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Conhecimento, atitudes e necessidades de qualificação de profissionais da atenção básica no atendimento às demências

RESUMO

Objetivo:

Identificar o conhecimento e as atitudes de médicos e enfermeiros no rastreamento, diagnóstico, tratamento e acompanhamento das demências e suas necessidades educacionais nesta temática.

Método:

Estudo transversal, realizado com 195 médicos e 274 enfermeiros atuantes nas equipes da Estratégia Saúde da Família, do município de São Paulo. Utilizou-se o instrumento Atenção Sanitária às Demências: a visão da Atenção Básica. Os dados foram submetidos à estatística descritiva.

Resultados:

Dentre os médicos, 64,1% referiram realizar o diagnóstico da demência de forma rotineira, mas apenas 23,1% na fase leve; 89,2% mencionaram dificuldades para identificar casos da doença; 94,9%, dificuldades para tratamento e acompanhamento dos pacientes, incluindo as necessidades de apoio ao cuidador (28,2%); 84,6% dos médicos e 79,2% dos enfermeiros referiram dificuldades no acompanhamento à forma grave da doença.

Conclusão:

Foram identificadas lacunas no conhecimento referentes ao rastreamento e diagnóstico das demências, acompanhamento dos pacientes, informação diagnóstica e suporte ao cuidador.

Descritores:
Educação Profissional em Saúde Pública; Atenção Primária à Saúde; Médicos; Enfermeiras e Enfermeiros; Demência

ABSTRACT

Objective:

To identify the knowledge and attitudes of doctors and nurses in tracking, diagnosing, treating, and monitoring dementias and their educational needs in this area.

Method:

Cross-sectional study, carried out among 195 doctors and 274 nurses working in teams of the Family Health Strategy (FHS) in the city of São Paulo. The instrument used was Health Care for Dementia: the Primary Care perspective. The data were submitted for descriptive statistics.

Results:

Among physicians, 64.1% reported routinely diagnosing dementia, but only 23.1% in the mild phase; 89.2% mentioned difficulties in identifying cases of the disease; 94.9%, difficulties in the treatment and monitoring of patients, including the needs to support the caregiver (28.2%); 84.6% of doctors and 79.2% of nurses reported difficulties in monitoring severe cases of the disease.

Conclusion:

Gaps in knowledge were identified regarding the tracking and diagnosis of dementia, patient monitoring, diagnostic information, and support for the caregiver.

Descriptors:
Education, Public Health Professional; Primary Health Care; Physicians; Nurses; Dementia

RESUMEN

Objetivo:

Identificar el conocimiento y las actitudes de médicos y enfermeros en el rastreo, diagnóstico, tratamiento y acompañamiento de las demencias y sus necesidades educacionales.

Método:

Estudio transversal, realizado con 195 médicos y 274 enfermeros actuantes en la Estrategia Salud de la Familia, del municipio de São Paulo. Se utilizó el instrumento Atenção Sanitária às Demências: a visão da Atenção Básica. Los datos han sometidos a la estadística descriptiva.

Resultados:

Entre los médicos, 64,1% refirieron realizar el diagnóstico habitualmente, pero 23,1% en la fase leve; 89,2% mencionaran dificultades para identificar casos de la enfermedad; 94,9%, dificultades para tratamiento y acompañamiento de los pacientes (28,2%); 84,6% de los médicos y 79,2% de los enfermeros refirieron dificultades en el acompañamiento a la forma grave de la enfermedad.

Conclusión:

Identificaron lagunas en el conocimiento referentes al rastreo y diagnóstico de las demencias, acompañamiento de los pacientes, información diagnóstica y suporte al cuidador.

Descriptores:
Educación Profesional en Salud Pública; Atención Primaria a la Salud; Médicos; Enfermeras y Enfermeros; Demencia

INTRODUÇÃO

O envelhecimento é certamente uma conquista da humanidade. Entretanto, o aumento da longevidade pode vir acompanhado de doenças crônico-degenerativas, como as demências, que estão entre as principais causas de incapacidade na velhice. Em 2016, estimou-se que havia um total de 43,8 milhões de pessoas vivendo com essa síndrome em todo o mundo. Projeções indicam que esse número poderá chegar a 100 milhões em 2050(11 Nichols E, Szoeke CEI, Vollset SE, Abbasi N, Abd-Allah F, Abdela J, et al. Global, regional, and national burden of Alzheimer’s disease and other dementias, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Neurol. 2019;18(1):88-106. doi: 10.1016/S1474-4422(18)30403-4
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).

A demência pode ser definida como uma disfunção cerebral caracterizada por deterioração intelectual adquirida e persistente, que compromete gradativamente as funções em três esferas: cognição, função e comportamento. Do ponto de vista cognitivo, alteram-se as funções de memória, linguagem, praxia e gnosia, além de alterações visuoespaciais. O comprometimento pode afetar funções em duas esferas: Atividades de Vida Diária, como banho, vestuário, alimentação, asseio, transferência e continência; e Atividades Instrumentais de Vida Diária, como controle das finanças, atividades profissionais e todas aquelas que envolvem competência para realizar tarefas moduladas pelo lobo frontal. Os sintomas comportamentais geralmente incluem agitação, disforia, apatia, irritabilidade, comportamento motor aberrante, delírios, alucinações, desinibição, entre outros, que tendem a aumentar conforme o avanço da doença(11 Nichols E, Szoeke CEI, Vollset SE, Abbasi N, Abd-Allah F, Abdela J, et al. Global, regional, and national burden of Alzheimer’s disease and other dementias, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Neurol. 2019;18(1):88-106. doi: 10.1016/S1474-4422(18)30403-4
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2 Barbosa MEM, Corso ER, Scolari GAS, Carreira L. Interdisciplinarity of care to the elderly with Alzheimer’s disease: reflection to the light of the theories of Leininger and Heller. Esc Anna Nery. 2020;24(1):e20190083. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2019-0083
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-33 World Health Organization. Global action plan on the public health response to dementia 2017-2025 [Internet]. 2017 [2019 Apr 19]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259615/9789241513487-eng.pdf
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).

