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Caracterização da atenção obstétrica desenvolvida em hospitais de ensino de uma capital do nordeste brasileiro

RESUMO

Objetivo:

Descrever a atenção obstétrica desenvolvida em hospitais de ensino (HE), em Maceió-AL, destinados à gestação de alto risco.

Métodos:

Estudo de coorte retrospectivo realizado entre os meses de junho e novembro de 2018 com 291 mulheres que receberam assistência ao parto vaginal, cesárea ou processo de abortamento nos hospitais escolas selecionadas como cenário desta pesquisa. A coleta dos dados permitiu a caracterização das entrevistadas bem como da assistência recebida e sua relação com a violência obstétrica. A análise foi realizada por meio da estatística descritiva e analítica com auxílio do software Epi Info (versão 7.2.0.1) e medidas que permitiram a comparação de médias e proporções.

Resultados:

Todas as mulheres referiram, no mínimo, uma situação de violência, contrariando recomendações baseadas em evidências científicas.

Conclusão:

Torna-se necessário otimizar a formação profissional para desconstrução da atenção obstétrica pautada na medicalização e patologização da gestação; e fortalecer o cuidado baseado na ciência.

Descritores:
Atenção à Saúde; Cuidados de Enfermagem; Obstetrícia; Violência contra a Mulher; Hospitais de Ensino

ABSTRACT

Objective:

to describe the obstetric care developed in teaching hospitals (TH) in the city of Maceió-AL, intended for high-risk pregnancies.

Methods:

Retrospective cohort study performed between June and November 2018 with 291 women who received assistance with vaginal delivery, cesarean section, or abortion process in teaching hospitals selected as settings for this research. Data collection allowed the characterization of the interviewees as well as the assistance received and its relationship with obstetric violence. The analysis was performed using descriptive and analytical statistics with the aid of the Epi Info software (version 7.2.0.1) and measures that allowed the comparison of means and proportions.

Results:

All women reported at least one violent situation, contrary to recommendations based on scientific evidence.

Conclusion:

It becomes necessary to optimize professional training to deconstruct obstetric care based on medicalization and pathologization of pregnancy and strengthen science-based care.

Descriptors:
Health Care; Nursing Care; Obstetrics; Violence Against Women; Teaching Hospitals

RESUMEN

Objetivo:

Describir la atención obstétrica desarrollada en hospitales de enseñanza (HE), en Maceió-AL, destinados a embarazo de alto riesgo.

Métodos:

Estudio de cohorte retrospectivo realizado entre junio y noviembre de 2018 con 291 mujeres que recibieron asistencia al parto vaginal, cesárea o proceso de aborto en los HEs seleccionados. Recogida de datos permitió la caracterización de las entrevistadas, así como de la asistencia recibida y su relación con la violencia obstétrica. El análisis se realizó mediante estadística descriptiva y analítica con la ayuda del software Epi Info. (versión 7.2.0.1) y medidas que permitieron la comparación de medianas y proporciones.

Resultados:

Todas las mujeres refirieron, en lo mínimo, una situación de violencia, contrariando recomendaciones basadas en evidencias científicas.

Conclusión:

Es necesario optimizar la formación profesional para desconstrucción de la atención obstétrica pautada en la medicalización y patologización del embarazo; y fortalecer el cuidado basado en la ciencia.

Descriptores:
Atención a la Salud; Cuidados de Enfermería; Obstetricia; Violencia contra la Mujer; Hospitales de Enseñanza

