Inclusão digital e o uso da internet pela pessoa idosa no Brasil: estudo transversal

RESUMO

Objetivos:

Descrever o perfil de pessoas idosas brasileiras que utilizam a internet, o meio de acesso e a finalidade desse uso, e verificar a existência de associação entre variáveis sociodemográficas e aquelas relacionadas ao uso da internet.

Método:

Estudo transversal com idosos brasileiros usuários das redes sociais Facebook e WhatsApp, analisados de modo descritivo, uni e bivariado.

Resultados:

Participaram 384 idosos, em maioria mulheres (52,08%), com idade média de 64,6 anos e que utilizavam a internet para sanar dúvidas de saúde (65,36%). Principais atividades na internet foram ler, ouvir música, jogar, ver vídeos e fotos (37,30%). Principais benefícios apontados são interação (74,5%), aprendizado (19,2%) e entretenimento (19,25%). Houve diferenças estatísticas entre tempo de permanência conectado e variáveis sexo, idade e estado civil.

Conclusão:

Este estudo mostrou características de idosos que utilizam a internet, algo que desperta para possibilidade do uso de tecnologias digitais na otimização dos cuidados em saúde nessa população.

Descritores:
Idoso; Internet; Promoção da Saúde; Inclusão Digital; Mídias Sociais

ABSTRACT

Objectives:

To describe the profile of Brazilian older adults who use the Internet, the means of Internet access and the purpose of Internet use and to verify the existence of association between socio-demographic variables and variables related to Internet use.

Method:

Cross-sectional study with Brazilian older adults who used the social networks Facebook and WhatsApp. Descriptive, univariate, and bivariate analysis were conducted.

Results:

384 older adults participated in the study, mostly women (52.08%), with a mean age of 64.6 years old and who used the Internet to address health concerns (65.36%). The main activities on the internet were reading, listening to music, playing games, watching videos and photos (37.30%). The main benefits pointed out were interaction (74.5%), learning (19.2%) and entertainment (19.25%). There were statistically significant differences between time spent online and the variables gender, age, and civil status.

Conclusion:

This study showed characteristics of older adults who use the Internet and revealed the possibility of using digital technologies to optimize health care for this population.

Descriptors:
Aged; Internet; Health Promotion; Digital Inclusion; Social Media

RESUMEN

Objetivos:

Describir el perfil de adultos mayores brasileños que utilizan la Internet, los medios de acceso y el propósito de este uso, y comprobar si existen asociaciones entre las variables sociodemográficas y las relacionadas con el uso de la Internet.

Método:

Se trata de un estudio transversal entre usuarios brasileños de edad avanzada usuarios de las redes sociales Facebook y WhatsApp, analizado de forma descriptiva, univariante y bivariante

Resultados:

Participaron 384 personas de edad avanzada, en su mayoría mujeres (52,08%), con edad media de 64,6 años que utilizaban Internet para resolver dudas sobre salud (65,36%). Las actividades practicadas en Internet eran leer, escuchar música, jugar, ver videos y fotos (37,30%). Los principales beneficios señalados son la interacción (74,5%), el aprendizaje (19,2%) y el entretenimiento (19,25%). Se encontraron diferencias estadísticas entre el tiempo que permanecían conectados y las variables sexo, edad y estado civil.

Conclusión:

Este estudio ha demostrado algunas características de adultos mayores que utilizan internet y plantea la posibilidad de utilizar las tecnologías digitales para mejorar los cuidados sanitarios de ese grupo etario.

Descriptores:
Adultos Mayores; Internet; Promoción de la Salud; Inclusión Digital; Redes Sociales

INTRODUÇÃO

Diante do crescimento das inovações tecnológicas, o uso da internet tem se tornado parte essencial da vida diária de quase todos os indivíduos. No Brasil, cerca de dois terços da população (69,8%) possui conexão com a internet⁽¹⁾. De modo semelhante, com o aumento do número de pessoas idosas em todo o mundo, cresce o interesse dessa população pelo espaço virtual⁽²⁾. No país, a proporção dos idosos que acessam a internet subiu de 24,7%, em 2016, para 31,1%, em 2017⁽¹⁾.

Todavia, esse aumento ainda não é suficiente para tirá-los da lista daqueles que sofrem o processo de “exclusão digital”⁽³⁾. Para muitos, o meio virtual tem se configurado como uma alternativa funcional em relação à televisão ou ao rádio, uma vez que os sites e redes sociais os têm atraído pela inovação e agilidade no acesso à informação⁽⁴⁾.

