A teoria de Florence Nightingale e suas contribuições para o pensamento crítico holístico na enfermagem

RESUMO

Objetivo:

refletir sobre o legado de Florence Nightingale e descrever suas contribuições para o pensamento crítico holístico na enfermagem.

Métodos:

trata-se de uma reflexão teórica, para a qual serviram de base produções científicas sobre a teoria ambientalista de Florence Nightingale, publicadas em periódicos nacionais e internacionais.

Resultados:

a filosofia e os ensinamentos de Florence Nightingale enfatizam que a enfermeira deve usar o cérebro, o coração e as mãos na criação de ambientes de cura, para cuidar do corpo do paciente, de sua mente e de seu espírito. A enfermagem, desde a época de Nightingale, vem construindo o paradigma holístico, em todas as escolas de pensamento, com vistas a uma abordagem humanística do ser humano em sua indivisível relação com o ambiente.

Considerações finais:

as contribuições de Florence ao pensamento crítico holístico na enfermagem são evidentes, constituindo o diferencial do enfermeiro na prática clínica.

Descritores:
Pensamento Crítico; Teoria de Enfermagem; História da Enfermagem; Cuidados de Enfermagem; Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

to reflect on Florence Nightingale’s legacy and describe her contributions to critical holistic thinking in nursing.

Methods:

this is a theoretical reflection, for which scientific productions on Florence Nightingale’s environmental theory, as published in national and international journals, were based.

Results:

Florence Nightingale’s philosophy and teachings emphasize that the nurse must use her brain, heart and hands to create healing environments to care for the patient’s body, mind and spirit. Nursing, since the time of Nightingale, has been building the holistic paradigm, in all schools of thought, with a view to a humanistic approach to the human being in their indivisible relationship with the environment.

Final considerations:

Florence’s contributions to holistic critical thinking in nursing are evident, constituting nurses’ differential in clinical practice.

Descriptors:
Critical Thinking; Nursing Theory; History of Nursing; Nursing Care; Nursing

RESUMEN

Objetivo:

reflexionar sobre el legado de Florence Nightingale y describir sus contribuciones al pensamiento crítico holístico en enfermería.

Métodos:

se trata de una reflexión teórica, para la cual se basaron producciones científicas sobre la teoría ambiental de Florence Nightingale, publicadas en revistas nacionales e internacionales.

Resultados:

la filosofía y las enseñanzas de Florence Nightingale enfatizan que la enfermera debe usar su cerebro, corazón y manos para crear ambientes curativos para cuidar el cuerpo, la mente y el espíritu del paciente. La enfermería, desde la época de Nightingale, ha ido construyendo el paradigma holístico, en todas las escuelas de pensamiento, con miras a un acercamiento humanista al ser humano en su relación indivisible con el medio ambiente.

Consideraciones finales:

las contribuciones de Florence al pensamiento crítico holístico en enfermería son evidentes, constituyendo el diferencial de la enfermera en la práctica clínica.

Descriptores:
Pensamiento; Teoría de Enfermería; Historia de la Enfermería; Atención de Enfermería; Enfermería

INTRODUÇÃO

O ano de 2020 marca o bicentenário do nascimento de Florence Nightingale, a precursora da enfermagem moderna, ou seja, o momento ideal para análise e reflexão das suas contribuições e do impacto na profissionalização da enfermagem. Partindo-se da premissa de Dewey, “O passado é a chave para compreender o presente”. Essa reflexão teórica se propõe descrever as contribuições de Florence ao pensamento crítico holístico na enfermagem⁽¹⁾.

Nightingale deixou um legado de ensinamentos e pedras angulares que alicerçam a profissão até hoje. Seu idealismo perpassa a trajetória histórica da enfermagem através dos registros deixados, tão atuais quanto há 200 anos. O alinhamento das tendências na atualidade com a teoria e a filosofia de Nightingale são impressionantes.

