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Análise psicométrica da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde

RESUMO

Objetivos:

avaliar a confiabilidade e a validade da versão com 46 itens da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico.

Métodos:

estudo metodológico, realizado com 278 familiares de pacientes críticos, internados em unidades de terapia intensiva adulto e pediátrica, do interior de São Paulo, Brasil. As análises foram baseadas na Teoria Clássica dos Testes e na Teoria de Resposta ao Item.

Resultados:

a análise paralela de Horn e as análises fatorial exploratória e confirmatória não identificaram a unidimensionalidade nem a tridimensionalidade da escala. As cargas fatoriais máximas foram positivas. A escala se mostrou confiável (α=0,93 e Ω=0,63), a maioria das correlações item-total foram superiores a 0,28 e os coeficientes de discriminação maiores que um.

Conclusões:

a escala apresentou confiabilidade satisfatória e relativa validade de construto. No entanto, a estrutura tridimensional recomendada para a escala não foi confirmada.

Descritores:
Psicometria; Estudos de Validação; Família; Enfermagem; Unidades de Terapia Intensiva

ABSTRACT

Objectives:

to assess the reliability and validity of the 46 items version of the comfort scale for family members of people in critical condition.

Methods:

a methodological study, carried out with 278 family members of critically ill patients, admitted to adult and pediatric intensive care units, in a city in the interior of the state of São Paulo, in Brazil. The analyzes were based on the Classical Test Theory and Item Response Theory.

Results:

Horn’s parallel analysis and exploratory and confirmatory factor analysis did not identify the scale’s unidimensionality nor the tridimensionality. The maximum factor loads were positive. The scale proved to be reliable (α=0.93 and Ω=0.63), most item-total correlations were greater than 0.28 and the discrimination coefficients were greater than one.

Conclusions:

the scale showed satisfactory reliability and relative construct validity. However, the recommended tridimensional structure for the scale has not been confirmed.

Descriptors:
Psychometrics; Validation Study; Family; Nursing; Intensive Care Units

RESUMEN

Objetivos:

evaluar la confiabilidad y validez de la versión con 46 ítems de la escala de comodidad para familiares de personas en estado crítico.

Métodos:

estudio metodológico, realizado con 278 familiares de pacientes críticos, ingresados en unidades de cuidados intensivos de adultos y pediátricos, en el interior de São Paulo, Brasil. Los análisis se basaron en la teoría clásica de los tests y la teoría de respuesta a los ítems.

Resultados:

el análisis paralelo de Horn y el análisis factorial exploratorio y confirmatorio no identificaron la unidimensionalidad o tridimensionalidad de la escala. Las cargas factoriales máximas fueron positivas. La escala demostró ser confiable (α=0,93 e Ω=0,63), la mayoría de las correlaciones ítem-total fueron mayores a 0.28 y los coeficientes de discriminación fueron mayores a uno.

Conclusiones:

la escala mostró una fiabilidad satisfactoria y una validez de constructo relativa. Sin embargo, no se ha confirmado la estructura tridimensional recomendada.

Descriptores:
Psicometría; Estudio de Validación; Familia; Enfermería; Unidades de Cuidados Intensivos

INTRODUÇÃO

Conforto é um conceito holístico, subjetivo e multidimensional, influenciado pelos contextos físicos, ambientais, sociais e psicoespirituais, que se modifica no tempo e no espaço(11 Kolcaba KY. A theory of holistic comfort for nursing. J Adv Nurs. 1994;19(6):1178-84. https://doi.org/10.1111/j.1365-2648.1994.tb01202.x
https://doi.org/10.1111/j.1365-2648.1994...
). É resultante das interações que o indivíduo estabelece consigo, com aqueles que o circundam e com as situações que enfrenta no processo de doença e cuidado em saúde(22 Freitas KS, Menezes IG, Mussi FC. Comfort from the perspective of families of people hospitalized in the Intensive Care Unit. Texto Contexto Enferm. 2012;21(4):896-904. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072012000400021
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072012...
-33 Ponte KMA, Silva LDF. Comfort as a result of nursing care: an integrative review. Rev Pesqui Cuid Fundam. 2015;7(2):2603. https://doi.org/10.9789/2175-5361.2015.v7i2.2603-2614
https://doi.org/10.9789/2175-5361.2015.v...
).

Nas unidades de terapia intensiva (UTIs), os familiares de pacientes críticos têm atrelado o conforto à infraestrutura existente no ambiente hospitalar, bem como à possibilidade de permanência ao lado do paciente, à comunicação efetiva, ao apoio psicológico e à flexibilização nas visitas(44 Høghaug G, Fagermoen MS, Lerdal A. The visitor's regard of their need for support, comfort, information proximity and assurance in the intensive care unit. Intens Crit Care Nurs. 2012;28(5):263-8. https://doi.org/10.1016/j.iccn.2011.11.009
https://doi.org/10.1016/j.iccn.2011.11.0...
-55 Freitas KS, Menezes IG, Mussi FC. Validation of the Comfort scale for relatives of people in critical states of health. Rev Latino-Am Enfermagem. 2015;23(4):660-8. https://doi.org/10.1590/0104-1169.0180.2601
https://doi.org/10.1590/0104-1169.0180.2...
).

No entanto, esse modelo de assistência hospitalar acaba impondo condutas restritivas que, além de não permitirem o cuidado aos pacientes em todas as suas dimensões, desconsidera as necessidades do familiar enquanto pessoa e sujeito passível de cuidado.

Esse modelo contribui também para que a percepção do conforto perpasse, igualmente, pela capacidade e pelas estratégias de enfrentamento utilizadas pela família, por suas experiências anteriores com internações hospitalares ou com a própria doença, bem como pela posição que o parente ocupa no contexto familiar(66 Fumis RRL, Ranzani OT, Martins PS, Schettino G. Emotional disorders in pairs of patients and their family members during and after ICU stay. PLoS One. 2015;10(1):e0115332. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0115332
https://doi.org/10.1371/journal.pone.011...
).

A internação de um paciente na UTI altera a rotina da família, que tem seu convívio interrompido subitamente, ao mesmo tempo em que suas necessidades são modificadas. Além disso, a angústia gerada pela possibilidade de perda e separação e o prolongado tempo de internação dos pacientes em estado grave são fatores que interferem na dinâmica familiar(77 Puggina AC, Ienne A, Carbonari KFBS da F, Parejo LS, Sapatini TF, Silva MJP. Perception of communication, satisfaction and importance of family needs in the Intensive Care Unit. Escola Anna Nery. 2014;18(2):277-83. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20140040
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201400...
).

No ambiente da prática de enfermagem, o termo conforto é muito utilizado na linguagem cotidiana dos profissionais de enfermagem, muitas vezes relacionado à dimensão física da pessoa doente. Também tem sido identificado como um componente importante do processo de promoção à saúde e de cuidado integral, diante da necessidade de amenizar o sofrimento das pessoas, em todos os contextos de atenção à saúde(22 Freitas KS, Menezes IG, Mussi FC. Comfort from the perspective of families of people hospitalized in the Intensive Care Unit. Texto Contexto Enferm. 2012;21(4):896-904. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-07072012000400021
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,88 Apóstolo JLA. Comfort in nursing theories: concept analysis and theoretical meaning. Ver Enf Ref. 2009;(9):61-7.).