Desse modo, a internet é considerada um espaço no qual as pessoas idosas podem desfrutar de informações relativas aos mais variados interesses, especialmente benefícios para a saúde, que envolvem conhecimento, lazer, trabalho e interação/comunicação⁽⁵⁾. Assim, a inclusão digital entre pessoas idosas é entendida como meio para melhoria da autonomia e da qualidade de vida. Apesar dos desafios para adoção de novas tecnologias por essa população, estudo relatou que os idosos se mostram dispostos a adotar novas tecnologias, sendo a utilidade e a usabilidade superadas pelos sentimentos de inadequação⁽⁶⁾. Tais situações são percebidas quando pessoas idosas se sentem motivadas pela interação com netos e parentes, sendo estimuladas a aprender e usufruir de tecnologias digitais.

Assim, a importância desta pesquisa consiste em reconhecer os meios de acesso à internet mais utilizados pelas pessoas idosas brasileiras e a finalidade da sua utilização, como forma de subsidiar o desenvolvimento de estratégias/intervenções de promoção da saúde para essa população por meio do uso de tecnologias digitais, pois as implicações destas são extremamente abrangentes para tal fim. Nesse contexto, o estudo contribui com a ciência tecnológica, social e gerontológica. Em especial, reconhece-se o papel fundamental do enfermeiro para promoção da saúde da pessoa idosa, por meio da educação em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde brasileiro, e a necessidade do emprego de tecnologias digitais para aprimoramento de sua prática clínica, desmistificando a ideia de que os idosos estão longe dessa realidade. Acredita-se que a aliança entre educação e inclusão digital torna possível o planejamento e a operacionalização de ações qualificadas em promoção da saúde⁽⁷⁾.

Os resultados deste estudo podem possibilitar o entendimento de que a utilização da internet através das mídias sociais traz diversos benefícios aos idosos, possibilitando melhoria na qualidade de vida dessa população. Compreende-se que essa ferramenta pode favorecer o processo de comunicação, fomentando as relações interpessoais, diminuindo o isolamento social, estimulando o trabalho cognitivo e facilitando a aproximação de amigos e parentes, mesmo que haja distância física. Assim, o estudo proporciona um saber de interesse multiprofissional na medida em que possibilita conhecer como as pessoas idosas utilizam a internet.

OBJETIVO

Descrever o perfil de pessoas idosas brasileiras que utilizam a internet, o meio de acesso e a finalidade desse uso. Além disso, buscou-se verificar a existência de associação entre variáveis sociodemográficas e aquelas relacionadas ao uso da internet.

MÉTODOS

Aspectos éticos

A pesquisa respeitou os princípios éticos e legais preconizados pela Resolução do Conselho Nacional de Saúde n° 466/12, com apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Vale do Acaraú.

Os participantes interessados em colaborar na pesquisa entraram no link divulgado nas mídias sociais do Facebook e WhatsApp, e receberam online o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após sua leitura, havia duas opções: “eu aceito participar da pesquisa” e “eu não aceito participar da pesquisa”. Dessa forma, quando o idoso marcava a opção “eu aceito participar da pesquisa”, era encaminhado automaticamente à página do instrumento de coleta de dados, mas, caso contrário, a página era finalizada.

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de estudo transversal de caráter quantitativo. Destaca-se que o estudo foi descrito conforme checklist Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE)⁽⁸⁾.

A pesquisa foi realizada por meio da internet. A coleta de dados ocorreu entre os meses de setembro e dezembro de 2018.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

A seleção dos idosos foi realizada por meio da estratégia de amostragem do tipo “bola de neve”, técnica conhecida como snowball sampling, que diz respeito aos primeiros participantes indicarem novos participantes, que também indicam outros, e assim sucessivamente, até que seja alcançada a meta proposta⁽⁹⁾. Dessa forma, com conhecimento prévio da existência de grupos de idosos no Facebook, conseguiu-se alcançar os primeiros participantes por meio da identificação de 13 grupos: Terceira idade, Terceira idade conectada, Longevidade saudável, Portal terceira idade, Núcleo de Apoio à Terceira Idade, Grupo da terceira idade, Renascer da terceira idade, Terceira idade melhor, Integrar terceira idade, Idosos mãos solidárias, Grupo de idosos zuquinha, Grupo de idosos de bem com a vida, Longevidade.

