Reorganização do atendimento em ambulatório de mastologia durante a pandemia de COVID-19

RESUMO

Objetivo:

relatar a experiência da equipe de saúde na reorganização dos atendimentos em ambulatório de mastologia.

Métodos:

relato de experiência em ambulatório de mastologia de serviço público universitário no Ceará entre março e abril de 2020. O serviço atende, exclusivamente, mulheres e que estão com alterações mamárias, para tratamentos cirúrgicos variando desde nodulectomias a mastectomias com oncoplástica.

Resultados:

o aumento dos casos de COVID-19 trouxe necessidade de reorganizar atendimentos em serviços de saúde. Seguiram-se as seguintes etapas: identificação das pacientes agendadas, leitura das evoluções clínicas nos prontuários eletrônicos, avaliação individual para definição da permanência ou não da consulta, contato telefônico para informar sobre a desmarcação. Dentre as 555 consultas agendadas para março e abril de 2020, 316 (56,9%) foram mantidas.

Considerações finais:

a reorganização dos atendimentos no ambulatório de mastologia otimizou o tempo de espera das consultas e evitou aglomerações no serviço, propiciando segurança às pacientes atendidas.

Descritores:
Infecções por Coronavírus; Neoplasias de Mama; Equipe de Assistência ao Paciente; Assistência Ambulatorial; Saúde da Mulher

ABSTRACT

Objective:

to report the experience of a health team in restructuring service at a mastology outpatient clinic.

Methods:

an experience report in a public university service mastology outpatient in Ceará between March and April 2020. Service in this outpatient clinic is exclusively for women and who have breast changes for surgical treatments ranging from nodulectomies to mastectomies with oncoplastic.

Results:

increased COVID-19 cases brought the need to restructure healthcare services. The following steps were followed: identification of scheduled patients, reading of clinical developments in electronic medical records, individual assessment to define whether or not appointment would remain, telephone contact to inform about unscheduling. Among the 555 consultations scheduled for March and April 2020, 316 (56.9%) were maintained.

Final considerations:

restructuring consultations at a mastology outpatient clinic optimized the waiting time for consultations and avoided crowds at service, providing patient safety.

Descriptors:
Coronavirus Infections; Breast Neoplasms; Patient Care Team; Ambulatory Care; Women’s Health

RESUMEN

Objetivo:

reportar la experiencia del equipo de salud en la reorganización de la atención en una consulta externa de mastología.

Métodos:

relato de experiencia en un servicio de mastología ambulatoria de un servicio público universitario en Ceará entre marzo y abril de 2020. El servicio atiende exclusivamente a mujeres y aquellas con alteraciones mamarias, para tratamientos quirúrgicos que van desde nodulectomías hasta mastectomías con oncoplásticos.

Resultados:

el aumento de casos de COVID-19 trajo la necesidad de reorganizar los servicios de salud. Se siguieron los siguientes pasos: identificación de pacientes programados, lectura de desarrollos clínicos en historias clínicas electrónicas, valoración individual para definir si se mantendría o no la cita, contacto telefónico para informar de la baja. De las 555 consultas programadas para marzo y abril de 2020, se mantuvieron 316 (56,9%).

Consideraciones finales:

la reorganización de la atención en el ambulatorio de mastología optimizó el tiempo de espera para las consultas y evitó aglomeraciones en el servicio, brindando seguridad a los pacientes atendidos.

Descriptores:
Infecciones por Coronavirus; Neoplasias de la Mama; Grupo de Atención al Paciente; Atención Ambulatoria; Salud de la Mujer

INTRODUÇÃO

A COVID-19 é uma doença causada pelo coronavírus SARS-CoV-2 (Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2) e tem trazido ameaça à saúde pública mundial. Com necessidade de mudanças imediatas, adaptações tendem ser a saída para evitar a contaminação, que, potencialmente, não distingue raça, cor e gênero⁽¹⁾.

