Avaliação em saúde: avaliabilidade de serviços de saúde para pessoas com ostomia

RESUMO

Objetivos:

realizar Estudo de Avaliabilidade do Serviço de Atenção às pessoas com ostomia no Brasil.

Métodos:

empregou-se metodologia qualitativa, com abordagem colaborativa dos atores envolvidos no serviço, baseada nos sete elementos propostos por Thurston e Ramaliu, que incluem a modelização do serviço e proposta de modelo avaliativo. Utilizou-se análise documental, observação direta, oficinas de consenso e entrevistas com informantes-chave.

Resultados:

foi realizada a descrição e a construção do modelo teórico-lógico do serviço de atenção às pessoas com ostomia, a elaboração das perguntas avaliativas, a construção da matriz de análise e julgamento, e apresentada proposta de avaliação.

Consideraç

ões Finais: verificou-se que é viável a avaliação sistemática do serviço a partir de elementos estruturantes, tais como sua teoria, recursos materiais e humanos. A avaliação proposta almeja fornecer subsídios para melhoria da qualidade da atenção.

Descritores:
Avaliação em Saúde; Ostomia; Política Pública; Práticas Interdisciplinares; Serviços de Saúde

ABSTRACT

Objectives:

to perform an evaluation study of the Ostomy Care Service in Brazil.

Methods:

a qualitative methodology was used, with a collaborative approach of the participants using the service, based on the seven elements proposed by Thurston and Ramaliu, which include service modeling and evaluation model proposal. Document analysis, direct observation, consensus workshops, and interviews with key informants were used.

Results:

the description and construction of the theoretical-logical model of the ostomy care service, the development of evaluative questions, the construction of the analysis and judgment matrix, and the evaluation proposal were presented.

Final Considerations:

it was found that it is feasible to systematically evaluate the service based on its structural elements, such as its theory, material and human resources. The proposed evaluation aims to provide support for improving the quality of care.

Descriptors:
Health Evaluation; Ostomy; Public Policy; Interdisciplinary Placement; Health Services

RESUMEN

Objetivos:

realizar un estudio de evaluación del Servicio de Atención de Ostomía en Brasil.

Métodos:

se utilizó una metodología cualitativa, con un enfoque colaborativo de los actores involucrados en el servicio, basado en los siete elementos propuestos por Thurston y Ramaliu, que incluyen el modelo de servicio y la propuesta de modelo de evaluación. Se utilizaron análisis de documentos, observación directa, talleres de consenso y entrevistas con informantes clave.

Resultados:

se presentaron la descripción y construcción del modelo teórico-lógico del servicio de atención de ostomía, la elaboración de las preguntas evaluativas, la construcción de la matriz de análisis y juicio y la propuesta de evaluación.

Consideraciones Finales:

se encontró que es factible evaluar sistemáticamente el servicio a partir de elementos estructurales, como su teoría, materiales y recursos humanos. La evaluación propuesta tiene como objetivo proporcionar apoyo para mejorar la calidad de la atención.

Descriptores:
Evaluación en Salud; Estomía; Política Pública; Prácticas Interdisciplinarias; Servicios de Salud

INTRODUÇÃO

Pessoas com ostomia são aquelas submetidas a uma intervenção cirúrgica com exteriorização do sistema digestório, respiratório ou urinário, criando um orifício externo denominado "ostoma"⁽¹⁾. Embora não existam dados definitivos sobre o número de estomizados no país, algumas estimativas podem ser feitas a partir de informações publicadas pelo Ministério da Saúde e em boletins ou revistas das associações dos estomizados, brasileiras e internacionais. De acordo com Santos⁽²⁾, a International Ostomy Association estima a prevalência de 1 estomizado por 1.000 habitantes em países com um bom nível de assistência médica. A autora projetou uma estimativa de 170 mil estomizados no Brasil, com base no censo demográfico de 2000.