A amostra foi calculada com base na estimativa do cálculo para estudos de prevalência para população infinita. Considerou-se uma prevalência de pelo menos 50% (p) de idosos que utilizam a internet em busca de benefícios à saúde, nível de confiança (Z1-α/2) de 95%, erro absoluto tolerável (d) de 0,05. Assim, utilizando-se da fórmula (, a estimativa da amostra foi de 385 pessoas idosas.

Destarte, participaram do estudo, de forma livre e independente, 384 pessoas idosas que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: pessoas com 60 anos ou mais, de ambos os sexos, brasileiros, que utilizam a internet por meio de redes sociais Facebook e WhatsApp, independentemente da frequência de uso. Foram excluídos dois idosos por não responderem o instrumento de forma completa e registrarem respostas desconexas.

As justificativas para a escolha dessas redes sociais como parte dos critérios de inclusão dos participantes da pesquisa foram as seguintes: serem gratuitas para o usuário e bastante utilizadas por toda a população, independente da faixa etária; o potencial de suas ferramentas, com o intuito de fortalecer o conhecimento e/ou a aprendizagem de determinados assuntos; para o usuário, não há necessidade de expertise na criação do espaço ou formação para iniciar as atividades; e facilitam momentos de interações, independentemente de tempo e espaço em que se encontram os indivíduos⁽¹⁰⁾.

Protocolo do estudo

O questionário foi construído na plataforma Google Forms e disponibilizado por meio de um link, o qual abrangeu questões referentes a dados sociodemográficos (sexo, idade, local onde vive, estado civil, escolaridade e ocupação) e sobre a utilização da internet (meio de acesso, tempo de acesso, finalidades do acesso e benefícios percebidos).

O questionário foi vinculado à conta do autor principal para garantir a segurança das informações. O preenchimento do questionário ficou disponível entre os meses de setembro e dezembro de 2018. A coleta de dados foi realizada por meio de questionário online, disponibilizado por meio de link no feed dos grupos do Facebook supracitados, quando permitido pelo administrador de cada grupo, ou pelo Messenger individualmente, ou ainda por meio do WhatsApp, quando os idosos disponibilizaram os contatos. Salienta-se que não foram extraídos dados dessas mídias sociais.

Análise dos resultados e estatística

Os dados foram compilados no software Excel, analisados estatisticamente com o apoio do software R for Windows versão 3.6.2 e sintetizados em tabelas. A análise descritiva dos dados incluiu o cálculo de frequências absolutas e percentuais. A associação entre variáveis categóricas e dados sociodemográficos foi analisada com a aplicação do teste de Qui-quadrado para independência ou teste da probabilidade exata de Fisher de acordo com as frequências esperadas de cada categoria. Para mensurar a magnitude da relação entre essas variáveis categóricas, utilizaram-se a razão de prevalência e o seu respectivo intervalo de confiança de 95%. Em todos os cálculos inferenciais, adotou-se o nível de significância de 0,05.

A associação entre a variável quantitativa idade com as variáveis qualitativas foi verificada por meio da aplicação do teste de Mann-Whitney. Este é uma alternativa ao teste T para duas amostras independentes, quando os dados não seguem uma distribuição normal. Para este estudo, a normalidade foi verificada por meio do teste de Lilliefors.

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 384 pessoas idosas brasileiras usuárias da rede social Facebook e/ou WhatsApp. Os dados sociodemográficos dos participantes estão demonstrados na Tabela 1.

Tabela 1
Perfil sociodemográfico das pessoas idosas brasileiras que utilizam redes sociais, Sobral, Ceará, Brasil, 2019

Variáveis	n	%
1. Sexo
Masculino	184	47,92
Feminino	200	52,08
2. Idade (anos)
60 |---- 63 anos	142	36,80
63 |---- 66 anos	92	23,89
66 |---- 69 anos	94	24,35
69 |---- 72 anos	25	6,49
72 |---- 75 anos	20	5,19
75 |---- 78 anos	4	1,03
78 |---- 81 anos	1	0,25
81 |----| 84 anos	2	0,51
3. Região
Centro-oeste	70	18,23
Nordeste	89	23,18
Norte	55	14,32
Sudeste	90	23,44
Sul	80	20,83
4. Escolaridade
Analfabeto	2	0,51
Ensino Fundamental	15	3,88
Ensino Médio	187	48,44
Ensino Superior	168	43,64
Pós-graduação	12	3,11
5. Ocupação
Trabalhando	123	31,86
Aposentado	261	67,61
6. Estado civil
Casado	280	73
Divorciado	26	6,70
Solteiro	68	17,70
Viúvo	10	2,6

Os dados sociodemográficos da amostra revelam que o sexo feminino foi levemente predominante (52,08%), com a média de idade de 64,60 anos, sendo a maioria casado (72,99%), quase metade tinha terminado o ensino médio (48,44%) e 67,61% eram aposentados. Além disso, quase metade da amostra residia nas regiões Sudeste e Nordeste (23,44% e 23,18%, respectivamente).

