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O trabalho em saúde coletiva da equipe de enfermagem brasileira no distrito sanitário especial indígena

RESUMO

Objetivo:

Identificar potencialidades e limites da atuação da equipe de enfermagem na Atenção Primária em Saúde Indígena.

Métodos:

Estudo de abordagem quantitativa orientado pela Teoria da Intervenção Práxica da Enfermagem em Saúde Coletiva. Participaram 230 profissionais de enfermagem, respondendo um instrumento sobre a frequência das ações realizadas na assistência, gestão, ensino e pesquisa.

Resultados:

Foram 168 técnicos de enfermagem e 62 enfermeiros. Como potencialidades, 80% participam da assistência na maior parte do tempo. Destacam-se: consulta de enfermagem e visita domiciliária realizada por 90,3% e 71% dos enfermeiros, respectivamente. Como limite, o envolvimento na educação e pesquisa é pequeno: apenas 2% dos entrevistados realizaram pesquisa científica, refletindo a necessidade de ampliar e qualificar o cuidado e aprimorar o uso das práticas tradicionais, superando o modelo biomédico.

Considerações finais:

A assistência de enfermagem é essencial na modificação e monitoramento dos perfis epidemiológicos da população indígena, e os resultados permitem o planejamento de ações qualificadas.

Descritores:
Enfermagem; Equipe de Enfermagem; Saúde Coletiva; Saúde de Populações Indígenas; População Indígena

ABSTRACT

Objective:

To identify the potential and the limits of the actions of the nursing team in the Primary Health Care for the Health of the Indigenous.

Methods:

This is a quantitative study guided by the Theory of Practical Intervention of Nursing and Collective Health. 230 nursing professionals participated, responding to an instrument about the frequency of the actions carried out in assistance, management, teaching, and research.

Results:

168 nursing technicians and 62 nurses participated. As strengths, 80% participated in the assistance most of the time. Stand out: 90.3% and 71% of nurses carried out nursing consultations and house visits, respectively. As a limitation, the involvement in education and research is small. Only 2% of the interviewees carried out scientific researches, reflecting the need to broaden and qualify care and improve the use of traditional practices, overcoming the biomedical model.

Final considerations:

Nursing assistance is essential in the modification and monitoring of the epidemiological profile of indigenous populations, and its results allow for the planning of quality actions.

Descriptors:
Nursing; Nursing, Team; Public Health; Health of Indigenous Peoples, Indigenous Population

RESUMEN

Objetivo:

Identificar potencialidades y límites de actuación del equipo de enfermería en Atención Primaria de Salud Indígena.

Métodos:

Estudio de abordaje cuantitativo orientado por la Teoría de la Intervención Práxica de Enfermería en Salud Colectiva. Participaron 230 profesionales de enfermería, respondiendo instrumento sobre la frecuencia de acciones realizadas en asistencia, gestión, enseñanza e investigación.

Resultados:

Como potencialidades, 80% participan de la asistencia en la mayor parte del tiempo. Destacan: consulta de enfermería y visita domiciliaria realizada por 90,3% y 71% de los enfermeros. Como límite, el envolvimiento en la educación e investigación: solo 2% de los entrevistados realizaron investigación científica, reflejando la necesidad de ampliar y calificar el cuidado y perfeccionar el uso de prácticas tradicionales, superando el modelo biomédico.

Consideraciones finales:

La asistencia de enfermería es esencial en la modificación y monitoreo de los perfiles epidemiológicos de la población indígena, y los resultados permiten el planeamiento de acciones cualificadas.

Descriptores:
Enfermería; Equipo de Enfermería; Salud Colectiva; Salud de Poblaciones Indígenas; Población Indígena

INTRODUÇÃO

Na perspectiva da saúde coletiva e no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS), as ações de saúde extrapolam os espaços institucionais, alcançando sobretudo outros territórios de atuação profissional. Isso decorre das transformações originadas na forma do Estado intervir na saúde e doença da população, observada nos últimos anos.

A enfermagem passou de prática vocacional à prática social, com o desenvolvimento do seu conteúdo técnico-científico e ético. A heterogeneidade característica das práticas da enfermagem, seja pela multiplicidade de ações, pelas diferentes inserções nos serviços de saúde, bem como pela composição da equipe de enfermagem e de saúde, impõem a necessidade de explorar e identificar as contradições que envolvem todo o processo de produção em saúde(11 Egry EY. Saúde Coletiva: um novo método em enfermagem. São Paulo; Ícone; 1996.).

