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Saúde ambiental: desafios e possibilidades para o cuidado emancipador pelo enfermeiro

RESUMO

Objetivos:

discutir os desafios e as possibilidades para a construção de práticas emancipatórias de cuidado em Saúde Ambiental pelo enfermeiro.

Métodos:

análise reflexiva baseada em aspectos conceituais, teóricos e metodológicos do processo de cuidar pelo enfermeiro sob a perspectiva emancipatória e crítica.

Resultados:

as questões ambientais contemporâneas envolvem complexos determinantes do processo saúde-doença. Este fato exige a realização de ações educativas que estimulem a mudança de atitudes ambientais relacionadas às situações de riscos à saúde. Nesse sentido, há significativas demandas de práticas emancipatórias de cuidado primário em Saúde Ambiental pelo enfermeiro que precisam ser sistematizadas pelas instituições formadoras e de saúde.

Considerações finais:

o enfermeiro como agente educador e ator social deve oferecer práticas emancipatórias de gerenciamento de riscos, empoderamento e responsabilidade socioambiental compartilhada, com vistas ao resgate de um ideário de bem-estar ecológico e da transformação social, para melhoramento da qualidade ambiental e de vida humana.

Descritores:
Saúde Ambiental; Enfermeiras e Enfermeiros; Promoção da Saúde; Cuidado de Enfermagem; Atenção Primária à Saúde

ABSTRACT

Objectives:

to discuss challenges and possibilities for the construction of Environmental Health emancipatory care practices by the nurse.

Methods:

reflective analysis based on conceptual, theoretical, and methodological aspects of nursing care, under the emancipatory and critical perspective.

Results:

contemporary environmental issues involve complex determinants of the health-disease process. This fact requires the accomplishment of educative actions that encourage the change of environmental attitudes related to health-risk situations. In this sense, there are significant demands for emancipatory practices of primary care in Environmental Health by nurses, which need to be systematized by health and education institutions.

Final considerations:

the nurse, as an educator and social actor, should offer emancipatory practices of risk management, empowerment, and shared social and environmental responsibility, with a view to recovering an ecological well-being and social transformation, to improve environmental quality and human life.

Descriptors:
Environmental Health; Nurses; Health Promotion; Nursing Care; Primary Health Care

RESUMEN

Objetivos:

discutir los desafíos y lãs posibilidades para la construcción de prácticas emancipatorias de cuidado em Salud Ambiental por el enfermero.

Métodos:

análisis reflexivo basado en aspectos conceptuales, teóricos y metodológicos delproceso de cuidar por elenfermero, bajo la perspectiva emancipatoria y crítica.

Resultados:

las cuestiones ambientales contemporâneas implican complejos determinantes del proceso salud-enfermedad. Este hecho exige larealización de acciones educativas que estimulen el cambio de actitudes ambientales relacionadas a las situaciones de riesgos a lasalud. Enese sentido, hay significativas demandas de prácticas emancipatorias de cuidado primário en Salud Ambiental por el enfermero, que necesitan ser sistematizadas por las instituciones formadoras y de salud.

Consideraciones finales:

el enfermero, como agente educador y actor social, debe ofrecer prácticas emancipatorias de gestión de riesgos, empoderamiento y responsabilidad socioambiental compartida, con miras al rescate de unideario de bienestar ecológico y de la transformación social, para mejoramiento de lacalidad ambiental y de vida humano.

Descriptores:
Salud Ambiental; Enfermeros; Promoción de La Salud; Atención de Enfermería; Atención Primaria de Salud

INTRODUÇÃO

A Saúde Ambiental é um campo da Saúde Pública que vem produzindo demandas de práticas emancipatórias de cuidado em saúde para enfermeiros e demais profissionais que atuam na Atenção Primária à Saúde (APS), dado aos riscos ambientais e à saúde aos quais estão expostas as populações e a proximidade das práticas destes profissionais nos territórios. Tais práticas caracterizam-se em ações de gerenciamento de riscos ambientais e de educação crítico-reflexiva, que devem estimular a cidadania e a transformação socioambiental(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

