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Atitudes de enfermeiros frente ao envolvimento da família nos cuidados à pessoa com transtorno mental

RESUMO

Objetivo:

Caracterizar as atitudes dos enfermeiros, de Atenção Primária à Saúde, quanto ao envolvimento da família nos cuidados às pessoas com Transtorno Mental.

Métodos:

Estudo correlacional, com 257 enfermeiros do município de São Paulo. Utilizou-se a escala “Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem-Atitudes dos Enfermeiros”. A análise foi realizada com recurso de estatística descritiva e inferencial.

Resultados:

Os escores da escala foram elevados, com valor médio de 82,1 (DP=8,4) favoráveis ao envolvimento das famílias, e estão relacionadas a ser enfermeiro da Estratégia de Saúde da Família (p<0,001), ter recebido conteúdos sobre enfermagem de família na formação/capacitação (p<0,005), carga-horária de trabalho de 40 hs/sem (p<0,005), atuar nas Regiões Oeste, Leste e Centro (p<0,005).

Conclusão:

Os enfermeiros detêm, na sua maioria, atitudes positivas para com o envolvimento das famílias, indicador relevante para a integração destas no processo de cuidado em saúde-doença mental.

Descritores:
Transtornos Mentais; Enfermeiros; Família; Atitude do Pessoal de Saúde; Atenção Primária à Saúde

ABSTRACT

Objective:

To characterize the attitudes of Primary Health Care nurses, regarding the involvement of the family in the care for people with Mental Disorder.

Methods:

Correlational study with 257 nurses from the city of São Paulo. The scale “Importance of Families in Nursing Care- Nurses’ Attitudes” was used. For the analysis, descriptive and inferential statistics were used.

Results:

The scale scores were high, with a mean value of 82.1 (SD=8.4) favorable to the families’ involvement, and are related to being a nurse in the Family Health Strategy (p<0.001), having received education/training in family nursing (p<0.005), the workload of 40 hours/week (p<0.005), working in the West, East and Center Regions (p<0.005).

Conclusion:

Most nurses have positive attitudes towards the involvement of families, a relevant indicator for their inclusion in the health-mental care process.

Descriptors:
Mental Disorders; Nurses; Family; Attitude of Health Personnel; Primary Health Care

RESUMEN

Objetivo:

caracterizar las actitudes de los enfermeros en Atención Primaria de Salud con respecto a la participación de la familia en la atención a las personas con Trastorno Mental.

Métodos:

estudio correlacional con 257 enfermeros de la ciudad de São Paulo. Se utilizó la escala “Importancia de la familia en los cuidados de enfermería: actitudes de las enfermeras”. El análisis se realizó mediante estadística descriptiva e inferencial.

Resultados:

los puntajes de la escala fueron altos, con un valor promedio de 82.1 (DE=8.4) favorables a la participación de las familias, y están relacionados con ser un enfermero en la Estrategia de Salud Familiar (p<0.001), haber recibido contenido sobre enfermería familiar en la educación/formación (p<0.005), carga de trabajo de 40 horas/semana (p<0.005) y trabajar en las regiones Oeste, Este y Centro (p<0.005).

Conclusión:

la mayoría de los enfermeros tienen actitudes positivas hacia la participación de las familias, un indicador relevante para su integración en el proceso de atención de salud-enfermedad mental.

Descriptores:
Trastornos Mentales; Enfermeros; Familia; Actitud del Personal de Salud; Atención Primaria de Salud

INTRODUÇÃO

Evidências teóricas e práticas, sobre a influência da família no bem-estar de seus membros, possibilitam que os enfermeiros as considerem como unidade a ser cuidada e inserida na prática, fundamentada na perspectiva sistêmica(11 Fernandes CS, Gomes JAP, Martins M, Gomes BP, Gonçalves, LHT. The importance of families in nursing care: nurses' attitudes in the Hospital Environment. Rev Enferm Ref. 2015;IV(7):21-30. doi: 10.12707/RIV15007
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). A receptividade dos serviços de saúde quanto à inclusão das famílias nos cuidados evoluiu nas últimas décadas, mas ainda está centrada nos espaços hospitalares e no cuidado individual. Além disso, esse cuidado é embasado no paradigma de doença, biomédico e não foca a família enquanto cliente(22 Cree L, Brooks H, Berzins K, Fraser C, Lovell K, Bee P. Carers' experiences of involvement in care planning: a qualitative exploration of the facilitators and barriers to engagement with mental health services. BMC Psychiatr [Internet]. 2015 [cited 2020 Jan 20];15;(208). https://bmcpsychiatry.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12888-015-0590-y
https://bmcpsychiatry.biomedcentral.com/...
).