É preciso considerar que as mudanças econômicas, políticas, sociais e tecnológicas, ao longo do tempo, imprimiram novas formas de organizar o trabalho, além de novas demandas e atribuições aos profissionais. Por ser o Brasil um país geograficamente extenso e com práticas culturais e sociais diversificadas, deve-se ter em mente a necessidade de conhecer cada espaço em suas peculiaridades. Além da extensão, o país possui também uma população expressiva em número e diversidade étnica e cultural. No caminho de tal multiplicidade, a atenção à população indígena do Brasil é um exemplo de como coexistem diferentes sistemas e modelos de atenção em saúde.

Após inúmeras mudanças no modelo político e de gestão da Atenção Primária em Saúde Indígena (APSI) e atendendo às diretrizes da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNAISP)(22 Ministério da Saúde (BR). Fundação Nacional de Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. 2ª ed. Brasília: Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde; 2002. 40 p.), desde 2010 foi criada a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), responsável unicamente pela gestão e execução dos programas e ações de saúde, com uma robusta estrutura administrativa. Com a criação da PNASPI, a população indígena passou a ser assistida de forma integral e hierarquizada dentro dos princípios que regem o SUS, tendo acessibilidade aos serviços de saúde, desde a Atenção Primária até o nível de assistência terciária. Percebem-se melhorias na estrutura do setor, mas os indicadores epidemiológicos permaneceram desfavoráveis e desiguais se comparados ao restante da população brasileira, sobretudo em relação à morbidade e mortalidade por doenças evitáveis, como anemia, desnutrição, doenças respiratórias e infecciosas(33 Mendes AM, Leite MS, Langdon EJ, Grisotti M. O desafio da atenção primária na saúde indígena no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2018;42:e184. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.184
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).

Dentre as peculiaridades do cuidado da população indígena, estão os aspectos culturais, sociais, históricos, econômicos e políticos, que interferem na organização da atenção e consequentemente nas práticas de saúde. No que se refere ao processo de trabalho da enfermagem, dadas as limitadas ações de educação permanente e qualificação dos trabalhadores, o espaço da assistência se torna campo de disputa e estranhamento cultural entre profissionais e população, com consequente dissociação da prática tradicional em saúde. Se por um lado a formação em serviço tende a diminuir essa disparidade com o tempo, por outro é diretamente afetada pela alta rotatividade de profissionais nas áreas indígenas, em decorrência dos contratos de trabalho precários e desmobilização do sistema como um todo(44 Ribeiro AA, Aciole GG, Arantes CIS, Reading J, Kurtz DLM, Rossi LA. The work process and care production in a Brazilian indigenous health service. Esc Anna Nery. 2017;21(4):e20170029. https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2017-0029
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).

Em vista dos desafios para a implementação de uma atenção em saúde qualificada e alinhada aos princípios e diretrizes preconizados nas políticas públicas de saúde, bem como da escassez de dados da literatura que explorem a temática(55 Sandes LFF, Freitas DA, Souza MFNS, Leite KBS. Atenção primária à saúde de indígenas sul-americanos: revisão integrativa da literatura. Rev Panam Salud Pública. 2018;42:e163. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.163
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), o presente estudo adotou a Teoria de Intervenção Práxica da Enfermagem em Saúde Coletiva (TIPESC)(11 Egry EY. Saúde Coletiva: um novo método em enfermagem. São Paulo; Ícone; 1996.) como referencial teórico e metodológico, para responder a questão norteadora: “Como se caracteriza o trabalho da equipe de enfermagem em um território de população indígena, considerando as dimensões da gestão, assistência, ensino e pesquisa?”

Ao se destacarem pontos fortes, especificidades e limitações da realidade do trabalho da equipe de enfermagem em um distrito sanitário indígena, por meio da descrição e problematização, justifica-se a relevância e finalidade do estudo. Os resultados são capazes de subsidiar o planejamento de ações e aprimoramento do trabalho da equipe de enfermagem e da saúde, em estudos de continuidade.

OBJETIVO

Discutir potencialidades e limites da atuação da equipe de enfermagem na Atenção Primária em Saúde Indígena (APSI).

MÉTODOS

Aspectos éticos

Estudo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Guarulhos autorizado pela Coordenação do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Yanomami.

Desenho, período e local do estudo

Estudo exploratório e de abordagem quantitativa, norteado pela ferramenta STROBE. Aborda o trabalho da equipe de enfermagem no DSEI Yanomami, com sede no município de Boa Vista, capital do estado de Roraima, e abrangência também no estado do Amazonas.

Amostra e critérios de inclusão e exclusão

No início da coleta de dados, o DSEI Yanomami contava com uma força de trabalho em enfermagem constituída por 75 enfermeiros e 310 técnicos de enfermagem. Para garantir a confiabilidade dos dados, a amostra probabilística foi calculada em 63 enfermeiros e 172 técnicos de enfermagem, considerando 95% de índice de confiança e erro amostral (a) de 5%.