No entanto, avaliar o conforto dos familiares tem sido um desafio, não somente pela multiplicidade de fatores que podem interferir na percepção desse conceito, mas também pela escassez de instrumentos disponíveis na literatura. Há somente um outro instrumento disponível na literatura destinado à avaliação do conforto de cuidadores de pacientes com câncer, traduzido e validado para o português(99 Paiva BSR, Carvalho AL, Kolcaba K, Paiva CE. Validation of the Holistic Comfort Questionnaire-caregiver in Portuguese-Brazil in a cohort of informal caregivers of palliative care cancer patients. Support Care Cancer. 2015;23(2):343-51. https://doi.org/10.1007/s00520-014-2370-5
https://doi.org/10.1007/s00520-014-2370-...
).

Este fato motivou pesquisadores de uma universidade pública brasileira a desenvolver, em 2011, a Escala de Conforto para Familiares de Pessoas em Estado Crítico de Saúde (ECONF). A versão preliminar do instrumento possuía 62 itens, distribuídos em escala do tipo Likert, de seis pontos (ou níveis), sendo: 0- não se aplica, 1- nada confortável, 2- pouco confortável, 3- mais ou menos confortável, 4- muito confortável e 5- totalmente confortável. Cada um dos 62 itens foi calibrado de forma crescente, ou seja, quanto maior o valor atribuído aos itens, maior o grau de conforto. Esses itens foram obtidos após a análise de conteúdo realizada por um grupo de juízes (especialistas e familiares) e distribuídos em sete dimensões: segurança (14 itens), acolhimento (12 itens), informação (12 itens), suporte social/espiritual (4 itens), proximidade (4 itens), comodidade (7 itens) e integração consigo e com o cotidiano (9 itens)(1010 Freitas KS. Construção e validação da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde (ECONF) [Tese]. Universidade Federal da Bahia; 2012.).

Na sequência do processo de validação, o instrumento foi aplicado a uma amostra com 274 familiares de pacientes adultos em estado crítico de saúde, internados em seis UTIs de três hospitais públicos do estado da Bahia(1010 Freitas KS. Construção e validação da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde (ECONF) [Tese]. Universidade Federal da Bahia; 2012.). Os dados foram analisados pela Teoria Clássica dos Testes (TCT) e pela Teoria da Resposta ao Item (TRI) utilizando-se o modelo Rasch. A análise dos itens pela TCT revelou um coeficiente alfa de Cronbach (α) elevado, indicando a confiabilidade da escala como um todo (α = 0,92). A análise de discriminação dos itens, baseada no Correlação Item-total (CIT), mostrou, com exceção dos itens 12, 27 e 35, que todos os demais exibiram CIT adequado (>0,20). A análise dos itens pela TRI-Modelo Rasch (análise o infit, outit e dificuldade) indicou que a maior parte dos itens foi respondida dentro do padrão esperado (infit e outfit médio na faixa de 0,7 a 1,3 e dificuldade absoluta inferior a 1)(1010 Freitas KS. Construção e validação da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde (ECONF) [Tese]. Universidade Federal da Bahia; 2012.).

Após a análise pela TCT e TRI, 16 itens foram excluídos da escala (critérios como CIT<0,2, Overfit no infit ou outfit, presença de DIF e carga fatorial<0,30 foram utilizados para a exclusão de itens), obtendo-se uma escala final com 46 itens e três fatores denominados Segurança (SEG), com 22 itens, Suporte (SUP), com 18 itens, e Interação familiar e ente (INT), com 6 itens. A escala, denominada ECONF-46, manteve o coeficiente alfa elevado (α=0,92) e correlação item-total dentro do parâmetro esperado (CIT>0,2). O fator SEG apresentou consistência interna muito boa (α=0,89), com CIT variando de 0,31 (item 21) a 0,67 (item 41);o fator SUP mostrou consistência interna alta (α=0,88), com CIT variando de 0,34 (item 31) a 0,66 (item 57); e o fator INT apresentou consistência interna satisfatória (α=0,77), com CIT variando de 0,43 (item 29) a 0,63 (item 32)(1010 Freitas KS. Construção e validação da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde (ECONF) [Tese]. Universidade Federal da Bahia; 2012.). O procedimentos de rotação adotados foram do tipo ortogonal (Varimax), oblíqua e também utilizou-se a matriz de correlações policóricas. Desse modo, uma versão do estudo com 46 dos 62 itens, agrupados em três dimensões (SEG, SUP e INT) foi disponibilizada ao final da conclusão de um programa de pós graduação(1010 Freitas KS. Construção e validação da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde (ECONF) [Tese]. Universidade Federal da Bahia; 2012.).

Posteriormente, uma análise de componentes principais sobre os 62 itens do mesmo instrumento, somente pela TCT, mostrou uma estrutura de quatro fatores e sete itens que não apresentaram critérios de permanência. Os quatro fatores, denominados segurança (20 itens), suporte (21 itens), interação familiar/ente (7 itens) e interação consigo e com o cotidiano (7 itens), constituíram uma escala com 55 itens, aqui denominada ECONF-55. A análise de confiabilidade revelou valores adequados tanto para a escala (α=0,92) como para sua dimensões Seguraça (α=0,89), Suporte (α=0,88), Interação família/ente (α= 0,81) e interação consigo e com o cotidiano (α=0,78). A análise de discriminação dos itens mostrou, com exceção dos itens 12 e 35, que todos os demais exibiram CIT superiores a 0,20(55 Freitas KS, Menezes IG, Mussi FC. Validation of the Comfort scale for relatives of people in critical states of health. Rev Latino-Am Enfermagem. 2015;23(4):660-8. https://doi.org/10.1590/0104-1169.0180.2601
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,1010 Freitas KS. Construção e validação da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde (ECONF) [Tese]. Universidade Federal da Bahia; 2012.). Desse modo, o estudo referente à validação do instrumento foi publicado com 55 dos 62 itens, distribuídos em quatro dimensões assim denominadas: Segurança, Suporte, Integração Familiar e Integração consigo e com o cotidiano, também com propriedades psicométricas satisfatórias(55 Freitas KS, Menezes IG, Mussi FC. Validation of the Comfort scale for relatives of people in critical states of health. Rev Latino-Am Enfermagem. 2015;23(4):660-8. https://doi.org/10.1590/0104-1169.0180.2601
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).

Embora a TCT não entre em conflito com a Teoria de Resposta ao Item, são referenciais utilizados para validação de um instrumento completamente diferentes que podem modificar os resultados de um estudo, como evidenciado na ECONF. Na TRI, cada item é considerado independente na análise do instrumento, sem destacar os escores totais. Destarte, os resultados não dependem exclusivamente do teste ou do questionário, mas do comportamento de cada item que o constitui(1111 Yang FM, Kao ST. Item response theory for measurement validity. Shanghai Arch Psychiatr. 2014;26(3):171-7. https://doi.org/10.3969/j.issn.1002-0829.2014.03.010
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). Na análise realizada pela TCT, todos os itens têm o mesmo peso e a análise é realizada considerando o escore total do instrumento, visando selecionar os melhores itens(1212 Sartes LMA, Souza-Formigoni MLO. Advances in psychometrics: from Classical Test Theory to Item Response Theory. Psicol Reflex Crit. 2013;26(2):241-50. https://doi.org/10.1590/S0102-79722013000200004
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). Os caminhos de análise completamente diferentes nas duas teorias provavelmente contribuíram para alterar a configuração dos itens da ECONF.