Os números globais de casos suspeitos e confirmados aumentam a cada dia. Até 18 de maio de 2020 foram confirmados 4.618.821 casos de COVID-19 no mundo (93.324 novos em relação ao dia anterior) e 311.847 mortes (4.452 novas em relação ao dia anterior)⁽²⁾. Estatísticas brasileiras indicam que a alta taxa de transmissibilidade traz colapsos no sistema de saúde pública, tornando o país uma das quatro maiores nações em número de infecções confirmadas por coronavírus no mundo, ultrapassando até mesmo a Espanha e a Itália⁽³⁾.

Como a disseminação é de uma pessoa a outra por gotículas respiratórias ou contato, cuidados especiais devem ser tomados referente à etiqueta respiratória, lavagem de mãos com água e sabão, dentre outras precauções. Logo, o ideal é que a circulação dos cidadãos em vias públicas diminua, para evitar a disseminação da doença⁽¹⁾.

Assim, foi necessário que alguns estados e municípios da federação brasileira decretassem restrições mais rígidas de circulação de pessoas em locais públicos, mesmo naqueles territórios de alta densidade populacional e habitações precárias⁽⁴⁾.

Após a sinalização da atual pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), diversos centros de tratamentos de saúde no Brasil vêm adotando medidas, para que não ocorram aglomerações de pacientes em suas dependências, o que aumentaria as chances de infecção pelo vírus. Mesmo com um cenário tão preocupante, há necessidade da permanência de alguns atendimentos ambulatoriais pelo fato de o tempo ser um fator influenciador no sucesso do tratamento⁽⁵⁾.

Particularmente nos pacientes oncológicos, que têm sua imunidade fragilizada por conta da própria doença, pelo status de recuperação pós-cirúrgica, tratamento com quimioterápicos, imunossupressores, imunoterapia, radioterapia, os cuidados acerca da infecção pela COVID-19 trazem uma grande preocupação para a equipe de saúde, sendo necessários ajustes de procedimentos, rotinas, protocolos e adequação de espaços físicos para atendimento seguro a esse grupo de risco de forma que não sejam suspensos seus acompanhamentos e tratamentos. Em alguns casos, as consultas são realizadas com o auxílio da telemedicina por telefone^(6-7).

Desse modo, é necessária a reorganização das unidades de saúde para atendimento ao público, a partir da determinação de medidas de segurança ajustadas para atender os usuários livres de riscos inerentes ao contágio da doença⁽⁸⁾. Destarte, o ambulatório de mastologia deste estudo precisou ter sua agenda de atendimentos reorganizada pela equipe de saúde em tempo exíguo, para atender as usuárias com segurança.

OBJETIVO

Relatar a experiência da equipe de saúde na reorganização dos atendimentos em ambulatório de mastologia.

MÉTODO

Estudo do tipo relato de experiência sobre a atuação da equipe de saúde na reorganização dos atendimentos no ambulatório de mastologia de uma maternidade universitária pública no Ceará nos meses de março e abril de 2020. O local faz parte do Complexo Hospitalar Universitário, referência no atendimento a mulheres no ciclo gravídico-puerperal, com alterações ginecológicas e mastológicas, sob a esfera do Sistema Único de Saúde, em necessidade de atendimento ambulatorial, ou mesmo, quando necessário, de alta complexidade. Além dos setores ambulatoriais, possui unidades de internações clínicas e Unidade de Terapia Intensiva Adulta e Neonatal.

O ambulatório de mastologia possui quatro salas para atendimento médico, de enfermagem e de fisioterapia, além de quatro boxes para exame físico e procedimentos, como retirada de pontos de sutura e drenos de sucção, curativos, core biopsy, punção aspirativa por agulha fina, biópsia incisional, entre outros procedimentos ambulatoriais. A equipe de saúde é composta por oito mastologistas, duas enfermeiras, seis técnicas de enfermagem, uma fisioterapeuta, trabalhando de segunda a sexta-feira dividida em turnos da manhã (7 h às 13 h) e da tarde (13 h às 19 h), exceto nos feriados.

Embora sejam atendidas mulheres com câncer de mama, o hospital onde esse ambulatório está inserido dispõe apenas de tratamento cirúrgico, referenciando para serviços parceiros àquelas usuárias com necessidade de outras modalidades de tratamento como radioterapia, hormonioterapia e quimioterapia, entretanto, ao final dessa etapa, retornam para o serviço.

