Tradução e adaptação transcultural do Student Nurse Stress Index para o Brasil

RESUMO

Objetivo:

Adaptar transculturalmente o Student Nurse Stress Index para a realidade brasileira.

Método:

Trata-se de estudo metodológico de tradução e adaptação transcultural. Utilizaram-se uma amostra de especialistas (n = 3) e outra de estudantes de enfermagem (n = 40). Os dados foram coletados com questionário socioeconômico e acadêmico, instrumentos de avaliação e o instrumento traduzido (SNSI-Brasil).

Resultados:

A maioria dos estudantes era do sexo feminino (90,0%), solteiros (87,5%), desempregados (80,0%), estudavam em média 11 horas/semana, dormiam 6 horas/dia e avaliaram como muito boa a face e o conteúdo do instrumento, concordando substancialmente (kappa = 0,74 e p-valor < 0,01). Os juízes apresentaram concordância regular em suas avaliações e o SNSI-Brasil demonstrou uma boa consistência interna (alpha de Cronbach = 0,80).

Conclusão:

O SNSI-Brasil é válido quanto a face e conteúdo e possui uma boa consistência interna, podendo ser comparado às versões utilizadas em outros países.

Descritores:
Estresse Psicológico; Estresse Ocupacional; Estudantes de Enfermagem; Inquéritos e Questionários; Traduções

ABSTRACT

Objective:

to cross-culturally adapt the Student Nurse Stress Index to the Brazilian context.

Method:

this is a methodological study of translation and cross-cultural adaptation. We used a sample of specialists (n = 3) and nursing students (n = 40). Socioeconomic and academic questionnaires were used for data collection, assessment and the translated instrument (SNSI-Brazil).

Results:

most students were female (90.0%), single (87.5%), unemployed (80.0%), they studied on average 11 hours per week, slept 6 hours per day; and rated the face and the content of the instrument as very good, agreeing substantially (kappa = 0.74 and p-value < 0.01). The judges showed regular agreement in their assessments, and the SNSI-Brazil showed a good internal consistency (Cronbach’s alpha = 0.80).

Conclusion:

The SNSI-Brazil was validated for face and content, has a good internal consistency if compared to versions used in other countries.

Descriptors:
Stress, Psychological; Occupational Stress; Students, Nursing; Surveys and Questionnaires; Translations

RESUMEN

Objetivo:

adaptar transculturalmente la Escala de Estrés de los Estudiantes de Enfermería (SNSI, sigla en inglés) a la realidad brasileña.

Método:

se trata de un estudio metodológico de traducción y adaptación transcultural. Se utilizó una muestra de especialistas (n = 3) y otra de estudiantes de enfermería (n = 40). Los datos se recogieron con cuestionarios socioeconómico y académico, instrumentos de evaluación y el instrumento traducido (SNSI-Brasil).

Resultados:

el 90% de los estudiantes era del sexo femenino, el 87,5% era soltero, el 80,0% estaba desocupado, el promedio semanal de estudio era de 11 horas/semana, las horas de sueño, 6 horas/día; se evaluó la fisonomía y el contenido del instrumento como muy bueno, de común acuerdo (kappa = 0,74 y p-valor < 0,01). Los jueces estuvieron prácticamente de acuerdo en sus evaluaciones y la SNSI -Brasil mostró una buena consistencia interna (alfa de Cronbach = 0.80).

Conclusión:

La SNSI-Brasil es válida en términos de expresión y contenido, con una buena consistencia interna, equiparándose con las versiones utilizadas en otros países.

Descriptores:
Estrés Psicológico; Estrés Ocupacional; Estudiantes de Enfermería; Encuestas y Cuestionarios; Traducciones

INTRODUÇÃO

Dentre os trabalhadores da saúde, alguns grupos são mais afetados pelo estresse como, por exemplo, os que trabalham nas unidades de terapia intensiva e os da unidade cirúrgica, por causa das condições específicas e exigências dos seus ambientes de trabalho. Algumas dessas condições são o ambiente em si, as condições críticas dos pacientes, a alta responsabilidade e o grau elevado de exigências quanto às competências e habilidades^(1-2).