As demências podem ser causadas por desordens neurodegenerativas de várias etiologias: vasculares, traumáticas, desmielinizantes, neoplásicas, hidrocefálicas, tóxicas, infecciosas, inflamatórias, dentre outras. São classificadas em primárias (decorrentes de lesões na estrutura cerebral) e secundárias a outras doenças de base — por exemplo, a hipertensão arterial e o diabetes mellitus. São ainda divididas em dois grandes grupos: reversíveis, incluindo alterações metabólicas, intoxicações, infecções e deficiências nutricionais, e irreversíveis, como a doença de Alzheimer (DA), a demência vascular (DV), a mista (DM), por corpúsculo de Lewy (DCL), frontotemporal (DFT) e as doenças de Parkinson (DP), Huntington (DH) e Creutzfeldt-Jakob (DCJ)(11 Nichols E, Szoeke CEI, Vollset SE, Abbasi N, Abd-Allah F, Abdela J, et al. Global, regional, and national burden of Alzheimer’s disease and other dementias, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Neurol. 2019;18(1):88-106. doi: 10.1016/S1474-4422(18)30403-4
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-22 Barbosa MEM, Corso ER, Scolari GAS, Carreira L. Interdisciplinarity of care to the elderly with Alzheimer’s disease: reflection to the light of the theories of Leininger and Heller. Esc Anna Nery. 2020;24(1):e20190083. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2019-0083
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). A DA é a forma mais comum da síndrome em todo o mundo, correspondendo a 60% a 70% dos casos. É seguida, em ordem de frequência, pela DV, DCL e DFT. Também são frequentes as formas mistas(11 Nichols E, Szoeke CEI, Vollset SE, Abbasi N, Abd-Allah F, Abdela J, et al. Global, regional, and national burden of Alzheimer’s disease and other dementias, 1990-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet Neurol. 2019;18(1):88-106. doi: 10.1016/S1474-4422(18)30403-4
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2 Barbosa MEM, Corso ER, Scolari GAS, Carreira L. Interdisciplinarity of care to the elderly with Alzheimer’s disease: reflection to the light of the theories of Leininger and Heller. Esc Anna Nery. 2020;24(1):e20190083. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2019-0083
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-33 World Health Organization. Global action plan on the public health response to dementia 2017-2025 [Internet]. 2017 [2019 Apr 19]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259615/9789241513487-eng.pdf
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).

Revisão sistemática que avaliou a prevalência global de demência entre indivíduos com 60 anos e mais, incluindo 147 estudos publicados no período de 1980 a 2009, identificou taxas entre 5% e 7% na maior parte das regiões do mundo (países da América do Norte, América Latina, Oceania, Ásia e Europa). Na metanálise, verificou-se que a porcentagem aumentou com a idade e foi maior em regiões com economia mais vulnerável(33 World Health Organization. Global action plan on the public health response to dementia 2017-2025 [Internet]. 2017 [2019 Apr 19]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259615/9789241513487-eng.pdf
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). No Brasil, revisão de literatura que incluiu estudos publicados entre 1995 e 2012 estimou uma prevalência de 7,6% entre pessoas com 65 anos ou mais. A taxa foi maior para a DA, em torno de 54% dos casos, aumentou com a idade e foi maior entre as mulheres(44 Prince M, Bryce R, Albanese E, Wimo A, Ribeiro W, Ferri CP. The global prevalence of dementia: a systematic review and metaanalysis. Alzheimers Dement. 2013;9(1):63-75. doi: 10.1016/j.jalz.2012.11.007
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).

Vivenciar um quadro de demência é doloroso tanto para o portador quanto para os familiares. O ato de cuidar de um familiar idoso com demência é tarefa extremamente complexa. A falta de compreensão sobre o quadro demencial resulta em estigmatização do paciente. As barreiras vão do diagnóstico aos cuidados de saúde, com impactos negativos na vida dos cuidadores e familiares nos aspectos físico, psicológico e emocional, razão pela qual os cuidadores necessitam não só de informações sobre a doença e suas manifestações, mas, sobretudo, que suas limitações e inseguranças sejam conhecidas e valorizadas pela equipe de saúde(55 Nieuwboer MS, Richters A, Van der Marck MA. Triple aim improvement for individuals, services and society in dementia care: the DementiaNet collaborative care approach. Z Gerontol Geriatr. 2017;50(Suppl 2):78-83. doi: 10.1007/s00391-017-1196-4
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).

Para os profissionais de saúde, saber reconhecer os sintomas da doença e orientar os cuidadores de forma efetiva pode colaborar para diminuir a tensão entre ambos. Na maioria das vezes, os cuidadores beneficiam-se do suporte emocional e educacional proveniente de profissionais especializados(55 Nieuwboer MS, Richters A, Van der Marck MA. Triple aim improvement for individuals, services and society in dementia care: the DementiaNet collaborative care approach. Z Gerontol Geriatr. 2017;50(Suppl 2):78-83. doi: 10.1007/s00391-017-1196-4
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6 Mattos EBT, Kovacs MJ. Doença de Alzheimer: a experiência única de cuidadores familiares. Psicol USP. 2020;(31):e180023. doi: 10.1590/0103-6564e180023
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-77 Springate BA, Tremont G. Dimensions of caregiver burden in dementia: impact of demographic, mood, and care recipient variables. Am J Psychiatry Geriatr. 2014;22(3):294-300. doi: 10.1016/j.jagp.2012.09.006
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). O médico generalista possui papel destacado na prevenção, no diagnóstico e no tratamento dos problemas mentais da terceira idade. Já a assistência de enfermagem deve ser planejada com o objetivo de preservar a autonomia e a independência do paciente, proporcionar conforto, avaliar e orientar sobre a nutrição, avaliar as complicações de saúde, se há angústia e alteração de sintomas comportamentais, bem como ajudar os familiares nos dilemas éticos e nas tomadas de decisão. Entretanto, nem sempre os profissionais estão preparados para tal(55 Nieuwboer MS, Richters A, Van der Marck MA. Triple aim improvement for individuals, services and society in dementia care: the DementiaNet collaborative care approach. Z Gerontol Geriatr. 2017;50(Suppl 2):78-83. doi: 10.1007/s00391-017-1196-4
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,88 Guimarães TMR, Silva KNF, Cavalcanti HGO, Souza ICA, Leite JS, Silva JTB, et al. Assistência de enfermagem aos pacientes com Doença de Alzheimer em cuidados paliativos: revisão sistemática. REAS/EJCH. 2020;Sup(38):1-10. doi: 10.25248/reas.e1984.2020
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).