No primeiro trimestre de 2020, foram atendidas, em média, 926 mulheres por mês. O fluxo de chegada das usuárias se dá através da Central de Regulação do estado ou município, assim como são referenciadas por outros ambulatórios do Complexo Hospitalar, ou, ainda, pelo serviço de emergência. Há, ainda, aquelas que já completaram seus tratamentos e estão sob seguimento.

Com o decreto estadual sobre o isolamento social em 19 de março de 2020, iniciou-se o desenho para reorganização dos atendimentos, mas apenas no dia seguinte foram definidas as etapas para reorganização dos atendimentos no ambulatório de mastologia e início dos contatos telefônicos para desmarcações das consultas.

Como a quantidade de usuárias do ambulatório é elevada, o que, normalmente, já provoca aglomerações nos corredores, a primeira iniciativa foi evitar tal situação, mas, para isso, algumas etapas foram percorridas a fim de garantir a segurança delas e dos profissionais. Para tanto, a equipe interdisciplinar de saúde desenvolveu um trabalho de forma integrada, interdependente, coesa, sobretudo em tempo exíguo.

A primeira etapa contemplou a confecção de um formulário com identificação das pacientes (nome completo, número do prontuário, telefone), data da consulta agendada e mastologista assistente. Posteriormente, uma enfermeira e uma mastologista buscaram nos prontuários eletrônicos, por meio do Aplicativo de Gestão dos Hospitais Universitários (AGHU), as consultas agendadas semana por semana a partir do dia 23 de março de 2020.

A partir daí, foi delimitada a quantidade de atendimento diário, normalmente 6 pacientes/mastologista/turno. Assim, realizou-se a leitura de todas as evoluções clínicas daquelas pacientes agendadas da semana seguinte e foi avaliada, individualmente, a necessidade do retorno precoce ao serviço. Foram sinalizadas no formulário aquelas usuárias cujas consultas poderiam ser postergadas e foi realizado contato telefônico para informar sobre a suspensão temporária da mesma.

Os critérios utilizados para a manutenção das consultas foram determinados em consonância com o que estabelece várias sociedades médicas, inclusive a Sociedade Médica de Cirurgia Oncológica e as mastologistas da equipe do ambulatório, cuja ideia foi estratificar pacientes por urgência de tratamento. Assim, os atendimentos que foram classificados como benefício moderado ou elevado foram: retornos para marcação de cirurgia oncológica (mastectomia, quadrantectomia) nos casos inviáveis do uso de hormonioterapia como estratégia para postergação segura do procedimento, pós-operatório (remoção de drenos e pontos de sutura ou acompanhamento de complicações como deiscências e hematomas), investigação de exames previamente alterados que indicavam possível neoplasia mamária, pós-quimioterapia ou pós-radioterapia para programação das etapas seguintes, já que atrasos no início dos tratamentos oncológicos podem significar um risco mais elevado de insucesso e maior mortalidade por câncer, apresentando-se até maior do que o risco associado a uma eventual infecção por COVID-19^(6-7).

RESULTADOS

Dentre as 555 consultas agendadas entre 20 de março a 30 de abril, 316 (56,9%) se adequavam nos critérios estabelecidos previamente e foram prontamente atendidas pela equipe de saúde. Quantitativo expressivo de pacientes foi atendido em momento de pandemia, embora marcado pela avaliação individual rigorosa para sua seleção. Entretanto, para as 239 restantes, cujas consultas foram sinalizadas no formulário que poderiam ser postergadas, realizou-se contato telefônico para informar sobre a suspensão temporária e orientá-las sobre a remarcação posterior das consultas pelo telefone, a depender do direcionamento das autoridades de saúde para liberação de atendimentos ambulatoriais. Ressalta-se que, com uma demanda menor de usuárias, o tempo de espera permaneceu reduzido, já que a quantidade de profissionais que realizaram os atendimentos se manteve.