As ações desenvolvidas sob o prisma emancipador em saúde, devem propiciar meios para o incremento do poder político e do conhecimento técnico dos indivíduos e grupos sociais em condições de desigualdade de decisão, mediação e interferência sobre a qualidade das condições e fatores que influenciam a saúde e o bem-estar humano(22 Campos CMS, Silva BRB, Forlin DC, Trapé CA, Lopes IO, et al. Emancipatory practices of nurses in primary health care: the home visit as an instrument of health needs assessment. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):119-25. doi: 10.1590/S0080-623420140000600017
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).

Nesse contexto, a relevância social, assistencial e científica da inserção do enfermeiro em espaços, setores e territórios, onde há produção de situações de perigos ambientais relacionados à saúde, torna-se fundamental e visível. O enfermeiro, como profissional sensível às vulnerabilidades e necessidades emergentes de saúde, tem papel significativo na aplicação de seu conhecimento para promoção da saúde e melhoramento da qualidade ambiental e de vida dos indivíduos e das coletividades(33 Zamberlan C, Medeiros AC, Dei Svaldi J, Siqueira HCH. Ambiente, saúde e enfermagem no contexto ecossistêmico. Rev Bras Enferm. 2013;66(4):603-6. doi: 10.1590/S0034-71672013000400021
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).

Com base nessas acepções, as competências e potencialidades do enfermeiro, em exercer práticas de cuidado comprometidas com a manutenção de boas condições ambientais dos locais onde as pessoas, famílias e comunidades vivem e trabalham, precisam ser mais evidenciadas, discutidas e legitimadas, segundo a perspectiva científica, social e política. Assim, haveria um melhor aproveitamento e valorização de seu processo de trabalho nesta direção. No contexto brasileiro, o cuidado realizado pelo enfermeiro no campo da Saúde Ambiental, mesmo despontando como relevante, ainda se configura como incipiente. Atualmente, não existe normativa, política ou consenso científico específico sobre esta forma de atuação.

Frente a essas ponderações e à inserção internacional da Enfermagem em questões socioambientais globais e locais, levantou-se a necessidade de elencar e refletir sobre as possibilidades e desafios da prestação de cuidados com elevada qualidade pelo enfermeiro no campo da Saúde Ambiental.

OBJETIVOS

Discutir os desafios e as possibilidades para a construção de práticas emancipatórias de cuidado em Saúde Ambiental pelo enfermeiro.

DESAFIOS PARA UMA PRÁXIS EMANCIPATÓRIA DE CUIDADO EM SAÚDE AMBIENTAL PELO ENFERMEIRO

No cenário brasileiro, os perigos ambientais e de riscos à saúde são os mais diversificados, incluindo problemas remotos, desde condições de saneamento básico inadequado até fatores mais recentes de origem tecnológica, envolvendo a disseminação de agentes radioativos e químicos (resíduos de medicamentos, agrotóxicos, metais pesados, plásticos, etc.), com atravessamentos por direções e locais distantes(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

Tal complexidade da problemática ambiental contemporânea exige a percepção crítica pelo enfermeiro das condições ambientais, de vida e trabalho como determinantes do processo saúde-doença no território. A pluralidade dos problemas ambientais clama, assim, a adoção de medidas que superem práticas biomédicas e assistencialistas, levando à adoção de ações transdisciplinares imbuídas de atitudes ambientais e movimentos coletivos de sensibilidade na dimensão ecológico-sanitária(33 Zamberlan C, Medeiros AC, Dei Svaldi J, Siqueira HCH. Ambiente, saúde e enfermagem no contexto ecossistêmico. Rev Bras Enferm. 2013;66(4):603-6. doi: 10.1590/S0034-71672013000400021
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).