Mais especificamente, a enfermagem tem sido alvo de estudos relacionados ao estresse. A enfermagem como profissão é reconhecida há mais de meio século e considerada, até então, como uma das mais estressantes. Portanto, o estresse na enfermagem tem sido amplamente estudado em diferentes contextos da assistência, desde a atenção primária até a alta complexidade, mas ainda merece destaque pelas peculiaridades presentes na atividade profissional, as diferenças regionais no modelo de assistência e os recursos de gerenciamento na estratégia de trabalho^(1,3-4).

O estresse entre os estudantes vem sendo cada vez mais estudado, pois os universitários passam por uma construção do seu conhecimento profissional e, nesse processo, acabam vivenciando situações e sentimentos que geram angústias, temores e frustrações, os quais desencadeiam patologias⁽⁵⁾.

Nos cursos da área de saúde, o currículo possui atividades práticas nas quais os estudantes são testados quanto ao conhecimento que adquiriram durante as aulas teóricas. Consequentemente, esses estudantes experimentam elevados níveis de estresse, sobretudo aqueles que cursam a graduação em Enfermagem, pela maior proximidade com os pacientes e seus problemas de saúde, pois, embora ainda não tenham as responsabilidades de um enfermeiro, precisam se adaptar à rotina da faculdade, que inclui provas, aulas práticas e estágios (experiências vivenciadas)⁽⁵⁾.

Na percepção dos estudantes de enfermagem, existe uma influência negativa do estresse na sua vida acadêmica, pois as situações estressoras que vivenciam durante o curso os deixam mais irritados, ansiosos, com baixa autoestima e/ou desestimulados, o que leva a uma queda na performance acadêmica e, também, a uma maior suscetibilidade à depressão e às suas consequências⁽⁶⁾.

Contudo, não apenas estressores do ambiente acadêmico, mas também socioeconômicos, são comuns a essa população e estão relacionados ao estresse: sexo feminino, idade entre 18-29 anos, ter filhos e situação ocupacional, por exemplo⁽⁵⁾.

Existem três formas de medir o estresse: a primeira é direcionada à presença de agentes estressores específicos; a segunda, aos sintomas físicos e psicológicos do estresse; e a terceira é relativa à percepção de estresse individual de forma global, independentemente dos agentes estressores⁽⁷⁾.

Dentre esses instrumentos de medida, destaca-se o uso do Student Nurse Stress Index (SNSI) que foi construído por Jones & Johnston (1999) no Reino Unido e mede o estresse através da presença de agentes estressores específicos. É uma adaptação do Inventário de Estresse, de Beck & Srivastava (1991), com mais 15 novos itens, resultando em um instrumento de 22 variáveis com uma estrutura simples, incluindo quatro categorias: “Academic load”, “Clinical sources”, “Interface worries” e “Personal problems”⁽⁸⁾.

As respostas dos itens do SNSI estão em uma escala do tipo likert e variam de 1 (= nada estressante) a 5 (= extremamente estressante). O instrumento tem sido utilizado em diversos estudos e demonstrou congruência entre fatores de amostra cruzada, boa confiabilidade interna e validade concorrente e discriminante⁽⁹⁾.

Assim, em face da epidemiologia do estresse e da escassez de instrumentos que podem ser utilizados para avaliá-lo no Brasil na população de estudantes, objetivou-se a adaptação transcultural do SNSI para a realidade brasileira.

OBJETIVO

Adaptar transculturalmente o Student Nurse Stress Index para a realidade brasileira.

MÉTODO

Aspectos éticos

O projeto deste estudo foi aprovado, sendo sua realização na instituição em questão autorizada pela Chefe do departamento. Os riscos foram mínimos, englobando a possibilidade de constrangimento e/ou desconforto em relação a algumas perguntas do instrumento (versão traduzida do SNSI), os quais foram minimizados mediante esclarecimentos feitos pelas pesquisadoras.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo do tipo metodológico que seguiu de acordo com a metodologia proposta por Beaton et al. (2007), observando-se os critérios do protocolo COSMIN^(10-11).