Na Tabela 2, constam os resultados que descrevem os dispositivos mais utilizados pelas pessoas idosas para acessar a internet, bem como as atividades realizadas nesse meio virtual e a sua utilização para obter informações sobre cuidados de saúde.

Tabela 2
Variáveis relacionadas aos dispositivos utilizados no dia-a-dia, às atividades realizadas e à utilização da internet para sanar dúvidas sobre cuidados de saúde, Sobral, Ceará, Brasil, 2019

Variáveis	n	%
1. Dispositivos utilizados no dia-a-dia
Celular	359	93,48
Notebook	10	2,60
Computador	8	2,08
Tablet	7	1,84
2. Atividades realizadas na internet
Ler, ouvir músicas, ver vídeos e fotos, jogar	144	37,30
Conversar com alguém	77	19,94
Conhecer novas pessoas e/ou buscar relacionamento amoroso	56	14,50
Pesquisar e estudar	43	11,13
Acessar redes sociais	40	10,36
Compras e movimentação financeira	17	4,40
Trabalhar	7	1,81
3. Sanar dúvidas sobre cuidados de saúde
Sim	251	65,36

Ressalta-se que não houve nenhuma associação estatisticamente significante entre as variáveis sociodemográficas e as atividades realizadas na internet.

A tabela 3 apresenta a associação entre os benefícios apontados, o tempo de permanência conectado, a frequência de acesso à internet diária e a variável sexo.

Tabela 3
Benefícios, tempo de permanência conectado e frequência de acesso à internet diária dos idosos brasileiros por sexo, Sobral, Ceará, Brasil, 2019

	Feminino		Masculino		Valor de p*	RP**	IC 95%
	n	%	n	%
1. Benefícios da utilização da internet
Atualização
Sim	41	20,5	56	30,43	0,03	0,77	0,62- 0,95
Não	159	79,5	128	69,56
Autonomia e independência
Sim	16	8	7	3,80	0,13	-	-
Não	184	92	177	96,19
Interação
Sim	140	70	137	74,45	0,39	-	-
Não	60	30	47	25,54
Entretenimento
Sim	32	16	35	19,02	0,02	1,65	1,05- 2,59
Não	168	84	149	80,97
Aprendizado
Sim	63	31,5	35	19,02	0,007	1,45	1,09- 1,94
Não	137	68,5	149	80,97
Nenhum
Sim	12	6	20	10,86	0,12	-	-
Não	188	94	164	89,13
2. Tempo de permanência conectado
Mais de 2 horas	89	44,5	57	30,97	0,008	1,36	1,08-1,72
Até 2 horas	111	55,5	127	69,02
3. Acesso à internet diariamente
Sim	178	89	157	85,32	0,36	-	-
Não	22	11	27	14,67
4. Acesso à internet mais de uma vez ao dia
Sim	181	90,5	166	90,21	1,00	-	-
Não	19	9,5	18	9,978

• Nota:
• ^*
  Teste Qui-quadrado de Pearson;
• ^**
  Razão de prevalência.

Destacam-se entre os benefícios da utilização da internet apontados pelas pessoas idosas a interação, o aprendizado e o entretenimento (74,5%, 19,02%, 19,02% respectivamente). Dentre as variáveis que apresentaram diferença estatisticamente significativa conforme sexo, estão: atualização (p=0,03), entretenimento (p= 0,02), aprendizado (p= 0,007) e tempo de permanência conectado (p= 0,008). Assim, verificou-se que não apontar atualização como benefício foi 33% mais prevalente entre os participantes do sexo feminino (RP = 0,77- IC 95%: 0,62- 0,95). Os benefícios de entretenimento e aprendizado apresentaram frequências maiores entre os participantes masculinos, com 65% e 45%, respectivamente (RP = 1,65- IC 95%: 1,05- 2,59; RP = 1,45- IC 95%: 1,09- 1,94). Além disso, passar mais de 2 horas na internet apresentou frequência 36% maior entre as mulheres (RP = 1,36- IC 95%: 1,08-1,72).

A Tabela 4 refere-se às associações entre a região de residência da pessoa idosa e os principais meios de obtenção de informações, níveis de escolaridade mais prevalentes, acesso à internet diário e tempo de permanência conectado.

