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Implementação de checklist de segurança cirúrgica no Brasil: estudo transversal

RESUMO

Objetivo:

identificar o processo de implantação da Lista de Verificação de Segurança Cirúrgica da Organização Mundial da Saúde em hospitais brasileiros.

Métodos:

estudo transversal com 531 participantes durante um Congresso de Enfermagem Perioperatória, promovido pela Associação Brasileira dos Enfermeiros de Centro Cirúrgico, Centro de Recuperação Anestésica e Material e Esterilização, em 2017.

Resultados:

dentre os profissionais de enfermagem incluídos, 84,27% relataram a implantação do checklist no ambiente de trabalho. Em relação à aplicação diária na etapa Sign-in, 79,65% dos profissionais confirmaram a identificação do paciente com dois indicadores; na etapa Time-out, 51,36% das cirurgias foram iniciadas independentemente da confirmação de um dos itens. Na etapa Sign-out, 69,34% dos profissionais não contaram ou ocasionalmente contaram os instrumentos cirúrgicos e agulhas de sutura. Apenas 36,36% revisaram preocupações sobre a recuperação pós-operatória.

Conclusão:

este estudo identificou necessidades de melhorias na aplicação do checklist na realidade brasileira, para garantir procedimentos cirúrgicos mais seguros.

Descritores:
Enfermeiras e Enfermeiros; Segurança do Paciente; Lista de Checagem; Assistência Perioperatória; Gestão de Riscos

ABSTRACT

Objective:

to identify the implementation process of the World Health Organization Surgical Safety Checklist in Brazilian hospitals.

Methods:

this is a cross-sectional study with 531 participants during a Congress of Perioperative Nursing, promoted by the Brazilian Association of Operating Room Nurses, Anesthetic Recovery and Material and Sterilization Center, in 2017.

Results:

among the nursing professionals included, 84.27% reported the checklist implementation in the workplace. Regarding daily application in the Sign-in stage, 79.65% of professionals confirmed patient identification with two indicators; in the Time-out stage, 51.36% of surgeries started regardless of confirmation of one of the items. In the Sign-out stage, 69.34% of professionals did not count or occasionally counted the surgical instruments and suture needles, and only 36.36% reviewed concerns about postoperative recovery.

Conclusion:

this study identified needs for improvements in applying the checklist in the Brazilian reality, to guarantee safer surgical procedures.

Descriptors:
Nurses; Patient Safety; Checklist; Perioperative Care; Risk Management

RESUMEN

Objetivo:

identificar el proceso de implementación de la Lista de Verificación de Seguridad Quirúrgica de la Organización Mundial de la Salud en los hospitales brasileños.

Métodos:

estudio transversal con 531 participantes durante un Congreso de Enfermería Perioperatoria, promovido por la Asociación Brasileña de Enfermeras del Centro Quirúrgico, Centro de Recuperación y Esterilización de Anestesia y Material, en 2017.

Resultados:

entre los profesionales de enfermería incluidos, el 84,27% informó la implementación de la lista de verificación en el lugar de trabajo. En cuanto a la aplicación diaria en la etapa de Sign-in, el 79,65% de los profesionales confirmaron la identificación del paciente con dos indicadores; en la etapa de Time-out, el 51,36% de las cirugías se iniciaron independientemente de la confirmación de alguno de los ítems. En la etapa de Sign-out, el 69,34% de los profesionales no contaba u ocasionalmente el instrumental quirúrgico y las agujas de sutura. Solo el 36,36% revisó las preocupaciones sobre la recuperación postoperatoria.

Conclusión:

este estudio identificó necesidades de mejoras en la aplicación del checklist en la realidad brasileña, para asegurar procedimientos quirúrgicos más seguros.

Descriptores:
Enfermeros y Enfermeras; Seguridad del Paciente; Lista de Verificación; Atención Perioperativa; Gestión de Riesgos

INTRODUÇÃO

O número de cirurgias tem aumentado progressivamente ao longo dos anos, com estimativa de 312,93 milhões de procedimentos em todo o mundo(11 Weiser TG, Haynes AB, Molina G, et al. Size and distribution of global volume surgery in 2012. Bull World Health Organ. 2016;94:201-209F. https://doi.org/10.2471/BLT.15.159293
https://doi.org/10.2471/BLT.15.159293...
). Nesse contexto, o centro cirúrgico (CS) é um ambiente complexo no qual os profissionais precisam atuar em equipe para garantir a qualidade e segurança do atendimento aos pacientes(22 Etherington N, Wu M, Cheng-Boivin O, Larrigan S, Boet S. Interprofessional communication in the operating room: a narrative review to advance research and practice. Can J Anaesth. 2019 Oct;66(10):1251-1260. https://doi.org/10.1007/s12630-019-01413-9.
https://doi.org/10.1007/s12630-019-01413...
).