Em virtude da divergência do número de itens envolvendo as duas versões do mesmo instrumento, da estrutura dimensional que não se manteve a mesma (quatro dimensões na versão com 55 itens e três na versão com 46 itens) e do tempo transcorrido para a publicação, em que muitos pesquisadores utilizaram o instrumento original disponibilizado na formatação de tese, divergente do publicado, o presente estudo se propôs a analisar as propriedades psicométricas da versão com 46 itens da ECONF e suas três dimensões, em familiares de pacientes adultos e pediátricos do estado de São Paulo.

OBJETIVOS

Avaliar a confiabilidade e a validade da versão com 46 itens da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Neste estudo seguiram-se as diretrizes da Resolução N° 510/2016 do Ministério da Saúde, em que informações agregadas em banco de dados sem possibilidade de identificação individual não são mais avaliadas pelo sistema de Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) do país(1313 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução no. 510 de 07 de abril de 2016. Brasília(DF); 2016.) e, portanto, não possuem CAAE.

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de estudo metodológico, observacional, transversal e analítico de validação psicométrica em que se utilizou um banco de dados anonimizado, com informações de familiares que responderam à ECONF-46. Os dados foram coletados nos anos de 2013 a 2016, nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) de dois hospitais públicos localizados nas cidades de Bauru e Botucatu, ambas no interior de São Paulo.

No momento da coleta de dados, as UTIs incluídas na pesquisa (duas UTIs adulto e duas UTIs pediátricas) não possuíam visita aberta, destinavam-se ao atendimento de pacientes clínicos e cirúrgicos e os familiares aguardavam a visita diária, que era uma vez ao dia, no hall de entrada das unidades.

Amostra, critérios de inclusão e exclusão

A amostra foi constituída de 278 familiares que apresentavam as seguintes condições: idade igual ou superior a 18 anos, um parente internado na UTI há mais de 48 horas, condições emocionais autorreferidas para responder o questionário e estar visitando o familiar na UTI.

Do total de familiares, 208 tinham pacientes internados em UTI adulto e o restante (n=70) em UTI pediátrica. Cabe salientar que a distribuição diferente da amostra pode ser atribuída ao fato de ter sido obtida de diferentes estudos realizados com a ECONF-46, alguns já publicados(1414 Meneguin S, Pollo CF, Benichel CR, Cunha LK, Miot HA. Comfort and religious-spiritual coping of intensive care patients' relatives. Intensive Crit Care Nurs. 2020;58:102805. https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102805
https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.1028...
-1515 Meneguin S, Souza Matos TD, Miot HA, Pollo CF. Association between comfort and needs of ICU patients' family members: a cross-sectional study. J Clin Nurs. 2019;28(3-4):538-44. https://doi.org/10.1111/jocn.14644
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).

A escala foi aplicada a familiares de pacientes pediátricos, pois, apesar do instrumento no seu processo de validação ter sido aplicado somente a familiares de pacientes adultos, o mesmo é destinado ao familiar de pacientes críticos, que também pode ser pediátricos e neonatais.

Protocolo do estudo

Os dados que subsidiaram a construção do nosso banco de dados foram coletados no período de 2013 a 2016, utilizando-se dois instrumentos: o primeiro para coleta dos dados clínicos dos pacientes e registro de informações sociodemográficas dos familiares; e o segundo para avaliar o conforto dos familiares por meio da escala ECONF com 46 itens, distribuídos em três dimensões: Segurança (SEG), Suporte (SUP) e Interação familiar/ente (INT). A abordagem e o convite ao familiar para participar da pesquisa eram realizados na sala de espera das UTIs (hall de entrada), antes da visita ao paciente. As entrevistas, com até dois membros da mesma família, foram realizadas individualmente em ambiente privativo.

Análise dos dados

Inicialmente, testes de Shapiro-Wilk foram realizados para verificar a aderência dos escores da escala à distribuição normal(1616 Stephens MA. EDF Statistics for Goodness of Fit and Some Comparisons. J Am Statistic Assoc. 1974;69(347):730-7. https://doi.org/10.2307/2286009
https://doi.org/10.2307/2286009...
). Os procedimentos de análise incluíram a avaliação da validade de construto e análise da confiabilidade do instrumento(1717 Salmond SS. Evaluating the reliability and validity of measurement instruments. Orthop Nurs. 2008;27(1):28-30. https://doi.org/10.1097/01.NOR.0000310608.00743.54
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).

Para avaliar a validade de construto, considerou-se o teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o teste de esfericidade de Bartlett para avaliar, respectivamente, a adequabilidade dos dados a uma análise fatorial e a nulidade da correlação entre os itens da escala. Para determinar o número de fatores/componentes a serem extraídos, utilizou-se a Análise Paralela de Horn (APH). Na APH, a média dos eigenvalues (autovalores) de um conjunto hipotético de matrizes de correlação dos itens da escala é calculada, pareada e comparada com os eigenvalues da matriz original(1818 Damásio BF. Uso da análise fatorial exploratória em psicologia. Aval psicol. 2012;11(2):213-28. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/v11n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/...
). O número de fatores retidos deve apresentar eigenvalue > 1 (critério de Kaiser) e superar os respectivos eigenvalues obtidos dos dados. A APH é considerada mais acurada do que o critério de Kaiser ou de Cattell(1919 Ledesma RD, Valero-Mora P. Determining the Number of Factors to Retain in EFA: An easy-to-use computer program for carrying out Parallel Analysis. 2007;12(2). https://doi.org/https://doi.org/10.7275/wjnc-nm63
https://doi.org/https://doi.org/10.7275/...
).

Uma Análise Fatorial Exploratória (AFE) foi realizada considerando o critério de Kaiser, o método de fatoração e o tipo de rotação sugerido pela natureza dos dados. Adicionalmente, AFEs baseadas nas dimensões sugeridas pela análise paralela foram realizadas. Cargas fatoriais com valor absoluto inferior a 0,30 e itens que apresentaram duas ou mais cargas absolutas com diferença absoluta inferior a 0,10 (isto é, que exibem estrutura de correlação complexa) ou com comunalidade após a extração do item inferior a 0,40 foram considerados desprezíveis(2020 Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construção de instrumentos de medida na área da saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(3):925-36. https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.04332013
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21 Kaiser HF. An index of factorial simplicity. Psychometrika. 1974;39(1):31-6. https://doi.org/10.1007/BF02291575
https://doi.org/10.1007/BF02291575...
-2222 Figueiredo Filho DB, Silva Jr JA. Visão além do alcance: uma introdução à análise fatorial. Opin Publica. 2010;16(1):160-85. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762010000100007
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762010...
).

Avaliou-se o poder discriminativo dos itens pela correlação item-total, por um modelo Graded Response Model (GRM) e pelas cargas fatoriais obtidas na AFE. O GRM é um modelo TRI especificamente desenvolvido para itens ordinais. As cargas fatoriais avaliaram a concordância entre as três dimensões da ECONF e os três fatores extraídos na AFE. O modelo GRM forneceu coeficientes de discriminação unidimensionais (a) para os itens. Padronizou-se que CIT<0,20 indicou correlação desprezível e a>1 boa discriminação do item.