Para o enfrentamento dessa situação, o Ministério da Saúde publicou a Portaria GM/SAS/MS nº 400/2009, estabelecendo as Diretrizes Nacionais para a Atenção à Saúde das Pessoas com Ostomia no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)⁽¹⁾. Tais diretrizes têm o objetivo de realizar ações de orientação para o autocuidado, prevenção de complicações nas ostomias e fornecimento de equipamentos coletores e adjuvantes de proteção e segurança nos serviços de atenção classificados como serviços Tipo I e Tipo II⁽¹⁾. Além das ações comuns aos dois tipos, o serviço de atenção do Tipo II inclui tratamentos cirúrgicos com equipe de saúde mais abrangente.

A pessoa com ostomia é considerada pessoa com deficiência⁽³⁾, portanto os serviços de atenção às pessoas com ostomia são integrantes da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência⁽⁴⁾. Essa rede considerou a necessidade de ampliar e diversificar os serviços do SUS para as pessoas com deficiência física, auditiva, intelectual, visual, ostomias e múltiplas deficiências, organizados na atenção especializada⁽⁴⁾.

No estado do Rio de Janeiro, foram definidos os serviços que compõem a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência⁽⁵⁾. Os Centros Especializados de Reabilitação (CER) são organizados como CER II, III ou IV conforme composição por 2, 3 ou 4 tipos de deficiência atendidos, respectivamente⁽⁴⁾. O município de Niterói conta com o serviço de atenção à pessoa com ostomia (SAPE) tipo II, habilitado em apenas um serviço de reabilitação, que não está credenciado como CER^(4-5). A avaliação da atenção da pessoa com ostomia faz parte das diretrizes nacionais e tem como premissa refletir a realidade, buscando o aprimoramento das ações de cuidado em saúde⁽¹⁾.

Estudo de avaliabilidade

A avaliabilidade, traduzida como "em que medida o programa pode ser avaliado", é o exame sistemático e preliminar de um programa, em sua teoria e prática, com a finalidade de determinar se há justificativa para avaliação do programa, bem como identificar áreas críticas a serem priorizadas na avaliação⁽⁶⁾. Os estudos de avaliabilidade (EA) constituem um conjunto de procedimentos que precedem a etapa da avaliação, para que esta seja desenvolvida com maior facilidade, maximizando seus potenciais e favorecendo também a racionalização de recursos, frequentemente escassos para o processo avaliativo. Busca uma descrição coerente da intervenção, seguida de um plano para a avaliação, tornando-a mais consistente e com maior credibilidade. O EA possibilita uma descrição completa do programa, elaboração dos modelos lógico e teórico, das questões fundamentais a serem abordadas pela avaliação, de um plano de avaliação e do acordo entre as partes interessadas, podendo servir de proposta de avaliação formal do programa^(7-8).

Thurston e Ramaliu⁽⁷⁾ propõem a avaliabilidade como uma ferramenta participativa para o planejamento de avaliações, incluindo a identificação da documentação do programa existente referente aos objetivos e atividades do programa como um elemento valioso. O EA pode ser visto como uma avaliação formativa que utiliza métodos sistemáticos de pesquisa. Nesse sentido, os estudos de avaliabilidade são particularmente valiosos para os gestores que desejam promover o desenvolvimento organizacional, pois geram a aprendizagem e a melhoria na vida institucional⁽⁷⁾.

A fim de subsidiar os gestores no processo de avaliação das ações voltadas à pessoa com ostomia e reunir informações para a tomada de decisões acerca das melhorias dessa intervenção, utilizou-se o EA, identificando-se a teoria dessa intervenção, a viabilidade da avaliação e o seu planejamento.

OBJETIVOS

Realizar o estudo de avaliabilidade do Serviço de Atenção à Pessoa com Ostomia (SAPE). E, como objetivos específicos: construir um modelo avaliativo do programa e propor recomendações para o planejamento de pesquisas avaliativas futuras.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Antônio Pedro, com Parecer nº.1.795.572, de 27/10/2016 (CAAE: 59600.516.8.0000.5243). Após a apresentação dos objetivos da pesquisa e mediante os devidos esclarecimentos, era solicitado o consentimento do participante por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Tipo de estudo

Estudo com abordagem colaborativa⁽⁹⁾ baseado nos sete elementos propostos por Thurston e Ramaliu⁽⁷⁾: (E1) delimitação do programa e identificação de suas metas, objetivos e atividades; (E2) identificação e análise dos documentos da intervenção a ser avaliada; (E3) construção do modelo lógico do programa; (E4) supervisão do programa ou entendimento preliminar de como o programa opera; (E5) desenvolvimento de um modelo teórico de avaliação; (E6) identificação dos usuários e envolvidos na avaliação; e (E7) definição de procedimento de avaliação.