Tabela 4
Associação entre os principais meios de obtenção de informações, níveis de escolaridade mais prevalentes, acesso à internet diário e tempo de permanência conectado e a região de residência do idoso, Sobral, Ceará, Brasil, 2019

	Norte	Nordeste	Sudeste	Centro oeste	Sul	Total	Valor dep
	n	n	n	n	n
Meio de obtenção de informações							0.014*
TV	24	32	50	41	31	178
Internet	31	55	38	29	49	202
Total	55	87	88	70	80	380
Escolaridade							<0.001*
Ensino Médio	50	59	23	30	25	187
Ensino Superior	5	17	58	38	50	168
Total	55	76	81	68	75	355
Acessa à Internet diariamente							<0,001**
Sim	35	81	78	62	79	335
Não	20	8	12	8	1	49
Total	55	89	90	70	80	384
Tempo de permanência conectado							<0,001**
Até 2 horas	46	48	51	52	41	238
Mais de 2 horas	9	41	39	18	39	146
Total	55	89	90	70	80	384

• Nota:
• ^*
  Teste Qui-quadrado de Pearson;
• ^**
  Teste Exato de Fisher.

Foram identificadas diferenças estatisticamente significativas entre os seguintes fatores, em relação às diferentes regiões brasileiras: os principais meios de obtenção de informações, TV e internet (p=0,014); os níveis de escolaridade mais prevalentes, nível médio e superior (p=0,001); o acesso à internet diariamente (p=0,001); e tempo de permanência conectado (p=0,001). Os meios de informações mais utilizados pelas pessoas idosas foram a TV e a internet (n= 380), sendo citados ainda rádio, jornais e livros impressos.

A TV foi a fonte preferida entre idosos do Sudeste e Centro-Oeste, e a internet entre idosos do Norte, Nordeste e Sul. Destaca-se esse fato quando se compara o nível de escolaridade, já que as regiões Norte e Nordeste são verificadas com a maioria dos idosos com apenas nível médio. Com relação ao acesso à internet, praticamente todos os idosos da região Nordeste e Sul acessavam diariamente, comparados a cerca de 85% nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, e apenas 63,63% para idosos da região Norte. Além disso, a maioria destes também não acessavam por mais de duas horas (16,4%), algo que foi similar para a região Centro-Oeste, onde apenas 25,7% permaneciam por mais de duas horas conectados. Nas outras regiões do país, 40% ou mais dos idosos permaneciam por mais de duas horas na internet.

Ademais, foi realizada uma análise bivariada entre a variável preditora ocupação com algumas variáveis desfechos, na qual se verificou associação estatística significante entre acessar a internet diariamente (p=0,002) e sanar dúvidas de saúde na internet (p= 0,01), sendo 34% (RP = 1,34; IC 95%: 1,18- 1,53) e 21% (RP= 1,21; IC 95%: 1,06- 1,38), respectivamente, mais frequentes entre as pessoas idosas que trabalhavam. De modo similar, foi associada a variável estado civil com o tempo de acesso à internet, quando se encontrou associação estatisticamente significante (p=0,01). Desse modo, o acesso à internet mais de uma vez ao dia é 30% mais frequente entre idosos que não têm companheiro (RP= 1,30- IC 95%: 1,15- 1,46).

Além disso, diferenças estatisticamente significantes também foram identificadas entre a idade dos idosos em relação ao acesso à internet diariamente, tempo de permanência conectado e os seguintes benefícios: autonomia, independência e interação. Idosos que usavam a internet diariamente (postos médios 64 vs. 66; p = 0,01) e por mais de 2 horas (postos médios 62 vs. 65; p = 0,004) eram os mais novos. De modo similar, autonomia e independência foram também mais frequentemente apontadas como benefício pelos idosos mais novos (postos médios 61vs. 64, p<0,001). Em contrapartida, a interação foi mais frequentemente apontada pelos idosos mais velhos (postos médios 65 vs. 62, p<0,001).

DISCUSSÃO

Este estudo descreve a utilização da internet pela pessoa idosa brasileira, em especial aquelas que utilizam as redes sociais Facebook e WhatsApp por meio do celular, haja vista que existe um quantitativo maior de idosos que utilizam a internet por outros meios. Por causa do sucesso e grande adesão dessas redes sociais, percebe-se uma escala sem precedentes de relações sociais se difundindo por esse sistema amplamente interconectado, afetando comportamentos públicos e construção de conhecimento⁽¹¹⁾. Compreende-se que tanto os homens quanto as mulheres empregam essas ferramentas tecnológicas no seu cotidiano, de modo que praticamente não houve diferença entre a quantidade de pessoas do sexo feminino e masculino nesta investigação, apesar de estudos demonstrarem finalidades diferentes^(12-13).