Complementando a análise da validade de construto, utilizou-se Análise Fatorial Confirmatória (AFC) para testar a hipótese de que os itens da escala podem ser agrupados segundo as três dimensões indicadas, ou de acordo com as três dimensões indicadas pela AFE ou conforme as dimensões indicadas na análise paralela. No processo, exibiram-se as estatísticas Path Diagram, Root-Mean-Square Error (RMSEA), Comparative Fit Index (CFI), Tucker Lewis Index (TLI) e utilizou-se o um teste qui-quadrado de adequabilidade do ajuste. Em geral, RMSEA<0,08; CFI>0,90, TLI>0,90 e teste de adequabilidade com p>0,05 indicam ajuste aceitável(2323 Anunciação L. An overview of the history and methodological aspects of psychometrics. JRTDD. 2018;1:44. https://doi.org/10.26407/2018jrtdd.1.6
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).

A confiabilidade da escala foi analisada por meio do coeficiente alfa de Cronbach (α) e do coeficiente ômega de McDonald (Ω) para os itens da escala, para as três dimensões sugeridas pela AFE, para as três dimensões indicadas e entre as dimensões. O coeficiente alfa é baseado na variância e covariância dos itens e valores acima de 0,70 indicam confiabilidade aceitável(2424 Sijtsma K. On the use, the misuse, and the very limited usefulness of Cronbach's Alpha. Psychometrika. 2009;74(1):107-20. https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-0
https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-...
). O coeficiente ômega é fundamentado na proporção da variância das cargas fatoriais e, em geral, fornece uma estimativa mais próxima para a confiabilidade do que o alfa(2424 Sijtsma K. On the use, the misuse, and the very limited usefulness of Cronbach's Alpha. Psychometrika. 2009;74(1):107-20. https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-0
https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-...
). Além disso, para escalas multidimensionais o ômega hierárquico é mais indicado(1616 Stephens MA. EDF Statistics for Goodness of Fit and Some Comparisons. J Am Statistic Assoc. 1974;69(347):730-7. https://doi.org/10.2307/2286009
https://doi.org/10.2307/2286009...

17 Salmond SS. Evaluating the reliability and validity of measurement instruments. Orthop Nurs. 2008;27(1):28-30. https://doi.org/10.1097/01.NOR.0000310608.00743.54
https://doi.org/10.1097/01.NOR.000031060...

18 Damásio BF. Uso da análise fatorial exploratória em psicologia. Aval psicol. 2012;11(2):213-28. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/v11n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/...

19 Ledesma RD, Valero-Mora P. Determining the Number of Factors to Retain in EFA: An easy-to-use computer program for carrying out Parallel Analysis. 2007;12(2). https://doi.org/https://doi.org/10.7275/wjnc-nm63
https://doi.org/https://doi.org/10.7275/...

20 Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construção de instrumentos de medida na área da saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(3):925-36. https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.04332013
https://doi.org/10.1590/1413-81232015203...

21 Kaiser HF. An index of factorial simplicity. Psychometrika. 1974;39(1):31-6. https://doi.org/10.1007/BF02291575
https://doi.org/10.1007/BF02291575...

22 Figueiredo Filho DB, Silva Jr JA. Visão além do alcance: uma introdução à análise fatorial. Opin Publica. 2010;16(1):160-85. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762010000100007
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762010...

23 Anunciação L. An overview of the history and methodological aspects of psychometrics. JRTDD. 2018;1:44. https://doi.org/10.26407/2018jrtdd.1.6
https://doi.org/10.26407/2018jrtdd.1.6...

24 Sijtsma K. On the use, the misuse, and the very limited usefulness of Cronbach's Alpha. Psychometrika. 2009;74(1):107-20. https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-0
https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-...
-2525 Zinbarg RE, Revelle W, Yovel I, Li W. Cronbach's a, Revelle's ß, and Mcdonald's ?H: their relations with each other and two alternative conceptualizations of reliability. Psychometrika. 2005;70(1):123-33. https://doi.org/10.1007/s11336-003-0974-7
https://doi.org/10.1007/s11336-003-0974-...
).

Considerando que os itens da escala são categóricos ordinais, nas análises fatoriais, optou-se por utilizar as correlações policóricas e, nas análises de correlações, utilizou-se o coeficiente de correlação ordinal de Spearman. Nas análises, foram utilizados o software R e o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 20.0, plataforma Windows. Como padrão, adotou-se nível de significância de 0,05.

RESULTADOS

A amostra foi constituída de 278 participantes adultos, a maioria do sexo feminino (50,4%) e com média de 42,8 anos de idade (±15,1). Pode-se destacar o predomínio de familiares com companheiro(a) (80,9%), ensino fundamental (42,8%), católicos (57,6%) e economicamente ativos (60,8%). De acordo com os resultados, os familiares de pacientes pediátricos eram significativamente mais jovens (p<0,001), possuíam maior renda (p=0,003) e menor escolaridade (p<0,001) do que os familiares de pacientes adultos, conforme Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização sociodemográfica dos familiares de pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva do estado de São Paulo, Botucatu, São Paulo, Brasil, 2013-2016

Dimensionalidade

Em virtude da ausência de normalidade dos dados e da natureza categórica ordinal dos itens da escala, a APH e as análises fatoriais foram baseadas no método dos principais eixos fatoriais (principal axisfactoring- PAF), rotação oblíqua simples (oblimin) e correlações policóricas. O PAF, enquanto método de análise fatorial, é capaz de diferenciar variância comum da variância específica dos itens, algo que a análise de componentes principais não faz(1818 Damásio BF. Uso da análise fatorial exploratória em psicologia. Aval psicol. 2012;11(2):213-28. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/v11n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/...
,2222 Figueiredo Filho DB, Silva Jr JA. Visão além do alcance: uma introdução à análise fatorial. Opin Publica. 2010;16(1):160-85. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762010000100007
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-62762010...
,2626 Costello AB, Osborne J. Best practices in exploratory factor analysis: four recommendations for getting the most from your analysis. Pract Assessm, Res, Evaluation. 2005;10(7). https://doi.org/https://doi.org/10.7275/jyj1-4868
https://doi.org/https://doi.org/10.7275/...
). A rotação oblíqua presume que os fatores extraídos estejam correlacionados e produz resultados similares aos dos métodos ortogonais quando a correlação está ausente(2727 Fabrigar LR, Wegener DT, MacCallum RC, Strahan EJ. Evaluating the use of exploratory factor analysis in psychological research. Psychol Methods. 1999;4(3):272-99. https://doi.org/10.1037/1082-989X.4.3.272
https://doi.org/10.1037/1082-989X.4.3.27...
). O uso de fatores em detrimento do uso de componentes principais está ligado à intenção de avaliar a inter-relação entre um conjunto de itens(2626 Costello AB, Osborne J. Best practices in exploratory factor analysis: four recommendations for getting the most from your analysis. Pract Assessm, Res, Evaluation. 2005;10(7). https://doi.org/https://doi.org/10.7275/jyj1-4868
https://doi.org/https://doi.org/10.7275/...
).