A coleta de dados ocorreu em duas etapas durante o segundo semestre de 2018, nos meses de outubro e novembro, em uma Instituição Federal de Ensino Superior (IFES) no estado do Piauí que possui o curso de graduação em Enfermagem. A primeira etapa deu-se por meio da aplicação dos instrumentos de avaliação da versão traduzida ao Comitê de Especialistas. Na segunda etapa, foi feita a aplicação do instrumento traduzido (com as correções sugeridas pelo comitê), o de dados sociodemográficos e acadêmicos e o de avaliação do questionário traduzido na amostra de estudantes de enfermagem pelas próprias pesquisadoras.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

A população de referência foi constituída por 293 estudantes de graduação em enfermagem. O tipo de amostragem utilizado foi não probabilístico acidental, constituída pelos participantes que estavam presentes no local de estudo no momento da coleta de dados.

Na etapa de pré-teste, foi utilizada uma amostra selecionada por conveniência de 40 estudantes, que correspondeu a 13,6% da população total. Os critérios de inclusão foram os seguintes: ter 18 anos ou mais e estar cursando pelo menos o segundo ano do curso de enfermagem. Não fizeram parte da pesquisa, como critério de exclusão, aqueles que estavam afastados por algum motivo como, por exemplo, licença maternidade ou médica.

Protocolo do estudo

Inicialmente, foi solicitada a permissão para a tradução e adaptação transcultural do instrumento denominado Student Nurse Stress Index, sendo concedida pelo seu autor principal. O processo de tradução e adaptação transcultural aconteceu de acordo com os passos propostos por Beaton et al. (2007), que são descritos a seguir⁽¹⁰⁾.

O Primeiro Passo foi a tradução forward ou tradução da língua estrangeira (inglês) para a língua desejada (Português-BR) por dois tradutores bilíngues que têm como língua materna o português (BR). Além disso, cada tradutor incluiu comentários relacionados às frases com ambiguidades e/ou incertezas, juntamente com a justificativa para a escolha final de cada item.

Vale ressaltar aqui que todos os tradutores participantes do estudo foram selecionados de acordo com indicações e análise de currículo, incluindo apenas aqueles com experiência com traduções e/ou com formações em área relacionadas.

O Segundo Passo consistiu na síntese e consenso das duas traduções realizadas pelas pesquisadoras, que foram mediadoras na discussão sobre as diferenças encontradas em cada tradução, por possuírem domínio e proficiência nos dois idiomas (português e inglês). Assim, a partir do instrumento original, da versão do primeiro tradutor e do segundo tradutor, foi produzida uma síntese que resultou em uma tradução comum.

O Terceiro Passo (tradução backforward ou retrotradução) consistiu na tradução da versão pré-final do instrumento (em português) para o idioma original (inglês), cuja finalidade foi garantir que a versão traduzida fosse fidedigna ao conteúdo da versão original, ressaltando-se ambiguidades ou erros conceituais no processo de tradução, conforme recomendações de Beaton et al. (2007).

Outros dois tradutores bilíngues que têm a língua inglesa como língua materna e que não conheciam a versão original traduziram a versão pré-final para o idioma original, resultando em outras duas traduções que foram sintetizadas em apenas uma pelas pesquisadoras.

O Quarto Passo foi a formação do Comitê de Especialistas, que teve como objetivo rever as versões (original e as versões traduzidas) para chegar a um consenso sobre qualquer discrepância encontrada, alcançando equivalência entre a versão traduzida e a versão original, de modo a desenvolver a versão pré-final do instrumento para o teste de campo (pré-teste). Essa equivalência pode ocorrer nas seguintes áreas:

• Semântica - verifica a manutenção do significado das palavras, baseando-se na avaliação do vocabulário e da gramática de cada item, isto é, se as palavras possuem os mesmos significados;

• Idiomática - verifica a equivalência das expressões coloquiais após a tradução, sempre preservando o significado original. Algumas palavras, termos e expressões idiomáticas são complexas de traduzir e, caso ocorressem dificuldades na compreensão de algum ponto, foi solicitado que o juiz sugerisse termos ou expressões idiomáticas equivalentes;

• Cultural - leva em consideração a cultura, a contextualização, experiências vividas pela população alvo em nosso contexto cultural;

• Conceitual - verifica palavras e conceitos, pois algumas palavras podem ser equivalentes quanto ao significado, mas em relação ao conceito pode não ocorrer, por isto a coerência do item em relação àquilo que se propõe a medir, já que palavras, frases ou expressões podem ter equivalência semântica e ser conceitualmente diferentes.

