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Diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em enfermagem: a luta da ABEn contra retrocessos

A Associação Brasileira de Enfermagem Nacional (ABEn), diante do disposto em seu estatuto social, no que tange à formação em enfermagem no contexto brasileiro, debruçou-se na construção da minuta propositiva para as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Enfermagem (DCN/Enf). Tal minuta foi construída considerando a Constituição Federal, as Leis e Resoluções que regem a educação superior e a graduação na área de saúde no nosso país. Para a ABEn, é fundamental considerar as demandas por uma formação alinhada às necessidades de saúde da população, aos avanços da atuação profissional da área de enfermagem, ao compromisso com a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS) e com o desenvolvimento de sua competência como ordenador da formação dos profissionais da saúde no cumprimento dos referenciais constitucionais.

Cabe destacar que as DCN/Enf vigentes foram aprovadas em 2001, ou seja, há duas décadas. Naquele momento, houve notável respeito e consideração às propostas emanadas de profícuas experiências na produção de conhecimentos, saberes e inovação na prática profissional de enfermeiras(os) nos serviços de saúde e participações da categoria. A necessidade de reformulação se deu pelo reconhecimento de questões sanitárias, sociais, políticas e culturais, que apontam para o alinhamento a um contexto mais contemporâneo sem perder a sua essência no que se refere à trajetória histórica de avanços da enfermagem e da saúde da sua importante contribuição para a saúde da população, assegurando os direitos sociais garantidos na constituição.

A minuta/documento foi encaminhada, em 2017, para apreciação do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e do Conselho Nacional de Educação (CNE). Tal minuta traz, de forma explícita, os valores inerentes à profissão e ao processo formativo, reafirma o papel social da educação em enfermagem e projeta uma formação ampla, sólida e com bases filosóficas, técnico e científicas capazes de sustentar um fazer profissional com competência, ética e compromisso social.

O debate e a formulação das DCN/Enf, com base na minuta encaminhada pela ABEn, avançam e ganham potência e legitimidade social na construção coletiva realizada no âmbito do CNS no ano de 2017, por meio de sua Comissão Intersetorial de Recursos Humanos e Relações de Trabalho (CIRHRT), que resultou na Resolução CNS nº 573 de 31 de janeiro de 2018, que aprovou o Parecer CNS nº 28/201811 Ministério da Saúde (BR). Resolução n. 573, de 31 de janeiro de 2018. Aprovar o Parecer Técnico n. 28/2018 contendo recomendações do Conselho Nacional de Saúde (CNS) à proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para o curso de graduação Bacharelado em Enfermagem. 2018 Available from: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2018/Reso573.pdf
https://conselho.saude.gov.br/resolucoes...
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Os coletivos que protagonizaram a construção da minuta mantiveram-se atentos e interessados na celeridade da tramitação e aprovação da proposta indicativa de mudanças nos cursos de graduação em enfermagem em todo território nacional. No entanto, por questões diversas que passam pela pandemia e até de decisão política, tem se estendido a agenda de formulação das novas DCN/Enf no âmbito da Câmara de Ensino Superior do CES/CNE, ainda que houvesse, neste tempo, as solicitações da ABEn de ofício ao CNE de informações sobre o andamento e de seu interesse do processo.

Três anos após o encaminhamento da minuta, somente em 2021, ela foi pautada pelo CNE. Não bastasse o hiato de tempo neste retorno, o documento deliberado pelo Conselho apresentou profundas alterações em relação à minuta original que comprometem a qualidade da formação da(o) enfermeira(o).

Trata-se de uma proposta de DCN/Enf com conceitos e fundamentos apresentados de forma genérica e superficial, escamoteando pontos nucleares e princípios fundamentais de inestimável valor para a formação da(o) enfermeira(o) e que são considerados inegociáveis. O documento adota caminhos que se afastam de uma concepção de qualidade da educação em saúde, socialmente referenciada, dissimulando tal intenção ao apresentar conceitos e categorias, sem enunciar concretamente quais sentidos pretende afirmar. Não justifica a adoção do modelo teórico filosófico da formação que retrocede a metodologia pedagógica da transmissão de conhecimentos não apropriada ao processo de formação profissional de enfermeiras(os).

A proposta do CNE retrocede a uma formação instrumental, tecnicista ao descartar conteúdo(s) da proposta da ABEn e do CNS, que contemplam o compromisso técnico, político e social dos processos de formação da(o) enfermeira(o) para atender a relevante participação deste profissional na ampliação da produção de serviços de saúde para a população e nos processos de aprimoramento de uma atuação ética, política e tecnicamente qualificada.

Do ponto de vista da educação, a proposta apresentada fere o significado da educação enquanto processo de transformação individual e social, transmite a concepção reducionista de que formar um profissional é, simplesmente, oferecer um curso, um ajuntamento de conteúdos, sem enraizamento no mundo do trabalho, na realidade e nos compromissos maiores com a sociedade.

Assim, a proposta apresentada pelo CES/CNE fragiliza a formação das novas gerações de trabalhadores da enfermagem, com forte impacto na qualidade do modelo de atenção à saúde e no SUS como sistema de acesso universal.

REFERÊNCIAS

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    Ministério da Saúde (BR). Resolução n. 573, de 31 de janeiro de 2018. Aprovar o Parecer Técnico n. 28/2018 contendo recomendações do Conselho Nacional de Saúde (CNS) à proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para o curso de graduação Bacharelado em Enfermagem. 2018 Available from: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2018/Reso573.pdf
    » https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2018/Reso573.pdf

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    2021
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