A coleta de dados ocorreu entre os meses de maio e novembro de 2018. Foram convidados 260 profissionais de enfermagem, dos quais 230 aceitaram participar do estudo — 62 enfermeiros e 168 técnicos de enfermagem. Os demais recusaram o convite, justificando desinteresse ou indisponibilidade para participar. Como critério de inclusão, os participantes deveriam atuar no DSEI há pelo menos três meses, na função de enfermeiro ou técnico de enfermagem. Não foram previstos critérios de exclusão.

Protocolo do estudo

Para caracterização das práticas de enfermagem, foi utilizado o instrumento adaptado dos modelos usados em outros estudos sobre a Classificação Internacional das Práticas da Enfermagem em Saúde Coletiva (CIPESC)(66 Cubas MR, Egry EY, Altino DM, Duarte FO, Pereira KCM, Apostolico MR. Adaptação dos instrumentos de coleta de dados do projeto CIPESC à realidade Curitibana. In: Egry EY, Cubas MR (Org) O trabalho da Enfermagem em saúde coletiva no Cenário CIPESC: guia para pesquisadores. Curitiba: Associação Brasileira de Enfermagem; 2006.-77 Antunes MJM, Silva IA, Egry EY, Sena RR, Almeida MCP. Projeto de classificação das práticas de enfermagem em saúde coletiva no Brasil: manual do pesquisador. Parte I: orientações para o trabalho de campo. Brasília: Associação Brasileira de Enfermagem; 1997 (Série Didática: Enfermagem no SUS).). O instrumento consiste em uma lista de ações desenvolvidas pelos profissionais da equipe de enfermagem e sua frequência de realização: diária, semanal, mensal, trimestral, semestral, anual, não realizo e não se aplica. Esta última frequência se refere às atividades que não integram o conjunto de ações designadas àquele profissional ou serviço, no contexto de atuação no DSEI Yanomami. Os instrumentos foram disponibilizados aos profissionais pelo Google Formulários® por meio de convites enviados por e-mail e WhatsApp; na segunda etapa de coleta, o pesquisador abordou os profissionais nos locais de trabalho ou por contato telefônico e realizou o preenchimento do instrumento com o participante. Por um lado, o uso da tecnologia foi um facilitador; por outro lado, gerou resistência em muitos participantes em relação a acessar o instrumento on-line, sendo necessário o acompanhamento do pesquisador.

Análise dos resultados e estatística

Os dados coletados foram organizados em planilhas no Microsoft Office Excel®, e a análise estatística descritiva foi feita por meio do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS)®. Efetuou-se a análise descritiva dos dados por meio de frequências absolutas e relativas dos resultados dos formulários adaptados dos modelos utilizados em outros estudos sobre a Classificação Internacional das Práticas da Enfermagem em Saúde Coletiva (CIPESC)(66 Cubas MR, Egry EY, Altino DM, Duarte FO, Pereira KCM, Apostolico MR. Adaptação dos instrumentos de coleta de dados do projeto CIPESC à realidade Curitibana. In: Egry EY, Cubas MR (Org) O trabalho da Enfermagem em saúde coletiva no Cenário CIPESC: guia para pesquisadores. Curitiba: Associação Brasileira de Enfermagem; 2006.). As frequências para realização das atividades no DSEI Yanonami avaliadas por meio do instrumento foram agrupadas em a) diária, semanal e mensal; b) semestral e anual; e c) nunca realizou e não se aplica. Para cada grupo de atividades analisado, foi calculada a mediana, definida como parâmetro para comparação dos resultados.

A TIPESC(11 Egry EY. Saúde Coletiva: um novo método em enfermagem. São Paulo; Ícone; 1996.), cujas bases filosóficas são sustentadas pelos conceitos de historicidade e dinamicidade dos fenômenos da realidade, define a assistência à saúde coletiva e processo de trabalho assistencial em enfermagem, adotados como categorias analíticas do estudo. A primeira é compreendida como a intervenção consciente no processo saúde doença de indivíduos e coletividades; e a segunda, como atividade articulada entre as disciplinas e campos de saber, para organização dos serviços e práticas em saúde. Além disso, como referencial teórico e metodológico adotado, a TIPESC permeia todo o processo de produção do conhecimento apresentado, desde as bases teóricas da saúde coletiva, que iluminam o fenômeno estudado, até a operacionalização da captação e interpretação da realidade objetiva, primeiras etapas da teoria e que fazem emergir as contradições do fenômeno e permitem explorá-lo como objeto passível de intervenção. Além disso, a TIPESC é potente na articulação entre a realidade das dimensões do fenômeno, que no presente estudo são representadas pela legislação nacional na dimensão estrutural, a organização do processo de trabalho na dimensão particular e as práticas dos profissionais das equipes de enfermagem na dimensão singular.