O Quinto Passo tratou-se da aplicação da versão pré-final do Student Nurse Stress Index - Brasil na população alvo, neste caso uma amostra de 40 estudantes de enfermagem de uma IFES. A realização desse pré-teste é essencial, pois permite ao pesquisador avaliar a adequação da forma de coleta de dados, detectar problemas relacionados ao conteúdo ou organização do instrumento e, ainda, estimar a sua confiabilidade e validade⁽¹²⁾.

Nessa fase, após a aplicação da versão pré-final, cada participante também respondeu a dois questionários: um sobre variáveis sociodemográficas e acadêmicas; e outro cujo objetivo era investigar a opinião dos estudantes sobre o Student Nurse Stress Index - Brasil em geral, os itens individualmente e suas sugestões sobre ele. Esse estágio fornece informações úteis sobre como uma pessoa individualmente interpreta os itens do questionário, além da medida para a validade de face e conteúdo do instrumento.

O Sexto Passo foi a Submissão da documentação ao Comitê de Especialistas. Nessa fase, toda a documentação relativa ao processo de tradução e adaptação foi apresentada ao comitê de especialistas. Este verificou se todos os estágios recomendados para esse processo foram seguidos e se os relatórios foram fidedignos. Após a análise, o Comitê decidiu que o processo de tradução e adaptação transcultural estava aprovado e que o instrumento poderia ser disponibilizado para uso. A Figura 1, a seguir, apresenta um esquema resumo do processo adotado durante este estudo.

Figura 1
Síntese do processo de tradução e adaptação transcultural

Nota: T1 - Tradução 1; T2 - Tradução 2; T1-2 - Consolidado das traduções 1 e 2; RT1-2 - Consolidado das retrotraduções 1 e 2; RT1 – Retrotradução 1; RT2 – Retrotradução 2.

Análise dos resultados e estatística

Os dados coletados foram organizados em banco de dados digitado em planilha do Software Excel e, posteriormente, exportados para o software IBM SPSS versão 20 para análise estatística. Inicialmente, foram realizadas análises descritivas dos dados e, posteriormente, cálculos do coeficiente Kappa e do Alpha de Chronbach. Foram utilizados dois tipos de coeficiente Kappa: o coeficiente Kappa de Cohen, que é uma medida de associação utilizada para medir a concordância entre as respostas de dois avaliadores; e o Fleiss Kappa, que possui a mesma finalidade, mas pode ser utilizado para mais de dois avaliadores^(13-14).

RESULTADOS

Durante a produção da síntese do processo de tradução forward do Student Nurse Stress Index por dois tradutores independentes e da versão consensual desse processo, foram observados alguns questionamentos. Para os itens 08 e 16 do instrumento, um dos tradutores levantou algumas questões que foram sanadas no momento da consolidação das traduções: se o termo course se referia a uma disciplina ou ao curso como um todo; e para clients sugeriu que poderia ser utilizado como tradução para as expressões “pacientes” e “usuários”, ao invés de clientes. Assim, tendo em vista a atual discussão sobre a utilização e o conceito agregado aos termos “paciente”, “usuário” e “cliente”, as pesquisadoras optaram por manter o termo “paciente”.

Em seguida, a versão consolidada foi enviada para os juízes que a avaliaram quanto às equivalências semântica, idiomática, cultural e conceitual. As tabelas 1 e 2 mostram os valores obtidos com o teste de concordância aplicado entre os juízes.

Sobre a avaliação dos juízes para a versão traduzida do instrumento, de acordo com os critérios de Landis e Koch (1977), na Tabela 1, podemos observar valores significativos de concordância entre os juízes 1 e 2 para equivalência semântica (0,35) e entre os juízes 2 e 3 para a idiomática (0,46), o que indica uma concordância regular e moderada, respectivamente. Na Tabela 2, observou-se que para a equivalência semântica a concordância foi pobre (0,16) e nas equivalências idiomática, cultural e conceitual foi regular (0,27, 0,28 e 0,22, respectivamente)⁽¹⁵⁾.