Procedimentos metodológicos

A pesquisa foi realizada no período de julho de 2017 a janeiro de 2018, no SAPE do município de Niterói. Os diversos atores envolvidos na intervenção e interessados na avaliação (stakeholders) participaram nas sete etapas citadas. Os avaliadores criaram, intencionalmente, um ambiente de parceria entre avaliadores e stakeholders, numa abordagem colaborativa para fortalecer o desenho avaliativo, ampliar a coleta de informações e a compreensão dos resultados por parte de todos, de forma a aumentar sua utilização⁽⁹⁾. A operacionalização do estudo ocorreu por meio das seguintes etapas: análise documental (E1-E2), observação direta (E4), entrevistas com informantes-chave (E4), elaboração do modelo teórico-lógico (MTL) (E3) e da matriz de análise e julgamento (MAJ) (E5). O MTL permite, ainda, documentar o sentido de um programa, conceitualizando os vínculos entre as estruturas, os processos e os resultados^(10-11). A MAJ é uma ferramenta fundamental para avaliação, pois possibilita o julgamento do programa a partir dos critérios ou indicadores e pontuações pré-estabelecidas, bem como delimita as fontes de verificação da informação com base em dados primários e secundários.

Fontes de dados

A descrição do programa, entendido neste estudo como o SAPE, e a construção do modelo lógico contaram com a análise documental, a observação direta das ações desenvolvidas no Polo de Atenção em Niterói e entrevistas com informantes-chave. Para a análise documental, foram utilizados os documentos técnicos institucionais (normas e portarias nacionais específicas para a atenção à pessoa com ostomia) e os documentos do SAPE (registros informatizados; fichas individuais dos usuários; protocolos disponíveis; livro de registro de capacitações dos profissionais; relatórios de gestão, relatórios de atividades; planilhas; pareceres técnicos). A escolha dos documentos seguiu os princípios básicos de Richardson: exaustividade, representatividade, homogeneidade e adequação⁽¹²⁾. O instrumento de coleta dos dados para a análise documental teve como critérios: existência dos objetivos do programa, público-alvo, metas a serem alcançadas, ações/atividades que precisam ser realizadas para operar o programa, recursos necessários para a realização das ações e resultados a serem alcançados⁽¹³⁾. Foram informantes-chave, num total de oito entrevistados: a) gestor municipal; b) técnicos de nível superior (coordenador do serviço, enfermeira e assistente social); c) estomaterapeuta; d) especialistas na área de avaliação em saúde (enfermeiros). Foi utilizado um roteiro semiestruturado para as entrevistas, as quais foram gravadas e transcritas na íntegra, e as informações coletadas foram organizadas em categorias e analisadas, com uso da técnica de análise de conteúdo⁽¹⁴⁾.