RESULTADOS

Entre os participantes do estudo, 168 (73%) eram técnicos de enfermagem; e 62 (27%), enfermeiros. A média de idade da amostra total foi de 36 anos (Desvio-padrão [DP] = 8,4). Quanto ao tempo de formação, a média foi de 8,9 anos (DP = 5,5); o tempo médio de atuação foi de 7,4 anos (DP = 5,2) e o tempo de atuação na função atual foi de 6,7 anos (DP = 4,6). Dentre os enfermeiros, 30 (48,3%) concluíram curso de especialização lato sensu. A respeito do estado civil, 144 (62,6%) dos profissionais eram casados ou viviam com companheiros; 69 (30,0%) eram solteiros; 16 (7,0%), separados ou divorciados; e 1 (0,4%), viúvo.

No tocante às atividades realizadas pelos enfermeiros e técnicos de enfermagem de acordo com a área de atuação (assistência, gestão, ensino e pesquisa), foi identificado que 184 participantes (80%) realizavam atividades na assistência na maior parte do tempo; 119 (51,7%) nunca realizaram atividades de gestão; 180 (78,3%) nunca realizaram atividades de ensino; e 211 (91,7%) nunca realizaram pesquisa.

Entre enfermeiros e técnicos de enfermagem, a diferença marcante estava na realização de atividades de gestão, efetuada por mais da metade dos enfermeiros na maior parte do tempo e nunca realizada por mais de 70% dos técnicos de enfermagem. Para atividades de assistência cumpridas sempre ou na maior parte do tempo, o percentual ficou em 90% e 80% para enfermeiros e técnicos, respectivamente (Figura 1).

Figura 1
Distribuição dos sujeitos do estudo segundo sua área de atuação na enfermagem (N = 230), Boa Vista, Roraima, Brasil, 2018

Muitas atividades de assistência eram realizadas pelos enfermeiros (Figura 2) e pelos técnicos de enfermagem (Figura 3) com frequências semelhantes. Houve uma relação inversa entre as atividades acima da mediana para frequências diária, semanal e mensal e para as atividades acima da mediana com frequência “não realiza” e “não se aplica”.

Figura 2
Frequência das atividades de assistência realizadas pelos enfermeiros, Boa Vista, 2018

Nota: EV – Endovenoso; IM – Intramuscular; VO – Via oral; SC – Subcutânea; ID – Intradérmica; SL – Sublingual.


Figura 3
Frequência das atividades de assistência realizadas pelos técnicos de enfermagem, Boa Vista, Roraima, Brasil, 2018

Nota: EV – Endovenoso; IM - Intramuscular; VO – Via oral; SC – Subcutânea; ID – Intradérmica; SL - Sublingual.


A mediana para as atividades de assistência realizadas diária, semanal ou mensalmente pelos enfermeiros foi de 79%; e pelos técnicos de enfermagem, 81,5%. Nas atividades de assistência, em ambas as categorias profissionais, destacou-se a realização de acolhimento, recepção, administração de inalação, medicação endovenosa, oral e intramuscular, administração de tratamentos normatizados ou prescritos, atendimentos de urgência e emergência, checagem de materiais de urgência, curativos, orientações à gestante, crianças e puérperas e verificação de sinais vitais.

Especificamente para os enfermeiros, a administração de medicamentos por via intradérmica (82,3%), subcutânea (85,5%) e sublingual (79%), consulta de enfermagem (90,3%), prescrição de cuidados de enfermagem (88,7%) e a referência por escrito para outros serviços (85,5%) também eram realizadas pela maioria dos entrevistados, representadas por frequências acima da mediana (Figura 2). Para os técnicos de enfermagem, além das atividades comuns aos enfermeiros, a reposição de materiais de urgência (88,7%) também se destacou (Figura 3).

Embora abaixo da mediana, algumas atividades merecem ser destacadas. A visita domiciliária foi realizada em frequência diária, semanal ou mensal por 71% dos enfermeiros e 79,8% dos técnicos de enfermagem; o auxílio em pequenas cirurgias ocorreu com uma frequência de 61,3% para ambas as categorias, e a coleta de material para exame preventivo de colo de útero foi efetuada trimestral, semestral ou anualmente por 66,1% dos enfermeiros e 63,7% dos técnicos de enfermagem. A participação mensal, trimestral, semestral e anual nas reuniões de conselhos locais, distritais e municipais de saúde foi apontada por mais de 72% dos entrevistados, correspondendo à frequência de realização das reuniões.

Outras atividades tiveram destaque, como a ordenha mamária e a cauterização umbilical, não realizadas por mais cerca de 62% dos enfermeiros e 72% dos técnicos de enfermagem.

Parte das atividades de planejamento, embora sejam em sua maioria de responsabilidade dos enfermeiros (Figura 4) em razão da complexidade e caráter da atividade, podem ser realizadas pelos técnicos de enfermagem (Figura 5) sob supervisão e como atividade compartilhada pela equipe.