O uso do celular como o principal meio de acesso à internet pelas pessoas idosas é justificável quando se entende que os aparelhos portáteis possuem vantagens por serem utilizados em qualquer lugar, são fáceis de usar, pois são menos complexos que outras interfaces e não exigem infraestrutura com fio. Além disso, o custo financeiro é menor dessa tecnologia, comparado com outros dispositivos, e tem como comodidade estar utilizando a internet em sua própria casa⁽¹⁴⁾.

Em relação às regiões brasileiras onde residiam os idosos, observou-se que houve diferenças estatisticamente significante para as variáveis do meio de acesso às informações, nível de escolaridade e de acesso à internet, sendo que a minoria dos participantes se encontrava nas regiões Norte e Centro-Oeste. Entende-se que a diferença quantitativa de idosos que utilizam a internet por região neste estudo possa estar relacionada diretamente às condições sociais e educacionais ou, ainda, à densidade populacional.

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua⁽¹⁵⁾, a região Sudeste apresentou a maior porcentagem (81,1%) de domicílios que possuem acesso à internet, seguida da região Sul (76,7%) e a Nordeste (64%). Apesar disso e da maioria ter nível superior de escolaridade, os idosos do Sudeste preferem a TV como meio de informação, de acordo com os resultados deste estudo.

Vale ressaltar que 85% da amostra era composta por pessoas idosas com até 68 anos de idade, sendo considerados idosos jovens⁽¹⁶⁾. Nesse contexto, verificou-se que idosos que usavam a internet diariamente e por mais de 2 horas eram mais novos que os demais, apontando mais frequentemente autonomia e independência como benefício. Pesquisadores referem que idosos jovens têm aptidão para serem mais ativos na sociedade, apresentando capacidade funcional preservada e com interesse em expandir as possibilidades de evolução no âmbito humano, social e educacional, com objetivo na aprendizagem⁽¹⁷⁾.

Em meio a uma amostra de idosos jovens, verificou-se que cerca de 32% dos participantes deste estudo ainda estavam trabalhando, sendo que acessavam a internet e sanavam suas dúvidas de saúde mais frequentemente, quando comparado aos aposentados. Isso, talvez, pode ser explicado pelo fato das atividades laborais empregarem a utilização dessa tecnologia e/ou eles já estarem familiarizados com as ferramentas digitais⁽¹⁸⁾.

Todavia, a internet é pouco utilizada pelas pessoas idosas para fins trabalhistas, pois entende-se que a motivação para uso de redes sociais entre elas envolve, principalmente, vínculo social, meio de comunicação, curiosidade e resposta a pedidos de membros da família⁽¹⁹⁾. Além disso, estudo revelou que idosos usam Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) para encontrar informações, e por necessidade e desejo de se comunicarem com os outros e de se divertirem⁽²⁰⁾. Tal resultado foi confirmado neste estudo, quando se observou como principais atividades dos idosos na internet: ler, ouvir músicas, jogar, ver vídeos e fotos; conversar com alguém; conhecer novas pessoas e/ou buscar relacionamento amoroso; pesquisar e estudar; e acessar redes sociais.

O uso de TIC com objetivo de ensino e aprendizagem ainda é um desafio entre idosos. Nesse sentido, estudo realizado recentemente indicou que os idosos não possuem habilidades digitais e que existem sistemas de apoio limitados, sendo investigado como os idosos percebem suas próprias habilidades digitais, quais barreiras enfrentadas e que sistemas de suporte social e institucional existem para alcançar maior alfabetização digital⁽²¹⁾. As barreiras identificadas podem estar ligadas ao nível de escolaridade dos idosos, apesar de ter sido constatado que isso não é um imperativo para limitá-los. Neste estudo, verificou-se que a escolaridade não impediu que alguns idosos do usufruíssem da internet, já que dois participantes eram analfabetos e 15 possuíam apenas ensino fundamental, vislumbrando a importância da motivação para o ser humano.