O conhecimento restrito afeta de várias maneiras o portador de demência, seus cuidadores, as famílias e as estruturas de apoio. Repercute negativamente na unidade familiar e aumenta sua vulnerabilidade. Em diversos países, incluindo aqueles que passam por transição econômica, os membros de famílias grandes já não vivem perto de seus familiares e não são mais capazes de absorver o impacto decorrente da prestação de cuidados. Essa mudança resulta em maior necessidade de cuidados profissionais, algo que tende a crescer em um futuro próximo. O conhecimento limitado e a infraestrutura precária para fornecer suporte adequado e oportuno nos casos de demência aumentam a probabilidade de aumento de custos, dependência e morbidade(33 World Health Organization. Global action plan on the public health response to dementia 2017-2025 [Internet]. 2017 [2019 Apr 19]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259615/9789241513487-eng.pdf
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,55 Nieuwboer MS, Richters A, Van der Marck MA. Triple aim improvement for individuals, services and society in dementia care: the DementiaNet collaborative care approach. Z Gerontol Geriatr. 2017;50(Suppl 2):78-83. doi: 10.1007/s00391-017-1196-4
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,99 Barcellos AP, Souza F, Mello HL, Florentino J, Souza S, Bianco T. Right to healthcare and priorities: introduction to an inevitable debate. Rev Direito GV. 2017;13(2):457-83. doi: 10.1590/2317-6172201718
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).

Os serviços de cuidados primários deveriam fornecer assistência integral à saúde de pacientes com demência. Entretanto, a doença é subdiagnosticada em instituições de cuidados primários de saúde, com números entre 25% e 80%. Variações na gravidade e na duração dos sintomas têm sido destacadas como aspectos que influenciam a detecção da demência em serviços de cuidados primários. Além disso, nem todos os casos detectados são encaminhados a serviços especializados para realizar o diagnóstico etiológico. Dentre as razões para a falta de encaminhamento, predominam as dúvidas dos próprios profissionais de saúde e de familiares sobre os benefícios que o diagnóstico etiológico pode trazer para a qualidade de vida do paciente(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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).

No Brasil, a assistência à saúde está vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS). Atualmente, a Estratégia Saúde da Família (ESF) é considerada a forma prioritária para a reorganização da Atenção Básica (AB) no país. Recentemente, o Ministério da Saúde lançou o manual de Orientações Técnicas para a Implementação de Linha de Cuidado para Atenção Integral à Saúde do Idoso no SUS, que recomenda o uso do instrumento Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa na Atenção Básica (AMPI-AB) para identificar as necessidades de saúde dos idosos e estratificá-los em três grandes perfis (frágil, pré-frágil e saudável), de acordo com os níveis de funcionalidade, a fim de estabelecer os cuidados necessários(1111 Veras RP, Oliveira M. Aging in Brazil: the building of a healthcare model. Ciên Saúde Colet. 2018;23(6):1929-36. doi: 10.1590/1413-81232018236.04722018
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-1212 Ministério da Saúde (BR). Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas [Internet]. Brasília: MS; 2018 [2019 Apr 19]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/linha_cuidado_atencao_pessoa_idosa.pdf
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).

Diante de tal cenário, este estudo buscou responder o seguinte questionamento: Qual o conhecimento e as atitudes dos profissionais da ESF em relação ao acompanhamento das demências? A resposta para tal pergunta permite subsidiar propostas de capacitação futuras das equipes, no âmbito da AB.

OBJETIVO

Identificar o conhecimento e as atitudes de médicos e enfermeiros em relação ao rastreamento, diagnóstico, tratamento e acompanhamento das demências, assim como suas necessidades educacionais na temática.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O projeto foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo e da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo. Conforme a legislação vigente no país, os participantes receberam informações sobre o objetivo do estudo, riscos e benefícios, assim como sobre o direito a indenização, caso se sentissem lesados em decorrência da participação. Todos os que concordaram em participar do estudo assinaram duas vias do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE (uma via, do sujeito; e a outra, da pesquisadora).

Desenho, período e local do estudo

Estudo transversal, prospectivo e quantitativo, norteado pela ferramenta STROBE(1313 Malta M, Cardoso LO, Bastos FI, Magnanini MF, Silva MFP. Iniciativa STROBE: subsídios para a comunicação de estudos observacionais. Rev Saúde Pública. 2010;44(3):559-65. doi: 10.1590/S0034-89102010000300021
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), desenvolvido em Unidades Básicas de Saúde com ESF pertencentes às Coordenadorias Regionais de Saúde Oeste, Centro, Sudeste e Norte do município de São Paulo, SP, Brasil, entre fevereiro e julho de 2018. Tais regiões foram escolhidas por concentrarem o maior número de idosos (acima de 60 anos), quando comparadas às demais.

Amostra e critérios de inclusão/exclusão

A população foi composta por médicos e enfermeiros que atuam nas unidades de saúde com ESF do município de São Paulo, SP. A amostra inicial foi composta por 508 médicos e 508 enfermeiros. Os critérios de inclusão na pesquisa foram: ser enfermeiro ou médico nas unidades incluídas na pesquisa e atuar na ESF por um período igual ou superior a 12 meses. Foram excluídos os sujeitos ausentes nas unidades por um período igual ou superior a 15 dias.

Incluíram-se todos os profissionais que preencheram os critérios de inclusão no estudo, constituindo uma amostra por conveniência. Da amostra inicial, foram excluídos 51 médicos e 15 enfermeiros, por ausência do profissional na equipe; 85 médicos e 46 enfermeiros, por atuarem na ESF durante período menor que 12 meses; 86 médicos e 89 enfermeiros, por recusa em participar do estudo; e 91 médicos e 84 enfermeiros, por estarem ausentes na unidade por um período igual ou superior a 15 dias. Dessa maneira, a amostra final do estudo foi composta por 195 médicos e 274 enfermeiros.

Protocolo do estudo

A coleta de dados foi realizada por meio da autoaplicação pelos profissionais do instrumento Atenção Sanitária às Demências: a visão da Atenção Básica, em suas versões para médicos (ASDVAB-M) e enfermeiros (ASDVAB-E), traduzido e adaptado culturalmente para o Brasil(1414 Costa GD, Souza RA, Yamashita CH, Pinheiro JCF, Alvarenga MRM, Oliveira MAC. Evaluation of professional knowledge and attitudes on dementia patient care: a trans-cultural adaptation of an evaluation instrument. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(2):298-308. doi: 10.1590/S0080-623420150000200016
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), sendo a versão original de origem espanhola(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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).