No que se refere à análise da dimensionalidade da escala, a Figura 1 exibe o scree plot da análise paralela dos itens da escala ECONF 46. O gráfico permite definir o número de fatores e o total de componentes a serem extraídos da escala. As quatro linhas pontilhadas estão associadas aos componentes principais ou a fatores baseados em dados simulados ou reamostrados. A quantidade de “-x-” acima das linhas pontilhadas superiores indica o número de componentes a serem extraídos e o número de “-∆-” acima das linhas pontilhadas inferiores, o número de fatores a serem extraídos. Assim, o exame do scree plot permite recomendar a extração de oito fatores e sete componentes, indicando a não unidimensionalidade da escala para os sujeitos estudados.

Figura 1
Análise paralela dos itens

Validade de Construto

Partindo-se do pressuposto de que a escala não é unidimensional, realizou-se a AFE considerando os oito fatores sugeridos pela APH e os três fatores recomendados na escala original. Com relação à adequabilidade dos dados para as três análises, AFE (com oito e três fatores) e com um fator para cada uma das dimensões postuladas na escala original (Tabela 2), os valores do KMO, para todos os cinco ajustes, foram maiores que 0,70, indicando a adequabilidade dos dados às análises fatoriais. O Teste de Esfericidade de Bartlett (TEB) indicou que a hipótese de que os itens não estão correlacionados entre si deve ser rejeitada (p<0,001).

Tabela 2
Medidas de adequabilidade dos dados para as análises fatoriais exploratórias da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde, Botucatu, São Paulo, Brasil, 2013-2016

Os cinco ajustes não exibiram desempenho satisfatório (RMSEA>0,10); os oito fatores extraídos explicaram 74,9% da variação total dos itens e três explicaram 56,2%. As subescalas (segurança, suporte e interação familiar/ente) elucidaram uma porcentagem insuficiente da variação total. Uma melhoria desses índices exigiria eliminar mais de 22% dos itens de cada uma das escalas. Como um subproduto, nota-se que a unidimensionalidade fica descartada para cada uma das três dimensões.

Capacidade discriminatória dos itens

Na Tabela 3, estão apresentadas as cargas fatoriais do ajuste tridimensional baseado na AFE referida na Tabela 2, as comunalidades (h2) e as correlações item-total (CIT) associadas aos itens da escala. O exame da carga fatorial absoluta máxima de cada item da tabela permite agrupá-los segundo os fatores F1, F2 e F3, de modo que F1 esteja ligado a 24 dos 46 itens, F2 a 10 dos 46 itens e F3 a 12 dos 46 itens. Juntos, os três fatores explicam 56,2% da variação total observada nos 46 itens.

Tabela 3
Cargas fatoriais, comunalidade, correlação item-total e discriminação dos itens da escala de conforto para familiares de pessoas em estado crítico de saúde, Botucatu, São Paulo, Brasil, 2013-2016

Com relação às dimensões segurança, suporte e interação familiar/ente indicadas, 16 dos 22 itens da dimensão Segurança estão associados ao fator F1, 9 dos 18 itens do Suporte estão associados ao fator F2 e 5 dos 6 itens da Interação familiar/ente estão associados ao fator F3. Isto significa que 72,7% dos itens de segurança estão associados ao F1, 50,0% dos itens de suporte estão associados ao F2 e 83,3% dos itens da interação familiar/ente estão associados ao F3.

Ao rodarmos a AFE com os três fatores é possível observar 24 itens mais associados ao Fator 1, com carga fatorial absoluta máxima variando de 0,34 (item 18_C) a 0,92 (item 15_A), sendo que os itens Q04_A, 36_B e 18_C recebem a recomendação de exclusão por exibirem carga absoluta máxima inferior a 0,30 ou carga absoluta muito próxima cada carga absoluta entre o item e outro fator (estrutura de correlação complexa). Os 10 itens mais associados ao Fator 2 exibiram carga fatorial absoluta máxima variando de 0,38 (35_B) a 0,83 (42_B), com indicação de exclusão do item 35_B, por apresentar estrutura de correlação complexa. Os 12 itens associados ao Fator 3 exibiram carga fatorial absoluta máxima variando de 0,38 (46_B) a 0,81 (45_C), com indicação de exclusão do item 46_B, por evidenciar estrutura de correlação complexa. Se excluirmos os itens com base nos critérios de carga fatorial baixa e estrutura de correlação complexa, eles podem ser agrupados de acordo com os fatores da seguinte maneira: Fator 1 (21 itens): 02_A, 03_A, 05_A, 06_ A, 10_ A, 11_ A, 13_ A, 14_ A, 15_ A, 16_ A, 19_ A, 20_ A, 24_ A, 28_ A, 40_ A, 07_B, 21_B, 33_B, 34_B, 38_B e 39_B; Fator 2 (9 itens): 17_A, 23_B, 25_B, 26_B, 30_B, 32_B, 37_B, 42_B e 44_B; Fator 3 (11 itens): 09_A, 12_A, 22_A, 27_A, 43_A, 29_B, 01_C, 08_C, 31_C, 41_C e 45_C.

Na AFE com os oito fatores indicados na análise paralela identificaram-se nove itens mais associados ao fator MR1, com carga fatorial absoluta máxima variando de 0,38 (item 02_A) a 0,83 (item 09_A), sendo que o item 02_A recebe a recomendação de exclusão por exibir carga absoluta máxima inferior a 0,30 e por essa carga estar muito próxima à carga absoluta entre o item e outro fator (no caso o fator MR5), o que denota uma estrutura de correlação complexa. Para os nove itens associados ao fator MR2, as cargas absolutas máximas variaram de 0,47 (23_B) a 0,81 (25_B). Para os três itens associados ao fator MR3, as cargas absolutas máximas foram 0,60 (itens 41_C e 45_C) e 0,71 (43_A). Para os 10 itens associados ao fator MR4, a variação foi de 0,42 (14_A) a 0,83 (19_A), com indicação de exclusão dos itens 03_A, 04_A, 06_A e 14_A, por exibirem estrutura de correlação complexa. Para os quatro itens associados ao fator MR5, a variação foi de 0,43 (37_B) a 0,83 (46_B). Para os dois itens associados ao fator MR6, as cargas absolutas máximas foram 0,61 (28_A) e 0,93 (07_B). Para os oito itens associados ao fator MR7, a variação da carga máxima absoluta foi de 0,8 (itens 39_B e 08_C) a 0,85 (38_B), com indicação de exclusão do item 33_B, por apresentar baixa carga fatorial absoluta máxima, e dos itens 40_A, 33_B, 39_B e 08_C, por exibirem estrutura de correlação complexa. O fator MR8 está associado somente ao item 13A com carga absoluta de 0,56. Se excluirmos os itens com base nos critérios de carga fatorial baixa e estrutura de correlação complexa, eles poderiam ser agrupados de acordo com os fatores da seguinte maneira: MR1 (8 itens): 09_A, 12_A, 16_A, 20_A, 22_A, 24_A, 27_A e 29_B; MR2 (9 itens): 17_A, 23_B, 25_B, 26_B, 30_B, 32_B, 35_B, 42_B e 44_B; MR3 (3 itens): 43_A, 41_C e 45_C; MR4 (6 itens): 05_A, 10_A, 11_A, 15_A, 19_A e 18_C; MR5 (4 itens): 37_B, 46_B, 01_C e 31_C; MR6 (2 itens): 28_A e 07_B; MR7 (4 itens): 21_B, 34_B, 36_B e 38_B; MR8 (1 item): 13_A.