Diante das taxas de morbimortalidade associadas às cirurgias, em 2008, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou o programa “Safe Surgery Saves Lives”, que propunha a aplicação de um checklist de segurança cirúrgica em três etapas (Sign-in, Time-out e Sign-out). Antes de iniciar a cirurgia, as etapas incluem a verificação dos materiais e equipamentos necessários, as condições das vias aéreas dos pacientes antes da anestesia, a confirmação do membro da equipe, os momentos críticos do procedimento anestésico-cirúrgico e a profilaxia antibiótica. Antes de sair da sala de cirurgia, as etapas incluíam a verificação de possíveis falhas ocorridas durante o procedimento, amostra anatomopatológica, revisão das necessidades dos pacientes para recuperação pós-operatória, bem como gaze, compressa e contagem de agulhas(33 World Health Organization (WHO). Second global challenge for patient safety: safe surgeries save lives (WHO guidelines for safe patient surgery) [Internet]. Rio de Janeiro: OPAS; 2010 [cited 2018 Nov 13]. 211 p. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/seguranca_paciente_cirurgia_salva_manual.pdf Portuguese.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Em 2013 o Ministério da Saúde do Brasil aprovou um protocolo de cirurgia segura, que orienta a aplicação do checklist em todos os estabelecimentos de saúde que realizam procedimentos, dentro ou fora do CS, envolvendo incisão no corpo humano ou introdução de equipamento endoscópico por qualquer profissional de saúde. Essa ação teve como objetivo prevenir e reduzir a incidência de eventos adversos, aumentando a garantia de segurança do paciente(44 Ministério da Saúde (BR). Portaria nº 1.377, de 9 de julho de 2013, Aprova os Protocolos de Segurança do Paciente [Internet]. 2013 [cited 2018 Nov 14]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt137709072013.html. Portuguese.
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-55 Ministério da Saúde (BR). Protocolo para cirurgia segura [Internet]. 2013 [cited 2018 Nov 15]. Available from: http://www20.anvisa.gov.br/segurancadopaciente/index.php/publicacoes/category/cirurgias-seguras
http://www20.anvisa.gov.br/segurancadopa...
).

Ressalta-se que a aplicação do checklist nas instituições de saúde reduz o número de complicações pós-operatórias, como infecção de sítio cirúrgico e reoperação, bem como diminui a mortalidade associada ao procedimento cirúrgico(66 Haugen AS, Wæhle HV, Almeland SK, Harthug S, Sevdalis N, Eide GE, et al. Causal analysis of world health organization's surgical safety checklist implementation quality and impact on care processes and patient outcomes: secondary analysis from a large stepped wedge cluster randomized controlled trial in Norway. Ann Surg. 2019;269(2):283-90. https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000002584
https://doi.org/10.1097/SLA.000000000000...
-77 Mayer EK, Sevdalis N, Rout S, Caris J, Russ S, Mansell J, et al. Surgical checklist implementation project: the impact of variable WHO checklist compliance on risk-adjusted clinical outcomes after national implementation: a longitudinal study. Ann Surg. 2016;263(1):58-63, https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000001185
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). Além disso, a aplicação do checklist durante a cirurgia melhorou a comunicação entre os profissionais e aumentou a percepção de segurança em relação ao atendimento prestado(22 Etherington N, Wu M, Cheng-Boivin O, Larrigan S, Boet S. Interprofessional communication in the operating room: a narrative review to advance research and practice. Can J Anaesth. 2019 Oct;66(10):1251-1260. https://doi.org/10.1007/s12630-019-01413-9.
https://doi.org/10.1007/s12630-019-01413...
,88 Haugen AS, Sevdalis N, Søfteland E. Impact of the World Health Organization Surgical Safety Checklist on Patient Safety. Anesthesiol. 2019;131(2):420-5, https://doi.org/10.1097/ALN.0000000000002674
https://doi.org/10.1097/ALN.000000000000...
).