INTRODUÇÃO

O modelo de atenção obstétrica sofreu mudanças importantes ao longo da história. Considerado um evento familiar de cunho feminino, a assistência ao parto recebeu grande influência do processo de urbanização e fundação das universidades em meados do século XIX. Desde então, com o avanço técnico-científico, essa assistência tem-se tornado embargada pela medicalização como consequência da intensa patologização de acontecimentos naturais na vida das mulheres, comprometendo as taxas de morbimortalidade materna e perinatal - indicadores do cuidado destinado a essa população 11 Carlo WA, Travers CP. Maternal and neonatal mortality: time to act. J Pediatr. 2016; 92(6):543-5. https://doi.org/10.1016/j.jped.2016.08.001
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Diante desse cenário, a insatisfação das mulheres perante o (des)cuidado recebido, promoveu, no século XX, o surgimento do Movimento de Humanização do Parto. Assim designado, por relacionar-se ao o movimento do humanismo que valoriza o ser humano e sua condição, que, confrontando assim o teocentrismo da Idade Média. Nesse sentido, a qualificação da assistência ao binômio embasada no uso de práticas comprovadas pela ciência como benéficas e no protagonismo do ser cuidado tornou-se o objetivo do movimento, agregando profissionais de diversas áreas em torno de uma série de reivindicações em prol dessa ideologia 22 D’aquino LS. The humanization of childbirth movement as a social movement and its similarities with the recent protests that have taken the world. Rev Dir Soc Pol Públicas [Internet]. 2016 [cited 2019 Apr 12]; 3(1):46-58. Available from: http://www.unifafibe.com.br/revista/index.php/direitos-sociais-politicas-pub/article/view/119/pdf
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No escopo do surgimento de políticas públicas atreladas à ideologia de qualificação do cuidado obstétrico e neonatal, o documento Assistência ao Parto Normal: um Guia Prático, publicado em 1996 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), tem uma simbologia representativa para promoção do parto e nascimento salutares, combatendo assim as altas taxas de morbimortalidade materna e neonatal, sendo fruto de debates internacionais com base em evidências científicas. Em caráter de atualização, após quase duas décadas, a OMS publicou um compilado de recomendações intitulado Intrapartum care for a positive childbirth experience, a fim de contribuir não apenas para uma assistência segura ao processo parturitivo, mas também para uma experiência positiva com enfoque no protagonismo da mulher e na abordagem holística pautada nos direitos humanos 33 Carvalho SR, Rodrigues CO, Costa FD, Andrade HS. Medicalização: uma crítica (im)pertinente? Introdução. Physis Rev Saúde Coletiva. 2015; 25(4):1251-69. https://doi.org/10.1590/S0103-73312015000400011
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-44 World Health Organization (WHO). WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva: WHO [Internet]. 2018 [cited 2019 Apr 12]. Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789241550215
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Apesar de tal esforço, a alarmante taxa de cesárea apresentada pelo Brasil e a quantidade de intervenções desnecessárias, realizadas por profissionais que participam no processo parturitivo ativamente e promoveram discussões acerca de uma modalidade de violência associada à assistência obstétrica 55 Zanardo GLP, Uribe MC, Nadal AHR, Habigzang LF. Obstetrical violence in Brazil: a narrative review. Psicol Soc. 2017;26:e155043. https://doi.org/10.1590/1807-0310/2017v29155043
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. Nesse contexto, a violência obstétrica pode então ser entendida como “qualquer ato ou intervenção desnecessária dirigida à parturiente ou ao neonato, praticada sem o consentimento da mulher e/ou em desrespeito a sua autonomia, integridade física ou psicológica, indo contra os seus sentimentos, desejos e opções” 66 Oliveira VJ, Penna CMM. Discussing obstetric violence through the voices of women and health professionals. Texto Contexto Enferm. 2017;26(2):e06500015. https://doi.org/10.1590/0104-07072017006500015
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ou ainda como “as diversas formas de violência ocorridas na assistência à gravidez, ao parto, ao pós-parto e ao abortamento” 77 Diniz SG, Salgado HO, Andrezzo HFA, Carvalho PGC, Carvalho PCA, Aguiar CA, Niy DY. Abuse and disrespect in childbirth care as a public health issue in Brazil: origins, definitions, impacts on maternal health, and proposals for its prevention. J Hum Growth Dev. 2015;25(3):377-84. https://doi.org/10.7322/jhgd.106080
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Torna-se importante ressaltar que a violência obstétrica se sustenta sob outros dois tipos de violência, a de gênero e a institucional. A violência de gênero fundamenta-se no tratamento calcado em uma construção histórica e social, no qual a mulher submete-se ao poder patriarcal, não podendo manifestar livremente suas vontades e preferências; e como violência institucional, aquela que é praticada contra a mulher, por negligência ou falha, em instituições públicas ou privadas por profissionais que deveriam prover o cuidado, bem como prevenir e/ou reparar danos, e não os promover 88 Marrero L, Brüggemann OM. Institutional violence during the parturition process in Brazil: integrative review. Rev Bras Enferm. 2018;71(3):1152-61. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0238
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-99 Chai CG, Santos JP, Chaves DG. [Institutional violence against women: the judiciary power, from pretenso protector to agressor effective]. Rev Eletrôn Direito UFSM. 2018;13(2):640-65. https://doi.org/10.5902/1981369429538 Portuguese
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Nesse contexto paradoxal gerado pelo confronto entre assistência obstétrica e políticas públicas, a reflexão acerca da formação de profissionais de saúde envolvidos com o cuidado à saúde mulher, torna-se de grande importância, sobretudo nos Hospitais de Ensino (HE), nos quais a formação ajuda a compreender o universo do cenário de prática, associando as bases curriculares dos cursos da área da saúde, das instituição de ensino superior pública, privada ou formalmente conveniadas 1010 Araújo KM, Leta J. Federal university hospitals and their institutional missions in the past and present. Hist Cienc Saude-Manguinhos. 2014;21(4):1261-81. https://doi.org/10.1590/S0104-59702014005000022
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-1111 Nogueira DL, Lira GV, Albuquerque IMN, Linhares MSC. Evaluation of Brazil’s Teaching Hospitals: a systematic review. Rev Bras Educ Med. 2015;39(1):151-8. https://doi.org/10.1590/1981-52712015v39n1e00772014
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Diante de tal discussão pertinente à equipe de saúde, vale destacar o papel da(o) enfermeira(o) obstétrica(o) que, segundo as evidências científica atuais, associa-se à redução do número de intervenções desnecessárias durante o cuidado prestado no trabalho de parto e parto, além da recepção do recém-nascido e à percepção por parte dessa mulher de uma vivência positiva do processo parturitivo 1212 Andrade LO, Felix ESP, Souza FS, Gomes LOS, Boerys RNSO. Práticas dos profissionais de enfermagem diante do parto humanizado. Rev Enferm UFPE.2017;11(Supl. 6):2576-85. https://doi.org/10.5205/reuol.9799-86079-1-RV.1106sup201712
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OBJETIVO