Com relação especificamente à capacidade discriminativa dos itens, a maioria das correlações item-total variou de 0,28 a 0,68 e dos coeficientes de discriminação dos itens foram superiores a 1. De fato, somente os itens Q08 (“Ser capaz de ajudar o seu parente a enfrentar essa situação”) e Q43 (“Ter profissionais disponíveis para ajudar o seu parente”) exibiram correlações desprezíveis (r = 0,09 e r = 0,08, respectivamente) e baixa capacidade discriminativa (a = 0,95 e a = 0,73, respectivamente). O item com maior correlação absoluta com o escore da escala foi o Q30 (“Ser atendido(a) com gentileza na recepção da UTI”), com correlação r = 0,68 e capacidade discriminativa muito alta (a = 1,69). O item Q26 (“Ser capaz de relaxar e/ou se distrair durante o período da internação”) exibiu a menor capacidade discriminante (a= 0,67 e r = 0,44) e o Q20 (“Perceber que a equipe presta atenção às condições do seu parente”) a maior (a = 3,69 e r = 0,57).

Análise fatorial confirmatória

Para examinar mais detidamente a estrutura da ECONF-46, realizou-se uma Análise Fatorial Confirmatória para verificar a hipótese de tridimensionalidade da escala. A Figura 2 apresenta o diagrama de caminho (path diagram) que sintetiza a análise. No diagrama, os valores ligados às setas indicam o coeficiente de regressão padronizado considerando a variável latente (dentro do círculo) como variável independente e a variável manifesta (dentro do quadrado) como variável dependente, e os valores ligados às setas bidirecionais indicam correlações.

Figura 2
Path diagram da análise fatorial confirmatória

Com relação à adequação do modelo à estrutura tridimensional (SEG, SUP, INT), duas medidas de adequação de ajuste foram razoavelmente favoráveis à estrutura (CFI = 0,92 e TLI = 0,916) e duas severamente desfavoráveis (RMSEA = 0,166 e χ2=8490,54 com p<0,001). Quando ajustados os dados às três dimensões indicadas pela AFE, as estatísticas não diferiram muito (CFI = 0,93, TLI = 0,93, RMSEA = 0,152 e χ2=7273,14 com p<0,001), demonstrando que tanto o modelo tridimensional das autoras quanto o obtido no presente trabalho exibem um comportamento um tanto obscuro quanto à adequabilidade do ajuste. Uma AFC com a estrutura dimensional indicada na análise paralela, com oito fatores, produziu as estatísticas CFI = 0,94, TLI = 0,93, RMSEA = 0,144 e χ2=5853,9 com p <0,001. Assim, ainda que eliminados os nove itens com cargas fatoriais máximas inferiores a 0,3 ou com complexa estrutura de correlação, os resultados serão pouco distintos daqueles observados na composição tridimensional das autoras da escala original ou daquela que foi observada na AFE.

Confiabilidade

Considerando que as dimensões conjecturadas para a ECONF 46 não se sustentaram, pode-se imaginá-las como escalas correlacionadas com a ECONF 46. Com este olhar, avaliou-se a consistência interna dos itens das ECONF 46 e de seus domínios, por meio do alfa de Cronbach e do ômega de MacDonald (Tabela 4), utilizando tais valores como estimativas da consistência interna das escalas.

Tabela 4
Distribuição dos Coeficientes alfa de Cronbach e ômega de MacDonald nas dimensões da ECONF-46*, Botucatu, São Paulo, Brasil, 2013-2016

Os valores obtidos evidenciaram consistência interna satisfatória (>0,70) entre os itens da ECONF 46 (alfa=0,93). Entre os itens dos domínios segurança (alfa=0,88), suporte (alfa=0,89) e interação familiar/ente, a confiabilidade se mostrou satisfatória (alfa=0,72). Com exceção do escore total, o coeficiente ômega indicou um resultado similar para as dimensões.

DISCUSSÃO

Avaliar o conforto dos familiares de UTI tem sido um desafio por se tratar de um conceito abstrato, subjetivo, multidimensional e para o qual ainda não existe uma definição consensual(2828 Meneguin S, Nobukuni MC, M. Bravin SH, Benichel CR, Dionísio de Souza Matos T. O significado de conforto na perspectiva de familiares de pacientes internados em UTI. Nursing. 2019;22(252):2882-6. https://doi.org/10.36489/nursing.2019v22i252p2882-2886
https://doi.org/10.36489/nursing.2019v22...
). Deste modo, a utilização de instrumentos precisos, válidos e confiáveis que auxiliem nessa mensuração é fundamental para assegurar a fidedignidade dos resultados obtidos.

É fundamental, antes de utilizá-los, conhecer os itens, seus domínios, como foram construídos, as formas de avaliação e, especialmente, as propriedades de medida, pois a qualidade da informação fornecida pelos mesmos depende, em parte, do seu bom desempenho psicométrico(2929 Hair JF, Anderson RE, Tatham RL, Black WC. Análise multivariada de dados. 5th ed. Porto Alegre: Artmed; 2005.-3030 Norris M, Lecavalier L. Evaluating the use of exploratory factor analysis in developmental disability psychological research. J Autism Dev Disord. 2010;40(1):8-20. https://doi.org/10.1007/s10803-009-0816-2
https://doi.org/10.1007/s10803-009-0816-...
).

Neste contexto, a psicometria é uma das formas de se realizar medidas por meio de testes que estimam construtos (também chamados variáveis latentes), ou seja, características dos sujeitos que não podem ser observadas diretamente(3131 Barrientos-Trigo S, Gil-García E, Romero-Sánchez JM, Badanta-Romero B, Porcel-Gálvez AM. Evaluation of psychometric properties of instruments measuring nursing-sensitive outcomes: a systematic review. Int Nurs Rev. 2019;66(2):209-23. https://doi.org/10.1111/inr.12495
https://doi.org/10.1111/inr.12495...
). De acordo com The Consensus-based Standards for the Selection of Health Measurement Instruments (COSMIN), as propriedades de um instrumento psicométrico estão estruturadas em três pilares: confiabilidade, validade e responsividade(3232 Mokkink LB, Terwee CB, Patrick DL, Alonso J, Stratford PW, Knol DL, et al. The COSMIN checklist for assessing the methodological quality of studies on measurement properties of health status measurement instruments: an international Delphi study. Qual Life Res. 2010;19(4):539-49. https://doi.org/10.1590/bjpt-rbf.2014.0143
https://doi.org/10.1590/bjpt-rbf.2014.01...
).