Assim, a Sociedade Brasileira de Enfermeiros de Centro Cirúrgico, Recuperação Anestésica e Centro de Material e Esterilização (SOBECC) desenvolve a missão de colaborar com o desenvolvimento técnico-científico e divulgação das melhores práticas de enfermagem perioperatória no Brasil, buscando identificar a Lista de Verificação de Segurança Cirúrgica da OMS implementação por membros da equipe de enfermagem em diferentes hospitais no Brasil.

OBJETIVO

Identificar o processo de implantação da Lista de Verificação de Segurança Cirúrgica da Organização Mundial da Saúde em hospitais brasileiros.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Os profissionais de enfermagem que compareceram ao evento e que trabalhavam em um CS foram convidados a participar do estudo, e concordaram após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O estudo foi aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa.

Desenho do estudo, cenário e amostra

Trata-se de um estudo quantitativo e transversal. A coleta de dados foi realizada em setembro de 2017 durante o 13º Congresso Brasileiro de Enfermagem em Centro Cirúrgico, Recuperação Anestésica e Centro de Material e Esterilização, realizado pela SOBECC.

Foi selecionada uma amostra não probabilística de profissionais de enfermagem, com inclusão de 531 enfermeiros.

Coleta de dados

Para a coleta de dados, foi utilizado um instrumento composto por 20 questões fechadas com base na Lista de Verificação de Segurança Cirúrgica da OMS. Além disso, foram coletadas características sociodemográficas e dados profissionais. O instrumento foi submetido à validade de face e de conteúdo por três especialistas em enfermagem perioperatória. Os especialistas concordaram com o conteúdo proposto e fizeram pequenas sugestões de reformulação.

Foi realizado um teste piloto com dez sujeitos antes do próprio período de coleta e não incluídos na amostra de análise final, para verificar a adequação do instrumento e do método de coleta proposto. Na ocasião, pequenos ajustes foram feitos na formulação da pergunta, para melhorar a compreensão.

Os sujeitos da pesquisa foram conduzidos a um auditório e as questões do instrumento projetadas em uma tela. Os participantes podiam selecionar a resposta de sua escolha por meio de um sistema de votação eletrônica, que divulgava os resultados preliminares após um período de votação de 60 segundos. As informações desta pesquisa serviram de guia para futuras discussões no evento, com especialistas em CS e qualidade.

Análise dos dados

Os dados foram analisados descritivamente e utilizando números absolutos e porcentagens.

RESULTADOS

O número de respondentes variou entre 531 e 280 assuntos entre as respostas recebidas por item, portanto, o número de respostas recebidas para cada item avaliado é apresentado nas tabelas a seguir.

A Tabela 1 mostra que os participantes vieram de todas as regiões do país, com destaque para a Região Sudeste (54,8%). Tinham entre 31 e 40 anos (45,4%) e trabalhavam em CS entre um e cinco anos (31,3%) (Tabela 1).

Tabela 1
Características sociodemográficas, segundo categoria profissional, região de atuação, idade e tempo de atuação em centro cirúrgico - Brasil, 2017

Dos profissionais avaliados, 51,18% referiram trabalhar em instituição de grande porte, 34,05% das instituições eram privadas e 58,70% dos sites não possuíam aprovação de qualidade (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição dos participantes de acordo com o porte, perfil e aprovação da organização, Brasil, 2017

No geral, 84,27% dos participantes relataram implementar a Lista de Verificação de Segurança Cirúrgica da OMS e 74,1% dos profissionais fizeram alterações no material proposto pela OMS.

No que se refere à execução dos itens por etapa, conforme proposta da OMS, observou-se na etapa de Sign-in que nenhum dos itens avaliados foi verificado na íntegra, conforme pode ser verificado na Tabela 3.

Tabela 3
Frequência de verificação e conclusão das etapas de Sign-in de acordo com a identificação do paciente, demarcação do sítio cirúrgico, verificação de alergia, risco de perda de sangue e via respiratória difícil, Brasil, 2017

Para a etapa de Time-out, constatou-se que esta etapa é realizada em sua maioria (74,77%) por auxiliar ou técnico de enfermagem, profissional caracterizado como circulante na sala, sendo o enfermeiro quem realiza esta etapa apenas em 24,08% das situações.