Outro desafio se refere à capacitação do enfermeiro em assistir pessoas com morbidades relacionadas à exposição ambiental e ocupacional às substâncias perigosas, a partir da realização de ações de intervenção precoce de Enfermagem, nestes problemas de saúde, além de habilidades para colaborar com as comunidades com formas de enfrentamento em situações de desastres, inundações e enchentes(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.,44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
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). Não há conhecimento publicado sobre práticas de Enfermagem, nestes contextos problemáticos(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

Nos dias atuais, comprova-se um movimento crescente de autonomia do enfermeiro, com a ampliação e a consolidação de ações assistenciais e gerenciais nos serviços de APS, que incluem práticas emancipatórias de promoção da saúde(22 Campos CMS, Silva BRB, Forlin DC, Trapé CA, Lopes IO, et al. Emancipatory practices of nurses in primary health care: the home visit as an instrument of health needs assessment. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):119-25. doi: 10.1590/S0080-623420140000600017
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). Contudo, revela-se como desafio desse tipo de prática, a aplicação de métodos de intervenção comunitária pelo enfermeiro, que contribuam para o melhoramento da qualidade ambiental e a equidade na Saúde Coletiva(44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
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).

Definem-se práticas emancipatórias em saúde aquelas que possibilitam as pessoas refletirem sobre a origem dos problemas de saúde e que lhes instrumentalizem a acessar e lutar pelos seus direitos à saúde. Tais práticas incentivam valores de solidariedade e resgatam a condição humana como condição multidimensional e singular, em antagonismo à condição do indivíduo exclusivamente como ser biológico. São exemplos de práticas emancipatórias realizadas pelo enfermeiro no âmbito da APS: visitas domiciliares, reuniões de equipe e encontros para educação em saúde(22 Campos CMS, Silva BRB, Forlin DC, Trapé CA, Lopes IO, et al. Emancipatory practices of nurses in primary health care: the home visit as an instrument of health needs assessment. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):119-25. doi: 10.1590/S0080-623420140000600017
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).

Ainda, é escassa a produção de conhecimento sobre práticas emancipatórias de cuidado em Saúde Ambiental pelo enfermeiro. O estudo de Romão et al.(55 Romão LMV, Maia ER, Albuquerque GA. Riscos ambientais: percepção dos enfermeiros da estratégia saúde da família em áreas adscritas. Rev Enferm UERJ [Internet]. 2014 [cited 2018 Jul 05];22(2):264-70. Available from: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/enfermagemuerj/article/view/13669
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) apontou que os enfermeiros participantes realizaram ações pontuais de educação ambiental com a população e os Agentes Comunitários de Saúde, em espaços físicos da unidade de saúde da família, da associação de moradores e do domicílio. As mesmas se restringiram ao fornecimento de informações sobre os fatores de riscos ambientais identificados nos territórios. Outro estudo(66 Bezerra EP, Alves MDS. Nursing and environmental health in schools. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):666-72. doi: 10.1590/S0103-21002012000500004
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) )evidenciou a implementação de práticas educativas efetuadas pelo enfermeiro, que promoveram reflexões em adolescentes no cenário escolar, sobre questões socioambientais de sua comunidade.

Revelam-se, assim, práticas de educação ambiental limitadas às trocas de informações e distantes do propósito de formação de cidadãos que busquem mudanças nas percepções e atitudes ambientais, a partir de uma produção compartilhada de valores éticos e conhecimentos críticos das dimensões política, social, econômica, ecológica e sanitária.

A expansão das ações de educação ambiental pelo enfermeiro, em todos os níveis de ensino e de assistência à saúde, tem se consolidado nas últimas décadas. Com isso, tornou-se um importante instrumento de trabalho frente à gestão dos problemas socioambientais e seus impactos à saúde pública(44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
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). Todavia, a educação ambiental ainda representa um desafio para o enfermeiro.