O ASDVAB-M contém 28 perguntas, incluindo um estudo de caso; já o ASDVAB-E é composto por 16 perguntas. Ambas as versões contêm questões abertas e fechadas (múltipla escolha, ordem de classificação e dicotômicas) referentes a: perfil profissional e necessidades educacionais dos profissionais em demência; processo diagnóstico das demências; informações fornecidas ao paciente e suas famílias; acompanhamento dos pacientes e cuidadores; funções principais da enfermeira na atenção aos pacientes com demência e suas famílias; e relação dos médicos com o serviço especializado. Não existem respostas incorretas: é solicitada a opinião dos profissionais em relação a procedimentos relacionados a sua prática clínica habitual, com o intuito de conhecer como atuam no atendimento aos pacientes com demência e suas famílias(1414 Costa GD, Souza RA, Yamashita CH, Pinheiro JCF, Alvarenga MRM, Oliveira MAC. Evaluation of professional knowledge and attitudes on dementia patient care: a trans-cultural adaptation of an evaluation instrument. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(2):298-308. doi: 10.1590/S0080-623420150000200016
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).

Análise dos resultados e estatística

As respostas foram analisadas por meio de estatística descritiva (número e porcentagem, média, desvio-padrão, mediana, mínima e máxima) e intervalo de confiança. Os dados foram armazenados no programa Excel® e analisados pelo Software R 3.5.1®. O nível de significância adotado foi de 5%; e os intervalos de confiança (IC), estabelecidos em 95%.

Os resultados das análises da aplicação do instrumento foram interpretados; e as lacunas de conhecimento, identificadas mediante o cotejo das respostas com as diretrizes e publicações vigentes para o atendimento às demências.

RESULTADOS

Preencheram os critérios de inclusão no estudo e participaram da pesquisa 469 profissionais, sendo 195 médicos e 274 enfermeiros, com uma representatividade de 38,4% e 53,9% da amostra inicial, assim distribuídos no município de São Paulo: 263 (56,1%) são vinculados à Coordenadoria Regional de Saúde Norte; 148 (31,5%), à Sudeste; 37 (7,9%), à Centro; e 21 (4,5%), à Oeste.

As idades dos profissionais médicos variaram de 25 e 68 anos, com média de 43,9 e mediana de 34 anos; já para os enfermeiros, entre 26 a 65 anos, com média de 39,2 e mediana de 37,5 anos. Em ambas as categorias profissionais, predominou o sexo feminino (60% médicas e 90,1% enfermeiras); na comparação com as médicas, houve predomínio de enfermeiras (p ≤ 0,001).

O tempo médio de experiência de trabalho na AB foi de 7 anos para os médicos e 10 anos para os enfermeiros (mín./máx.: 1–40; 1–35; DP = 7, 5; IC 95%: 4,5–6,5; 9,0–10,0). Já o tempo médio de atuação na unidade de saúde foi de 4 anos para médicos e 5 anos para enfermeiros (mín./máx.: 0,8–22; 0,8–20; DP = 4,4; IC 95%: 2,0–3,0; 4,5–5,5). Em ambos os casos, o tempo de trabalho foi maior entre os enfermeiros (p ≤ 0,001).

No processo de rastreamento e diagnóstico das demências, 64,1% dos médicos referiram realizar diagnóstico da doença de forma rotineira; e 56,9%, já na fase moderada (IC 95%: 49,9–63,7). Com relação ao número de casos novos atendidos e diagnosticados, houve predomínio de 5 a 9 pacientes nos últimos 12 meses (59,5% dos médicos e 63,1% dos enfermeiros). Trinta e dois (16,4%) médicos informaram não realizar o diagnóstico de demência, preferindo encaminhar o paciente ao especialista (IC 95%: 11,9–22,2).

Quanto aos sinais e sintomas mais considerados pelos profissionais para o diagnóstico de demência, 52,3% dos médicos mencionaram como prioridades o comprometimento cognitivo com alterações de memória; e 34,4%, os sintomas psicológicos e comportamentais das demências (depressão, delírios, agitação, alterações de personalidade etc.). Os enfermeiros relataram as mesmas prioridades, porém em ordem inversa, com 44,9% e 50%, respectivamente (Tabela 1).

Tabela 1
Processo de rastreamento e diagnóstico das demências pelas equipes da Estratégia Saúde da Família (n = 469), São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Houve predomínio do uso de instrumentos para avaliação da capacidade cognitiva pelos médicos (médicos: 159, 81,5%; enfermeiros: 201, 73,4%; p = 0,039), especificamente o Mini Exame do Estado Mental – MEEM (p = 0,002) e o teste do relógio (p = 0,047). Entre os enfermeiros, observou-se preponderância do uso de instrumentos para avaliação da capacidade funcional (médicos: 71 ou 37% e enfermeiros 159 ou 58%; p ≤ 0,001) (Tabela 1). Quatro (2,0%) médicos e 25 (9,1%) enfermeiros referiram utilizar a AMPI-AB para a avaliação cognitiva ou funcional.

Dificuldades enfrentadas no diagnóstico das demências foram mencionadas por 174 (89,2%) médicos. As dificuldades predominantes foram diferenciar os sinais e os sintomas da demência da depressão geriátrica e os sinais e sintomas de demência do envelhecimento normal, respectivamente citadas por 40% e 34,9% dos médicos. Ademais, 175 (89,0%) fizeram referência a aspectos dificultadores no momento de realizar o diagnóstico, dentre os quais a falta de tempo para aplicar testes e realizar análises (56,4%) e a pouca confiança ao emitir o diagnóstico (19%) (Tabela 1).

Dentre os exames complementares mais solicitados pelos médicos para realizar o diagnóstico do subtipo de demência, foram mencionados o hemograma (57,9%; IC 95%: 50,9–64,7), o hormônio estimulante da tireoide (57,4%; IC 95%: 50,4–64,2), a vitamina B12 (55,9%; IC 95%: 48,9–62,7), o exame bioquímico com glicemia (55,4%; IC 95%: 48,4–62,2), a sorologia para sífilis (54,9%; IC 95%: 47,9–61,7) e a tomografia computadorizada do crânio (43,1%; IC 95%: 36,3–50,1) (Tabela 1). Quarenta e cinco médicos (23,1%) informaram não utilizar exames complementares para diagnosticar o subtipo da doença, preferindo encaminhamento ao especialista (IC 95%: 17,7–29,5).

A maioria dos médicos referiu informar às famílias o diagnóstico dos pacientes às vezes e frequentemente (69%) e raramente ou às vezes (62%). Do total, 138 (70,8%) fizeram referência a fatores intervenientes no momento de informar o diagnóstico ao paciente, dentre os quais a ausência de capacidade cognitiva do paciente para compreender a informação sobre o diagnóstico (34,4%) e o estágio avançado da doença (21,5%) (Tabela 2).