Descrever a atenção obstétrica desenvolvida em hospitais de ensino (HE) destinados à gestação de alto risco em Maceió, estado de Alagoas (AL).

MÉTODOS

Aspectos éticos

Em observância à legislação que regulamenta a realização de pesquisas científicas envolvendo seres humanos, após obtenção das autorizações institucionais dos HEs, o projeto desta pesquisa foi encaminhado para apreciação a um Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas mediante a Plataforma Brasil, a fim de confirmar o respeito aos princípios éticos, tendo sido aprovado. Nos casos de aceitação de participação na pesquisa, realizou-se a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelas participantes ou por seus pais/responsáveis e, no caso de participantes menores de 18 anos, a assinatura do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE), buscando garantir o entendimento das informações e proporcionar o respeito à autonomia da mulher. A documentação foi então assinada em duas vias, permanecendo uma delas com a participante/responsável e outra com a pesquisadora.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo epidemiológico observacional caracterizado como coorte e realizado em dois Hospitais de Ensino da cidade de Maceió, estado de Alagoas, destinados ao atendimento de gestantes de alto risco, identificados nesta pesquisa como HE-A e HE-B. A coleta das informações, desenvolveu-se entre os meses de junho e novembro de 2018. Para nortear a metodologia da pesquisa, utilizou-se o roteiro STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology) da Equator Network, adequado para estudos de coorte.

População, critérios de inclusão e exclusão

Foram entrevistadas, 291 mulheres que receberam assistência relacionada ao parto vaginal, cesárea (anteparto ou intraparto) ou ao processo de abortamento nos hospitais selecionados como cenário desta pesquisa. Para tanto, adotaram-se como critérios de inclusão: mulheres em qualquer faixa etária, que concordaram em participar da pesquisa e em condições físicas e/ou emocionais para responder as perguntas do instrumento de coleta de dados. Foram excluídas da amostra as mulheres menores de 18 anos desacompanhadas de seus pais ou responsáveis, devido à inviabilidade da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); e, ainda, mulheres que vivenciaram o parto decorrente de morte fetal intrauterina (fetos com mais de 20 semanas).

Para estabelecimento da amostra, foram adotados, por referência, os dados pertinentes à demanda obstétrica, durante o ano de 2017, nos HEs selecionados como unidades de coleta de dados desta pesquisa. Esses dados referem-se à modalidade de internação conforme o Capítulo XV (gestação, parto e puerpério) da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10) e estão disponíveis no sistema de informação do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Para estabelecimento da amostra, utilizou a calculadora estatística StatCalc, com adoção dos seguintes parâmetros: frequência esperada do evento de 25% com base no estudo Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado 1313 Sena LM, Tesser CD. Obstetric violence in Brazil and cyberactivism of mothers: report of two experiences. Interface Comun Saúde Educ. 2017;21(60):209-20. https://doi.org/10.1590/1807-57622015.0896
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, margem de erro de 10% e grau de confiança de 90%.