Em meio ao achado de que 65% dos idosos participantes utilizavam a internet para sanar dúvidas de saúde e a importância da promoção da saúde por meio de TIC, compreendem-se quatro pontos importantes em uma TIC para idosos: utilidade da aprendizagem (responder às necessidades pessoais e sociais do idoso), cooperação e colaboração (concentrar-se no trabalho em equipe, apoio, coesão e interação para alcançar um aprendizado mais proativo), promoção da inclusão social e promoção da autonomia (ser protagonistas de seu próprio aprendizado)⁽¹⁴⁾. Tais pontos convergem para os benefícios mais citados pelos idosos neste estudo: a interação apontada por 75% da amostra, sendo mais frequentemente considerada por idosos mais velhos, seguida do aprendizado e da atualização, apontados por um quarto da amostra.

Quanto aos benefícios listados, apesar da interação ter sido a mais prevalente, verificou-se que entretenimento, aprendizado e atualização tinham relação com o sexo do idoso, sendo mais comumente apontados pelas idosas os dois primeiros. Além disso, são mulheres que costumam passar mais tempo conectadas, segundo este estudo. A diferença observada pode estar relacionada às características individuais, tais como motivações para o uso, personalidade, níveis de autoestima, bem como ao tempo de uso. As redes sociais, por serem recreativas e públicas, favorecem uma inclinação maior à atividade e aos relacionamentos sociais, além de proporcionarem uma tendência a encontrar, interagir e compartilhar informações com outros usuários^(22-23).

Quase todos os idosos participantes deste estudo acessavam a internet diariamente, e mais de uma vez ao dia. Esse acesso foi 30% mais frequente entre idosos que não tinham companheiro. Nesse sentido, estudo identificou que o uso das tecnologias digitais possibilita a busca por relacionamentos entre idosos, o que resulta na redução do sentimento de solidão e abandono, tornando-se ferramenta facilitadora na busca por companhia, de modo que se entende o envolvimento emocional como sentimento de maior relevância aludida pelos idosos⁽²⁴⁾.

No entanto, é preciso reconhecer que, com o avanço do uso da internet para esse fim, o público idoso torna-se vulnerável ao abuso digital nos relacionamentos amorosos, fato internacionalmente conhecido pelo termo Cyber Dating Abuse⁽²⁵⁾. Esse fenômeno compreende ameaças, insultos, humilhações ou comportamento de ciúme, além de incluir comportamentos de controle do parceiro (a exemplo de exigir senhas do celular ou de contas de e-mails), compartilhamentos de fotos ou vídeos do parceiro sem a sua permissão, pressão para que o parceiro envie fotos ou vídeos sexualmente explícitos ou pratique atos sexuais contra a sua vontade através da internet ou do celular^(26-27). Estudiosos afirmam que o abuso digital emerge, por um lado, da violência entre parceiros íntimos, e relaciona-se intimamente, por outro lado, com o desenvolvimento das tecnologias de comunicação e sua inserção no meio social⁽²⁸⁾.

Assim, cumpre destacar a importância dos profissionais de saúde estarem atentos à dimensão da sexualidade da pessoa idosa, principalmente na era digital, quando esse público ampliou suas perspectivas de satisfação de necessidades e desejos sexuais. Contudo, entender como a pessoa idosa pensa e sente em relação à sua sexualidade é necessário não somente para compreender o processo de envelhecimento associado à sexualidade, mas essencialmente para identificar e desenvolver estratégias que minimizem os efeitos da senescência relacionados à sexualidade, contribuindo para uma experiência positiva e saudável. Isso depende de um acompanhamento profissional despido de preconceitos, tabus e, sobretudo, de críticas^(29-30).

O uso da internet pela população idosa tem sido uma grande preocupação na busca de uma sociedade mais inclusiva, com o intuito de resolver as demandas frente ao processo de envelhecimento da população e das diversas mudanças das tecnologias digitais e de comunicação^(31-33). Dessa forma, a internet é um meio que as pessoas mais velhas utilizam para favorecer a inclusão social, com uma perspectiva de ter uma comunicação mais efetiva entre familiares e amigos, além das possibilidades de atualização e aprendizagem, interação, dentre outros.

Pode-se afirmar que a internet pode inserir as pessoas idosas socialmente no mundo contemporâneo, favorecendo novas perspectivas de interações sociais. Evidencia-se a relevância do acesso, do uso e da aprendizagem dos recursos tecnológicos pelas pessoas no contexto do envelhecimento. Um dos objetivos do envelhecimento saudável é continuar aprendendo para se adaptar às mudanças que ocorrem no envelhecimento e adquirir habilidades para continuar ativo e produtivo. Nesse sentido, acredita-se que o envolvimento dos idosos com a internet pode proporcionar essa conquista⁽³⁴⁾.