Tabela 2
Informação diagnóstica das demências ao paciente e suas famílias pelas equipes da Estratégia Saúde da Família (n = 195), São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

O número mensal de consultas variou de 1 a 4 (65,6% dos médicos e 63,1% dos enfermeiros). Além disso, 79,5% dos médicos e 82,9% dos enfermeiros referiram programar de forma habitual visitas domiciliárias para acompanhamento dos pacientes.

Quanto ao encaminhamento a serviços médicos especializados no diagnóstico ou no controle das demências, a maioria dos médicos citou o neurologista de referência (64,6%), o Centro de Referência do Idoso (63,6%) e o Ambulatório Médico de Especialidades – AME (41,5%). Sessenta e oito (34,9%) profissionais referiram encaminhar mais de 75% dos casos suspeitos para confirmar o diagnóstico (IC 95%: 28,5–41,8); e 50 (25,6%) informaram direcionar para o controle dos distúrbios comportamentais (IC 95%: 20,0–32,2) (Tabela 3).

Tabela 3
Acompanhamento dos pacientes com demência pelas equipes da Estratégia Saúde da Família (n = 469), São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Dentre as funções da equipe de enfermagem no acompanhamento das demências, os enfermeiros classificaram como prioridades a avaliação periódica do comprometimento cognitivo (42,3%), a avaliação de riscos no domicílio (31%) e o apoio às necessidades do cuidador ou da família (26,6%) (Tabela 3).

A quase totalidade dos médicos referiu dificuldades no tratamento e no acompanhamento dos pacientes com demência (185; 94,9%; IC 95%: 90,8–97,2), com destaque para o tratamento com fármacos específicos como anticolinesterásicos e memantina (32,3%), a grande quantidade de tempo requerida para o acompanhamento e tratamento (31,3%) e as necessidades de apoio ao cuidador e à família (28,2%) (Tabela 3).

Nas demências graves, 84,6% dos médicos e 79,2% dos enfermeiros relataram dificuldades no tratamento farmacológico complexo (45,6% dos médicos), falta de suporte para o atendimento especializado (39,5% dos médicos e 44,3% dos enfermeiros) e demandas não solucionáveis na AB (35,9% dos médicos e 37% dos enfermeiros) (Tabela 3).

Mais de 70% dos médicos informaram que sempre ou quase sempre indicam exercícios de memória e estimulação cognitiva e encaminham os casos suspeitos ao especialista. Quanto ao ingresso em uma Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI), cerca de 65% dos médicos quase nunca ou nunca o recomendam (Tabela 4).

Tabela 4
Acompanhamento dos pacientes com demência pelas equipes da Estratégia Saúde da Família - recomendação médica (n = 195), São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Houve predomínio dos enfermeiros no planejamento e no acompanhamento específico das necessidades de saúde dos cuidadores de pacientes com demência (p = 0,003). A distribuição dos resultados em frequência absoluta e relativa pode ser observada na Tabela 5.

Tabela 5
Acompanhamento do cuidador do paciente com demência pelas equipes da Estratégia Saúde da Família (n = 469), São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

A satisfação dos médicos em relação ao encaminhamento dos pacientes com demência aos serviços especializados foi consideravelmente baixa. A maior satisfação foi para a capacidade de solucionar as demandas (5,7) (mín./máx.: 1–10; mediana: 5,0; DP = 2,4; IC 95%: 5,5–6,0) e a menor, para a devolução das informações ao serviço de AB (3,3) (mín./máx.: 1–10; mediana: 2; DP = 2,6; IC 95%: 3,0–3,5). No mais, o acompanhamento ao paciente pelo serviço especializado apresentou uma média de satisfação de 5,5 (mín./máx.: 1–10; mediana: 5; DP = 2,5; IC 95%: 5,0–6,0); o tempo de espera desde a solicitação da visita ao paciente até sua realização foi de 4,0 (mín./máx.: 1–10; mediana: 4,0; DP = 2,5; IC 95%: 3,5–4,5); e a acessibilidade ao serviço de emergência, de 3,8 (mín./máx.: 1–10; mediana: 3,0; DP = 2,6; IC 95%: 3,0–4,0).

Por fim, 98,1% (IC 95%; 96,4–99,0) dos profissionais consideraram necessário realizar capacitação específica em demência (99,5% dos médicos e 97,1% dos enfermeiros). Entretanto, 122 (62,6%) médicos e 149 (54,4%) enfermeiros sinalizaram nunca ter participado de capacitação com essa finalidade. Entre os que referiram participação no último ano, 18,5% (36) eram médicos e 20,1% (55), enfermeiros.

DISCUSSÃO

Os resultados revelados neste estudo corroboram a literatura especializada, na qual se destaca: a fase moderada como aquela em que o diagnóstico da demência é mais comumente feito; a baixa confiança dos médicos em realizar o diagnóstico, visto que grande parte não diagnostica o subtipo de demência, preferindo encaminhar o paciente ao especialista; a dificuldade em diferenciar os sinais e sintomas da demência do envelhecimento normal e da depressão geriátrica; a falta de tempo e a pouca confiança ao emitir o diagnóstico(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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,1515 Poltroniere S, Cecchetto FH, Souza EN. Alzheimer diseases and care demands: what do nurses know? Rev Gaúcha Enferm. 2011;32(2):270-8. doi: 10.1590/S1983-14472011000200009
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16 Martín-Carrasco M, Arranz FJ. Perspectives of Spanish psychiatrists on the management of dementias: the PsicoDem survey. Rev Psiquiatr Salud Ment. 2014;9(14):1-9. doi: 10.1016/j.rpsmen.2015.03.002
https://doi.org/10.1016/j.rpsmen.2015.03...

17 Parmar J, Dobbs B, McKay R, Kirwan C, Cooper T, Marin A, et al. Diagnosis and management of dementia in primary care: exploratory study. Can Fam Physician [Internet]. 2014 [2019 Apr 5];60(5):457-65. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4020652/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
-1818 Barbosa LFLN. Knowledge and attitude of the physicians and nurses of the PSF of Piracicaba in the care of elderly people with dementia [Internet]. Piracicaba: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Odontologia; 2014 [2019 Apr 9]. Available from: http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/288036
http://repositorio.unicamp.br/jspui/hand...
).