Protocolo do estudo

A coleta das informações, ocorrida entre os meses de junho e novembro de 2018, deu-se por meio de um formulário desenvolvido nas versões on-line e impressa, que permitiu tanto a caracterização sociodemográfica e obstétrica das entrevistadas quanto a análise da assistência fornecida a essas mulheres e sua relação com a violência obstétrica. Tal formulário foi aplicado por estudantes de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas, selecionados e treinados ao longo de um projeto de extensão da escola de enfermagem, proporcionando a interação entre a graduação e a pós-graduação.

A fim de formalizar os resultados deste estudo e compará-los aos de outras publicações científicas sobre o tema, definiu-se como variável dependente a violência obstétrica e como variáveis independentes características socioeconômicas e obstétricas das participantes, tais como: idade, município de residência, raça/cor, estado civil, escolaridade, ocupação, paridade/passado obstétrico e aspectos relacionados à gestação atual.

Nesse sentido, para caracterizar a violência obstétrica, considerou-se, nesta pesquisa, além das definições trazidas anteriormente, sua relação com as recomendações obstétricas propostas pela OMS por meio do documento intitulado Intrapartum care for a positive childbirth experience, publicado no ano de 201844 World Health Organization (WHO). WHO recommendations: intrapartum care for a positive childbirth experience. Geneva: WHO [Internet]. 2018 [cited 2019 Apr 12]. Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789241550215
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Análise dos resultados e estatística

Dando seguimento à etapa de coleta, os dados produzidos por meio dos formulários foram inseridos em uma planilha do Programa Excel (Pacote Office 2016) e, posteriormente, tabulados e analisados à luz da estatística descritiva e analítica com o auxílio do software Epi Info (versão 7.2.0.1), sendo os elementos gráficos produzidos no Excel. Para a comparação de médias e proporções, foram utilizados, respectivamente, a Análise de Variância (ANOVA) e o qui-quadrado (χ2). Foi usada como medida de risco o Risco Relativo (RR) e, em todas as análises, considerado como ponto de corte o nível de significância de α igual a 0,05.

RESULTADOS

No decorrer do estudo, foram entrevistadas mulheres entre 13 e 49 anos. Prevaleceram aquelas na faixa etária de 18 anos ou mais; residentes na capital do estado de Alagoas; de raça parda; em união estável; com escolaridade entre 10 e 12 anos de estudo e pertencentes à população não economicamente ativa. A renda familiar das mulheres entrevistadas variou de 0 a 7 salários mínimos, apresentando média de R$ 1.141,50 e diferença estatisticamente significante em comparação com as mulheres submetidas à cesariana (p = 0,0361), que apresentaram renda superior às demais.

A caracterização da vivência obstétrica no período de internação hospitalar demonstra que 69,8% das mulheres entrevistadas foram submetidas à cesárea, sobretudo antes do trabalho de parto; seguidas daquelas que vivenciaram o parto vaginal (29,5%) e das que estavam internadas em razão da assistência ao processo de abortamento (0,7%).

Quanto à paridade, houve o predomínio de mulheres na vivência da primeira gestação (38,5%); sem experiência de partos vaginais (51,5%); que se submeterem apenas a uma cesárea em suas vidas (45,7%) e que nunca vivenciaram o aborto (78%). Quando questionadas sobre a gestação atual, 55,7% das puérperas informaram que não houve planejamento para concepção. Apesar desse dado, 98,6% das entrevistadas receberam assistência pré-natal. Sob o ponto de vista da estatística analítica, houve associação de relevância significante entre a média de gestações e as mulheres sem escolaridade (p = 0,0000), viúvas (p = 0,0177), entre 40 e 49 anos (p = 0,0000) e sem planejamento da gestação atual (p = 0,0299), o que pode retratar a vulnerabilidade social dessa população em específico.

Observou-se que 67,6% das mulheres realizaram o pré-natal apenas na Atenção Básica, tendo participado de seis consultas ou mais e iniciado o acompanhamento até a 12ª semana de gestação. Com relação as orientações realizadas pelos profissionais de saúde que desenvolveram o cuidado pré-natal, 47,7% das mulheres verbalizaram não ter recebido informações acerca da maternidade de referência para assistência ao parto ou a intercorrências e 63,8% disseram não ter sido orientadas quanto à fisiologia do processo parturitivo, tão pouco sobre a assistência obstétrica.

A análise do modelo de atenção obstétrica recebida pelas mulheres nos HEs constatou que todas as entrevistadas referiram, no mínimo, uma situação de violência, dentre elas: não se sentir à vontade para expor queixas ou dúvidas; ter mãos, braços ou pernas amarrados; não conseguir compreender as informações que recebeu; não sentir-se segura diante do cuidado recebido; não receber informações acerca do cuidado desenvolvido pelos profissionais de saúde; não sentir-se acolhida e/ou apoiada; acreditar que não houve respeito à sua privacidade; vivenciar procedimentos não consentidos; permanecer sem acompanhantes de sua escolha; receber gritos durante a assistência; e ser solicitada a parar de chorar ou gritar.