Sabe-se que o apoio e envolvimento da família aumentam a qualificação dos cuidados à pessoa com transtorno mental (TM), compreendido aqui enquanto uma manifestação complexa, considerando os aspectos sociais, econômicos, culturais e ambientais do viver, para a pessoa e família(33 Gaino LV, Souza, J, Cirineu, CT, Tulimosky TD. O conceito de saúde mental para profissionais de saúde: um estudo transversal e qualitativo. SMAD Rev Eletrôn Saúde Mental Álcool Drog. 2018:14(2);108-16. doi: 10.11606/issn.1806-6976.smad.2018.149449
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). Entretanto, no campo da saúde mental (SM), desgastes são apontados na relação entre essas famílias e prestadores de serviços de saúde em função de estereótipos negativos impostos à família, que colaboram para sentimentos de vergonha e discriminação(44 Keogh B, Skärsäter I, Doyle L, Ellilä H, Jormfeldt H, Lahti M, et al. Working with families affected by mental distress: stakeholders' perceptions of mental health nurses educational needs. Issues Ment Health Nurs [Internet]. 2017[cited 2020 Jan 20];38(10):822-8. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28745973
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), que culminam em sobrecarga e não reconhecimento do seu potencial de apoio(11 Fernandes CS, Gomes JAP, Martins M, Gomes BP, Gonçalves, LHT. The importance of families in nursing care: nurses' attitudes in the Hospital Environment. Rev Enferm Ref. 2015;IV(7):21-30. doi: 10.12707/RIV15007
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).

Ao envolver as famílias, o enfermeiro contribui para que essas encontrem sentido para a vivência do próprio sofrimento, construam novos significados ao processo saúde-doença, ampliem conhecimentos e desenvolvam habilidades no contexto do cuidar. Tais ações ajudam a melhorar as atitudes positivas de outros profissionais no âmbito da área da SM(55 Cairns V, Reid G, Murray C. Family member's experience of seeking help for first-episode psychosis on behalf of a loved one: a meta-synthesis of qualitative research. Early Interv Psychiatr. 2015;9(3):185-99. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24958353
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2495...
) e possibilitam impactos positivos nos indicadores de saúde(66 Weber CAT, Juruena, MF. Familys view on the therapeutic of a mental health partial hospitalization. RPESM. 2017;(17):25-33. doi: 10.19131/rpesm.0180.
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). Entende-se que as atitudes são “as convicções e sentimentos que predispõem as nossas reações a objetos, pessoas e acontecimentos” e ao considerar que alguém “é má pessoa e tem mau caráter”, pode-se ter por ela atitudes de repulsa e hostilidade(77 Vala J, Monteiro, MB. Psicologia Social. 9ª Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian; 2013; pág. 188.).

As famílias relatam sentimentos de marginalização e distanciamentos dos profissionais prestadores de cuidados, expressos em condutas negativas que despertam culpa pelos problemas de SM do familiar(44 Keogh B, Skärsäter I, Doyle L, Ellilä H, Jormfeldt H, Lahti M, et al. Working with families affected by mental distress: stakeholders' perceptions of mental health nurses educational needs. Issues Ment Health Nurs [Internet]. 2017[cited 2020 Jan 20];38(10):822-8. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28745973
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). Desse modo, para avançar na perspectiva de mudanças, é essencial a construção de parceria entre enfermeiro-família, e que o planejamento de cuidados de enfermagem à pessoa com TM seja colaborativo, para melhorar o funcionamento das relações como um todo, o que requer mudanças nas atitudes dos enfermeiros frente ao envolvimento das famílias(22 Cree L, Brooks H, Berzins K, Fraser C, Lovell K, Bee P. Carers' experiences of involvement in care planning: a qualitative exploration of the facilitators and barriers to engagement with mental health services. BMC Psychiatr [Internet]. 2015 [cited 2020 Jan 20];15;(208). https://bmcpsychiatry.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12888-015-0590-y
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).

Em revisão de literatura, os enfermeiros de cuidados de saúde primários de Portugal apresentaram atitudes de suporte face à família de pessoas com TM, e opinam que a decisão de incluí-las potencializa seu papel como agente facilitador no processo de reorganização da assistência(88 Fernandes CSNN, Nóbrega MPSS, Angelo M, Torre MI, Chaves SCS. Importance of families in care of individuals with mental disorders: nurses' atitudes. Esc Anna Nery. 2018;22(4): e20180205. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2018-0205
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). Na China, as atitudes dos enfermeiros generalistas foram menos solidárias em relação à importância da família no cuidado de enfermagem, e despertaram a percepção, nas famílias, de que os enfermeiros não conseguem ofertar o cuidado que as envolva. Todavia, quando apresentam atitudes de inclusão, a qualidade da assistência prestada melhora. Os autores ainda destacam que a capacitação dos enfermeiros generalistas, e até mesmo dos especialistas em saúde mental, é crucial para que possam trazer a família para um papel de mais centralidade no cuidado99 Chiu-Yueh Hsiao, Huei-Lan Lu, Yun-Fang Tsai. Factors associated with primary family caregivers' perceptions on quality of family-centered care in mental health practice. J Nurs Scholarsh. 2019 Nov;51(6):680-8. doi: 10.1111/jnu.12526
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.