Baseado em uma perspectiva crítica, transformadora e emancipatória, o desenvolvimento de práticas de educação ambiental exige o preparo do conhecimento do enfermeiro sobre o envolvimento de diversos atores sociais (profissionais de saúde, moradores, agentes políticos, etc.), em diferentes etapas deste processo. Tais etapas incluem a realização de ações de diagnóstico das condições e fatores ambientais locais e de sua inter-relação com as situações de riscos à saúde, considerando a percepção dos indivíduos e do grupo sobre a prioridade dos problemas que lhes impactam a saúde; a realização de ação participativa, cuja proposta metodológica esteja adequada ao contexto social dos participantes; a avaliação coparticipativa dos resultados, por meio de estratégias que, também, devem estar condizentes com o interesse dos envolvidos no processo(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

A dimensão crítica diz respeito ao despertar da consciência do sujeito para questionamentos de sua própria percepção e atitude perante a vida e o meio ambiente. Assim, a práxis educativa crítica apresenta como propósito a negação e a superação de verdades preconcebidas; o conhecimento da situação ambiental, de forma a transcender a visão preservacionista, a partir do contexto histórico das relações sociais, econômicas e políticas sobre o meio ambiente; e a constituição de habilidades humanas para síntese dos conhecimentos e ações organizadas pelos grupos sociais envolvidos na práxis(77 Ribeiro CRB, Saboia VM, Moniz MA, Koopmans FF, Ramos LGA, Daher DV, et al. Investigación-acción y Enfermería en educación ambiental: reflexión metodológica. Index Enferm[Internet]. 2018 [cited 2018 Sept 30];27(3):1-5. Available from: http://ciberindex.com/c/ie/e11669
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).

A dimensão transformadora da práxis educativa refere-se ao ideário de mudanças de atitudes, enquanto condições subjetivas humanas, e das situações objetivas de deterioração ambiental. Em relação à práxis emancipatória, a ação educativa deve oferecer amplo acesso às informações e estimular a participação ativa e a autonomização das pessoas e dos grupos na problematização da realidade ambiental e de sua influência na situação de saúde como requisitos indispensáveis à construção e ao emprego de soluções e alternativas sustentáveis(33 Zamberlan C, Medeiros AC, Dei Svaldi J, Siqueira HCH. Ambiente, saúde e enfermagem no contexto ecossistêmico. Rev Bras Enferm. 2013;66(4):603-6. doi: 10.1590/S0034-71672013000400021
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,77 Ribeiro CRB, Saboia VM, Moniz MA, Koopmans FF, Ramos LGA, Daher DV, et al. Investigación-acción y Enfermería en educación ambiental: reflexión metodológica. Index Enferm[Internet]. 2018 [cited 2018 Sept 30];27(3):1-5. Available from: http://ciberindex.com/c/ie/e11669
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).

Nesse sentido, a pedagogia crítica libertadora de Paulo Freire, tem sido reconhecida como o referencial teórico-metodológico que melhor sustenta o desenvolvimento de práticas de educação ambiental. O enfermeiro tem se apropriado de conhecimentos teóricos e metodológicos desta proposta pedagógica, para utilizá-la como eixo norteador de sua ação educativa em saúde(77 Ribeiro CRB, Saboia VM, Moniz MA, Koopmans FF, Ramos LGA, Daher DV, et al. Investigación-acción y Enfermería en educación ambiental: reflexión metodológica. Index Enferm[Internet]. 2018 [cited 2018 Sept 30];27(3):1-5. Available from: http://ciberindex.com/c/ie/e11669
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).

Porém, a aplicabilidade dos pressupostos da pedagogia freireana, nas práticas educativas em Saúde Ambiental, tem emergido como possibilidade desafiadora para o enfermeiro. A relação pedagógica embasada pela valorização de um diálogo democrático e horizontal entre educandos e educadores, para a construção de conhecimentos, em que devem ser respeitados o pensar autêntico e a pluralidade de saberes de ambos e do protagonismo dos participantes, deve ser concatenada às dimensões crítica, transformadora e emancipatória dessa práxis educativa em Saúde Ambiental(44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
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,77 Ribeiro CRB, Saboia VM, Moniz MA, Koopmans FF, Ramos LGA, Daher DV, et al. Investigación-acción y Enfermería en educación ambiental: reflexión metodológica. Index Enferm[Internet]. 2018 [cited 2018 Sept 30];27(3):1-5. Available from: http://ciberindex.com/c/ie/e11669
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).