As contribuições de Florence têm destaque na literatura internacional, especialmente quando traz para discussão em seus escritos o seu princípio fundamental, ou seja, a healing (processo de cura ou ato de cura), representando a reunião de todos os aspectos do corpo, mente e espírito, para alcançar e manter a integração de um equilíbrio, o que denota cuidado de enfermagem holístico^(2-4). Nightingale, na distinção entre terapêutica e cura, explicita que a terapêutica pode ser sempre instituída, porém a cura nem sempre é possível. A remoção dos sinais e sintomas da doença não cura a doença, e envolve apenas uma dimensão do cuidado, a dimensão física, deixando em segundo plano a dimensão espiritual^(5-8).

Nessa direção, faz-se importante destacar que Nightingale introduziu, no contexto do cuidado, as cores, a luz, a música, os animais de estimação, o exercício, as flores como aspectos a serem enfatizados em um ambiente favorável em busca da cura, reafirmando as bases da teoria ambientalista e a premissa de que o ambiente influencia na saúde das pessoas⁽⁵⁾.

Afirma-se que, para se tornar um enfermeiro sensível ao holismo, requer a compreensão, no encontro de cuidado no qual está presente, de todas as facetas apresentadas pelo paciente. Essa presença genuína exige primeiro do enfermeiro a compreensão de todos os aspectos de si mesmo⁽³⁾; ou seja, é primordial, no processo de cuidado, que o enfermeiro também se compreenda em sua totalidade para, a partir disso, ser capaz de compreender o paciente em todas as suas necessidades, sejam elas fisiológicas ou espirituais.

Dessa forma, a espiritualidade na enfermagem se constitui em um dos pilares da enfermagem holística, com destaque para características como: harmonia, equilíbrio e interação em uma totalidade funcional de seus aspectos; qualidades e potencialidades dos indivíduos e/ou da coletividade; assistência centrada na pessoa e/ou na coletividade, focalizando-a como uma unidade indivisível e em constante interação com o meio ambiente; atenção integral às necessidades humanas básicas do indivíduo e/ou da coletividade, abordando os aspectos biopsicossociais e espirituais; utilização de tecnologia aplicada à saúde dos seres humanos; o desenvolvimento de métodos naturais com o intuito de melhorar sua saúde^(6-7).

Atualmente, os enfermeiros estão sendo desafiados a impulsionar os ideais de Florence por meio do pensamento crítico, objetivando prestar cuidado humano e competente com base nas melhores evidências científicas frente ao cenário de mudanças sem precedentes, ocorridas em nível mundial, e que exigem dos enfermeiros capacidade para o pensar crítico e holístico na tomada de decisão clínica e de gestão do cuidado, em distintos contextos de prática. Frente a isso, há de se destacar os conceitos fundamentais da disciplina propostos por Nightingale na década de 1850. Seus preceitos, criados com sabedoria e a partir de uma visão ampliada de mundo, revolucionários para a época, ecoam através das décadas, influenciando a ciência de enfermagem até hoje e que denotam suas contribuições para a constituição do pensamento crítico holístico dos enfermeiros⁽²⁾.

OBJETIVO

Refletir acerca do legado de Florence Nightingale e descrever suas contribuições para o pensamento crítico holístico na enfermagem.

MÉTODOS

Trata-se de um artigo de reflexão teórica, para a qual serviram de base produções científicas sobre a teoria ambientalista de Florence Nightingale, publicadas em periódicos nacionais e internacionais. Para isso, realizou-se busca em bases de dados nacionais e internacionais, com o objetivo de selecionar estudos publicados sobre as contribuições da teoria ambientalista de Florence ao pensamento crítico holístico na enfermagem.

Além disso, utilizaram-se referenciais bibliográficos para o embasamento teórico acerca do pensamento crítico e da teoria de Florence Nightingale. Com base nas produções científicas selecionadas, realizou-se a leitura criteriosa buscando identificar e sintetizar as principais contribuições da teoria ambientalista, sendo organizadas e apresentadas em três seções: O legado de Florence Nightingale: princípios e conceitos centrais da teoria ambientalista; Florence Nightingale: repercussões de seus ensinamentos para a enfermagem moderna; Enfermagem holística e o pensamento crítico holístico do enfermeiro.