Figura 4
Frequência das atividades de planejamento realizadas pelos enfermeiros, Boa Vista, Roraima, Brasil, 2018

Figura 5
Frequência das atividades de planejamento realizadas pelos técnicos de enfermagem, Boa Vista, Roraima, Brasil, 2018

As medianas para as atividades de planejamento realizadas diária, semanal e mensalmente por enfermeiros e técnicos de enfermagem foram respectivamente 72,6% e 58,9%. Ambas as categorias realizam frequentemente (acima da mediana) ações de vigilância epidemiológica e sanitária, avaliação de situação vacinal, previsão e provisão de vacinas, identificação de problemas de saúde, execução de atividades com a equipe de saúde, grupos de usuários e famílias, providência de comunicação e transporte, elaboração de relatórios e boletins e requisição de materiais de consumo.

Ainda, entre as ações mais executadas para os técnicos de enfermagem, destacam-se a administração de vacinas, avaliação de esterilização, execução de atividades com as comunidades e realização de palestras para alunos, pais, professores e comunidade. Aos enfermeiros, cabe predominantemente analisar e propor soluções aos problemas de saúde, participar e planejar para os planos de programação da unidade de saúde, planejar as atividades com as equipes e usuários, prever e prover material do setor e realizar reuniões com pessoal da saúde e da enfermagem.

Algumas ações privativas dos enfermeiros, como a coordenação, planejamento e supervisão dos serviços e do pessoal de saúde e de enfermagem, distribuição de tarefas, elaboração de escalas, provisão, previsão e requisição de materiais de consumo e medicamentos e supervisão de limpeza, estiveram entre as mais realizadas por esse grupo.

As atividades menos realizadas são as de Educação e Pesquisa. Para Educação, a participação como aluno em cursos e reciclagens foi realizada por 95,2% dos enfermeiros e 87,5% dos técnicos de enfermagem. Os programas de treinamento de educação continuada são planejados por 64,5% dos enfermeiros, e 84,5% dos técnicos não participam desse planejamento.

A preparação de recursos humanos de nível médio pelos enfermeiros superou 50% dos participantes embora a preparação de outros enfermeiros e profissionais da saúde tenha sido destacada por pouco mais de 32%. A realização ou participação em pesquisas científicas foi apontada por menos de 2% dos entrevistados.

DISCUSSÃO

Historicamente, a APSI passou por reformulações. Antes da Constituição Federal de 1988, esperava-se que a população indígena fosse assimilada pelo restante da população brasileira, com base em uma postura de tutela pelo Estado. Após 1988, essa população teve seus direitos de cidadania definidos e garantidos, favorecendo a formulação de outras políticas públicas específicas a esses grupos e seguindo recomendações internacionais(33 Mendes AM, Leite MS, Langdon EJ, Grisotti M. O desafio da atenção primária na saúde indígena no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2018;42:e184. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.184
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).

Mesmo com o advento do SUS, a população indígena não teve reconhecimento imediato de sua especificidade, conforme previsto nos princípios da Atenção Primária à Saúde (APS). Movimentos sociais indígenas e não indígenas discutiram amplamente a questão desde a década de 1980; e, no ano 2000, foi promulgada a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI)(22 Ministério da Saúde (BR). Fundação Nacional de Saúde. Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas. 2ª ed. Brasília: Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde; 2002. 40 p.). Dentre inúmeras medidas, foram incorporados à legislação de saúde elementos que respeitassem as especificidades de cada povo, incluindo questões sociais, culturais, logísticas e epidemiológicas, respeitando os saberes tradicionais praticados popularmente e incorporando trabalhadores indígenas no sistema de saúde(33 Mendes AM, Leite MS, Langdon EJ, Grisotti M. O desafio da atenção primária na saúde indígena no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2018;42:e184. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.184
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). Apoiando-se nesses princípios, a atenção à população indígena passou a se estruturar, sendo o DSY (Distrito Sanitário Yanomami) o primeiro distrito a se estabelecer e desenvolver metodologias de trabalho posteriormente aplicadas por outros DSEIs(88 Ministério da Saúde (BR). Fundação Nacional de Saúde. Coordenação Regional de Roraima. Situação de Saúde e Assistência: relatório epidemiológico operacional, novembro de 2009 a março de 2010 [Internet]. 2010 [cited 2019 Jun 13]. Available from: https://hutukara.org/images/stories/pdf/03_situacao_saude_yanomami2010.pdf
https://hutukara.org/images/stories/pdf/...
).