Uma pequena parcela de médicos e enfermeiros fez referência à AMPI-AB, cuja implantação na AB vem possibilitando a instrumentalização dos profissionais para a avaliação dos idosos no município de São Paulo, SP, Brasil. Recentemente, o instrumento passou por reformulação, de modo que, além da redução do tempo de aplicação, as perguntas ficaram mais objetivas, claras e fáceis de responder.

Em relação aos exames solicitados pelos médicos da ESF para diagnóstico do subtipo de demência, foram destacados aqueles cuja solicitação é permitida nesse nível de atenção à saúde, dentre eles o hemograma, a dosagem da vitamina B12, o exame bioquímico com glicemia, a sorologia para sífilis e a tomografia computadorizada do crânio. Quanto aos testes de rastreio para demência, os instrumentos mais citados foram o MEEM e o Índice de Katz, todavia foi constatada maior tendência dos médicos em realizar a avaliação cognitiva, enquanto os enfermeiros incumbiram-se preferencialmente da avaliação funcional, o que também ocorreu no estudo espanhol(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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).

Constatou-se que a informação sobre o diagnóstico é dada com maior frequência aos familiares. Dentre os motivos para não revelar o diagnóstico aos pacientes, foram citados a ausência de capacidade cognitiva para compreender a informação e o estágio avançado da doença, à semelhança do estudo espanhol(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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). A opinião dos familiares é decisiva para não comunicar o diagnóstico ao paciente em pelo menos um terço dos casos. Treinamentos que abranjam aspectos ético-legais relacionados às demências podem ser úteis para a decisão da comunicação do diagnóstico da doença ao paciente(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
https://doi.org/10.1016/j.aprim.2010.11....
,1919 Wang Y, Xiao LD, Ullah S, Ele GP, De Bellis A. Evaluation of a nurse-led dementia education and knowledge translation programme in primary care: a cluster randomized controlled trial. Nurse Educ Today. 2017;49:1-7. doi: 10.1016/j.nedt.2016.10.016
https://doi.org/10.1016/j.nedt.2016.10.0...
-2020 Wilcock J, Iliffe S, Griffin M, Jain P, Thuné-Boyle I, Lefford F, et al. Tailored educational intervention for primary care to improve the management of dementia: the EVIDEM-ED cluster randomized controlled trial. Trials. 2013;14:397. doi: 10.1186/1745-6215-14-397
https://doi.org/10.1186/1745-6215-14-397...
).

Os profissionais elencaram dificuldades no acompanhamento dos pacientes com demência na AB, dentre elas a falta de tempo para a consulta; o manejo complicado desses pacientes, sobretudo relacionado à prescrição de fármacos específicos para tratamento das demências; a necessidade de visitas e consultas frequentes; a falta de suporte para o atendimento especializado; as demandas não solucionáveis nesse nível de atenção e a necessidade de apoio familiar e social. Um percentual considerável referiu que habitualmente programa visitas para o acompanhamento desses pacientes. Tais resultados não diferem dos encontrados por outros estudos assemelhados(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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,1515 Poltroniere S, Cecchetto FH, Souza EN. Alzheimer diseases and care demands: what do nurses know? Rev Gaúcha Enferm. 2011;32(2):270-8. doi: 10.1590/S1983-14472011000200009
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).

Estudo qualitativo realizado no Brasil com 22 enfermeiros de unidades de internação a fim de verificar seu conhecimento acerca da DA e a demanda de cuidados de pacientes e familiares revelou conhecimento limitado sobre a temática. A análise dos discursos evidenciou que na maioria das vezes reconheciam os sinais e os sintomas característicos e as possíveis complicações da doença, mas desconheciam os aspectos relacionados a seu manejo(1515 Poltroniere S, Cecchetto FH, Souza EN. Alzheimer diseases and care demands: what do nurses know? Rev Gaúcha Enferm. 2011;32(2):270-8. doi: 10.1590/S1983-14472011000200009
https://doi.org/10.1590/S1983-1447201100...
).

Estudo transversal realizado com 152 médicos do primeiro ano do programa de residência da Universidade Federal de São Paulo evidenciou baixo percentual de respostas relacionadas aos aspectos de prevalência, incidência e sintomas da demência. Entretanto, apresentaram bom nível de conhecimento sobre etiologia, fatores de risco e avaliação diagnóstica da doença(2121 Jacinto AF, Boas PJFV, Mayoral VFS, Citero VA. Knowledge and attitudes towards dementia in a sample of medical residents from a university-hospital in São Paulo, Brazil. Dement. Neuropsychol. 2016;10(1):37-41. doi: 10.1590/S1980-57642016DN10100007
https://doi.org/10.1590/S1980-57642016DN...
).

No presente estudo, parcela considerável dos médicos informou indicar sempre ou quase sempre exercícios de memória e estimulação cognitiva e encaminhar ao especialista os casos suspeitos de demência. Dentre os encaminhamentos, os profissionais e serviços mais citados foram o neurologista de referência, o Centro de Referência do Idoso e o AME. Com a implantação da Rede de Atenção à Saúde do Idoso, o município de São Paulo passou a ter diversas opções de serviços para o encaminhamento, articulação e acompanhamento da população idosa(1111 Veras RP, Oliveira M. Aging in Brazil: the building of a healthcare model. Ciên Saúde Colet. 2018;23(6):1929-36. doi: 10.1590/1413-81232018236.04722018
https://doi.org/10.1590/1413-81232018236...
).

Em que pesem os esforços dos últimos anos para aumentar a oferta de vagas e os equipamentos de assistência aos idosos no SUS, os serviços existentes ainda são insuficientes em face da demanda. Pesquisas realizadas em regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos revelaram resultados preocupantes em relação ao acesso a especialistas e ao tempo de espera. No estado do Paraná, foi identificada a inexistência de oferta para cinco especialidades médicas, dentre elas a geriatria e a neurologia. Em Minas Gerais, o tempo médio de espera pela primeira consulta, independentemente da especialidade, foi de 244 dias, com variação de 6 a 559 dias(2222 Silva CR, Carvalho BG, Cordoni Jr L, Nunes EFPA. Difficulties in accessing services that are of medium complexity in small municipalities: a case study. Ciênc Saúde Coletiva. 2017;22(4):1109-20. doi: 10.1590/1413-81232017224.27002016
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-2323 Vieira EWR, Lima TMN, Gazzinelli A. The waiting time for specialized medical consultations in a small municipality of Minas Gerais, Brazil. Rev Min Enferm. 2015;19(1):72-8. doi: 10.5935/1415-2762.20150006
https://doi.org/10.5935/1415-2762.201500...
).