RESULTADOS

O legado de Florence Nightingale: princípios e conceitos centrais da teoria ambientalista

A trajetória de vida de Nightingale foi imersa em complexidade, parcialmente revelada em suas 14.000 cartas e 100 livros, relatórios e boletins. A precursora da enfermagem acreditava que a enfermagem era seu chamado de Deus, sua mente curiosa e apaixonada pela enfermagem e sua implacável vontade de transformar fez abrir portas desafiando o contexto social, no qual encontrou oposição persistente, pois sempre foi uma mulher visionária e corajosa. Além disso, defendia que os pacientes recebessem cuidado civilizado, independente da situação social vivenciada⁽⁵⁾.

Frente a essa premissa, este artigo de reflexão busca provocar no leitor a reflexão sobre a trajetória de Florence, examinando o seu legado com o seguinte questionamento: a teoria e os princípios de Nightingale contribuem para o desenvolvimento do pensamento crítico holístico do enfermeiro na atualidade? A resposta é afirmativa, uma vez que, neste contexto, a enfermagem holística está baseada nos conhecimentos de enfermagem, nas teorias, na pesquisa, no fazer mediado pela experiência, na intuição e na criatividade. Além disso, “inclui como função e objetivo da Enfermagem cuidar e contribuir para a cura das pessoas em sua totalidade desde o nascimento até a morte”, como preconizado por Florence Nightingale⁽⁶⁾.

Em 1859, Florence escreveu Notes on Hospital, e Notes on Nursing em 1860. Esses compêndios explicitaram os padrões de higiene, tratamento de lesões, ventilação e outros conceitos necessários à construção da ciência de enfermagem. Seus padrões sobre nutrição, sono e exercícios continuam orientando a promoção da saúde até os dias atuais⁽³⁾.

Os três princípios da teoria ambientalista de Florence são a cura, a liderança e a ação global. O princípio considerado básico foi a cura, e os secundários, liderança e ação global, princípios necessários para apoiar a cura no seu nível mais aprofundado. No que se refere ao modelo educacional de Florence, deve-se levar em consideração o fato de esse ser fundamentado na antecipação do atendimento e na atenção às necessidades dos pacientes, fornecendo orientação para a realização das atividades pelos enfermeiros a fim de satisfazer as necessidades dos pacientes⁽⁸⁾.

A teoria ambientalista de Florence Nightingale está alicerçada em cinco pontos, os quais acreditava ser essenciais para se obter uma casa saudável, como água e ar puros, saneamento básico, limpeza e luminosidade, pois acreditava que um ambiente saudável era fundamental para a cura. Em seu tempo, relatava que o ruído era prejudicial e perturbava o repouso dos indivíduos, assim, a conversa dos cuidadores deveria ser evitada, bem como a agitação, as perguntas desnecessárias. Em contrapartida, Florence preconizava a alimentação nutritiva, leitos e roupas de cama apropriadas e higiene pessoal dos indivíduos⁽⁸⁾.

Neste contexto teórico e prático, a enfermagem era vista como um meio de “colocar a estrutura do indivíduo em um estado tal que não tenha doença ou possa se recuperar da doença”, colocando o indivíduo em uma condição na qual a natureza possa preservar ou recuperar a saúde – prevenindo ou curando a doença ou lesão. A saúde, na visão de Florence, era definida como a capacidade dos indivíduos em utilizar adequadamente todas as suas habilidades e competências na perspectiva do cuidado de si e dos outros⁽³⁾.

Florence defendia a base sólida de conhecimentos na enfermagem e ancorada em princípios; caso isso não fosse possível, seria como construir uma casa com alicerce fraco, ou seja, ela tombará. Essa premissa se torna ainda mais atual quando aplicada na formação em enfermagem, ou seja, enfermeiros formados com bases e princípios fortes terão subsídios para cuidar com qualidade, aplicando seu pensamento crítico para a tomada de decisões acuradas em benefício dos pacientes sob sua responsabilidade. Em sua ótica, Florence defendia que as enfermeiras deveriam observar, com precisão, seus pacientes e relatar o estado real de saúde de maneira ordenada ao médico⁽⁵⁾.