Ao realizar a comparação do modelo de atenção obstétrica desenvolvido nos Hospitais de Ensino A e B, pode-se inferir que houve significância estatística apenas quanto ao fornecimento de informações (p = 0,0294) e à sensação de segurança diante da assistência (p = 0,0027), ambas com baixa força de associação em razão dos valores de RR e IC. Dessa forma, constata-se que os desfechos são praticados sem diferença significante no que diz respeito ao local da internação.

Com relação às mulheres que receberem assistência ao parto vaginal, observou-se que, durante o trabalho de parto, 68,6% não se alimentaram; 30,2% não ingeriram líquidos; 40,7% receberam ocitocina sintética por meio de acesso venoso; a 37,2%, não foram ministrados Métodos Não Farmacológicos para o Alívio da Dor (MNFAD); 33,7% foram submetidas a toques vaginais consecutivos por pessoas distintas; 27,9% foram submetidas à amniotomia; 10,5% não tiveram liberdade para deambular e/ou mudar de posição; 2,3% foram submetidas à tricotomia; e 2,3% foram submetidas à lavagem gástrica Tabela 1.

Além das mulheres que vivenciaram o parto vaginal, mulheres submetidas à cesárea intraparto também usufruíram do trabalho de parto. Nesses casos: a 79% não foram fornecidos MNFAD; 77,4% das entrevistadas não se alimentaram nesse período; 69,4% não ingeriram líquidos; 38,7% não tiveram liberdade para deambular e/ou mudar de posição; 29% foram submetidas à amniotomia e 29% a toques vaginais consecutivos por pessoas distintas; 17,7% receberam ocitocina sintética por acesso venoso; 12,9% foram submetidas à tricotomia; e 8,1% passaram por lavagem gástrica Tabela 1.

Tabela 1
Análise estatística das variáveis pertinentes ao trabalho de parto em relação ao tipo de parto, Maceió, Alagoas, Brasil, 2018

Ao realizar a análise estatística dos desfechos descritos em comparação com o tipo de parto, viu-se que há diferença estatisticamente significante entre as mulheres que vivenciaram o parto vaginal e mulheres que passaram por cesárea (ambos antecedidos pelo trabalho de parto) no que se refere à ingestão de líquidos (p = 0,0000), deambulação e liberdade de posição (p = 0,0000), fornecimento de MNFAD (p = 0,0000) e administração de ocitocina sintética (p = 0,0029). Ainda, para mulheres que vivenciaram o parto vaginal, o risco de não ingerir líquidos (RR = 0,43), de não deambular e mudar de posição livremente (RR = 0,68), de não utilizar MNFAD (RR = 0,33) e de receber ocitocina sintética (RR = 0,43) é menor do que nas que foram submetidas à cesárea Tabela 1.

Quanto à assistência ao período expulsivo (parto vaginal), 91,9% das mulheres pariram em posições não supinas, principalmente em posição litotômica/ginecológica (53,2%) e semissentada (45,6%), além de terem recebido indução de puxos (72,1%). Houve ainda, em menor número, entrevistadas que foram submetidas à episiotomia (15,1%) e à Manobra de Kristeller (5,8%). Ao realizar a análise estatística desses dados em comparação com o período de início e com o número de consultas do pré-natal, não houve diferença estatisticamente significante entre a realização das intervenções supracitadas e as características do pré-natal. Isso pode sugerir que um pré-natal iniciado no primeiro trimestre e com seis consultas ou mais não garante informações suficientes para a prevenção de práticas desnecessárias durante a assistência obstétrica no tocante ao empoderamento da mulher.

Uma vez conduzidas à cesárea (anteparto ou intraparto), 4,3% das mulheres não receberam informações acerca dos motivos que justificaram a realização da cirurgia. Dentre as que foram informadas, sinais e/ou sintomas relacionados às síndromes hipertensivas específicas da gestação foram usados como argumento para a submissão à cesariana em pouco menos da metade dos casos.

Quanto à assistência recebida por mulheres e recém-nascidos no pós-parto (partos vaginais e cesáreas), em 56,4% das assistências não houve estímulo ao aleitamento na primeira hora de vida do recém-nascido; 47,8% dos binômios não estabeleceram contato pele a pele; em 39,8%, não houve clampeamento tardio de cordão umbilical; em 38,8%, a mulher não pôde permanecer com seu filho; e, em 33,6%, os recém-nascidos foram conduzidos à Unidade de Terapia Intensiva (UTI) ou Unidade de Cuidados Intermediários (UCI) após o nascimento Tabela 2.