Limitações do estudo

Considerou-se como limitação da pesquisa o tipo de estudo, de caráter transversal, o qual não permite inferir causalidade. No entanto, a abrangência nacional e o público-alvo atingido minimizaram esse efeito. Além disso, a utilização do critério de inclusão de idosos usuários de apenas duas redes sociais e a dificuldade de inserção em grupos fechados do Facebook caracterizaram-se como limitações.

Com isso, recomendam-se novas pesquisas de abordagens mistas que possam aprofundar o universo da utilização da internet pelos idosos, tais como as informações compartilhadas, os links mais acessados, as repercussões sociais e na saúde após a utilização da internet. Ademais, verifica-se a necessidade de realizar pesquisas que possam esclarecer as associações verificadas, com o intuito de contribuir com a discussão da temática na Enfermagem, já que os enfermeiros devem prover o cuidado ao idoso, contemplando todas as necessidades humanas, inclusive a de utilização das tecnologias como meio facilitador de saúde.

Contribuições para a área da enfermagem

No âmbito da saúde, em especial da enfermagem, deve-se aliar as tecnologias existentes para promover saúde. O enfermeiro tem um papel significativo na assistência ao idoso, pois é quem mais convive e está mais próximo desse público. Dessa forma, a utilização da internet pelos enfermeiros e idosos pode proporcionar uma assistência mais eficaz, uma vez que contribui para acompanhamento e orientação de forma mais rápida e dinâmica⁽³⁴⁾.

Portanto, o enfermeiro precisa se apropriar das tecnologias, bem como da utilização da internet, de forma a oferecer múltiplas perspectivas sobre a ampliação da informação para essa população, favorecendo e possibilitando a interação e a construção coletiva do conhecimento. Além disso, esse profissional precisa oportunizar melhoria da qualidade de vida para a população idosa, com o intuito de propiciar repercussões sociais e de saúde de forma adequada e segura para os idosos.

Nessa perspectiva, os profissionais de saúde podem viabilizar ações de assistência a partir dos dados encontrados, sendo capazes de realizar ações preventivas e de promoção à saúde, bem como a criação de políticas públicas com o intuito de incluir o idoso na sociedade, por meio da utilização dessa ferramenta potente, que é a internet, como apoio na saúde.

A utilização dos dados desta pesquisa serve como subsídio para o aprimoramento dos profissionais de saúde em tecnologias digitais e de informação e comunicação, favorecendo inúmeras possibilidades de utilização dessa ferramenta como meio de alcance aos idosos. Nesse sentido, tem-se na internet uma forma de influenciar os comportamentos de saúde, tornando-se um meio eficiente para promoção de saúde na população focalizada.

CONCLUSÃO

Este estudo mostrou as principais características de pessoas idosas brasileiras que utilizam a internet, mais especificamente, por meio das redes sociais Facebook e WhatsApp, sendo possível reconhecer as possibilidades de estratégias de cuidados em saúde no espaço virtual. Idosos brasileiros que utilizam internet por meio das redes sociais citadas apresentaram idade média de 64,60 anos, eram em sua maioria casados, aposentados, com ensino médio completo, provenientes majoritariamente das regiões Sudeste, Nordeste ou Sul. A utilização da internet acontece predominantemente pelo celular para realizar atividades como ler, ouvir músicas, ver vídeos e fotos, jogar, conversar e conhecer novas pessoas e/ou buscar relacionamento amoroso. Percebeu-se que a informação sobre saúde é foco potencial de interesse desses idosos quando navegam na internet e nas redes sociais digitais, uma vez que 65% dos participantes afirmaram utilizá-las para sanar dúvidas sobre cuidados de saúde. Houve diferença estatisticamente significativa entre as diferentes regiões brasileiras com as variáveis relacionadas aos meios de obtenção de informações, escolaridade, acesso à internet diário e tempo de permanência conectado. Na análise bivariada entre ocupação e as variáveis acesso diário à internet e sanar dúvidas de saúde pela internet, verificou-se associação estatística significante. De forma semelhante, as associações entre estado civil e tempo de acesso à internet revelaram ser 30% mais frequente o acesso à internet mais de uma vez ao dia pelo idoso sem companheiro(a).

Além disso, diferenças estatisticamente significantes também foram identificadas entre a idade dos idosos em relação ao acesso à internet diariamente, o tempo de permanência conectado e os seguintes benefícios: autonomia e independência e interação.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Fátima Helena Espírito Santo

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  06 Nov 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  03 Abr 2020
• Aceito
  27 Jul 2020