Com base nos princípios de Nightingale, podemos evidenciar sua busca por respeito à humanidade e à justiça social, pois defendeu o respeito à pessoa humana independentemente de classe social, deficiências físicas, condições de higiene ou ocupação. Enquanto sua família buscava incluí-la em uma cultura elitista, sua espiritualidade a chamou para servir pessoas comuns. Para Nightingale, uma verdadeira enfermeira deveria renunciar às distinções de classe e sempre manter seu foco na pessoa⁽²⁾.

Diante dos soldados feridos na Guerra da Criméia, insistiu que cada soldado fosse tratado com dignidade e gentileza, um afastamento radical do costume militar. Frente a isso, destacamos os esforços das instituições hospitalares em prestar cuidados humanos e centrados no paciente. Podemos observar na atualidade o foco na segurança e no atendimento às reais necessidades de saúde dos usuários, por meio de programas de qualidade e através de cuidados diretos prestados por enfermeiros se propondo a estarem mais próximos dos seus pacientes⁽⁵⁾.

Florence Nightingale: repercussões de seus ensinamentos para a enfermagem moderna

A enfermagem moderna se (re)inventou; no entanto, manteve inúmeros princípios da teoria ambientalista de Florence em suas bases científicas. Também incorporou novas tecnologias, para garantir a execução de cuidados humanos e singulares aos seres humanos, sempre pautados pela ciência e arte herdadas de Florence Nightingale, priorizando o conforto, a técnica e o ambiente adequados para a cura dos pacientes.

O compromisso de Nightingale em permanecer ao lado dos pacientes em momentos de sofrimento é a própria base do cuidado centrado no paciente, que se torna um princípio ainda muito atual e necessário para a plena recuperação dos pacientes⁽⁵⁾. Para isso, cuidados individualizados às necessidades dos pacientes precisam ser implementados. Tais cuidados, na atualidade, também chamados de intervenções ou atividades de enfermagem, terminaram por ser pesquisados e lapidados, sendo catalogados sob a forma de classificação internacional de resultados e intervenções, com base na linguagem padronizada dos diagnósticos de enfermagem, estruturados a partir dos problemas reais ou potenciais dos indivíduos, os quais necessitam da assistência de enfermagem.

Florence tratou a organização da prestação dos cuidados com foco na obtenção da cura; atualmente, podemos encontrar essa determinação no Processo de Enfermagem, compreendido como um instrumento metodológico utilizado pelos enfermeiros para organizar e planejar a assistência de enfermagem e estruturado em cinco etapas: investigação, diagnósticos de enfermagem, planejamento, implementação e avaliação.

A modernidade trouxe avanços significativos, os quais tensionaram a qualificação do ser e do fazer dos enfermeiros; a inserção de novas tecnologias de cuidado e ensino tem sido amplamente implementada. Nessa direção, os ensinamentos de Florence deixaram sua marca, influenciando no cotidiano de enfermagem, pois sempre enfatizou a importância do compromisso do enfermeiro com o cuidado, bem como o aprendizado alicerçado na prática.

Inúmeros modos de fazer enfermagem são apresentados atualmente como novidades, denotando o resgate das inovações que Florence, em sua época, criou e implementou, apenas com a diferença de hoje assumirem uma nova roupagem, como a classificação de risco, a prevenção e o controle de infecções, a limpeza, o ar fresco, o conforto, considerando que o ambiente interefere diretamente na saúde dos indivíduos por meio da música, das cores. A possibilidade da inserção de animais de estimação ou animais terapêuticos são práticas indicadas e implementadas por Florence⁽⁸⁾.

Portanto, neste processo, inovar em enfermagem pressupõe levar em consideração os princípios e conceitos aprendidos com Nightingale, além das teorias propostas por inúmeras teoristas de enfermagem, buscando mapear os territórios e contextos de cuidado, para, dessa maneira, modificar formas de cuidar desprovidas do saber científico e da estrutura necessária para a assistência de enfermagem de qualidade.

Assim, deve-se preservar as memórias do passado relacionadas às origens da ciência do cuidado, a fim de compreender e modificar o ser e o fazer do enfermeiro no presente e no futuro, sendo este o objetivo principal da enfermagem moderna. Neste contexto, destaca-se a importância da enfermagem holística e do desenvolvimento do pensamento crítico, tão prementes na atualidade, a fim de qualificar o ensino, a pesquisa e a assistência⁽²⁾.