Tabela 2
Análise estatística das variáveis pertinentes ao pós-parto em relação ao tipo de parto, Maceió, Alagoas, Brasil, 2018

No que se refere à análise estatística, não se verificou diferença estatisticamente significante entre os recém-nascidos encaminhados à UCI ou UTI quando comparadas as vias de nascimento; no entanto, quando avaliadas sob a ótica das boas práticas neonatais, essa diferença foi significante. Os dados demonstram que, entre os binômios que vivenciaram o parto vaginal, houve menor risco de não haver clampeamento tardio de cordão (RR = 0,46), de não haver estímulo ao aleitamento materno na primeira hora de vida do recém-nascido (RR = 0,73), de não haver contato pele a pele (RR = 0,50) e de o recém-nascido não permanecer com a mãe após o nascimento (RR = 0,73) Tabela 2.

DISCUSSÃO

Durante o processo parturitivo, a mulher vivencia sentimentos como o medo de intercorrências que possam acontecer, a ansiedade pelo nascimento de seu filho e a solidão vivenciada no ambiente em que se encontra 1414 Rodrigues FAC, Lira SVG, Magalhães PH, Freitas ALV, Mitros MS, Almeida PC. Violence obstetric in the parturition process in maternities linked to the Stork Network. Reprod Clim . 2017;32(2):78-84. https://doi.org/10.1016/j.recli.2016.12.001
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. Dessa forma, a fim de garantir uma experiência acolhedora, ela deve ser informada acerca dos procedimentos envolvidos na assistência obstétrica de maneira clara, de modo a compreender o que está sendo dito e se sentir segura diante do contexto no qual está inserida.

Além do não fornecimento de informações, a apreciação de outros aspectos relacionados diretamente à assistência recebida nos HEs demostra algumas situações caracterizadas como violência obstétrica, na medida em que desrespeitam orientações de cunho científico para a garantia da qualidade do cuidado, tais como: a impossibilidade da presença do acompanhante escolhido pela parturiente, a realização de procedimentos sem a permissão da mulher, a comunicação de profissionais de saúde por meio de gritos e a falta de acolhimento durante a vivência hospitalar.

No que se refere à ausência de acompanhante da escolha da mulher, sabe-se que, desde 2005, a Lei nº 11.108 garante à parturiente a presença de acompanhante (indicado por ela) durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato no âmbito do SUS 1515 Souza SRRK, Gualda DMR. The experience of women and their coaches with childbirth in a public maternity hospital. Texto Contexto Enferm. 2016;25(1):e4080014. https://doi.org/10.1590/0104-0707201600004080014
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. Não garantir esse acesso relaciona-se ao não fornecimento de informação à mulher acerca de seu direito, bem como à violência institucional, uma vez que o serviço veta o que é estabelecido por lei.

Os benefícios da participação de um acompanhante do convívio da mulher durante o processo de parto e nascimento têm sido amplamente apontados em literaturas nacionais e internacionais, dentre os quais, estão: a maior satisfação global da mulher com a experiência do processo de parto (promoção de conforto e segurança), a redução do uso de fármacos para o alívio da dor e a redução no índice de intervenções como cesárea e episiotomia, além de melhores índices de Apgar para bebês ao nascimento 1515 Souza SRRK, Gualda DMR. The experience of women and their coaches with childbirth in a public maternity hospital. Texto Contexto Enferm. 2016;25(1):e4080014. https://doi.org/10.1590/0104-0707201600004080014
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Como cuidado respeitoso em obstetrícia, entende-se aquele organizado para/fornecido a todas as mulheres, de maneira a preservar sua dignidade, privacidade e confidencialidade, bem como livrá-la de maus tratos, de modo a permitir a escolha informada, além do acolhimento/apoio durante o trabalho de parto e parto 1616 Pereira SB, Diaz CMG, Backes MTS, Ferreira CLL, Backes DS. Good practices of labor and birth care from the perspective of health professionals. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 3):1313-9. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0661
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. Em oposição a essa recomendação, durante a realização do estudo houve o relato de mulheres que não se sentiram seguras diante da assistência recebida nem acolhidas pelos profissionais de saúde da instituição hospitalar na qual estavam internadas.