Para validar o MTL e desenvolver a MAJ, foram realizadas duas oficinas com especialistas (E6-E7) e sujeitos do serviço interessados na avaliação. Na primeira oficina, os especialistas esclareceram os resultados esperados e propuseram os indicadores da matriz de maneira a atender ao objetivo de avaliação dos resultados alcançados pelo SAPE. O MTL foi estruturado a partir da literatura técnica e científica^(8,13) sobre a temática e análise documental^(1,4). Levou-se em consideração o contexto social no qual a intervenção encontra-se inserida, sendo extensamente discutido com os coautores deste estudo e profissionais de saúde com experiência no tema ostomia e na área de avaliação em saúde. A identificação de cada um dos componentes do MTL levou em conta os seguintes questionamentos, propostos em Hartz⁽⁸⁾: A realização de cada atividade é possível a partir dos recursos listados? As atividades propostas atendem aos componentes do programa? As atividades possibilitam o alcance dos resultados? Com os resultados alcançados, é possível mensurar o grau de impacto do programa? Na segunda oficina, foram validados o MTL e a MAJ, com a seleção de suas dimensões, critérios e indicadores. O processo de decisão por consenso foi obtido a partir da concordância de todos os participantes. Em seguida, foi elaborada a MAJ constando de componentes, padrão, resultados e fonte de verificação. A MAJ (Quadro 2) considerou as pontuações máximas da dimensão "implantação", resultante do somatório do grupo de indicadores de cada componente (Σ dos pontos dos indicadores). Para a pontuação máxima (PM), foram consideradas como padrão as metas preconizadas pelas diretrizes nacionais, além das considerações dos envolvidos na implantação do projeto. Para definição da pontuação observada, quando para o mesmo critério ou indicador houver pontuação por mais de uma base de evidência, considerou-se a pontuação verificada nos documentos. Na ausência desta, foi considerada a pontuação predominante. Os componentes foram escolhidos tendo em vista as atividades, a estrutura e os resultados previstos do programa, tomando-se como padrão o que está normatizado nos documentos oficiais^(1,4). A fonte de verificação refere-se ao local e/ou atores de onde os dados foram coletados. Foi, ainda, realizada a triangulação dos dados obtidos mediante as fontes primárias (entrevistas e observação direta) e da análise documental. A triangulação possibilitou verificar que diferentes métodos de coleta de dados encontraram achados semelhantes, reforçando a sua legitimidade⁽¹⁵⁾.

Quadro 2
Matriz de Análise e Julgamento do contexto de implantação do Serviço de Atenção à Pessoa com Ostomia, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

Componente - Organização e planejamento
Categoria	Critério/Indicador	P	PM	FV
Recursos humanos	Coordenador e/ou demais profissionais com especialização em saúde pública ou experiência no serviço há mais de 2 anos	5	15	AD; E.
	Equipe mínima para as ações de atenção (1 enfermeiro, 1 médico e 1 assistente social)	5
	Ao menos um técnico para apoio administrativo	5
Recepção e cadastro	Sala de recepção e cadastro, mesa de apoio e cadeira	1	3	AD; OD.
	Sala de recepção e cadastro, mesa de apoio, cadeira e computador	2
	Sala de recepção e cadastro, mesa de apoio, cadeira, computador e telefone	3
Consultório	Maca com revestimento impermeável	1	10	AD; OD.
	Escadinha de dois degraus	1
	Pia para lavagem das mãos, dispensador de sabão líquido e papel-toalha	1
	Banheiro exclusivo e com ducha higiênica	1
	Presença de espelho com dimensões mínimas de 120×50 cm	1
	Esfigmomanômetro e estetoscópio	1
	Termómetro	1
	Material de curativo	1
	Material de Higiene e limpeza do ostoma	1
	Material de irrigação	1
Área de estocagem para os insumos coletores	Armário com portas fechadas	3	3	AD; OD.
	Estantes com prateleiras abertas	2
Qualidade técnica dos equipamentos	Equipamentos dentro do prazo de validade	2,5	5	AD; OD.
	Registro de controle de entrada e saída de material	2,5
Insumos coletores e adjuvantes	Distribuição mensal de insumos coletores e adjuvantes suficientes ao longo do último ano	10	10	AD; OD, E.
	Falta de insumos coletores e adjuvantes suficientes ao longo do último ano, prejudicando a entrega aos usuários por período de até dois meses	3
	Falta de insumos coletores e adjuvantes suficientes ao longo do último ano, por período superior a dois meses	2
Sala de reuniões para atendimento em grupo	Sala destinada à reunião para atendimento em grupo	2	2	AD; OD, E.
Normas, prontuários e protocolos disponíveis	Presença de normas, prontuários e protocolos	1	1
Planejamento quantitativo e qualitativo dos equipamentos coletores e adjuvantes	Ausência de reunião para planejamento anual	0	2	AD; E.
	Uma ou mais reuniões anuais de planejamento	2
Cadastro de usuários no SER	Ausência de cadastro de usuários no SER	0
	Comprovação de cadastro de usuários no SER	2
Qualidade dos registros	Ausência de registro do controle e histórico dos usuários, em meio digital	0	3	AD; OD.
	Presença de registro do controle e histórico dos usuários, em meio digital com completitude acima de 75% dos campos	3
	Presença de registro do controle e histórico dos usuários, em meio digital com completitude, abaixo de 75% dos campos	2
Componente - Assistência à Saúde
Categoria	Critérios ou Indicadores	P	PM	FV
Dispensação (agendamento e/ou demanda espontânea)	Dispensação oportuna das bolsas e adjuvantes suficientes para período de 30 dias ou mais	10	10	AD; OD; E.
	Ausência de bolsas e adjuvantes suficientes para dispensação por período de 30 dias	0
Consultas com assistente social	100% das consultas agendadas para o mesmo mês	2,5	5	AD; OD; E.
	100% das consultas realizadas por demanda espontânea	2,5
Assistência de estomaterapia	100% das consultas agendadas para o mesmo mês	2,5	5
	100% das consultas realizadas por demanda espontânea	2,5
Assistência médica	100% das consultas agendadas para o mesmo mês	2,5	5
	100% das consultas realizadas por demanda espontânea	2,5
Apoio nutricional	100% das consultas agendadas para o mesmo mês	2,5	5
	No mínimo, 50% das consultas realizadas por demanda espontânea	2,5
Tratamento e/ou encaminhamento das complicações do ostoma	Presença de médico, para atendimento das complicações	5	10	AD.
	Presença de enfermeiro, para atendimento das complicações	5
	Ausência de referências especializadas para as complicações do ostoma	0
Componente - Educação Permanente e Formação
Categoria	Critérios ou Indicadores	P	PM	FV
Grupos de autocuidado	Ausência de reuniões de grupos de autocuidado	0	3	AD; E.
	Pelo menos uma reunião de grupos de autocuidado a cada dois meses	2
	Uma reunião mensal de grupos de autocuidado	3
Conhecimento de instrumentos legais	Ausência de conhecimento sobre instrumentos legais que regem os serviços de atenção	0	3	AD; E.
	Ao menos o coordenador com conhecimento sobre instrumentos legais que regem os serviços de atenção	2
	Todos os profissionais com conhecimento sobre instrumentos legais que regem os serviços de atenção	3
Participação em cursos de capacitação	Ausência de capacitação de técnicos, promovida por qualquer nível de gestão, referentes ao serviço	0	3	AD; E.
	Capacitação de 10% dos técnicos, promovida por qualquer nível de gestão, referentes ao serviço, nos últimos 2 anos	2
	Capacitação de mais de 10% dos técnicos, promovida por qualquer nível de gestão, referentes ao serviço, nos últimos 2 anos	3