Na Austrália, o estudo, que analisou as experiências de familiares de pessoas com TM em relação a suas interações e contribuições no cuidado, destaca que os enfermeiros precisam reconhecer o papel e compreender as experiências das famílias, para garantir uma abordagem mais focada destas em relação aos cuidados, uma vez que estão em melhor posição para reconhecer mudanças no quadro clínico do paciente e colaborarem no planejamento da assistência(1010 M Olasoji, P Maude, K McCauley. Not Sick Enough: Experiences of Carers of People With Mental Illness Negotiating Care for Their Relatives With Mental Health Services. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2017;24(6):403-411. doi: 10.1111/jpm.12399
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). Outros autores apontam que a família pode sentir-se isolada se deixada sozinha ou não envolvida no tratamento de seus entes queridos, com poucas oportunidades de oferecer informações e pouco poder para influenciar as decisões, embora as evidência apontem que trabalhar com famílias não é apenas benéfico para resultados a curto prazo, mas também pode obter melhorias duradouras no funcionamento e na qualidade de vida das pessoas com TM(1111 Ingela S, Brian K , Louise D, Heikki E, Henrika J , Mari L , et al. Advancing the knowledge, skills and attitudes of mental health nurses working with families and caregivers: a critical review of the literature. Nurse Educ Pract. 2018;32:138-46. doi: 10.1016/j.nepr.2018.07.002
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).

Estudo destaca que as diretrizes de SM, ao sugerirem algum tipo de envolvimento das famílias, colocam que a inclusão destas podem ajudar a prevenir recaídas e reduzir internações, apesar de não se ter bem definido o que de fato constitui o envolvimento das famílias nos cuidados e o melhor método para incorporá-las(1212 Dirik A, Sandhu S, Giacco D, Barrett K, Bennison G , Collinson S, et al. Why involve families in acute mental healthcare? a collaborative conceptual review. BMJ Open 2017;7:e017680. doi: 10.1136/bmjopen-2017-017680
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). Na Suécia, detectou-se que os profissionais apoiam o envolvimento das famílias, porém para convidá-las foram menos favoráveis, e que trabalhar em centro de atenção primária e ter competência em lidar com famílias são fatores preditores para atitudes positivas(1313 Blomqvist M, Ziegert K. 'Family in the waiting room': a Swedish study of nurses' conceptions of family participation in acute psychiatric inpatient settings. Mental Health Nurs. 2011;20(3). doi: 10.1111/j.1447-0349.2010.00714.x
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).

No Brasil, na era institucional, devido ao isolamento que foi imposto à pessoa com TM, as famílias foram excluídas e culpabilizadas pelos problemas do familiar adoecido(1414 Covelo BSR, Badaró-Moreira MI. Links between family and mental health services: family members' participation in care for mental distress. Interface. 2015;19(55):1133-44. doi: 10.1590/1807-57622014.0472
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). Desse modo, estudos sobre a participação das famílias na produção do cuidado em saúde mental são recentes, e focados nos espaços especializados, em uma perspectiva mais de expectadoras do que protagonistas. Somente com o redirecionamento da política de saúde mental, a família tem sido chamada a se incluir e contribuir no processo de desinstitucionalização, que vem se configurando na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), no compromisso da Estratégia de Saúde da Família (ESF) e na figura dos enfermeiros que devem acolher e integrar as famílias de pessoas com TM no cuidado(1515 Oliveira EC, Medeiros AT, Trajano FMP, Chaves NG, Almeida SA, Almeida LR. O cuidado em saúde mental no território: concepções de profissionais da atenção básica. Esc Anna Nery. 2017;21(3):e20160040. 2017. https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2017-0040
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).

Posto que, em revisão de literatura nacional, não foram encontrados estudos sobre as atitudes de enfermeiros da Atenção Primária à Saúde (APS) em relação à inclusão das famílias nos cuidados, este estudo preenche uma lacuna de conhecimento que possibilita fortalecer a SM nesse cenário.

OBJETIVO

Caracterizar as atitudes dos enfermeiros de Atenção Primária à Saúde quanto ao envolvimento da família nos cuidados às pessoas com Transtorno Mental.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Estudo aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos de uma Universidade Pública e da Secretaria de Saúde de São Paulo, de acordo com a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo quantitativo, descritivo-correlacional e transversal. Com recorte do estudo multicêntrico “Atitudes na Atenção Primária à Saúde”, conduzido entre Portugal e Brasil.

Cenário do estudo

Realizado na cidade de São Paulo, em 69 Unidades Básicas de Saúde (UBS) com/sem ESF, de oito Distritos de Saúde (DS), das seis Coordenadorias Regionais de Saúde (CRS) da cidade de São Paulo. Participaram os DS: Microrregião da Vila Maria/Vila Guilherme, (Norte), Microrregião Butantã (Oeste), Distrito do Ipiranga, Distrito Jabaquara e Distrito da Vila Prudente (Sudeste), Distrito Guaianazes (Leste), Campo Limpo (Sul) e Sé (Centro). Este estudo foi reportado de acordo com as guidelines STROBE.