Vale ressaltar que a questão do acolhimento em saúde é algo que vem sendo discutido há bastante tempo por meio de políticas públicas relevantes, nas quais se defende que esta é uma atitude capaz de construir relações de confiança, compromisso e vínculo entre os trabalhadores de saúde e os usuários 1717 Martins CP, Luzio CA. HumanizaSUS policy: anchoring a ship in space. Interface (Botucatu). 2017;21(60):13-22. https://doi.org/10.1590/1807-57622015.0614
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. Um aspecto positivo observado refere-se ao fato de que, entre as mulheres que se sentiram acolhidas e apoiadas durante a internação, em mais da metade dos casos o profissional de saúde pertencia à equipe de enfermagem.

Em consonância com esse dado, estudo realizado em uma unidade de Pré-parto/Parto/Pós-parto (PPP) de um hospital de ensino do Mato Grosso1818 Ruschi GEC, Zandonade E, Miranda AE, Antônio FF. Determinantes da qualidade do pré-natal na Atenção Básica: o papel do Apoio Matricial em Saúde da Mulher. Cad Saúde Colet. 2018;26(2):131-9. https://doi.org/10.1590/1414-462x201800020229
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, entre os anos de 2014 e 2016, com o objetivo de analisar o cuidado prestado após a inserção de enfermeiras obstétricas, viu-se que a prática dessas profissionais está associada aos princípios da humanização do parto e nascimento, promovendo a valorização/qualificação de seu processo de trabalho.

Na busca pela mudança do modelo obstétrico atual e consequente qualificação da assistência ao processo parturitivo, destaca-se o papel da enfermagem obstétrica. Segundo Reis et al., “A formação da enfermeira obstétrica envolve habilidades e competências que possibilitam a prestação de um cuidado integral, respeitando o parto como um processo fisiológico, repercutindo positivamente na saúde materno-infantil” 1919 Reis TR, Zamberlan C, Quadros JS, Grasel JT, Moro ASS. Obstetric Nurses: contributions to the objectives of the Millennium Development Goals. Rev Gaúcha Enferm. 2015;36(esp):94-101. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2015.esp.57393
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, o que transmite às mulheres segurança e conforto; resgata, assim, sua autoconfiança; e fortalece a sua capacidade de parir.

Nesse sentido, enquadrada na definição de parteira segundo a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS), a enfermeira obstétrica possui como características a singularidade na prestação do cuidado, que proporciona a mulher uma assistência livre de danos, conferindo a promoção e prevenção de agravos, voltados para autocuidado, com respeito à dignidade humana e que gozam de direitos humanos plenos, empoderando-as nas escolhas, para que as tentativa de práticas culturais prejudiciais não tire seu protagonismo frente ao evento da gestação e a torne fortalecida nas escolhas de maneira que gravidez possa ser considerada como um evento normal da vida2020 Organização Panamericana de Saúde (OPAS). Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevidéu: CLAP/SMR, 2014..

No que diz respeito à assistência durante o trabalho de parto para mulheres que vivenciaram o parto vaginal ou a cesárea intraparto, observa-se o uso de práticas consideradas desnecessárias sob ótica do cuidado baseado em evidências, tais como realização de tricotomia, privação de deambulação e mudança de posição, além de toques vaginais sucessivos realizados por pessoas distintas e o não fornecimento de MNFAD, reforçando a medicalização da assistência ao parto e nascimento2121 Andrade PON, Silva JQP, Diniz CMM, Caminha MFC. Factors associated with obstetric abuse in vaginal birth care at a high-complexity maternity unit in Recife, Pernambuco. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2016;16(1):29-37. https://doi.org/10.1590/1806-93042016000100004
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.

Contrapondo-se aos dados deste estudo, pesquisas atuais recomendam que, durante o trabalho de parto, as mulheres devem ingerir líquidos e aquelas sem fatores de risco devem alimentar-se; não devem ser submetidas à tricotomia de rotina; devem ser incentivadas a deambular e adotar posturas verticais; devem ser submetidas a toques vaginais com intervalo mínimo de quatro horas; devem ter à disposição técnicas de relaxamento para o alívio da dor, de acordo com sua preferência (musicoterapia, técnica de respiração, meditação e/ou massagem); e não devem ser submetidas à amniotomia e infusão de ocitocina sintética com o objetivo de encurtar a duração do trabalho de parto2222 Gupta JK, Sood A, Hofmeyr GJ, Vogel JP. Position in the second stage of labour for women without epidural anaesthesia: review. Cochrane Database Syst Rev. 2017;5(5):CD002006. https://doi.org/10.1002/14651858CD002006.pub4
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.