A frequência de indicação para ingresso em ILPI pelos médicos foi relativamente baixa. Historicamente, no Brasil, tais instituições estão associadas a imagens negativas. Tiveram suas origens nas chamadas casas-lares ligadas a obras de caridade, as quais prestavam serviços voluntários a pessoas de qualquer idade em situação de vulnerabilidade social, necessitadas de abrigo e atenção à saúde, na ausência de políticas públicas específicas. Na maioria, o cuidado era de baixa qualidade, e seus residentes frequentemente evidenciavam sentimentos de solidão e abandono(2424 Alves MB, Menezes MR, Felzemburg RDM, Silva VA, Amaral JB. Long-stay institutions for the elderly: physical-structural and organizational aspects. Esc Anna Nery 2017;21(4):1-8. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2016-0337
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).

Quanto às funções da enfermagem no acompanhamento de pacientes com demência na AB, os enfermeiros classificaram como prioridades a avaliação periódica do comprometimento cognitivo, a avaliação de riscos no domicílio e o apoio às necessidades do cuidador ou da família. Todavia, não mencionaram o controle da prescrição farmacológica e o acompanhamento terapêutico, o controle das comorbidades apresentadas pelo paciente nem a estimulação cognitiva. Especialistas na área consideram que estas são atividades essenciais do enfermeiro em um protocolo específico de manejo às demências(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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).

Apesar da implantação da AMPI-AB no município de São Paulo, a baixa confiança no diagnóstico, a dificuldade no acompanhamento dos pacientes com demência e a pouca disponibilidade de tempo para o atendimento continuam a ser barreiras importantes para detectar a demência nas fases iniciais. A formação específica na temática pode melhorar a confiança no diagnóstico, reduzir o tempo da consulta e diminuir as taxas de interconsultas ocasionadas pela incerteza(2525 Galvin JE, Meuser TM, Morris JC. Improving physician awareness of Alzheimer disease and enhancing recruitment: the Clinician Partners Program. Alzheimer Dis Assoc Disord. 2012;26(1):61-7. doi: 10.1097/WAD.0b013e318212c0df
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26 Jefferson AL, Cantwell NG, Byerly LK, Morhardt D. Medical student education program in Alzheimer’s disease: The PAIRS Program. BMC Med Educ. 2012;12(80):1-8. doi: 10.1186/1472-6920-12-80
https://doi.org/10.1186/1472-6920-12-80...
-2727 Broughton M, Smith ER, Baker R, Angwin AJ, Pachana NA, Copland DA, et al. Evaluation of a caregiver education program to support memory and communication in dementia: a controlled pretest-posttest study with nursing home staff. Int J Nurs Stud. 2011;48(11):1436-44. doi: 10.1016/j.ijnurstu.2011.05.007
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2011....
).

Constatou-se predomínio da atuação do enfermeiro no acompanhamento dos cuidadores de pacientes com demência. Grande parte deles mencionou que o acompanhamento ocorre às vezes (36,5%) e frequentemente (32,8%), o que difere dos resultados da pesquisa espanhola(1414 Costa GD, Souza RA, Yamashita CH, Pinheiro JCF, Alvarenga MRM, Oliveira MAC. Evaluation of professional knowledge and attitudes on dementia patient care: a trans-cultural adaptation of an evaluation instrument. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(2):298-308. doi: 10.1590/S0080-623420150000200016
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) , na qual se verificou que cerca de metade dos médicos (46,2%) e dos enfermeiros (47,6%) realizava o acompanhamento habitual dos cuidadores de pacientes com demência.

É sabido que cuidar de paciente com demência é tarefa desafiadora. Revisão crítica de literatura evidenciou que os cuidadores de pacientes com demência apresentam maior risco de doenças cardiovasculares, principalmente a hipertensão, que é mediada por resposta inflamatória crônica e superativação simpática, depressão e ansiedade. Além disso, os sintomas depressivos do cuidador levam a aumento nos custos dos cuidados de saúde durante um período médio de dois anos, incluindo os custos do uso de medicamentos sem receita médica. Com a aproximação do “tsunami da demência”, a carga sobre o sistema de saúde e assistência social aumentará, a menos que os cuidadores familiares sejam devidamente apoiados e suas necessidades de saúde, assistidas(2828 Cheng ST. Dementia caregiver burden: a research update and critical analysis. Curr Psychiatry Rep. 2017;19(9):64. doi: 10.1007/s11920-017-0818-2
https://doi.org/10.1007/s11920-017-0818-...
).

A satisfação dos médicos em relação ao serviço especializado ficou aquém do esperado. A contrarreferência das informações ao serviço de AB, a acessibilidade dos serviços em situação de emergência e o tempo de espera desde a solicitação de visita até sua ocorrência receberam as piores avaliações (3,3; 3,8 e 4,0, respectivamente). Em contrapartida, a capacidade de solucionar o problema e o acompanhamento dos pacientes com demência receberam as maiores avaliações (5,7 e 5,5, respectivamente), embora bem distante do ideal. No estudo espanhol(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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), também foram evidenciadas melhores avaliações relacionadas à capacidade de solucionar o problema (6,3) e ao acompanhamento dos pacientes com demência (5,7). A pior avaliação recaiu sobre a acessibilidade do serviço em situações de emergência (4,1).

Um fato peculiar que ocorreu nesta investigação e no estudo realizado na Espanha(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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) foi que os médicos relataram encaminhar mais os pacientes para confirmar o diagnóstico de demência que para o controle dos sintomas comportamentais. Os autores espanhóis atribuem esse achado ao longo tempo de espera da visita e à baixa acessibilidade dos serviços em situação de emergência. Consideram necessário estabelecer uma colaboração mais eficiente entre os cuidados primários à saúde e os serviços especializados, com protocolos assistenciais e múltiplas formas de comunicação, como a utilização de contato telefônico em horários pactuados, o uso de aplicativos, a disponibilidade de hospital-dia ou unidades de curta permanência para resolver os casos mais complexos.