POSSIBILIDADES PARA O CUIDADO EMANCIPADOR EM SAÚDE AMBIENTAL PELO ENFERMEIRO

As iniciativas de planejamento e execução de práticas de cuidado em Saúde Ambiental, com qualidade pelos enfermeiros, devem contemplar ações ecossistêmicas em seus cotidianos de trabalho, criando oportunidades de atendimentos integrais baseados em preceitos de interatividade, de equilíbrio e de sustentabilidade, entre os seres humanos e suas múltiplas dimensões biológicas, sociais, psicológicas e espirituais com o ambiente(22 Campos CMS, Silva BRB, Forlin DC, Trapé CA, Lopes IO, et al. Emancipatory practices of nurses in primary health care: the home visit as an instrument of health needs assessment. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):119-25. doi: 10.1590/S0080-623420140000600017
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).

O alcance de um cuidado ecossistêmico em saúde, pelo enfermeiro, é possível por meio da realização de práticas de gerenciamento dos riscos à saúde ambiental, que se incluem no nível das ações de promoção da saúde. Estas práticas são condizentes com a implementação de ações de diagnóstico e vigilância local do estado de saúde ambiental, investigação e acompanhamento sobre o perfil epidemiológico da situação de saúde da população assistida(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

Assim, o enfermeiro deve distanciar-se de concepções naturalistas que vêm orientando as práticas em Saúde Ambiental. Eles devem conhecer diferentes ferramentas de análise territorial e possibilidades de diagnóstico participativo socioambiental, que estão mais próximas dos aspectos curriculares de sua formação, baseadas mais em teorias sociais do que em análises laboratoriais e quantitativas(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.,44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
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).

Outra importante possibilidade de contribuição do enfermeiro é por meio de sua participação em espaços decisórios de saúde e ambiental (conselhos e conferências municipais, estaduais e nacionais). Nestas instâncias colegiadas, evidencia-se a importância do engajamento do enfermeiro enquanto ator social e possível representante da sociedade civil e do segmento de profissionais da Saúde sobre a formulação de políticas públicas, com vistas à justiça social(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

Nesse sentido, os enfermeiros têm demonstrado desconhecimento e pouco engajamento acerca dos problemas de saúde global sob a perspectiva da sustentabilidade(88 Anåker A, Elf M. Sustainability in nursing: a concept analysis. Scand J Caring Sci. 2014; 28(2):381-9. doi: 10.1111/scs.12121
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). Vale ressaltar que a Enfermagem foi reconhecida internacionalmente pelo Conselho Internacional de Enfermagem e pela Sociedade de Honra de Enfermagem Sigma Theta Tau International (STTI) como categoria importante para o alcance dos objetivos do desenvolvimento sustentável(99 Chaparro-Díaz L. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Doença crônica não transmissível. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2717. doi: 10.1590/1518-8345.0000.2717
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).

Nas sociedades ocidentais modernas, o uso do desenvolvimento sustentável é indispensável no setor da Saúde, uma vez que está atrelado à preocupação social, científica e política de garantir o acesso equânime e igualitário de indivíduos e comunidades aos recursos e às possibilidades de exercer direitos para a promoção de ambientes saudáveis(88 Anåker A, Elf M. Sustainability in nursing: a concept analysis. Scand J Caring Sci. 2014; 28(2):381-9. doi: 10.1111/scs.12121
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-99 Chaparro-Díaz L. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Doença crônica não transmissível. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2717. doi: 10.1590/1518-8345.0000.2717
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). O desenvolvimento sustentável preconiza a busca das populações atuais por condições para manter suas necessidades, sem impossibilitar que gerações futuras também encontrem suas necessidades. Urge-se, portanto, o desenvolvimento de um sentimento de interdependência global e de responsabilidade universal(99 Chaparro-Díaz L. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Doença crônica não transmissível. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2717. doi: 10.1590/1518-8345.0000.2717
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).