Fontes de dados

A amostra utilizada foi por conveniência e contou com a participação de 257 enfermeiros. Como critério de inclusão, atuar na APS (independentemente do tempo de atuação profissional) no serviço, na gestão e asssistência. De exclusão, atuar exclusivamente na gestão.

Coleta e organização dos dados

Realizada de abril a agosto de 2019, com questionário sociodemográfico (incluindo idade, sexo, estado civil, naturalidade, religião, formação profissional, tempo de atuação na área, tempo de atuação na unidade, carga-horária semanal total), além de questionário laboral com questões sobre formação e vivências profissionais com família de pessoas com TM. Aplicou-se a escala “Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem-Atitudes dos Enfermeiros” (IFCE-AE), cujas hipóteses de resposta são do tipo likert (quatro opções), que permite avaliar as atitudes dos enfermeiros no seu componente cognitivo, afetivo e comportamental(1616 Angelo M, Cascaes A, Fernandes F, Cavalcante C, Costa M, Ferreira M. Attitudes regarding the importance of families in pediatric nursing care. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):74-79. doi: 10.1590/S0080-623420140000600011
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). A IFCE-AE foi traduzida e validada para a população brasileira(1717 Oliveira PCM, Fernandes HIV, Vilar AISP, Figueiredo MHJS, Ferreira MMSRS, Martinho MJCM, et al. Attitudes of nurses towards families: validation of the scale Families' Importance in Nursing Care-Nurses Attitudes. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1331-7. doi: 10.1590/S0080-62342011000600008
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), e inclui três subescalas: família como parceiro dialogante e recurso de coping (12 itens) - indica a valorização do envolvimento da família no cuidado, com amplitude de 12 a 48; família como recurso dos cuidados de enfermagem (10 itens) - demonstra os pontos de fortalecimento da famíla que auxiliam no cuidado, com amplitude de 10 a 40; e família como um fardo (4 itens) - expressa pontos de desgastes que interferem na inclusão da família no cuidado, com amplitude de 4 a 16.

A consistência interna da IFCE-AE, obtida no presente estudo, foi (=0,91). O valor é superior ao encontrado pelos autores que a validaram para a população brasileira (=0,81)(1717 Oliveira PCM, Fernandes HIV, Vilar AISP, Figueiredo MHJS, Ferreira MMSRS, Martinho MJCM, et al. Attitudes of nurses towards families: validation of the scale Families' Importance in Nursing Care-Nurses Attitudes. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1331-7. doi: 10.1590/S0080-62342011000600008
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), o que corrobora a ideia de que se trata de ums escala com muito boa consistência interna. Os escores possíveis variam entre 26 e 104, ponto médio 65, moda 77, mediana 80 e Desvio-Padrão 8,4. Para a avaliação do resultado final da escala, quanto maior for o escore obtido, melhores são as atitudes dos enfermeiros perante as famílias. Após contato com o gestores das UBS e explicações sobre a pesquisa, os instrumentos foram enviados. Vale ressaltar que foi ofertado suporte contínuo aos enfermeiros.

Análise de dados

Empregou-se o IBM SPSS-25. As variáveis categóricas nominais foram descritas e apresentadas em tabelas de frequência. Para a estatística descritiva foi utilizado o cálculo de média e Desvio-Padrão (DP). Já para identificação da distribuição nas duas amostras aplicou-se o Teste de Mann-Whitney, sendo a significância estatística de p <0,05 e intervalo de confiança de 95%.

RESULTADOS

Caraterização sociodemográfica

A amostra (n= 257) é predominantemente do sexo feminino; com idade média de 36,3 anos (DP= 7,5), variando entre 23 e 65 anos; formada em instituição particular (84%); natural da região Sudeste do país (42,0%); que atua em apenas um serviço (88,7%); católica (69,2%). As atitudes de maior apoio, portanto mais positivas, foram em relação à carga-horária (p=0,001), ter recebido conteúdo sobre enfermagem de família na formação e/ou em capacitação (p=0,004), atuar em determinadas CRS/D (p=0,001) e atuar na ESF (p<0,001), Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição dos profissionais de enfermagem segundo as variáveis sociodemográficas e laborais, estudo Atitudes na Atenção Primária à Saúde, São Paulo, Brasil, 2019

Atitudes dos enfermeiros para com as famílias

O somatório dos escores da IFCE-AE, com amplitude de 26 a 104, ponto médio de 65, possibilitou obter uma medida global do perfil de cada profissional, cuja média total foi 82,1 com DP=8,4, superior ao ponto médio, estimando que os enfermeiros apresentam em sua maioria atitudes favoráveis quanto ao envolvimento das famílias. Na subescala “Família: parceiro dialogante e recurso ao coping”, com questão tipo: “Discuto com a família e convido a participar ativamente o processo de cuidado”, o escore médio foi de 38,5 (Mín- 12; Máx- 48) com DP=4,6. Na subescala “Família: como recurso dos cuidados de enfermagem”, que inclui a questão “Ganho muitos conhecimentos valiosos com as famílias, que posso utilizar no meu trabalho”, o escore médio foi de 31,9 (Mín-10; Máx.-40) com DP= 3,7. Finalmente, na subescala “Família: como fardo”, que inclui a questão: “A presença de membros da família faz-me sentir avaliado”, o escore médio foi de 12,1 (Mín- 4; Máx-16) e DP=1,5, (Tabela 2).