Tabela 1
Valores do coeficiente Kappa para a concordância entre os juízes nas equivalências semântica, idiomática, cultural e conceitual, Brasil, 2019

Equivalência	Coeficiente Kappa
Semântica	Juiz 1	Juiz 2	Juiz 3
Juiz 1	1
Juiz 2	0,353 *	1
Juiz 3	0,000	0,000	1
Idiomática	Juiz 1	Juiz 2	Juiz 3
Juiz 1	1
Juiz 2	-0,048	1
Juiz 3	-0,069	0,463 *	1
Cultural	Juiz 1	Juiz 2	Juiz 3
Juiz 1	1
Juiz 2	0,000	1
Juiz 3	0,102	0,000	1
Conceitual	Juiz 1	Juiz 2	Juiz 3
Juiz 1	1
Juiz 2	0,083	1
Juiz 3	-0,076	-0,058	1

Tabela 2
Valores do coeficiente Kappa para a concordância entre todos os juízes nas equivalências semântica, idiomática, cultural e conceitual, Brasil, 2019

Equivalência	Valor Kappa
Semântica	0,1639
Idiomática	0,2736
Cultural	0,2844
Conceitual	0,2202

As avaliações dos juízes, seus comentários e sugestões foram levados em consideração para a modificação da versão T1-2, resultando na versão pré-final do instrumento (agora intitulado SNSI - Brasil). Após as modificações realizadas nos itens 04, 08, 09, 10, 15, 16, 17 e 19, o SNSI - Brasil foi submetido a um pré-teste, que foi aplicado em 40 estudantes de enfermagem de uma instituição de ensino superior pública. Esses estudantes também responderam um questionário socioeconômico e acadêmico, além de avaliarem o SNSI - Brasil.

As características sociodemográficas predominantes dos estudantes que avaliaram o instrumento foram: sexo feminino (90%), idade média 22,95 anos, cor parda (62,5%), solteiro (87,5%), natural de Teresina (70%) e residente em Teresina (97,5%), mora com 3 pessoas (em média), sem filhos (87,5%), sem renda e com os gastos financiados pela família ou outros (82,5%), desempregados (80%), renda familiar variando de 1 a 2 salários mínimos (32,5%), seguida por renda maior que 4 salários mínimos (27,5%) (na ocasião da coleta, o salário mínimo era 954 reais).

Com relação às variáveis acadêmicas, observou-se que a maioria dos estudantes estava cursando o sexto período (35%), escolheu o curso de enfermagem por motivo de inserção no mercado de trabalho (39,2%) e por vocação (31,3%), estuda em média 11,38 horas por semana, dorme 5,72 horas por dia, cursa de 3 a 4 disciplinas com carga horária total de 433,25 horas durante o semestre.

O SNSI - Brasil é composto por 22 itens, divididos em 4 categorias, compreendidas por carga acadêmica, fontes clínicas, problemas de interação e problemas pessoais (Academic Load; Clinical Sources; Interface Worries; Personal Problems), que são distribuídas em agrupamentos de questões relacionadas ao cotidiano do estudante de enfermagem. Cada item é avaliado com escala tipo Likert e a pontuação varia de nada estressante = 1 a extremamente estressante = 5. A figura 2 ilustra a distribuição da frequência das respostas para cada categoria.

Figura 2
Distribuição da frequência das respostas para as categorias do Student Nurse Stress Index (SNSI) -Brasil

Para a categoria Carga Acadêmica, observou-se um padrão crescente na distribuição das respostas, indo de “nada estressante” (2,5%) a “extremamente estressante” (34,3%). A categoria Fontes Clínicas obteve a menor frequência de respostas “extremamente estressante” dentre as demais, embora esse valor fosse o mesmo de “nada estressante” (15%).

Na categoria Problemas Pessoais, a frequência das respostas apresentou-se bem similar, exceto apenas para o item “nada estressante” (11,9%). Já para Problemas de Interação, as duas frequências mais elevadas foram de “estressante” (30%) e “extremamente estressante” (29,3%). De uma maneira geral, em todas as categorias foi observado que a maioria das respostas foi de “estressante”, “muito estressante” e “extremamente estressante”.

A confiabilidade do instrumento aplicado foi avaliada por meio do coeficiente Alpha de Cronbach e o valor obtido foi 0,80. As categorias do instrumento também foram avaliadas individualmente, como pode ser observado na Tabela 3, sendo os valores abaixo de 0,70.