Com base nessa premissa, são necessárias a exploração e a incorporação da sustentabilidade em todas as suas dimensões - ambiental, sociocultural, econômica, política e organizacional - nas áreas de ensino, pesquisa e assistência de enfermagem(88 Anåker A, Elf M. Sustainability in nursing: a concept analysis. Scand J Caring Sci. 2014; 28(2):381-9. doi: 10.1111/scs.12121
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). O entendimento do cuidado ecológico como um fenômeno complexo e de compromisso com a cidadania, ética e sustentabilidade ambiental, é imprescindível para a realização de práticas de cuidado ampliado, emancipatório e sistêmico em saúde pelo enfermeiro(1010 Backes MTS, Backes DS, Drago LC, Koerich MS, Erdmann AL, et al. Cuidado ecológico como um fenômeno amplo e complexo. Rev Bras Enferm. 2011;64(5):876-81. doi: 10.1590/S0034-71672011000500012
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).

Para tanto, o contexto formativo do enfermeiro deve oportunizar diferentes espaços e cenários para a produção de conhecimentos, capacidades, movimentos e atitudes em relação às diferentes formas e necessidades de atuação deste profissional no campo da Saúde Ambiental(1010 Backes MTS, Backes DS, Drago LC, Koerich MS, Erdmann AL, et al. Cuidado ecológico como um fenômeno amplo e complexo. Rev Bras Enferm. 2011;64(5):876-81. doi: 10.1590/S0034-71672011000500012
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).

A metodologia da problematização, em conformidade com a proposta pedagógica freireana, tem abarcado estratégias dinâmicas e afetivas com bons resultados no processo de ensinagem e de sensibilização ambiental(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.,77 Ribeiro CRB, Saboia VM, Moniz MA, Koopmans FF, Ramos LGA, Daher DV, et al. Investigación-acción y Enfermería en educación ambiental: reflexión metodológica. Index Enferm[Internet]. 2018 [cited 2018 Sept 30];27(3):1-5. Available from: http://ciberindex.com/c/ie/e11669
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). Assim, tal estratégia, enquanto alternativa de metodologia, tem ampliado as possibilidades de empoderamento dos estudantes no exercício da ética ambiental. Trata-se de um caminho que visa oferecer oportunidades para que ocorram mudanças de atitude e que seja assumida a corresponsabilidade pelas complexas questões ambientais locais e globais(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.).

Ademais, nos processos formativos do enfermeiro, deve ser considerada a educação ambiental interdisciplinar, vislumbrando a abertura de espaços que propiciem a reflexão e a capacidade crítica das pessoas para a construção de identidades e valores com o ambiente e a sociedade moderna(44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
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). Reitera-se, portanto, a importância de se construírem espaços formais e não-formais e instigadores, para debates e reflexões sobre a interface de saúde e meio ambiente, constituindo-se em atitude fundamental para a busca de uma visão mais integradora sobre o tema(66 Bezerra EP, Alves MDS. Nursing and environmental health in schools. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):666-72. doi: 10.1590/S0103-21002012000500004
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).

Estudos recentes(11 Moniz MA, Sabóia VM, Daher DV, Pereira RL, organizadores. Práticas comunicativas socioambientais - Inovação e potencialidades no uso de tecnologias educacionais na formação do enfermeiro. Niterói: Eduff; 2017.,44 Moniz MA, Pereira JM, Marques TS. Tecnologia Educacional - Painel Integrado Saúde-Ambiente - na formação do enfermeiro: pesquisa descritiva. O Braz J Nurs. 2016;15(3):466-71. doi: 10.17665/1676-4285.20165421
https://doi.org/10.17665/1676-4285.20165...
), desenvolvidos com estudantes de enfermagem de uma universidade pública brasileira, revelaram a possibilidade de aplicação de duas técnicas de pesquisa pouco utilizadas ainda na produção científica da Enfermagem, a “fotovoz” e o World café, que serviram também como estratégias de ensino-aprendizagem baseadas em problemas reais.