Tabela 2
Dimensões "Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem-Atitudes dos Enfermeiros" (IFCE-AE), estudo Atitudes na Atenção Primária à Saúde, São Paulo, Brasil, 2019

Atitude dos enfermeiros x cenário de atuação

A média do escore total da IFCE-AE e os DS foram: Norte (=77,0), Centro (=83,0), Sudeste (=80,0), Sul (=82,0), Leste (=83,0) e Oeste (=83,0). Evidencia-se que os enfermeiros dos DS Butantã (Oeste), Guaianazes (Leste) e Sé (Centro) apresentam média do escore total de 83,0, respectivamente, portanto com atitudes ligeiramente mais positivas em relação ao Norte, Sul e Sudeste (p=0,001), (Figura 1).

Figura 1
Relação da “Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem- Atitudes dos Enfermeiros” (IFCE-AE) e CRS/DA, estudo Atitudes na Atenção Primária à Saúde, São Paulo, Brasil, 2019

Atitude dos enfermeiros x carga-horária de trabalho

Destaca-se que as atitudes dos enfermeiros que trabalham com carga-horária de 40hs/sem são mais positivas do que aqueles que trabalham com cargas-horárias menores, tanto no âmbito da IFCE-AE total, como nas três dimensões (p<0,05), (Tabela 3).

Tabela 3
Dimensões da "Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem-Atitudes dos Enfermeiros" (IFCE-AE), carga-horária, estudo Atitudes na Atenção Primária à Saúde, São Paulo, Brasil, 2019

Atitude dos enfermeiros x conteúdo de enfermagem de família x Unidade Básica de Saúde com ou sem Estratégia de Saúde da Família

A Tabela 4 reflete as atitudes dos enfermeiros que receberam conteúdo sobre enfermagem de família na formação e/ou em capacitação e os que não receberam. Os que tiveram, apresentam média na IFCE-AE total e dimensões ligeiramente superiores (p=0,004). Da mesma forma, as atitudes dos que atuam em UBS com ESF são mais positivas do que aqueles que não têm ESF (p<0,05).

Tabela 4
Total e dimensões da "Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem-Atitudes dos Enfermeiros" (IFCE-AE), ter recebido conteúdos sobre enfermagem de família, Unidades Básicas de Saúde com e sem Estratégia de Saúde da Família, estudo Atitudes na Atenção Primária à Saúde, São Paulo, Brasil, 2019

DISCUSSÃO

No Brasil, os cuidados primários em saúde são oferecidos, sobretudo, em dois cenários: UBS Tradicionais, com ou sem Agentes Comunitários de Saúde e UBS com ESF, dispositivos constituintes do estudo. Os principais achados apontam que as atitudes dos enfermeiros são favoráveis ao envolvimento das famílias nos cuidados à pessoa com TM, uma vez que o valor médio da IFCE-AE foi de 82,1 (DP=8,4). Valor próximo de recente estudo desenvolvido com enfermeiros de cuidados primários em Portugal 85,9 (DP= 9,6)(88 Fernandes CSNN, Nóbrega MPSS, Angelo M, Torre MI, Chaves SCS. Importance of families in care of individuals with mental disorders: nurses' atitudes. Esc Anna Nery. 2018;22(4): e20180205. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2018-0205
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), nas dimensões: “Família parceiro dialogante/coping” 38,5 (DP=4,6) e“Família como recurso” 31,9 (DP=3,7); e superior na “Família: como fardo” 12,1 (DP=1,5) nos dois países. Salienta-se, contudo, que 82,8% da amostra é composta por profissionais do gênero feminino, e as autoras da versão original da IFCE-AE apontam que estas expressam, em média, atitudes de maior suporte e inclusão das famílias que o gênero oposto(1818 Benzein E, Johansson P, Arestedt, KF, Saveman BI. Nurses'attitudes about the importance of families in nursing care: a survey of Swedish Nurses. J Fam Nurs. 2008;14(2):162-80. doi: 10.1177/1074840708317058
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).