A atenção à população indígena do Brasil exemplifica a diversidade de práticas em saúde. Estudo realizado acerca dos desafios da Atenção Primária para a saúde indígena destacou que, embora o percentual seja pequeno, a sociodiversidade e as peculiaridades que envolvem cada uma das mais de 300 etnias que habitam o território brasileiro transparecem nos indicadores epidemiológicos desfavoráveis comparativamente ao restante da população(33 Mendes AM, Leite MS, Langdon EJ, Grisotti M. O desafio da atenção primária na saúde indígena no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2018;42:e184. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.184
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).

No Censo de 2010, 817 mil pessoas se declararam indígenas, correspondendo a 0,4% da população brasileira, com a maior concentração no estado do Amazonas(99 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, Os indígenas no censo demográfico 2010: primeiras considerações com base no quesito cor ou raça [Internet]. 2010 [cited 2019 Jun 13]. Avaiable from: http://www.ibge.gov.br/indigenas/indigena_censo2010.pdf
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). Os Yanomami representam o maior contingente de etnia semi-isolada das Américas, divididos em quatro subgrupos linguísticos (Yanomae, Yanõmami, Sanima e Ninam). Do total de 35 mil indígenas Yanomami, mais de 25 mil localizam-se no Brasil. Realizam atividades de subsistência baseadas na caça, pesca e pequena agricultura(88 Ministério da Saúde (BR). Fundação Nacional de Saúde. Coordenação Regional de Roraima. Situação de Saúde e Assistência: relatório epidemiológico operacional, novembro de 2009 a março de 2010 [Internet]. 2010 [cited 2019 Jun 13]. Available from: https://hutukara.org/images/stories/pdf/03_situacao_saude_yanomami2010.pdf
https://hutukara.org/images/stories/pdf/...
).

Dentro do contexto de assistência à saúde da população indígena, a enfermagem vem desempenhando papel fundamental. No DSEI Yanomami, verificou-se que os enfermeiros acumulam as atividades de assistência e gestão, ambas sob responsabilidade de mais de 50% dos entrevistados. Dentre as diferentes facetas da atuação em enfermagem, deve-se considerar a complementaridade entre a gestão e a assistência, embora se reconheçam conflitos e tensões no cotidiano de trabalho, relacionados às disputas pelo espaço de produção e de saberes entre os diferentes profissionais que constituem as equipes de saúde(1010 Galavote HS, Zandonade E, Garcia ACP, Freitas PSS, Seidl H, Contarato PC, Andrade MAC, Lima RCD. The nurse's work in primary health care. Esc Anna Nery. 2016;20(1):90-8. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20160013
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).

A dupla dimensão do trabalho do enfermeiro, voltada tanto para a assistência de indivíduos e coletivos quanto para a gestão dos serviços de saúde e equipes, apresenta uma atuação diversificada e repleta de possibilidades de intervenções para transformação nos perfis epidemiológicos. Observase uma tendência de afastamento dos enfermeiros das atividades assistenciais, sobretudo da consulta de enfermagem(1111 Ferreira SRS, Périco LAD, Dias VRGF. The complexity of the work of nurses in Primary Health Care. Rev Bras Enferm. 2018;71(Supl 1):704-9. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0471
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). Contrariamente ao que apresenta a literatura(1111 Ferreira SRS, Périco LAD, Dias VRGF. The complexity of the work of nurses in Primary Health Care. Rev Bras Enferm. 2018;71(Supl 1):704-9. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0471
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0...
), o presente estudo evidenciou a participação do enfermeiro na assistência e na gestão. Esse aspecto representa uma potencialidade para a assistência à população indígena, bem como a possibilidade de planejamento de ações alinhadas às necessidades identificadas no momento da assistência, embora o acúmulo de atividades possa incorrer em sobrecarga, nas circunstâncias de quadro de pessoal reduzido.

Problemas que afetam o SUS se refletem e se repetem na saúde indígena, dentre eles a discutível efetividade das práticas profissionais para modificação dos perfis epidemiológicos e condições de vida e saúde da população. As condições para atendimento da população indígena são adversas e peculiares. Existem falhas no atendimento diferenciado decorrentes de dificuldades com a língua e de desconsideração das necessidades culturais. Cabe ao enfermeiro promover o acesso ampliado ao serviço por meio de estratégia que aprimore a comunicação deficiente, a qual cria uma barreira de acesso do indígena ao serviço de saúde, comprometendo a assistência(1212 Borghi AC, Alvarez AM, Marcon SS, Carreira L. Cultural singularities: indigenous elderly access to Public Health Service. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(4):589-95. https://doi.org/10.1590/S0080-623420150000400008
https://doi.org/10.1590/S0080-6234201500...
).