Um dos maiores desafios da enfermagem moderna é atender às necessidades humanas em sua totalidade. Essas serão melhor identificadas por enfermeiros que pensam e exercem a enfermagem em uma perspectiva holística, desenvolvendo a formação profissional voltada para o pensamento crítico em seus contextos e práticas de cuidado. Desse modo, as ditas inovações na enfermagem consistirão no resgate necessário e premente dos ensinamentos de Florence^(2-3).

Assim, isso nos remete ao atual cenário mundial de saúde que estamos vivenciando no que se refere à conjuntura sanitária no bojo do bicentenário de Florence, reafirmando o compromisso científico, humano, ético e social da ciência de enfermagem em tempos de pandemia, reconhecendo o valor da filosofia que, por sua vez, é ainda mais necessária para manter os princípios de sua teoria ambientalista na atualidade. Deve ser explorada em profundidade nos espaços de formação e assistência, possibilitando a base de sustentação ao ensino da enfermagem e no desenvolvimento e aplicação prática do pensamento crítico dos futuros enfermeiros, com o objetivo de intervir qualitativamente no cuidado humano com vistas à prevenção e à cura das doenças em geral. Com isso, tais princípios nightingaleanos poderão refletir diretamente no processo de formação e cuidado em diferentes contextos de ensino e assistência.

Enfermagem holística e o pensamento crítico holístico do enfermeiro

A enfermagem holística tem como base os conhecimentos de enfermagem, as teorias, a pesquisa, o fazer mediado pela experiência, bem como a intuição e a criatividade⁽⁶⁾. Nesta perspectiva, a prática da enfermagem incorpora a teoria, a prática e os aspectos subjetivos, bem como a intuição e a criatividade, os quais são decisivos no modo como se constituirá esse modelo de cuidado.

O legado de Florence no que concerne à enfermagem holística, bem como ao pensamento crítico, é evidente quando analisamos o percurso histórico de atendimento às necessidades da humanidade, e tem sido vanguarda na realização de cuidados e conforto aos doentes. Além disso, a enfermagem também se ocupou da educação em saúde da população. Florence incentivou seus alunos a considerarem a diversidade cultural e religiosa, bem como os valores, as necessidades e preocupações dos indivíduos em sua singularidade, sem descuidar-se dos aspectos econômicos e sociais que envolvem o cuidado⁽⁵⁾.

A trajetória histórica de Florence denota a importância de enfermeiros capazes de pensar critica e holisticamente para lidar com situações de adversidades, como foi seu caso na Guerra da Criméia. Florence vivenciou cenários de incertezas, adversos e contextos de cuidados para os quais necessitou aplicar o seu pensamento crítico muito desenvolvido para os moldes e padrões femininos da sua época⁽³⁾.

O pensamento crítico holístico pode ser definido como o pensar com qualidade, ou seja, um processo de julgamento centrado em decidir no que acreditar ou no que fazer. Mediante isso, o pensador crítico não deve ser negativo ou cínico, mas reflexivo e equilibrado, exigindo das pessoas a expressão de algum tipo de razão ou base para o que quer que esteja dizendo⁽⁹⁾.

Na ótica de Florence, a enfermeira deveria pensar de maneira crítica sobre o cuidado do paciente, fazendo o que fosse apropriado e necessário para auxiliá-lo a se curar, reforçando a importância de desenvolver no enfermeiro o modo crítico e holístico de pensar no cotidiano de ser e de fazer enfermagem⁽⁸⁾.

Partindo desse modo de pensar, naquela época, a prática baseada em evidências se efetivava de maneira muito salutar para a realização dos procedimentos e cuidados de enfermagem, pois as pesquisas ainda eram escassas. Mesmo assim, pode-se considerar Florence como uma pioneira na realização de pesquisas acerca da prática baseada em evidências e na aplicação do pensamento crítico. A teoria ambientalista de Florence apoiou sobremaneira a enfermagem e também para o desenvolvimento do pensamento crítico, contribuindo na prática de enfermagem baseada em evidências e para além desses aspectos tão importantes da formação e da prática clínica dos enfermeiros^(5,8).