Torna-se importante destacar que, a partir do estabelecimento da pandemia de COVID-19 pela OMS, a entrada de qualquer paciente no ambulatório foi monitorada por uma enfermeira devidamente paramentada, designada especialmente para tal atribuição através de triagem individual realizada na porta de entrada antes do acesso às instalações do serviço. Nesse momento, a paciente era indagada sobre sintomas gripais e/ou contato com pessoas gripadas. Em caso afirmativo, a equipe do setor que a paciente seria atendida era acionada para atendimento em sala preparada para tal situação e a equipe responsável no turno se paramentava conforme as recomendações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Esse protocolo hospitalar instituído para triagem exclusivamente presencial nos ambulatórios foi desenhado depois de reuniões com enfermeiros e médicos logo após início dos casos da doença na cidade. O reconhecimento dos sintomáticos, ou seja, com sintomas respiratórios antes mesmo de entrarem nos locais dos serviços de saúde, constituiu uma rotina essencial para redução da exposição de pacientes e profissionais, além de prevenir a progressão da doença⁽⁹⁾.

DISCUSSÃO

Inicialmente, reforça-se que a saúde pública a nível mundial tem à frente um grande desafio, visto que a doença ocasionada pelo novo coronavírus ainda não possui tratamento antiviral específico ou vacina efetiva, embora com promissoras pesquisas para alcançar esse objetivo⁽²⁾.

A experiência relatada corrobora algumas entidades nacionais de saúde, quando propõe determinadas atividades para controle de contaminação pelo SARS-CoV-2 como adiação de consultas até o fim do período de pandemia, assim como exames de seguimento, objetivando evitar visitas desnecessárias ao serviço de saúde e, sobretudo, aglomerações de usuários⁽⁵⁾.

Ainda nesse contexto, a Organização Pan-Americana da Saúde/OMS recomenda reduzir a exposição dos indivíduos através do isolamento social, até mesmo nos casos em que houver sintomas leves suspeitos da infecção^(2,10). Contudo, cabe às unidades de saúde uma comunicação efetiva com os pacientes, encorajamento da não interrupção do tratamento oncológico ajustada de acordo com a realidade local, considerando os riscos e demandas, além de orientações acerca do funcionamento durante o período de pandemia⁽⁹⁾.

Pelo limitado número de estudos, as recomendações voltadas aos pacientes com câncer de mama são preliminares, e as condutas são baseadas na experiência clínica e discussão de especialistas e equipe multidisciplinar. Portanto, algumas sugestões foram traçadas para priorização, tratamento e triagem de pacientes cuja condição refletisse ameaça imediata para continuidade da vida, em que o prognóstico seria significantemente alterado pelo atraso no atendimento⁽¹¹⁾.

A dimensão da importância do trabalho da equipe interdisciplinar de saúde se sobressai, essencialmente, quando o foco principal de suas decisões é prioritariamente pautada no paciente. Considerando que a finalidade primordial durante essa pandemia é priorizar a redução de riscos à saúde, além de proporcionar desfechos satisfatórios para as pacientes oncológicas, as discussões são necessárias para fornecer informações, compartilhar decisões e discutir os benefícios de iniciar, manter ou suspender o tratamento durante o período pandêmico.

Limitações do estudo

Entre as limitações estava a falta de tempo para o acompanhamento dos atendimentos a partir da reorganização para identificar os resultados.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

A atuação do enfermeiro na equipe interdisciplinar possibilita troca, cooperação, planejamento, execução e avaliação do plano de cuidados tanto sob a esfera administrativa como assistencial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O relato evidenciou que a reorganização dos atendimentos aos pacientes do ambulatório mastologia otimizou o tempo de espera dessas consultas e evitou aglomerações no serviço, propiciando segurança às pacientes atendidas e maior proteção à sua imunidade.

A integração do trabalho da equipe interdisciplinar foi fundamental, uma vez que cada profissional interveio de acordo com seu conhecimento e as diferenças técnicas ou especialidades e se aliaram para as tomadas de decisões com objetivo de prevenção, promoção e reabilitação da saúde das pacientes com câncer de mama.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Jan 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  28 Maio 2020
• Aceito
  09 Ago 2020