Considerando que a responsividade é “um atributo que se refere à validade no contexto longitudinal”(2020 Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construção de instrumentos de medida na área da saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(3):925-36. https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.04332013
https://doi.org/10.1590/1413-81232015203...
), exigindo, portanto, a aplicação da escala em vários momentos, não foi possível avaliar esse atributo no presente estudo. Em relação à confiabilidade, é considerada um dos principais critérios de avaliação da qualidade de um instrumento, pois expressa sua capacidade em reproduzir um resultado consistente(3333 Fayers PM, Machin D. Quality of life: the assessment, analysis, and interpretation of patient reported outcomes. 2nd ed. Chichester: J Wiley; 2007.). Na presente investigação, apesar do ômega hierárquico do escore total da escala ser questionável (Ω = 0,63), os valores observados de alfa de Cronbach, tanto no escore total como nos domínios da ECONF-46, indicaram forte consistência interna, o que atesta a confiabilidade do instrumento. Os resultados ainda evidenciaram que a consistência interna do instrumento também não seria alterada de forma importante caso itens fossem excluídos, reforçando a boa confiabilidade do mesmo.

No entanto, cabe destacar que a confiabilidade não é uma propriedade fixa de um instrumento de medida, pois depende da função do instrumento, da população em que é aplicado e das circunstâncias(3434 Keszei AP, Novak M, Streiner DL. Introduction to health measurement scales. J Psychosom Res. 2010;68(4):319-23. https://doi.org/10.1016/j.jpsychores.2010.01.006
https://doi.org/10.1016/j.jpsychores.201...
). Isso contribui para que o mesmo instrumento não seja considerado confiável segundo diferentes condições, o que não aconteceu nesta investigação.

Embora o alfa de Cronbach seja uma estimativa da consistência baseada na magnitude da covariância dos itens, pode ser afetado pelo número de itens, de alternativas de resposta do questionário, além da própria proporção de variância do teste(2424 Sijtsma K. On the use, the misuse, and the very limited usefulness of Cronbach's Alpha. Psychometrika. 2009;74(1):107-20. https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-0
https://doi.org/10.1007/s11336-008-9101-...
). Já o Coeficiente Ômega, por utilizar as cargas fatoriais, transforma a análise mais estável e fornece estimativas mais próxima da confiabilidade(3535 Ventura-León, José Luis, Caycho-Rodríguez, Tomás. El coeficiente Omega: un método alternativo para la estimación de la confiabilidad. Rev Latinoamericana Cienc Soc, Niñez Juv [Internet]. 2017[cited 2020 Jun 02];15(1):625-27. Available from: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=77349627039
https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=7...
).

Para avaliar a validade de construto da escala, inicialmente, estudou-se a dimensionalidade do instrumento por meio de uma análise paralela de Horn, uma estratégia que compara os autovalores (eigenvalues) de fatores dos dados observados com os de uma matriz de dados aleatórios do mesmo tamanho que o original. Este é considerado na literatura o método mais amplamente utilizado para retenção de fatores de um instrumento(3636 Horn JL. A rationale and test for the number of factors in factor analysis. Psychometrika. 1965;30(2):179-85. https://doi.org/10.1007/BF02289447
https://doi.org/10.1007/BF02289447...
). A análise paralela sugeriu a extração de 8 fatores para a escala ECONF46, o que indicaria uma estrutura com oito dimensões. Resultados não corroborados no estudo de validação da ECONF-55, publicado em 2015, no qual tal estrutura não foi confirmada para o instrumento(55 Freitas KS, Menezes IG, Mussi FC. Validation of the Comfort scale for relatives of people in critical states of health. Rev Latino-Am Enfermagem. 2015;23(4):660-8. https://doi.org/10.1590/0104-1169.0180.2601
https://doi.org/10.1590/0104-1169.0180.2...
).

Na análise fatorial confirmatória sob a hipótese tridimensional da escala original e a tridimensionalidade indicada pela AFE utilizada no presente estudo as análises produziram duas estatísticas (CFI e TLI) favoráveis à estrutura tridimensional e duas severamente desfavoráveis (qui-quadrado e RMSEA). O resultado sugere a rejeição da hipótese de que a escala tem uma estrutura tridimensional e, de fato, a análise paralela mostrou que a estrutura deveria possuir mais do que três dimensões. Essa situação provavelmente contribuiu para que os autores da escala aprimorassem as análises psicométricas, o que resultou nas quatro dimensões do instrumento publicado posteriormente.

Na AFC, quando consideradas as oito dimensões sugeridas pela análise paralela, foram obtidos resultados muito similares aos observados na estrutura tridimensional. No entanto, tais valores ainda não oferecem evidências suficientes para empregar o instrumento com este número de dimensões.

Cabe destacar, todavia, que uma das principais limitações da TCT refere-se ao fato de que todas as análises realizadas são dependentes da amostra estudada, que por sua vez é influenciada pela condição e/ou circunstância sob a qual a medida foi realizada, além da habilidade do indivíduo em entender e responder o construto investigado(3737 Bichi AA. Classical Test Theory: an introduction to linear modeling approach to test and item analysis. Int J Soc Stud [Internet]. 2o ed 2016[cited 2020 Jun 02]. Available from: https://www.researchgate.net/publication/317012320_CLASSICAL_TEST_THEORY_An_Introduction_to_Linear_Modeling_Approach_to_Test_and_Item_Analysis
https://www.researchgate.net/publication...
).Outro ponto importante a ser considerado refere-se ao procedimento de rotação da análise fatorial adotado na presente investigação(oblíqua), diferente do utilizado no processo de validação da ECONF-46, a ortogonal Varimax.

As rotações ortogonais partem do princípio de que não há correlação entre os fatores, gerando assim fatores totalmente independentes uns dos outros(1818 Damásio BF. Uso da análise fatorial exploratória em psicologia. Aval psicol. 2012;11(2):213-28. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/v11n2a07.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v11n2/...
). Apesar de amplamente utilizada, a literatura tem mostrado que esse pressuposto de independência dos fatores adotado pelas rotações ortogonais raramente é obtido nas pesquisas das áreas de ciências da saúde e humanas, uma vez que comportamentos, sintomas, atitudes, dentre outros parâmetros estudados, dificilmente são separados em unidades que funcionam de maneira independente umas das outras(2626 Costello AB, Osborne J. Best practices in exploratory factor analysis: four recommendations for getting the most from your analysis. Pract Assessm, Res, Evaluation. 2005;10(7). https://doi.org/https://doi.org/10.7275/jyj1-4868
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,3838 Schmitt TA, Sass DA. Rotation criteria and hypothesis testing for exploratory factor analysis: implications for factor pattern loadings and interfactor correlations. Educ Psychol Measurem. 2011;71(1):95-113. https://doi.org/10.1177/0013164410387348
https://doi.org/10.1177/0013164410387348...
). Quando se trabalha com esse tipo de escala, o pressuposto básico é que as dimensões da mesma não somente tenham correlação com o construto investigado, mas que também estejam inter-correlacionadas entre si, caso contrário não faria sentido denominá-las de dimensões do instrumento.

Nesse contexto, ainda não há evidências suficientes para recomendar o uso absoluto do instrumento, seja com três, seja com oito dimensões. Entende-se a necessidade de novos estudos para corroborar as estruturas dimensionais inicialmente encontradas, na perspectiva de identificar novos itens que permitam aprimorar o instrumento atual, considerando a multidimensionalidade do construto conforto.

