfação corporal ⁽³⁰⁾.

Diante da insatisfação com a imagem corporal entre adolescentes é essencial acompanhar o estado nutricional nessa faixa etária, tendo em vista principalmente o fato de tratar-se de indivíduos ainda em fase de crescimento e desenvolvimento e com risco de introdução precoce de doenças associadas aos desvios ponderais ⁽¹⁾. Adicionalmente, a forma como o adolescente percebe a própria imagem corporal pode levar a consequências nas dimensões física, mental e social. A satisfação com a imagem corporal é um fator importante na autoaceitação dos adolescentes que pode repercutir em atitudes inadequadas, o que pode comprometer a saúde global do indivíduo ⁽²⁾. Um estudo realizado na mesma cidade do presente trabalho observou que a percepção negativa do peso corporal foi associada a comportamentos de violência ⁽²⁶⁾.

Acrescenta-se, ainda, a possibilidade de a insatisfação corporal ter como gênese, em alguns adolescentes, o transtorno dismórfico corporal. Este normalmente coexiste com outros transtornos mentais. O transtorno depressivo maior acomete 90% desses indivíduos ao longo da vida e aproximadamente 70% desenvolvem transtorno de ansiedade e 30% transtorno psicótico ⁽¹⁹⁾. Aspecto que merece ser mais bem investigado em estudos futuros.

Nesse contexto, é evidente a necessidade de intervenções por profissionais de saúde na fase da adolescência, a fim de prevenir que a insatisfação com a imagem corporal resulte na ocorrência de problemas psíquicos que estão relacionados à autoimagem e a transtornos alimentares ^(2,6,31-32). Dessa forma, a escola e a família devem ficar atentos aos indícios de distorções da imagem corporal dos adolescentes, tendo importante papel na identificação de situações de risco que necessite de acompanhamento de profissional especializado.

Limitações do estudo

Neste estudo deve se levar em consideração as limitações: a aplicação de questionários no ambiente escolar pode ter influências do ambiente e dos pares e a avaliação de adolescentes no contexto do cenário de escolas públicas do município, de modo que os dados não podem ser generalizados.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

O presente trabalho ratificou a importância de conhecer a imagem corporal dos adolescentes ⁽³²⁾. A avaliação da insatisfação corporal deve ser incorporada na prática dos profissionais de saúde, em especial da enfermagem, com ações de promoção e proteção da saúde dos adolescentes.

O enfermeiro tem importante papel de educador e deve promover entre os adolescentes, pais/responsáveis e professores reflexões sobre a imagem corporal e às repercussões da insatisfação corporal. Na sua prática, este profissional pode estimular a consciência crítica e reflexiva dos adolescentes no empoderamento para o autocuidado com o seu corpo e a sua saúde. Atividades educativas com orientações sobre o conhecimento e percepção corporal, adoção e manutenção de estilos de vida saudáveis e uso adequado das redes sociais precisam ser incorporadas no ambiente escolar e nas equipes de Estratégia de Saúde da Família ⁽⁷⁾. A vigilância constante de fatores de risco ⁽²⁹, incluindo medidas de rastreamento e avaliação do estado nutricional dos adolescentes deve se tornar uma realidade na prática do enfermeiro nestes cenários, além das consultas clínicas.

Ademais, o estilo de vida saudável precisa ser valorizado e consolidado no contexto escolar, por meio de políticas públicas locais que favoreçam o apoio à atividade física, com a adequação dos ambientes físicos e a inserção de exercício físico no contraturno escolar e a promoção da alimentação saudável, com a restrição de alimentos processados e ultraprocessados ofertados nas cantinas escolares ⁽³³⁾.

Esses resultados devem ser levados em consideração na implantação de estratégias e intervenções para adolescentes, voltadas para reflexões e esclarecimentos sobre a exposição de estereótipos corporais, evitando-se implicações que elevam o risco de transtornos na vida adulta. Os resultados poderiam subsidiar os profissionais que atuam com o público adolescente a trabalharem a temática “corpo na adolescência”.

CONCLUSÃO

Neste estudo, parte relevante dos adolescentes de escolas públicas possuía insatisfação com a imagem corporal, associado ao sexo e ao estado nutricional. Os adolescentes do sexo feminino apresentaram maior prevalência de insatisfação por excesso de peso e o sexo masculino por déficit de peso. A insatisfação da imagem corporal apresentou maior proporção entre os adolescentes com desvios nutricionais.

Espera-se que a difusão de informações obtidas nesse estudo propicie a reflexão de profissionais de saúde e da comunidade escolar que atuam diretamente com essa faixa etária quanto à necessidade de se considerar essa variável na assistência a esses grupos. Esses resultados podem viabilizar assistência precoce a uma condição que pode levar à ocorrência de outros transtornos, com sofrimento mental e comprometimento da funcionalidade do indivíduo. E ainda, que direcione o desenvolvimento de novos trabalhos neste campo, especialmente na investigação da insatisfação da imagem corporal e a relação com transtornos mentais em adolescentes.

• FOMENTO
  Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Concessão de Bolsa de Estudos pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  05 Dez 2019
• Data do Fascículo
  Nov 2019

Histórico

• Recebido
  17 Ago 2018
• Aceito
  13 Abr 2019