Como exemplo das necessidades culturais determinando o cuidado, para os Sanumá, subgrupo da família linguística Yanomami, os remédios alopáticos e tratamentos biomédicos agem sobre sintomas e sensações desagradáveis, que poderiam ser amenizados ou curados com ações tradicionais, mas não necessariamente ação dos xamãs. Por outro lado, as intervenções cirúrgicas nem sempre são vistas positivamente, pois a agressão causada pela incisão feita pelo não indígena pode introduzir elementos nocivos no sangue indígena, gerando outros males e a necessidade da ação do xamã para a cura. Admite-se a complementaridade dos sistemas biomédico e tradicional bem como a liberdade de escolha(1313 Guimarães SMF. O sistema médico Sanumá-Yanomami e sua interação com as práticas biomédicas de atenção à saúde. Cad Saúde Pública. 2015;31(10). https://doi.org/10.1590/0102-311X00194414
https://doi.org/10.1590/0102-311X0019441...
).

A aplicação de intervenções biomédicas esbarra na intersubjetividade do profissional e do indígena: este resguardado pelos costumes e tradições; e o outro, pelo saber científico e hegemônico. A imposição de intervenções pode acarretar conflitos, desgastes e perda do vínculo com a comunidade. Somente uma assistência pautada no respeito e no conhecimento da tradição da etnia poderá auxiliar e combinar saberes, transformando o perfil epidemiológico e melhorando as condições de saúde da população. Um exemplo da interferência do aspecto cultural na assistência é a baixa frequência de realização de ordenha mamária e cauterização umbilical, práticas recusadas pelas índias, por disporem de recursos tradicionais para manejo dessa necessidade.

A aplicação do saber específico do enfermeiro para atuação na APS mostra sua relevância diante dos resultados. O caráter social e historicamente determinado da profissão prevê articulação dos demais membros da equipe na produção de saúde ampliada, não mais centrada na clínica e na cura, mas prevalente na integralidade do cuidado, em diferentes espaços sociais e ciclos vitais. O desenvolvimento de competências para atuar nesse cenário deve ser amparado por atividades de formação permanente dos profissionais(1111 Ferreira SRS, Périco LAD, Dias VRGF. The complexity of the work of nurses in Primary Health Care. Rev Bras Enferm. 2018;71(Supl 1):704-9. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0471
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0...
).

Ainda no que se refere à formação para atuação na saúde indígena, estudo analisou o ensino da disciplina relacionada à saúde indígena nos cursos de graduação em Enfermagem de 69 instituições de ensino superior públicas e privadas da Região Norte do Brasil. A formação não tem valorizado as práticas tradicionais, reforçando um paradoxo entre os cursos oferecidos na região e a formação que deveria ser voltada à realidade local. A abordagem da atenção ao indígena foi localizada na periferia do processo de aprendizagem, e não na posição central como preconizado pelas políticas de educação e formação em saúde(1414 Castro NJC, Cavalcante IMS, Palheta ASE, Santos DN. Inclusion of undergraduate nursing subjects about traditional populations from the amazon region. Cogitare Enferm. 2017;(22)2:e49730. https://doi.org/10.5380/ce.v22i2.49730
https://doi.org/10.5380/ce.v22i2.49730...
). Na saúde indígena, a qualificação dos profissionais para atuação em um contexto cultural específico é determinante da qualidade da assistência. Os resultados mostraram que há espaço para crescimento de práticas de educação continuada e qualificação dos profissionais.

Os enfermeiros reconheceram o acolhimento, a consulta de enfermagem e a visita domiciliária como atividades frequentes na atenção indígena. Na prática cotidiana dos serviços de saúde, tem-se observado que essas atividades seguem um modelo hegemônico de exercício clínico em detrimento de uma clínica do cuidado, isto é, aquela que se configura enquanto espaço de escuta de necessidades com olhar ampliado sobre o indivíduo, família e comunidade. A proposta da clínica do cuidado encontra barreiras operacionais e organizacionais, como falta de respaldo por protocolos, de espaços físicos apropriados e de apoio técnico. A prática clínica hegemônica, pautada no modelo biomédico de atenção, gera conflitos e tensões na atuação de enfermeiros, diante da indefinição dos limites de atuação. Por outro lado, no campo da clínica do cuidado, há possibilidades de construção de atenção integral e ampliada(1515 Matumoto S, Fortuna CM, Kawata LS, Mishima SM, Pereira MJB. Nurses' clinical practice in primary care: a process under construction. Rev Latino-Am Enferm. 2011;19(1):123-30. https://doi.org/10.1590/S0104-11692011000100017
https://doi.org/10.1590/S0104-1169201100...
).

Nesse sentido e sob o enfoque do processo de trabalho em saúde, os resultados mostraram que a organização do trabalho no DSY corresponde a uma política pública que enfrenta avanços e retrocessos na sua estrutura e operacionalização. Observou-se uma diversidade de atividades realizadas pela equipe de enfermagem que representa uma potencialidade para a assistência da população indígena.