Tabela 3
Valores de Alpha de Cronbach para as categorias do Student Nurse Stress Index (SNSI) -BRASIL, Brasil, 2019

Categoria	Alpha de Cronbach
Carga Acadêmica	0,58
Fontes Clínicas	0,64
Problemas Pessoais	0,62
Problemas de Interação	0,67

A concordância entre as avaliações dos estudantes também foi avaliada com o teste Kappa de Fleiss e o valor de Kappa, sendo p-valor obtidos 0,74 e 0 (zero), respectivamente. Em suas avaliações, alguns estudantes investigados também responderam à questão “você gostaria de acrescentar ou substituir algum item do questionário?”, fazendo sugestões com relação a itens que, em suas opiniões, deveriam constar no instrumento, como, por exemplo, Sobrecarga de atividades extraclasse (estudante 06), Uso de substâncias (álcool etc.) (estudante 10), Adicionar questão sobre alimentação (estudante 21), Acrescentar algum item a respeito de deslocamento ao local de trabalho/estágio, como também a respeito de violência (estudante 26), Condição financeira do estudante com relação ao estresse na vida do estudante (estudante 34).

DISCUSSÃO

Em consonância aos resultados da caracterização sociodemográfica e acadêmica dos estudantes, pode-se citar um estudo realizado na Arábia Saudita cuja amostra foi composta por 121 estudantes de enfermagem que apresentaram uma média de idade de 21,4 anos, variando entre 20 e 24 anos. A maioria era solteira (86,8%) e 95,7% estavam desempregados⁽¹⁶⁾.

Um outro, realizado no Brasil com 88 graduandos em bacharelado e licenciatura em enfermagem, verificou que a idade média dos estudantes era de 22,5 anos, com desvio-padrão de 1,07, sendo a maioria dos participantes do sexo feminino (Bacharelado = 96,2% e Licenciatura = 97,2%), solteira (Bacharelado = 93,9 e Licenciatura = 91,7%), católica (Bacharelado = 64,3% e Licenciatura = 84,6%)⁽⁶⁾.

Em um estudo recente, observou-se que alguns desses fatores sociodemográficos estavam associados significativamente com o estresse, que foi apresentado na maioria dos estudantes (64%). Esses fatores compreendem sexo (p<0,010), faixa etária (p<0,029), situação conjugal (p<0,001), presença de filhos (p<0,001), situação ocupacional (p<0,001), custeio dos estudos (p<0,009) e ano em curso (p<0,001)⁽⁵⁾.

Durante a análise dos dados da aplicação do SNSI-Brasil, verificaram-se alguns itens que se destacaram nas respostas. Por exemplo, os itens “Quantidade de matéria a ser aprendida”, “Dificuldade da matéria a ser aprendida”, “avaliações e/ou notas” e “muita responsabilidade”, da categoria carga acadêmica, não foram assinalados como “nada estressante” por nenhum dos estudantes. Além disso, os itens “as atitudes dos pacientes em relação à minha pessoa”, “as atitudes dos pacientes em relação à minha profissão” e “relacionamento com os funcionários da área clínica”, da categoria fontes clínicas, não foram assinalados como “extremamente estressante” por nenhum deles.

Outros estudos com o SNSI observaram que, para a categoria acadêmica, as mulheres e aqueles que não tinham algum outro tipo de formação marcaram um escore mais alto de estresse do que os homens e aqueles com uma formação anterior (p<0,01 e p<0,05, respectivamente)⁽¹⁷⁾. Já Hirsch et al. (2015) destacaram que a formação acadêmica, o déficit de conhecimento prático e a falta de tempo e lazer foram preditores de estresse mais significantes na sua amostra, sendo que, para lidarem com o estresse, esses estudantes utilizavam estratégias como negação e fuga da realidade⁽¹⁸⁾.

Verificou-se também que os itens relativos a fatores intrínsecos ao ambiente acadêmico em que se encontram, como, por exemplo, o suporte da faculdade para os alunos, podem se tornar elementos de proteção contra o estresse e, consequentemente, contra o uso de álcool e outras drogas como forma de enfretamento (coping)^(9,17,19).

Comparando todas as categorias do instrumento, um estudo verificou que os alunos do segundo ano de enfermagem apresentaram maior estresse em todas as categorias do que os alunos do primeiro ano do curso. Alguns fatores podem explicar: estudantes mais experientes possuem maiores demandas profissionais porque a eles são atribuídas maiores responsabilidades; os estudantes criam maiores expectativas com relação a si próprios ao passo que progridem no curso; possuem maior percepção e empatia da situação do paciente devido ao maior conhecimento dos papéis de cuidador⁽¹⁷⁾.