Na etapa de Time-out, mais da metade da amostra afirmou que a presença de todos os membros da equipe só é confirmada ocasionalmente e que a cirurgia é iniciada ocasionalmente sem a confirmação de um dos itens do Time-out para 51% da amostra. A identificação do paciente, sítio cirúrgico e procedimento antes do seu início ocorrem apenas ocasionalmente em 46,09% da amostra (Tabela 4).

Tabela 4
Frequência de verificação das etapas de Time-out, presença de membros da equipe, identificação do paciente, sítio cirúrgico e procedimento; avaliação da necessidade de materiais específicos e preocupações com anestesia e cirurgia, Brasil, 2017

Na etapa de Sign-out, vale ressaltar que embora 39,54% dos profissionais realizem pontualmente contagens de instrumental cirúrgico e agulha de sutura, a maioria relata sempre realizar a contagem de compressas e gazes. Quanto ao manejo pós-operatório e às preocupações de recuperação dos pacientes, 50,51% dos participantes ocasionalmente revisam essas preocupações com um anestesiologista (Tabela 5).

Tabela 5
Frequência de verificação das etapas de Sign-out, conforme contagem de instrumentos, agulhas, gazes e compressas; identificação de preocupações anatomopatológicas e do paciente, Brasil, 2017

Quando questionados sobre a importância da aplicação do checklist, 393 (99,49%) profissionais acreditam que a aplicação do checklist aumenta a segurança do paciente operado. No entanto, ao preencher o checklist, apenas 52 (13,27%) acreditaram ter implementado 100% das etapas e itens; 174 (44,39%) consideraram que atingiram 80%; 98 (25%) alcançaram 60% de completude do checklist; 36 (9,18%) atingiram 40%; 32 (8,16%) alcançaram apenas 20% de completude.

DISCUSSÃO

Os resultados demonstraram que embora os profissionais reconheçam a importância da aplicação do checklist para a segurança do paciente, a aplicação incompleta dos itens ocorre em todas as etapas, o que pode favorecer a ocorrência do evento adverso. Nesse contexto, desde o início do desenvolvimento do checklist de cirurgia segura, a literatura tem mostrado que a implementação dessa ferramenta proporcionou resultados positivos no pós-operatório. O uso do checklist de segurança em oito instituições de saúde mostrou redução de complicações pós-operatórias, como infecção de sítio cirúrgico e reoperação, de 11% para 7%, além de redução de 1,5% para 0,8% da mortalidade associada à procedimento cirúrgico(99 Haynes AB, Weiser TG, Berry WR, Lipsitz SR, Breizat AH, Dellinger EP, et al. A surgical safety checklist to reduce morbity and mortality in a global population. N Engl J Med. 2009;360(5):491-9. https://doi.org/10.1056/NEJMsa0810119
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).

Nesse sentido, um estudo retrospectivo analisando 233 casos de lesões a pacientes, em dez anos de procedimentos otorrinolaringológicos antes de completar a implementação do checklist de cirurgia segura, apontou que 84,3% das lesões estavam associadas ao atendimento oferecido, principalmente estando relacionado à técnica cirúrgica, procedimentos desnecessários, retenção de corpos estranhos e infecção(1010 Helmiö P, Blomgren K, Lehtivuori T, Palonen R, Aaltonen LM. Towards better patient safety in otolaryngology: characteristics of patient injuries and their relationship with items on the WHO Surgical Safety Checklist. Clin Otolaryngol. 2015;40(5):443-8. https://doi.org/10.1111/coa.12396
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).