Fonte: Documentos oficiais e técnicos.
• Nota: P - Parâmetro; PM - Pontuação Máxima; AD - Análise Documental; E - Entrevista; FV - Fonte de Verificação.

RESULTADOS

Os resultados encontrados foram descritos tendo como base os sete elementos (E1, E2, E3, E4, E5, E6 e E7).

E1 - Delimitação do programa e identificação de suas metas, objetivos e atividades

Embora não seja constituído como um programa, o SAPE está normatizado, com o objetivo de realizar ações de orientação para o autocuidado, prevenção de complicações nas ostomias e fornecimento de equipamentos coletores e adjuvantes de proteção e segurança.

Verificou-se que, apesar de as metas não estarem definidas claramente nas diretrizes nacionais, a assistência integral e especializada de natureza interdisciplinar às pessoas com ostomia foi entendida pelos diversos participantes desta pesquisa como a meta da intervenção. Os objetivos identificados foram: orientar para o autocuidado; implementar ações de prevenção de complicações nas ostomias; fornecer equipamentos coletores e adjuvantes de proteção e segurança; dispor de equipe multiprofissional, equipamentos e instalações físicas adequadas.

E2 - Identificação e análise dos documentos do SAPE

Os documentos técnicos institucionais e seus principais objetivos encontram-se apresentados no Quadro 1. Tais documentos apresentam coerência bem como fundamentam e articulam diretrizes e conceitos da atenção às pessoas com ostomia.