Houve associação entre enfermeiros que receberam conteúdo sobre enfermagem de família na formação e/ou em capacitação, perante aqueles que não tiveram, evidenciando atitudes mais positivas. No Brasil, de modo geral, o ensino de enfermagem de família não está consolidado nos currículos de graduação em enfermagem, e a abordagem de sua especificidade ainda é conduzida de forma pouco estruturada(1919 Angelo M, Bousso RS, Rossato LM, Damião EBC, Silveira AO, Castilho AMCM, et al. Family as an analysis category and research field in nursing. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe2):1337-41. doi: 10.1590/S0080-62342009000600033
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). Assim, trata-se de um resultado favorável, mas que requer outros estudos para avaliar a natureza das ações de enfermagem de família no contexto da SM na APS, considerando, em princípio, os desafios teórico e práticos que os enfermeiros enfrentam para implementá-las(2020 Santos REB, Nóbrega MPSS. Mental Health in Primary Care: Annals of the Brazilian Congress of Nursing. Rev Baiana Enferm. 2017;31(4):e20134. doi: 10.18471/rbe.v31i4.20134
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).

A despeito dessas considerações, outra associação encontrada diz respeito a ser enfermeiro da ESF e apresentar atitudes de maior suporte e de importância ao envolvimento das famílias. Achado que se sustenta no compromisso social da ESF, nos princípios do SUS e da Política Nacional de Saúde Mental (PNSM), quanto à constituição de novas possibilidades para atender a pessoa/família na comunidade.

Todavia, é necessário investimento na capacitação desses profissionais, posto que o conhecimento sobre a importância das famílias nos cuidados deve ser necessário desde a graduação e se estender até a prática clínica(1212 Dirik A, Sandhu S, Giacco D, Barrett K, Bennison G , Collinson S, et al. Why involve families in acute mental healthcare? a collaborative conceptual review. BMJ Open 2017;7:e017680. doi: 10.1136/bmjopen-2017-017680
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). Além disso, o cuidado de enfermagem à família requer uma fundamentação téorica e prática que o subsidie de maneira sistematizada como, por exemplo, na perspectiva sistêmica. Por outro lado, esse achado contribui para melhorar a concepção e aplicabilidade do conceito “família nos cuidados”, erroneamente compreendido na atualidade, posto que os enfermeiros ainda acreditam que as famílias atuam como fiscalizadoras de suas ações, e servem como “mão de obra” para cuidados de menor importância(2121 Corrêa AR, Andrade AC, Manzo BF, Couto DL, Duarte ED. The family-centered care practices in newborn unit nursing perspective. Esc Anna Nery. 2015;19(4):629-34. doi: 10.5935/1414-8145.20150084
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201500...
).

A carga-horária de trabalho variou de 30 a 44 hs/sem. Os enfermeiros que fazem 40 hs têm atitudes mais positivas em relação à inclusão das famílias do que os atuantes de menos ou mais de 40hs. Esse dado sintoniza com a carga-horária de 40hs/sem estabelecida para os enfermeiros da ESF que tem na família como foco de sua atenção, as possibilidades de desenvolver um cuidado colaborativo com a família da pessoa com TM se intensificam. Os enfermeiros com maior tempo de experiência profissional apresentam atitudes mais positivas e de maior suporte em relação à participação da família nos cuidados, resultado similar à pesquisa conduzida na região central de Portugal(2222 Silva MANCG, Costa MASM, Silva MMFP. The Family in Primary Care: characterization of nurses attitudes. Rev Enferm Ref. 2011;3(11):19-28. doi: 10.12707/RIII13105
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).

Entretanto, em relação aos mesmos itens da IFCE-AE, o presente estudo apresenta escore superior a um estudo brasileiro desenvolvido cinco anos atrás com enfermeiros de cuidados pediátricos hospitalares, no qual os escores na escala foram menores(1616 Angelo M, Cascaes A, Fernandes F, Cavalcante C, Costa M, Ferreira M. Attitudes regarding the importance of families in pediatric nursing care. Rev Esc Enferm USP. 2014;48(spe):74-79. doi: 10.1590/S0080-623420140000600011
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), prospectando, dessa forma, mudanças na área de cuidados à família.

As CRS/DA, onde os enfermeiros exercem suas atividades, parecem condicionar suas atitudes de modo ligeiramente mais positiva para com as famílias na presença de TM, tendo-se obtido escores totais, na escala, mais elevados nos DA Sé (Centro), Butantã (Oeste) e Guaianazes (Leste). Tais dados são relevantes, embora haja uma tendência crescente na cobertura da ESF no estado de São Paulo, com aumento entre 2006 e 2016(2323 Neves RG, Flores TR, Duro SMS, Nunes BP, Tomasi E. Time trend of Family Health Strategy coverage in Brazil, its Regions and Federative Units, 2006-2016. Epidemiol Serv Saúde. 2018;27(3):e2017170. doi: 10.5123/s1679-49742018000300008
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), ainda predomina no município de São Paulo o modelo de atenção em UBSs tradicionais (sem ESF), bem como alguns bairros com baixas coberturas, ou seja, com menos da metade de sua população atendida pela ESF(2424 Malta DC, Santos MAS, Stopa SR, Vieira JEB, Melo EA, Reis AC. Family Health Strategy Coverage in Brazil, according to the National Health Survey, 2013. Ciênc Saúde Colet. 2016;21(2):327-38. doi: 10.1590/1413812320152122360
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).