No que se refere à capacidade discriminatória dos itens ao comparar as dimensões (SEG, SUP, INT) com os fatores (F1, F2, F3) através da análise das cargas fatoriais e da comunalidade dos itens da ECONF46, foi possível agrupar os 46 itens em três fatores (F1, F2, F3), que deveriam coincidir com as dimensões indicadas (SEG, SUP, INT). Observou-se que o fator F1 aproximou-se do domínio SEG, F2 do domínio SUP e F3 do domínio INT, mas isso não foi suficiente para garantir a estrutura tridimensional do instrumento. Tal resultado que pode ser atribuído à distribuição desigual de itens nos domínios que compõem a ECONF-46 e o baixo percentual da variância que os três fatores explicam (56,2%).

Dos três fatores obtidos na amostra analisada, 16 dos 22 itens da dimensão Segurança estão associados ao fator F1, 9 dos 18 itens do Suporte estão associados ao fator F2 e 5 dos 6 itens da Interação familiar/ente estão associados ao fator F3, isto é, 72,7% dos itens de segurança estão associados ao F1, 50,0% dos itens de suporte ao F2 e 83,3% dos itens da interação familiar/ente ao F3. Apesar da estrutura encontrada ser muito parecida com a ECON-46, ela não é suficiente para afirmar que F1, F2 e F3 correspondem, respectivamente, às dimensões Segurança, Suporte e Interação.

No que se refere à correlação item-total da escala nota-se que variou de muito fraca a fraca (r = 0,28), de moderada para forte (r = 0,68), exceto para os itens Q08 (“Ser capaz de ajudar o seu parente a enfrentar essa situação”) e Q43 (“Ter profissionais disponíveis para ajudar o seu parente”). O item que apresentou maior correlação absoluta com o escore da ECONF46 foi o Q30 (“Receber informações sobre o funcionamento da UTI”), com r =0,68.

Ao examinar os itens da escala, no contexto da AFE com três fatores, cinco itens foram excluídos por exibirem carga absoluta máxima inferior a 0,30 ou estrutura de correlação complexa. Já na AFE com oito fatores sugere-se a exclusão de nove itens, seguindo-se os mesmos critérios de análise. No entanto, AFC com a exclusão dos referidos itens não introduziu um ganho importante de qualidade ao ajuste, fato que demonstra a necessidade de revisão dos itens do instrumento.

Em relação à distribuição das opções de resposta de cada item, dadas pelos 278 familiares aos itens da escala, observou-se predominância da atribuição “Total conforto” (49,4%), seguida das opções “Muito confortável” ou “Totalmente confortável”, as quais, juntas, representaram 75% das respostas. Oportuno ressaltar que apenas 1,1% das atribuições foi do tipo “Nada confortável” e 3,3% do tipo “Nada confortável” ou “Pouco confortável”.

A alta porcentagem de atribuições do tipo “Muito confortável” ou “Totalmente confortável” na grande maioria dos itens da escala (42 dos 46 itens) indica um padrão de resposta que pode ter reduzido o poder discriminativo dos itens da escala. Tal resultado é corroborado pelo exame dos coeficientes a da análise GRM, na qual a maioria dos itens exibe valores de a relativamente próximos.

Foi possível identificar que os itens com mais atribuições do tipo “não se aplica” foram Q23 (“Ter um telefone púbico perto da sala de espera”), Q25 (“Sentir que a equipe se interessa pela recuperação do seu parente”), Q26 (“Ser capaz de relaxar e/ou se distrair durante o período da internação”) e Q44 (“Ter um meio de distração na sala de espera (revista, TV, rádio”). Nota-se que os itens Q23 e Q44 referem-se a questões estruturais do local em que o familiar se encontra, sendo possível inferir que os locais não dispunham de tal infraestrutura. Os demais itens representam a percepção do indivíduo no momento em que foi entrevistado, considerando toda complexidade da situação vivida diante da internação de um familiar em UTI.

Por fim, acreditamos que a presente investigação traz uma discussão importante acerca das propriedades psicométricas do instrumento, tanto das suas versões como nesta amostra. Também evidencia a importância dos pesquisadores conhecerem o instrumento de medida para que tenham dados precisos, válidos e interpretáveis(3939 Alexandre NMC, Gallasch CH, Lima MHM, Rodrigues RCM. A confiabilidade no desenvolvimento e avaliação de instrumentos de medida na área da saúde. Rev Eletron Enf. 2013;15(3):800-7. https://doi.org/10.5216/ree.v15i3.20776
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). Além disso, nos mostra que no processo de construção e validação de um instrumento é fundamental os pesquisadores manterem um padrão de análise desde o início, pois caminhos diferentes de análise psicométrica produzem resultados divergentes. Como a psicométrica é um campo vasto de possibilidades e análises, é fundamental o respaldo teórico para realização do tipo de teste a ser aplicado.

Limitações do estudo

Uma das limitações desta pesquisa está relacionada à heterogeneidade da amostra, uma vez que os participantes recrutados eram de duas instituições públicas localizadas em cidades diferentes do interior de SP, e os dados foram coletados em quatro UTIs. Além disso, não foi avaliada a estabilidade temporal do instrumento, visto que os dados analisados são oriundos de um banco de dados. A escassez de estudos sobre conforto de familiares de pacientes críticos e a indisponibilidade de outro instrumento na literatura para mensuração do construto também dificultaram a comparação de nossos resultados.

Contribuições para a área da Saúde

O estudo traz informações relevantes sobre um instrumento que ficou, durante alguns anos, disponível na formatação de tese, único na literatura para avaliação do conforto de familiares de pacientes críticos, cuja análise psicométrica não confirma sua estrutura dimensional. Isso comprova que as propriedades psicométricas de um instrumento não são estáticas, mas influenciadas pela amostra estudada, pela condição e/ou situação sob a qual a medida foi realizada e, também, pelos métodos de análise utilizados, que são fundamentais para credibilidade dos resultados. Acredita-se que o estudo também abre caminho para futuras pesquisas que podem contribuir para identificar as peculiaridades do conforto nos mais diversos cenários, bem como para realização de novos testes de validade de construto.

CONCLUSÕES

Com base nas análises deste estudo, pode-se inferir que a ECONF-46 apresentou parâmetros psicométricos satisfatórios de confiabilidade e relativa validade de construto, obtida por meio da análise fatorial confirmatória. Tal análise demostrou resultados consistentes para a aceitação do modelo teórico proposto em dois indicadores de adequabilidade do ajuste ao modelo, com três ou oito dimensões.

A não confirmação da estrutura tridimensional do instrumento mostra que, nesta amostra, os itens não mediram com precisão o construto conforto dos familiares. Nesse sentido, as evidências apontam para a necessidade de depurar e aprimorar esse instrumento, de modo que as estruturas dimensionais impetradas sejam corroboradas nos mais diversos cenários. Por outro lado, é preciso considerar que nem sempre os itens de um instrumento apresentam o comportamento esperado, tanto por motivos intrínsecos ao participante da pesquisa quanto por ausência de relação teórica dos itens com o construto em estudo e/ou, até mesmo, pela própria trajetória da análise psicométrica, que pode ser realizada em diferentes softwares.

No entanto, cabe destacar que, neste estudo, seguiu-se, quando possível, o mesmo itinerário de análises psicométricas realizadas na validação original do instrumento, e o tamanho amostral foi considerado adequado para conferir precisão aos resultados.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Álvaro Sousa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    04 Jun 2020
  • Aceito
    27 Out 2020
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