A confiabilidade do SNSI-Brasil obteve valores que indicam uma boa consistência interna (α = 0,80), sendo que as categorias individualmente, apesar de apresentarem valores abaixo de 0,70, possuem uma consistência interna considerada aceitável⁽²⁰⁾.

Em estudo realizado na Turquia, para adaptação e validação do SNSI, o valor do coeficiente alpha foi de 0,86 para o instrumento como um todo e 0,85, 0,83, 0,73 e 0,74, respectivamente, para as categorias problemas pessoais, fontes clínicas, problemas de interação e carga acadêmica⁽²¹⁾.

Alguns outros países também avaliaram a consistência interna do SNSI. Por exemplo, na aplicação do instrumento em estudantes indianos, o valor de alpha foi 0,79, enquanto na Califórnia foi de 0,89, em uma amostra de 154 estudantes^(22-23).

Isso demonstra que o SNSI é uma ferramenta confiável tanto para realidade do Brasil quanto em outros países, visto que um instrumento pode ser considerado confiável se o seu coeficiente Alpha for maior que 0,70⁽²⁴⁾.

Já nas avaliações dos estudantes, os valores obtidos com os testes Fleiss Kappa e Kappa (p-valor = 0,74 e p-valor <0,01, respectivamente) indicam uma concordância substancial entre as avaliações.

Limitações do estudo

O estudo apresentou algumas limitações, como o tempo para a realização do estudo, a comunicação com o autor do instrumento, visto que mora em outro país, e a baixa adesão dos juízes, pois vários foram convidados e apenas alguns responderam ao convite, o que resultou em uma amostra pequena, podendo ter influenciado nos valores de concordância entre os juízes.

Contribuições para a área da Enfermagem

Dentre os benefícios, podemos citar que o conhecimento dos fatores estressores para os estudantes de enfermagem pode servir de suporte para o desenvolvimento de estratégias para o seu enfrentamento, influenciando o desempenho acadêmico e, consequentemente, o desempenho desse profissional quando formado.

CONCLUSÃO

Estudos de adaptação cultural e validação de instrumentos de medida são de suma importância para o desenvolvimento de instrumentos válidos e confiáveis, principalmente quando se pretende comparar os resultados de pesquisas em diferentes culturas.

Instrumentos que avaliam o estresse devem ser bem delineados e possuir propriedades psicométricas adequadas, visto a multidimensionalidade e complexidade desse fenômeno. Sendo assim, antes de ser utilizado em outra realidade, esses instrumentos devem passar por um processo de tradução e adaptação transcultural.

O SNSI é um instrumento que se propõe a medir a intensidade de estresse que alguns fatores relacionados provocam em acadêmicos de enfermagem, englobando o ambiente acadêmico, a prática clínica, as interações pessoais nesses ambientes e os problemas pessoais. O SNSI já foi utilizado em diversos estudos internacionais, demonstrando boa consistência interna e confiabilidade.

No decorrer deste estudo, obteve-se como resultado um instrumento traduzido e adaptado para a realidade brasileira (SNSI - Brasil), com boa consistência interna, confiabilidade e validade de face e conteúdo.

Além disso, os resultados da aplicação do instrumento permitiram uma visualização dos fatores mais estressantes para os estudantes de enfermagem no cenário brasileiro, avaliado como quantidade de matéria a ser aprendida, avaliações e/ou notas, competição entre os colegas de classe, falta de tempo livre, medo de reprovação, muita responsabilidade e não ter tempo suficiente para a família.

O conhecimento desses fatores relacionados ao estresse pode servir de suporte para o planejamento e a implementação de estratégias de enfrentamento do estresse dentro e fora do ambiente acadêmico, o que pode influenciar diretamente no desempenho acadêmico dos estudantes, futuros profissionais que estão sendo formados e, possivelmente, no cuidado que será prestado por eles.

Portanto, algumas etapas ainda precisam ser desenvolvidas. Faz-se necessário um estudo de validação do instrumento traduzido e adaptado com uma amostra maior tanto de juízes como de estudantes, além do estabelecimento de pontos de corte para a avaliação dos escores obtidos com a somatória das respostas dos itens.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  10 Jul 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  20 Ago 2019
• Aceito
  05 Dez 2019