Se o objeto do processo de trabalho na saúde indígena for a assistência integral, ampliada e cultural, a finalidade da assistência deve se ancorar na busca pela qualidade de vida e garantia de saúde e pleno exercício de cidadania e tradição. A produção de saúde se confunde com a própria produção de condição de vida do povo indígena, que, ao longo de séculos, sofreu ora a invasão de sua cultura, ora o descaso do poder público com sua existência. É mister equilibrar o conhecimento biomédico para enfrentar condições adversas de vida, ao mesmo tempo que se deve respeitar a tradição, cultura e crença.

Nesse ponto, entram os instrumentos necessários ao processo de trabalho em saúde. Recursos utilizados na assistência do SUS se mostram insuficientes e impotentes quanto às necessidades indígenas. Basta uma análise atenta ao objeto e finalidade do processo de trabalho para perceber que a imposição das práticas de saúde pautadas no modelo hegemônico, ainda que revestidas por uma máscara cultural, não bastam. A participação no planejamento do cuidado, a manutenção do vínculo, a captação e satisfação das necessidades sob o ponto de vista da população e o fortalecimento das ações de enfermagem são importantes meios para se transformar esse objeto.

Limitações do estudo

Como limitação do estudo, ressalta-se a abordagem quantitativa, mensurando a prática da enfermagem pela lente do modelo hegemônico. A aplicação de um instrumento pode não ser suficiente para explicar a complexidade do trabalho da enfermagem, mas permite iniciar uma importante discussão acerca do que e quanto o enfermeiro e o técnico de enfermagem realizam nesse espaço. Outros estudos são necessários para aprofundamento da qualidade da assistência no que se refere às peculiaridades das ações e potencialidades de atendimento ao cuidado cultural necessário.

Contribuições para a Área

Com os resultados apresentados, espera-se ser possível desenvolver ferramentas para instrumentalizar a formação, a qualificação e o processo de trabalho da enfermagem no DSEI Yanomami e em outros DSEIs. A equipe de enfermagem representa uma potencialidade na assistência e na gestão do cuidado à população indígena, no entanto a educação e a pesquisa foram identificadas como limites do trabalho da enfermagem. Sendo assim, os resultados do estudo permitem a reflexão sobre a importância do investimento na formação do enfermeiro com foco na atuação na saúde indígena e nas peculiaridades de cada território, bem como no desenvolvimento de pesquisas com essa população, principalmente nas instituições de ensino superior da Região Norte do país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo tratou de identificar potencialidades e limites da atuação da equipe de enfermagem na APSI. As atividades realizadas no âmbito da assistência à população indígena são organizadas com base nas diretrizes da PNASPI, que regula a temática. Nesse contexto, a assistência de enfermagem tem fundamental importância na modificação e monitoramento dos perfis epidemiológicos da população indígena.

Os resultados permitiram compreender quais são as ações da equipe de enfermagem no DSEI Yanomami e com que frequência estas são realizadas. Como potencialidade, ressalta-se o envolvimento dos enfermeiros na assistência, possibilitando a intervenção direta nos potenciais de desgaste e fortalecimento identificados na população; ainda, a realização da consulta de enfermagem, a visita domiciliária e da vigilância epidemiológica evidenciaram a atuação dos enfermeiros no monitoramento das condições de vida e saúde no território. Outro destaque nos resultados está na participação dos profissionais nas conferências locais e regionais de saúde, espaços de deliberação, debate e fortalecimento do SUS.

Todavia, algumas limitações podem ser apontadas. Se por um lado há um alto envolvimento com a assistência e a gestão, por outro lado a necessidade constante de qualificação dos profissionais trazida pela literatura confronta o resultado acerca da quase inexistente participação dos enfermeiros nas dimensões de educação e pesquisa. Outro agravante é a pequena inserção do cuidado tradicional como disciplina nos cursos de graduação em Enfermagem das instituições da Região Norte. Vale destacar que a formação e qualificação profissional não podem ser limitadas pelos aspectos técnicos das práticas e devem ser sustentadas pelo caráter étnico cultural, para respeito e preservação do direito à vida e saúde do povo indígena.

As atividades realizadas no DSEI Yanomami buscam a articulação de saberes e instrumentos voltados para a atenção às necessidades da população. Há espaço para crescimento e desenvolvimento da atenção à saúde, bem como dos profissionais que atuam nesse território. Desde que investimentos, políticas públicas e os direitos à saúde sejam preservados, as potencialidades do cuidado em enfermagem poderão ser fortalecidas; e as condições de vida e saúde das comunidades, melhoradas.

  • FOMENTO
    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, com a concessão de bolsas e taxas escolares de Mestrado e Doutorado.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Álvaro Sousa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2020
  • Aceito
    14 Out 2020
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