Desse modo, as instituições formadoras e de saúde têm papéis fundamentais como promotoras dessa discussão, oferecendo não somente um aporte acadêmico e social a respeito, como também oportunizando espaços, mecanismos e recursos para que estudantes e trabalhadores possam repensar o seu fazer, a partir das experiências vividas e das reflexões individuais sobre temas que envolvam a corresponsabilidade, a ética e a sustentabilidade socioambiental, e sua repercussão sobre a saúde e a qualidade de vida humana(1010 Backes MTS, Backes DS, Drago LC, Koerich MS, Erdmann AL, et al. Cuidado ecológico como um fenômeno amplo e complexo. Rev Bras Enferm. 2011;64(5):876-81. doi: 10.1590/S0034-71672011000500012
https://doi.org/10.1590/S0034-7167201100...
).

Contribuições para a área da Enfermagem

A perspectiva emancipatória e crítica trouxe ampliação das análises acerca dos desafios e possibilidades de práticas de cuidado em Saúde Ambiental, que podem ser desenvolvidas pelo enfermeiro, evidenciando que não devem se restringir ao levantamento de problemas ambientais que estejam impactando a saúde e a qualidade de vida humana. Essas práticas devem promover estratégias de cuidado junto às pessoas e às comunidades, visando ampliar suas capacidades críticas de percepção, engajamento e atitude na busca da resolubilidade de tais problemas e situações de riscos à saúde, em seus contextos reais.

Ressalta-se, assim, que há significativas demandas de práticas emancipatórias de cuidado em Saúde Ambiental pelo enfermeiro, que precisam ser sistematizadas pelas instituições formadoras e de saúde.

Espera-se que o conhecimento dessa reflexão possa subsidiar mudanças não apenas em cenários de formação e qualificação do conhecimento e das práticas do enfermeiro em Saúde Ambiental, mas das instituições de saúde e nos territórios. Essas abarcam a necessidade de adequação das estruturas políticas, sociais e profissionais, contribuindo para que o profissional possa compreender, incorporar e concretizar práticas emancipatórias de cuidado em Saúde Ambiental, na agenda das ações de saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um ambiente salubre não é apenas um elemento de qualidade de vida, mas um direito à saúde inalienável. Sendo assim, cabe aos enfermeiros realizarem um atendimento integral e ecossistêmico em saúde, englobando não apenas os aspectos biológicos, psicossociais, espirituais do indivíduo, mas a intervenção sobre as condições ambientais de vida e de trabalho das comunidades e coletividades.

Há indicativos de que os enfermeiros, gradativamente, vêm se distanciado de concepções naturalistas sobre meio ambiente, e avançando na compreensão de que as mudanças ambientais tanto podem ser afetadas por atividades políticas, econômicas, culturais, sociais e infraestrutura, quanto podem responder por riscos à saúde da população.

Nesta direção, avançam as percepções destes profissionais acerca da relevância das práticas de cuidado em Saúde Ambiental, construídas sob a perspectiva emancipatória e crítica. Entretanto, urge a necessidade de que tais práticas sejam sistematizadas e legitimadas pelas instituições de saúde e que as instituições de formação sejam locais onde se devem deflagrar este movimento.

A utilização de práticas emancipatórias de cuidado em Saúde Ambiental pelos enfermeiros, possibilita a capacitação da comunidade e dos membros de sua equipe de saúde, para o conhecimento das formas de garantir os direitos ambientais que se constituem em direitos à saúde.

O enfermeiro, como agente educador, deve oferecer práticas de empoderamento e responsabilidade socioambiental compartilhada, com vistas ao resgate de um ideário de bem-estar ecológico. Isso permitirá, possivelmente, a consolidação de atitudes humanas ativas para a transformação e melhoramento da qualidade ambiental e de vida humana.

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EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Marcia Magro

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    15 Jun 2018
  • Aceito
    03 Maio 2019
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