Assim como Florence, cabe destacar outras teoristas de enfermagem, tais como Watson, Horta, King e Leninger, que impactaram a sociedade ao considerar não apenas os aspectos físicos da pessoa humana, mas também a interconexão entre corpo, mente e espírito de cada indivíduo. Há de se considerar que, nas últimas três décadas, a enfermagem passou de um modelo focado nos aspectos fisiológicos e científicos para um modelo focado na ciência de enfermagem, no cuidado e na cura, buscando considerar os aspectos culturais, valores e crenças conectados ao ato de cuidar⁽¹⁰⁾.

No Brasil, podemos descrever esse movimento como uma mudança de paradigma de um modelo biomédico-tecnicista para um modelo de cuidado embasado na arte e na ciência do cuidado técnico-científico e humanista⁽¹⁰⁾. Esse movimento impulsionou a ênfase na filosofia e nos ensinamentos de Florence Nightingale, despertando nos enfermeiros a capacidade e a necessidade de pensar holisticamente, utilizando o cérebro, o coração e as mãos na criação de ambientes de cura, a fim de cuidar efetivamente do trinômio dimensional corpo-mente-espírito.

Diante disso, nota-se o pensamento crítico fortemente influenciado pelas contribuições do legado de Florence, que direcionam o enfermeiro para uma abordagem integral e humanística, em que predominam a capacidade de ouvir e de considerar a pessoa em sua totalidade. Nessa direção, o enfermeiro que desenvolve o pensamento crítico holístico no processo de formação em enfermagem terá melhor desempenho na aplicação das habilidades cognitivas, comportamentais e hábitos da mente e, consequentemente, dos princípios e da teoria de Florence Nightingale. Dessa maneira, será possível cuidar dos indivíduos como um ser humano único, ou seja, singular, de modo a considerar as necessidades relacionadas ao corpo físico (aspectos fisiológicos), à mente (aspectos emocionais) e ao espírito (aspectos espirituais)⁽¹⁰⁾.

Das limitações dessa reflexão, destacamos a escassez de pesquisas publicadas no Brasil abordando a influência da teoria de Nightingale ao pensamento crítico holístico dos enfermeiros. Isso denota uma lacuna do conhecimento a ser preenchida, haja vista a importância dessa temática para a formação e o cuidado de enfermagem. Em relação às contribuições deste estudo, destaca-se a possibilidade de produzir impactos na prática profissional por meio do conhecimento e reconhecimento do legado de Florence para a formação e a prática profissional, além de possibilitar a compreensão pelos estudantes e enfermeiros acerca da teoria de Nightingale.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Finaliza-se esta reflexão teórica com a evidência da fundamental importância das contribuições do legado de Florence Nightingale ao pensamento crítico na enfermagem. Além disso, vê-se que sua teoria é decisiva no preenchimento das lacunas de conhecimento relacionadas à dimensão holística na execução do processo de enfermagem, tendo como objetivo a tomada de decisão clínica acurada dos estudantes e enfermeiros. É imperativo que os enfermeiros apliquem a filosofia e os pressupostos holísticos de Nightingale na enfermagem, pois os pacientes esperam compaixão, além de enfermeiros especializados e focados na totalidade das necessidades da pessoa humana.

O legado de Nightingale nos permite atender a essas expectativas, pois sua filosofia inclui o estímulo ao autocuidado, à arte e à ciência de enfermagem, contemplando as teorias relacionadas, além da pesquisa e da ética. Nightingale demonstrou por meio do exemplo em sua trajetória, difundindo, em suas produções científicas, que seu princípio fundamental foi cuidar com foco na prevenção e cura através do processo que une todas as dimensões singulares que constituem o todo dos indivíduos para alcançar e manter a integração e o equilíbrio. Assim, para garantir esse enfoque na formação em enfermagem, reafirma-se o compromisso de que ensinar e cuidar são verbos e ações a serem conjugados para além do discurso e efetivados na prática genuína do ser e do fazer dos enfermeiros.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Rafael Silva

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  03 Maio 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  26 Abr 2020
• Aceito
  27 Set 2020