Quanto à necessidade de educação permanente em demência para os profissionais da AB, dados da pesquisa espanhola(1010 Tuero GC, Garre-Olmo J, Lòpez-Pousa S, Vilalta J, Limon E, Caja C. Percepción, actitudes y necesidades de los profesionales de atención primaria con relación al paciente con demencia. Atenc Primaria. 2011;43(11):585-94. doi: 10.1016/j.aprim.2010.11.015
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) corroboram os resultados deste estudo, pois 98,6% de seus profissionais consideraram necessário realizar capacitação específica em demência. Comparado a este estudo, um percentual menor de médicos (49,1%) e maior de enfermeiros (75,2%) referiu nunca ter participado de treinamento específico em demência. Outro estudo brasileiro também encontrou percentual menor de médicos (48%) que referiram nunca ter participado de programa de capacitação em demência(2121 Jacinto AF, Boas PJFV, Mayoral VFS, Citero VA. Knowledge and attitudes towards dementia in a sample of medical residents from a university-hospital in São Paulo, Brazil. Dement. Neuropsychol. 2016;10(1):37-41. doi: 10.1590/S1980-57642016DN10100007
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).

Na ESF, os enfermeiros são considerados os gestores do cuidado das equipes, pois direcionam as necessidades de saúde da população, gerenciam os programas de assistência e replicam os treinamentos nas unidades de saúde. Atuam ao lado dos médicos, equipes dos Centros de Atenção Psicossocial e Núcleo de Apoio à Saúde da Família, participam das discussões clínicas e coordenam a assistência referente às necessidades de saúde dos indivíduos e suas famílias. A educação permanente dos enfermeiros é, portanto, essencial para a melhoria das práticas assistenciais e direcionamento das equipes.

Investigações internacionais que incluíram profissionais médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem em programas de educação em demência constataram melhora na abordagem, no diagnóstico, no atendimento e no acompanhamento de pacientes com demência e seus familiares(2525 Galvin JE, Meuser TM, Morris JC. Improving physician awareness of Alzheimer disease and enhancing recruitment: the Clinician Partners Program. Alzheimer Dis Assoc Disord. 2012;26(1):61-7. doi: 10.1097/WAD.0b013e318212c0df
https://doi.org/10.1097/WAD.0b013e318212...
2727 Broughton M, Smith ER, Baker R, Angwin AJ, Pachana NA, Copland DA, et al. Evaluation of a caregiver education program to support memory and communication in dementia: a controlled pretest-posttest study with nursing home staff. Int J Nurs Stud. 2011;48(11):1436-44. doi: 10.1016/j.ijnurstu.2011.05.007
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2011....
).

Estudo realizado nas unidades de saúde com ESF da Coordenadoria Norte do município de São Paulo avaliou o impacto do treinamento on-line intitulado Identificação da Demência em Idosos. Seus resultados revelaram melhora significativa do conhecimento após o treinamento. Porém, houve discreto declínio no conhecimento na avaliação tardia (180 dias)(2929 Alavarce DC, Peres HHC. Online training assessment For Primary Care professionals of the city of São Paulo. Stud Health Technol Inform. 2015;216:1112. doi: 10.3233/978-1-61499-564-7-1112
https://doi.org/10.3233/978-1-61499-564-...
). Embora o treinamento tenha apresentado resultados imediatos no conhecimento dos profissionais no acompanhamento às demências, tardiamente esse resultado diminuiu, e isso sugere que, além do treinamento à distância, são necessários encontros presenciais, com espaços discussão entre especialistas e profissionais da AB. A formação deve ser pautada no conhecimento epidemiológico das demências, na segurança diagnóstica e no manejo dos sintomas comportamentais(2525 Galvin JE, Meuser TM, Morris JC. Improving physician awareness of Alzheimer disease and enhancing recruitment: the Clinician Partners Program. Alzheimer Dis Assoc Disord. 2012;26(1):61-7. doi: 10.1097/WAD.0b013e318212c0df
https://doi.org/10.1097/WAD.0b013e318212...

26 Jefferson AL, Cantwell NG, Byerly LK, Morhardt D. Medical student education program in Alzheimer’s disease: The PAIRS Program. BMC Med Educ. 2012;12(80):1-8. doi: 10.1186/1472-6920-12-80
https://doi.org/10.1186/1472-6920-12-80...
-2727 Broughton M, Smith ER, Baker R, Angwin AJ, Pachana NA, Copland DA, et al. Evaluation of a caregiver education program to support memory and communication in dementia: a controlled pretest-posttest study with nursing home staff. Int J Nurs Stud. 2011;48(11):1436-44. doi: 10.1016/j.ijnurstu.2011.05.007
https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2011....
).

Limitações do estudo

Uma das limitações deste estudo é a composição da amostra, que pode ter contribuído para a participação das unidades de saúde e profissionais com maior interesse no assunto, bem como para a subjetividade das respostas, baseadas na percepção dos profissionais.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde e política pública

As lacunas de conhecimento referentes às demências evidenciadas nesta pesquisa constituem preocupação de caráter mundial. Países de primeiro mundo já estão se organizando há mais de duas décadas para enfrentar o estigma e a exclusão social associados à demência, superar o conhecimento restrito no assunto e reduzir os custos relacionados ao cuidado.

No Brasil, país em transição demográfica e epidemiológica e com um número reduzido de profissionais de saúde especializados na assistência aos idosos, esta investigação fornece informações para fundamentar propostas de capacitação em demência aos profissionais da ESF e, também, para a Educação Permanente na Saúde do Idoso. Além disso, propicia dados para que os gestores de saúde planejem as agendas das equipes de ESF considerando o atendimento à população idosa por faixa etária, e não por doenças mais prevalentes entre os idosos, como a hipertensão arterial e o diabetes mellitus, por exemplo.

Este trabalho pode ainda contribuir para que as instituições de ensino superior promovam mudanças em seus currículos de formação profissional, ampliando e sustentando a prática assistencial na área da saúde, para que levem em conta as necessidades e as demandas do processo de transição demográfica brasileiro.

CONCLUSÃO

Os resultados do presente estudo evidenciaram lacunas no conhecimento dos profissionais médicos e enfermeiros da AB relacionadas ao processo de rastreamento e diagnóstico das demências; acompanhamento dos pacientes, principalmente na forma mais grave da doença; manejo de drogas específicas; informação diagnóstica ao paciente e às famílias; e suporte ao cuidador.

Uma proposta de capacitação em demência deve ser elaborada considerando tais lacunas de conhecimento em prol da melhoria das práticas assistenciais, além da redução dos custos associados à falta de conhecimento dos profissionais e cuidadores sobre a temática.

  • FOMENTO
    Este estudo faz parte da pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, intitulada: Necessidades educacionais de profissionais da Estratégia Saúde da Família no atendimento às demências. Processo: 2016/01359-0.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Fátima Helena Espírito Santo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    02 Jul 2020
  • Aceito
    03 Set 2020
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