Uma pesquisa mostrou que mais da metade dos participantes não aplicou o checklist. A mesma evidência foi observada em outros estudos, cuja completude das etapas do checklist variou entre 34% e 68%(77 Mayer EK, Sevdalis N, Rout S, Caris J, Russ S, Mansell J, et al. Surgical checklist implementation project: the impact of variable WHO checklist compliance on risk-adjusted clinical outcomes after national implementation: a longitudinal study. Ann Surg. 2016;263(1):58-63, https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000001185
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,1111 Russ S, Shantanu R, Caris J, Mansell J, Davies R, Mayer E, et al. Measuring variation in use of the WHO Surgical Safety Checklist in the operating room: a multicenter prospective cross-sectional study. J Am Coll Surg. 2015;220(1):1-11.e4. https://doi.org/10.1016/j.jamcollsurg.2014.09.021
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). A avaliação de 565 procedimentos cirúrgicos, realizados em cinco hospitais da Inglaterra, também verificou a aplicação incompleta do checklist. A realização da etapa de Time-out ocorreu em 64% dos procedimentos e a etapa de Sign-out em 68% das cirurgias(1010 Helmiö P, Blomgren K, Lehtivuori T, Palonen R, Aaltonen LM. Towards better patient safety in otolaryngology: characteristics of patient injuries and their relationship with items on the WHO Surgical Safety Checklist. Clin Otolaryngol. 2015;40(5):443-8. https://doi.org/10.1111/coa.12396
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).

Ao analisar os itens de Time-out, a equipe estava incompleta em 43% dos procedimentos; em 10% das cirurgias a identificação do paciente e o procedimento não foram confirmados; em 29% dos procedimentos houve perda sanguínea e em 15% dos casos a profilaxia antibiótica não foi avaliada. Na etapa de Sign-out, 36% dos procedimentos não analisaram as preocupações sobre recuperação e gerenciamento de pacientes pós-operatórios(1111 Russ S, Shantanu R, Caris J, Mansell J, Davies R, Mayer E, et al. Measuring variation in use of the WHO Surgical Safety Checklist in the operating room: a multicenter prospective cross-sectional study. J Am Coll Surg. 2015;220(1):1-11.e4. https://doi.org/10.1016/j.jamcollsurg.2014.09.021
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).

Outra investigação observou que as três etapas do checklist foram aplicadas em apenas 62,1% dos procedimentos cirúrgicos, e a execução incompleta do checklist foi relacionada a um aumento de 16,9% no risco de complicações após a cirurgia. Quando analisados individualmente, o Sign-in foi realizado em 64,4% dos procedimentos, o Time-out, em 34,4%, e o Sign-out, em 64,3% das cirurgias.(77 Mayer EK, Sevdalis N, Rout S, Caris J, Russ S, Mansell J, et al. Surgical checklist implementation project: the impact of variable WHO checklist compliance on risk-adjusted clinical outcomes after national implementation: a longitudinal study. Ann Surg. 2016;263(1):58-63, https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000001185
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).

Por outro lado, deve-se destacar que a aplicação do checklist nas três etapas propostas foi associada a um menor risco de sangramento pós-operatório, redução da transfusão intra-operatória e redução do número de infecções devido à administração de antibióticos antes da incisão cirúrgica(1212 Haugen AS, Waehle HV, Almeland SK, Harthug S, Sevdalis N, Eide GE, et al. Causal analysis of Word Health Organization's surgical safety checklist implementation quality and impact on care processes and patient outcomes. Ann Surg. 2017;20(20):1-6. https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000002584
https://doi.org/10.1097/SLA.000000000000...
).

Assim, é importante mencionar que apenas implementar um checklist de cirurgia segura não garante seu desempenho adequado, uma vez que as percepções dos profissionais e os fatores organizacionais podem influenciar no uso adequado de uma ferramenta assistencial.

O uso inadequado do checklist foi associado à falta de compreensão dos profissionais sobre o momento adequado de execução da etapa e à pressa dos cirurgiões para iniciar o procedimento, dando a impressão de que a pausa para o checklist atrasa o desenvolvimento do trabalho. Além disso, nem todos os profissionais estiveram atentos durante o tempo de aplicação do checklist(1313 Papadakis M, Meiwandi A, Grzybowski A. The WHO safer surgery checklist time out procedure revisited: Strategies to optimise compliance and safety. Int J Surg. 2019;69:19-22, https://doi.org/10.1016/j.ijsu.2019.07.006
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). Por outro lado, o uso do checklist de cirurgia segura melhorou a comunicação e o trabalho em equipe entre os profissionais, como aumento da percepção de segurança sobre os pacientes, porque todos os profissionais têm as informações sobre os pacientes e recursos para o atendimento(1414 Haynes AB, Weiser TG, Berry WR, Lipsitz SR, Breizat AH, Dellinger EP, et al. Changes in safety attitude and relationship to decreased postoperative morbidity and mortality following implementation of a checklist-based surgical safety intervention. BMJ Qual Saf. 2011;20(1):102-7. https://doi.org/10.1136/bmjqs.2009.040022
https://doi.org/10.1136/bmjqs.2009.04002...
).