A atenção à saúde no município de São Paulo configura-se como uma rede em constante movimento, e nos últimos vinte anos a Organizações Sociais de Saúde (OSS) tem gerido grande parte dos serviços de cuidados primários, disseminando suas técnicas, estratégias, conhecimentos, domínio e cultura(2525 Baggenstss S, Donandone JC. The public health intermediated by social organizations: Arrangements and adjustments in the last two decades in Brazil. Latinoamérica Rev Estudios Latinoamericanos. 2014;(59):69-98. doi: 10.1016/S1665-8574(14)71726-0
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). Ainda assim, estudos sobre a constituição, processo de trabalho, perspectivas e desafios sobre a RAPS da cidade são incipientes. Enfatiza-se também que, apesar das atitudes dos enfermeiros dos distritos de saúde apontarem para inclusão ou não das famílias da pessoa com TM nos cuidados, não é possível afirmar que o tipo de gestão das OSS nos serviços primários de saúde impacta nessas atitudes.

A CSR Sé (Centro) caracteriza-se por ser um território complexo, onde circulam muitas singularidades, mas que ainda enfrenta obstáculos no acesso aos serviços públicos, especialmente os de saúde(2626 Campos A. População de rua: um olhar da educação interprofissional para os não visíveis. Saude Soc. 2018;27(4):997-1003. doi: 10.1590/s01041290 2018180908
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); bem como concentra pessoas em situação de rua e em cenas de uso de substâncias psicoativas. Essas particularidades põem à prova o trabalhao dos enfermeiros quanto a dispor de uma abordagem mais sistêmica, de resgate das relações familiares, presumindo, portanto, que esses aspectos impulsionam os profissionais a terem um olhar mais ampliado e à frente de outras regiões da cidade, embora essa realidade seja comum em outros cenários sociais.

A CRS/DA Oeste, caracterizada por expor bons indicadores socioeconômicos e de saúde em uma fração do seu território, tem, especialmente na região do Butantã, áreas de vulnerabilidade social(2727 Organização Pan-Americana da Saúde. Inovação e direito à saúde na cidade de São Paulo (2013-2016). Brasília, D.F. OPAS; 2017.). A despeito da inabilidade de alguns profissionais dessa microrregião em lidar com casos de SM na APS, os enfermeiros atuam de forma interdependente e articulada com serviços especializados(2828 Nóbrega MPSS, Domingos AM, Silveira ASA, Santos JC. Weaving the West Psychosocial Care Network of the municipality of São Paulo. Rev Bras Enferm. 2017;70(5):965-72. doi: 10.1590/0034-7167-2016-0566
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) e com uma universidade pública localizada na região. O ensino de Enfermagem dessa universidade defende a importância das famílias nos cuidados de enfermagem bem estruturados, e sustenta a relevância do envolvimento como condição primária para um cuidado de sucesso. Todavia, para atingir tal objetivo, condiciona a transformação de crenças e comportamentos(2929 Cruz AC, Angelo M. Cuidado centrado na família em pediatria: redefinindo os relacionamentos. Ciên Cuid Saúde. 2012;10(4):861-5. doi: 10.4025/cienccuidsaude.v10i4.18333
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), logo, uma influência potente para as atitudes mais positivas pelos enfermeiros dessa CRS.

A CRS/DA Leste é um espaço periférico, com poucos recursos e uma região densamente povoada. A população reconhece os serviços de saúde como importante representação do Estado. No plano municipal de saúde 2014-2017 a meta foi ordenar a linha de cuidado em SM na APS(3030 Prefeitura de São Paulo. Plano Municipal de Saúde de São Paulo 2014-2017 [Internet]. 2017[cited 2020 Jan 20]. Available from: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/noticias/?p=187928
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). Acredita-se que os esforços centrados tenham possibilitado aos enfermeiros uma coesão com a comunidade, e essa aproximação conduzido a uma visão de inclusão das famílias ao longos dos últimos dois anos, dentro do período da coleta de dados do presente estudo.

No território da CRS Norte, as mudanças políticas interferiram na constituição da RAPS, com desafios que passam pela diversidade dos territórios, contingente populacional e tomada de decisões pautadas em ordem política a cada gestão municipal. Embora tenha resistência dos profissionais, usuários e familiares, ainda há centralidade na cultura manicomial instituída a partir dos contratos de gestão feitos pela Secretaria Municipal de Saúde e OSS(3131 Almeida IS, Campos GWS. Analysis of the implementation of a Mental Health network in a major city. Saúde Colet. 2019;24(7):22. doi: 10.1590/1413-81232018247.20122017
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).