Quadro 1
Documentos do Serviço de Atenção à Pessoa com Ostomia e seus principais objetivos

Documento	Ano	Principais deliberações/objetivos
Portaria GM/MS nº 400	2009	Estabelece ações de orientação para o autocuidado, prevenção de complicações nas ostomias e fornecimento de equipamentos coletores e adjuvantes de proteção e segurança.
Portaria GM/MS nº 793	2012	Delibera a ampliação do acesso e qualificação do atendimento às pessoas com deficiência no SUS; Delimita a vinculação das pessoas com deficiência e suas famílias aos pontos de atenção.
Portaria GM/MS nº 835	2012	Contempla o incentivo financeiro para a construção de CER, de oficina ortopédica, reforma ou ampliação para qualificação de CER II, CER III e CER IV, aquisição de equipamentos e outros materiais permanentes.
Portaria GM/MS nº 2.602	2012	Estabelece recurso financeiro para suporte às atividades dos diversos polos de atenção, incorporando-os ao Teto Financeiro de Média e Alta Complexidade (Teto MAC) dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Deliberação CIB-RJ n° 2.790	2014	Atualiza os Polos de Atenção às Pessoas com Ostomia do Estado do Rio de Janeiro.
Livro de registro de atividades	2016 a fev./2018	Registra as atividades diárias do Polo de Atenção, capacitações, reuniões de serviço.
Fichas individuais de dispensação dos insumos	2016 a fev./2018	Registra o quantitativo mensal dos insumos coletores, distribuídos por usuário e agendamento de retorno.

Fonte: documentos oficiais e institucionais da pesquisa

E3 - Construção e desenvolvimento do Modelo Teórico-Lógico

A partir das informações obtidas com a análise documental, observação direta das ações desenvolvidas, oficinas de consenso e entrevistas com os informantes-chave, elaborou-se o MTL da Atenção às Pessoas com Ostomia com base na teoria do programa. O contexto externo onde se insere o SAPE refere-se ao município e sua dinâmica sociodemográfica. O contexto político-organizacional é constituído pela governabilidade e gestão dos serviços de atenção. O contexto de implantação refere-se ao SAPE propriamente, onde as ações de saúde são desenvolvidas. As ações estão representadas pelos componentes do MTL: Organização e Planejamento, Assistência à Saúde e Educação Permanente e Formação.

O componente Organização e Planejamento demanda ações no sistema de saúde, do poder público estadual e municipal e da gestão do serviço, sendo influenciado pelos elementos dos contextos externo e político-institucional. Os componentes Assistência à Saúde e Educação Permanente e Formação também sofrem influências do contexto político-organizacional, no que tange à disponibilização de recursos estaduais e municipais. As ações desenvolvidas nos SAPEs estão inter-relacionadas e são fundamentais para garantir a atenção integral com repercussão na qualidade de vida dos usuários. No componente Educação Permanente e Formação do ML da atenção, foram apontadas as atividades de orientação e capacitação dos profissionais da atenção básica, dos SAPEs e das equipes de saúde das unidades hospitalares. Fazem parte dessas ações as atividades de capacitação quanto à assistência nas etapas pré-operatórias e pós-operatórias das cirurgias que levam à realização de ostomas, incluindo as reconstruções de trânsito intestinal e urinário, assim como o tratamento das complicações pós-operatórias e técnicas especializadas. O MTL, desenvolvido e pactuado com os stakeholders, incluiu objetivos, metas, insumos, atividades, público-alvo e resultados, bem como a relação lógica entre os componentes.

E4 - Descrição da organização e funcionamento do programa

O SAPE de Niterói existe desde 2005, atendendo os usuários do município e da região metropolitana II, constituída pelos municípios de São Gonçalo, Maricá, Itaboraí, Rio Bonito, Silva Jardim e Tanguá. Situa-se nas dependências do Hospital Municipal Orêncio de Freitas, vinculado à Vice-Presidência de Atenção Hospitalar e de Emergência da Fundação Municipal de Saúde de Niterói. As atividades são realizadas nos dias úteis das 8h às 17h. A principal motivação para o comparecimento dos usuários ao serviço é a busca dos insumos coletores. No entanto, essa atividade nem sempre é realizada, devido ao contínuo desabastecimento desses insumos.