Portanto, as organizações de saúde desempenham papel fundamental na orientação educacional dos profissionais da equipe de saúde, oferecendo subsídios para a implantação de instrumentos de cuidado na rotina diária e mostrando a importância do uso de medidas de segurança(1515 Algie CM, Mahar RK, Wasiak J, Batty L, Gruen RL, Mahar PD. Interventions for reducing wrong-site surgery and invasive clinical procedures. Cochrane Database Syst Rev. 2015;(3):CD009404, https://doi.org/10.1002/14651858.CD009404.pub3
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-1616 Horvat L, Horey D, Romios P, Kis-Rigo J. Cultural competence education for health professionals. Cochrane Database Syst Rev. 2014;(5):CD009405. https://doi.org/10.1002/14651858.CD009405.pub2
https://doi.org/10.1002/14651858.CD00940...
). A implementação bem-sucedida do checklist esteve associada à promoção de treinamento e material didático, desenvolvimento de lideranças para monitoramento contínuo e auditoria do uso do checklist, clareza no papel de cada profissional da equipe e suporte para análise da real eficácia da implementação do checklist(1313 Papadakis M, Meiwandi A, Grzybowski A. The WHO safer surgery checklist time out procedure revisited: Strategies to optimise compliance and safety. Int J Surg. 2019;69:19-22, https://doi.org/10.1016/j.ijsu.2019.07.006
https://doi.org/10.1016/j.ijsu.2019.07.0...
,1717 Pattni N, Arzola C, Malavade A, Varmani S, Krimus L, Friedman Z. Challenging authority and speaking up in the operating room environment: a narrative synthesis. Br J Anaesth. 2019;122(2):233-44. https://doi.org/10.1016/j.bja.2018.10.056
https://doi.org/10.1016/j.bja.2018.10.05...
).

Como a aplicação diária do checklist em um CS impacta positivamente na comunicação entre os profissionais (cirurgiões, anestesiologistas, enfermeiras) e na segurança do CS, ocorrem mudanças nas percepções do trabalho em equipe e no clima de segurança, constituindo aspectos que podem influenciar a redução da morbidade pós-operatória(22 Etherington N, Wu M, Cheng-Boivin O, Larrigan S, Boet S. Interprofessional communication in the operating room: a narrative review to advance research and practice. Can J Anaesth. 2019 Oct;66(10):1251-1260. https://doi.org/10.1007/s12630-019-01413-9.
https://doi.org/10.1007/s12630-019-01413...
).

Limitações do estudo

Este estudo demonstra uma limitação na ausência de análise das causas do não preenchimento dos itens do checklist pelos profissionais. Assim, é importante o desenvolvimento de estudos futuros, que avaliem os fatores limitantes para a correta execução do checklist, bem como uma análise dos danos e complicações gerados pelo uso inadequado.

Contribuições para as áreas de enfermagem e saúde

Os resultados deste estudo demonstram uma amostra da realidade nacional, que pode colaborar para a implementação de melhorias por parte do corpo cirúrgico, instituições de saúde e órgãos governamentais responsáveis, além de apontar rumos futuros em termos de educação e treinamento a serem realizados pela SOBECC.

CONCLUSÃO

Este estudo possibilitou identificar que, apesar de reconhecer a importância do checklist para a segurança do paciente por parte dos profissionais, vários são os pontos frágeis na aplicação das etapas do checklist de cirurgia segura em instituições hospitalares brasileiras, principalmente aquelas relacionadas ao Time-out e Sign-out.

Destacaram-se como pontos a serem melhorados: demarcação cirúrgica; organização de materiais e equipamentos; identificação do paciente, sítio cirúrgico e confirmação do procedimento; iniciar a cirurgia mesmo que os itens não tenham sido revisados; contagem de instrumentos e agulhas; revisão das preocupações pós-operatórias entre a equipe.

REFERENCES

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Alexandre Bansanelli

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    06 Abr 2020
  • Aceito
    21 Set 2020
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