Presume-se, portanto, um entrave na evolução do cuidado de SM na APS, que conduz a atitudes menos positivas nos enfermeiros dessa CRS. Apesar dos escores da IFCE-AE, na perspectiva dos enfermeiros da CRS/DA Sudeste, serem relativamente baixos, essa região também é campo de prática de acadêmicos de enfermagem de uma instituição de ensino superior, que se destaca na área de ensino do cuidado centrado na família, e no processo de instrumentalização de futuros profissionais. Desse modo, mobilizando os enfermeiros dos campos de ensino clínico de cuidados primários na transformação de suas atitudes frente à inserção das famílias nos cuidados de enfermagem(3232 Moraes HAL, Hannes CN. Terapia comunitária: cuidado com a família na perspectiva do graduando de enfermagem. Acta Paul Enferm. 2011;24(2):165-71. doi: 10.1590/S0103-21002011000200002
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).

Apesar dos resultados promissores do presente estudo, os desafios para o envolvimento das famílias no cuidado envolvem a superação de ideias equivocadas dos enfermeiros de que as famílias abandonam seus doentes, posto que esses profissionais não entendem que o desconhecimento dos familiares em relação ao TM e às dificuldades para prover cuidados está relacionado ao despreparo e à falta de suporte adequado(3333 Barros S, Nóbrega MPSS, Santos JC, Fonseca LM, Floriano LSM. Mental health in primary health care: health-disease according to health professionals. Rev Bras Enferm. 2019;72(6):1609-17. doi: 10.1590/0034-7167-2018-0743
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). De todo modo, esses achados respondem às orientações nacionais e internacionais para o envolvimento da família nos cuidados de enfermagem e da assunção pelos enfermeiros, bem como o compromisso e obrigação ética e moral de incluí-la nos cuidados(3434 Wright LM, Leahey, M. Enfermeiras e famílias: um guia para avaliação e intervenção familiar. 5th ed. São Paulo. Roca; 2012.).

Limitações do estudo

Recaem na amostra de conveniência que impossibilita fazer generalizações sobre a população estudada. Em decorrência de questões logísticas, devido à amplitude dos espaços geográficos do município, não foi possível acessar uma amostra maior, e àqueles que responderam ao estudo são provavelmente os enfermeiros mais sensibilizados para o tema.

Contribuições para a área da saúde e para a Enfermagem

O estudo reafirma a importância das atitudes positivas para sustentar a decisão dos enfermeiros em incorporar as famílias e que essas fortalecem o cuidado de base comunitária proposto na RAPS. É o primeiro no país que investiga a associação entre as atitudes de enfermeiros da APS sobre a participação da família nos cuidados à pessoa com TM.

CONCLUSÃO

Conclui-se que os enfermeiros que atuam em cuidados primários no município de São Paulo detêm, na sua maioria, uma atitude positiva para com o envolvimento das famílias, indicador relevante para a integração dessas no processo de cuidado em saúde-doença mental. Aponta-se ainda que a carga-horária de 40hs/sem de trabalho favorece o maior contato com a população, e que as habilitações acadêmicas e a especialização parecem relacionar-se com atitudes mais positivas em relação às famílias e, consequentemente, potencializar a qualidade nos cuidados.

Outrossim, as atitudes dos enfermeiros podem esbarrar na concepção que têm sobre o significado da formação em enfermagem de família versus atuar na Estratégia de Saúde da Família, que tem a família como centralidade de ação programática de saúde. Posto que a práxis da SM na APS ainda não se consolidou no país, e muito menos no que diz respeito à acessibilidade das famílias de pessoas com TM aos cuidados. Este estudo oferece dados para tomada de decisões no âmbito dos serviços.

O investimento na capacitação/formação dos enfermeiros de cuidados primários, nos quesitos “saúde mental” e “enfermagem de família”, potencializa a inclusão das famílias como parceiras, corresponsáveis e facilitadoras no processo de cuidado. Tal fato justifica-se uma vez que a proposta da PNSM vigente não prevê o cuidado em espaços de reclusão, de distanciamento da pessoa de seu núcleo relacional, posto que usuários dos serviços de saúde mental, preferencialmente, devem retornar para suas famílias.

Fomentar estudos sobre enfermagem de família, no contexto da pessoa com TM na APS, é relevante para compor evidências quanto à reinserção da pessoa com essa condição clínica na unicidade social que é a família. Bem como da aceitação desse núcleo social nos espaços não especializados, além de compreender como se constrói uma prática de cuidados à família e as variáveis determinantes para o seu desenvolvimento. Em futuras investigações considera-se importante entender a relação entre as CRS/DA, as particularidades da gestão e do processo de trabalho que melhorem as atitudes dos enfermeiros e sua conexão com essas famílias.

  • FOMENTO
    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) Programa de Professor Visitante no Exterior-edital 9/2019 Print USP-Portugal (Bolsa). Trabalho desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem- Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    02 Abr 2020
  • Aceito
    29 Jun 2020
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