Figura 1
Modelo Teórico-Lógico da Atenção às Pessoas com Ostomia de Niterói, Rio de Janeiro, Brasil, 2018

E5 - Construção e desenvolvimento da Matriz de Análise e Julgamento

Os indicadores relativos aos insumos se referiram a recursos humanos, físicos e materiais. A equipe mínima definida pelas diretrizes é de: um médico; um enfermeiro (com capacitação em assistência às pessoas com ostomia); um psicólogo; um nutricionista e um assistente social. Os indicadores relativos aos recursos físicos e materiais foram: consultório clínico, área de estocagem com mobiliário adequado, insumos coletores e adjuvantes suficientes; sala de reuniões; normas, prontuários e protocolos disponíveis.

E6 - Identificação dos usuários e envolvidos na avaliação

Durante as oficinas, os coautores deste estudo, o coordenador e demais profissionais do serviço apontaram como principais usuários envolvidos na avaliação do SAPE de Niterói os usuários do serviço, o gestor municipal e os profissionais do serviço. Verificou-se a participação dos usuários como elemento favorável do contexto externo, com participação da gestão do Serviço, indicando as prioridades para a efetiva implementação das ações.

E7 - Definição de procedimento de avaliação

Os participantes do estudo consideraram a avaliação necessária para a verificação do cumprimento das diretrizes e do alcance dos objetivos do programa bem como para subsidiar a tomada de decisão com base no acompanhamento e adequação das ações realizadas. Foram formuladas as perguntas avaliativas, mediante análise de questões sobre a avaliação do programa contidas nas entrevistas e pactuação dos modelos teórico e lógico. Ao final, foram definidas as seguintes perguntas: (a) Qual é o grau de implantação do SAPE de Niterói? (b) Os contextos político-organizacional e externo influenciaram na implantação do programa? De que maneira? (c) O grau de implantação do SAPE de Niterói influenciou os resultados alcançados?

DISCUSSÃO

O estudo permitiu constatar que os documentos do SAPE apresentam coerência bem como fundamentam e articulam diretrizes e conceitos da atenção.

O incentivo financeiro para aquisição de equipamentos e outros materiais permanentes é repassado pelo Fundo Nacional de Saúde^(16-17). Tais recursos dão suporte às atividades dos diversos polos de atenção⁽¹⁸⁾.

As relações entre objetivos propostos pela intervenção, credenciada e habilitada como polo I e II em 2012, com suas atividades e resultados pretendidos, além da análise contextual, foram elencadas no MTL^(19-20). O uso dos resultados das avaliações do programa foi compartilhado pelas principais partes interessadas na avaliação⁽²¹⁾. Nesse estudo, a construção consensual do MTL foi essencial para o conhecimento da intervenção e futura utilização na avaliação da implantação e dos seus resultados^(22-24). A teoria da intervenção evidenciou sua fundamentação na decisão política que antecedeu a sua operacionalização, como demonstram Silva et al.⁽²⁵⁾⁾ e SOBEST⁽²⁶⁾, apontando que as intervenções são planejadas a partir de problemas evidenciados, considerando o contexto em que se desenvolvem e pelos atores envolvidos no seu planejamento e execução.

Um estudo de revisão sobre modelos lógicos, provenientes de estudos de avaliabilidade, identificou três estudos em que a teoria do programa é usada como estratégia metodológica para a modelização, tornando-se parte necessária para futura avaliação⁽²⁷⁾. Outros EAs que utilizaram MTL e MAJ demonstraram a importância dessa etapa preliminar para o correto desenvolvimento de posteriores avaliações^(28-29).

Quanto à organização e funcionamento do programa, as atividades de orientação e consultas de estomaterapia são as mais presentes. As orientações mais frequentes envolvem os direitos e deveres da pessoa com ostomia, funcionamento do serviço, encaminhamento dos usuários para consultas ambulatoriais com nutricionista, cirurgião e assistência de estomaterapeuta, que inclui orientação para o autocuidado. Um dos aspectos críticos da Portaria 400 é a não inclusão do estomaterapeuta como componente da equipe mínima. Como o enfermeiro estomaterapeuta consta do Código Brasileiro de Ocupação desde 2013, a portaria deveria ter sido atualizada. As atividades integrantes do SAPE convergem com relatos de alguns autores como Moraes⁽¹⁶⁾, para análise diagnóstica SAPE em Minas Gerais e Santos⁽³⁰⁾. Entre elas, destacam-se o cadastro de usuários, dispensação de dispositivos coletores e consultas individuais.

A discussão fundamentada apenas na dispensação dos equipamentos coletores, como cerne da atenção às pessoas com ostomia, encontra eco no estudo de Barros et al.⁽³¹⁾, quanto à necessidade de fornecimento de materiais e equipamentos pelas unidades de saúde aos usuários, para manter a autonomia e compreender o autocuidado como a forma de traduzir a capacidade de vivenciar novos desafios a partir da reelaboração de si⁽³²⁾.

Cabe ressaltar que as políticas públicas de saúde voltadas às pessoas com ostomia devem contemplar o acesso às necessidades de saúde, por meio da garantia dos diversos níveis de assistência, de modo a possibilitar a integralidade da atenção e não apenas a limitação do fornecimento dos equipamentos coletores⁽³³⁾. Apesar de delimitar metas, objetivos e atividades, a Portaria 400 estabelece as diretrizes de atenção a pessoas com ostomia, mas não se constitui um Programa de Saúde Pública.

O estudo de Santos e Sawaia⁽³⁴⁾ analisou o processo de construção e reconstrução dos significados dos conceitos "ostomia" e "papel do enfermeiro no manejo de uma ostomia", após a experiência de uso de bolsa por esses profissionais. A partir da experiência, foram propostas mudanças na prática, de modo a incorporar as dimensões afetivas, simbólicas e relacionais críticas para a gestão do cuidado ao paciente com ostomia. O ensino do autocuidado assegura à pessoa com ostomia a prevenção de complicações do ostoma, possibilitando independência na realização dos seus cuidados em relação à família e aos profissionais de saúde. A ajuda de um profissional mostra-se relevante no processo adaptativo para elucidar indagações e reduzir preocupações relativas à aceitação de uma nova condição^(32,35-36).

Quanto à identificação dos usuários e envolvidos na avaliação, diversos autores^(21,37) destacam o envolvimento amplo das partes interessadas dando prioridade à obtenção dos pensamentos e percepções dos grupos e reconciliando as diferenças, quando necessário. Trevisan⁽²¹⁾ propõe grupos de trabalho no EA, incluindo o avaliador e representantes da equipe do programa e de outros interessados, para aumentar a probabilidade do uso dos achados.

Limitações do estudo

A pesquisa foi restrita a um município da região Sudeste do Brasil. Com isso, sugere-se que outros estudos sejam realizados envolvendo outros serviços. Além disso, as entrevistas realizadas com poucos usuários, devido à pouca frequência no período de coleta de dados e aos poucos profissionais do único polo municipal, também se constituíram como limitações desse estudo.

Contribuições para a saúde pública

Os estudos de avaliabilidade têm o objetivo de preparar avaliações dos serviços de atenção à saúde, pois fornecem subsídios para o planejamento e desenvolvimento de estudos avaliativos. Tais estudos podem tornar-se a base para tomada de decisões visando o aprimoramento ou mudança nos serviços e programas. Importante ressaltar que o desenvolvimento de estudo de avaliabilidade no SAPE, onde o enfermeiro tem papel essencial, pode contribuir como modelo para avaliação nos serviços já implantados nos diversos municípios do país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este EA contribuiu para o entendimento da intervenção e melhor compreensão sobre a concepção e lógica de seu funcionamento. A abordagem colaborativa e a metodologia utilizada atenderam aos objetivos do estudo e possibilitaram a construção de um MTL da intervenção e de uma MAJ, com ampla participação dos interessados, o que pode aumentar o conhecimento e compromisso dos envolvidos na futura utilização dos resultados da avaliação. Os elementos constituintes do MTL mostram, entre si, uma relação de interdependência que permite o alcance dos resultados esperados.

Recomenda-se proceder a uma avaliação formativa embasada no EA que inclua a identificação dos aspectos a serem priorizados para o alcance dos resultados esperados. Destaca-se que o modelo proposto poderá ser revisto. Além disso, enfatiza-se a necessidade de atualizar a portaria em vigor que trata da atenção à pessoa com ostomia, para que passe a constar do texto legal a exigência de estomaterapeuta na equipe mínima.

REFERENCES

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Aparecida Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Alexandre Balsanelli

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  01 Jun 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  18 Out 2018
• Aceito
  04 Set 2019