Continuando nessa perspectiva, no que se refere à assistência ao parto vaginal/período expulsivo, práticas como indução de puxos, episiotomia e Manobra de Kristeller foram pontuadas pelas mulheres entrevistadas como ofertadas pelos profissionais de saúde. No entanto, sabe-se que, durante o período expulsivo, as mulheres devem ser encorajadas e apoiadas a seguir seu próprio impulso de modo a conduzir seus puxos, não devem ser submetidas à episiotomia de rotina, tão pouco à Manobra de Kristeller com a justificativa de facilitar o parto2323 Oliveira RR, Melo EC, Novaes ES, Ferracioli PLRV, Mathias TAF. Factors associated to caesarean delivery in public and private health care systems. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):733-40. https://doi.org/10.1590/s0080-623420160000600004
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.

Além da adoção de tais práticas, constatou-se também que a quase totalidade das mulheres entrevistadas pariu em posição supina (posição litotômica/ginecológica, semissentada ou lateralizada). Segundo evidências científicas, a deambulação e adoção de posições verticais durante o processo parturitivo apresentam vantagens como a redução do primeiro e segundo estágios do trabalho de parto (dilatação e expulsão); redução da necessidade de analgesia pela diminuição do estresse e da dor; redução da incidência de sofrimento fetal e promoção de melhores condições do recém-nascido; além do incentivo ao protagonismo da mulher a participar ativamente do nascimento de seu filho2222 Gupta JK, Sood A, Hofmeyr GJ, Vogel JP. Position in the second stage of labour for women without epidural anaesthesia: review. Cochrane Database Syst Rev. 2017;5(5):CD002006. https://doi.org/10.1002/14651858CD002006.pub4
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. Sendo assim, as mulheres devem ser encorajadas a movimentar-se e a adotar posições de sua preferência durante o processo parturitivo.

Ao analisar os resultados pertinentes à hospitalização no tocante à via de nascimento, observa-se que a maioria das entrevistadas foram submetidas à cesárea (anteparto ou intraparto), e isso corresponde a uma taxa de cesárea de 70,2% neste estudo. Tal dado representa um importante problema de saúde pública e caracteriza-se como violência obstétrica na medida em que acarreta riscos à população materno-infantil, visto que se apresenta muito acima do que é estipulado pela OMS, mostrando-se questionável acerca de seu caráter de emergência2323 Oliveira RR, Melo EC, Novaes ES, Ferracioli PLRV, Mathias TAF. Factors associated to caesarean delivery in public and private health care systems. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):733-40. https://doi.org/10.1590/s0080-623420160000600004
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. Além disso, configura-se como um risco para as mulheres que vivenciaram o parto vaginal a não adesão das boas práticas obstétricas e neonatais.

A situação é ainda mais alarmante porque as maternidades participantes desta pesquisa são instituições envolvidas com a formação de profissionais de saúde e deveriam preocupar-se com o processo de aprendizagem pautado em evidências científicas, conduzindo para cirurgia apenas mulheres com reais indicações. Desconstruir a compreensão de que o corpo da mulher é imperfeito (base da medicalização da assistência) e de que o conhecimento provém da repetição da técnica são atitudes que podem contribuir para reflexão voltada para diminuição da taxa de cesárea.

Outra questão importante diz respeito ao fato de que, no estudo, houve mulheres que não foram informadas sobre os motivos pelos quais foram conduzidas à cirurgia, indo totalmente de encontro aos princípios da humanização da assistência, pois comunicar ao ser cuidado os procedimentos realizados em seu corpo deveria ser a primeira atividade desempenhada pelo profissional de saúde, antes mesmo de desenvolver a técnica a que se propõe.

Quanto à análise dos dados relacionados à assistência ao binômio no período pós-parto, observou-se que a adesão a cuidados como o contato pele a pele, clampeamento tardio de cordão e estímulo ao aleitamento materno na primeira hora de vida encontra-se comprometida visto que, apesar de tais cuidados serem comprovadamente benéficos, não são amplamente praticados, mesmo nos casos em que os bebês não são encaminhados à UCI/UTI, indo ao encontro do estudo Nascer no Brasil, o qual apresentou percentuais aproximados para não adesão de tais práticas na Região Nordeste2424 Moreira MEL, Gama SGN, Pereira APE, Silva AAM, Lansky S, Pineiro RS, et al. Clinical practices in the hospital care of healthy newborn infant in Brazil. Cad Saúde Pública. 2014;30(Suppl 1):S128-S139. https://doi.org/10.1590/0102-311X00145213
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. Desse modo, pode-se inferir a presença da violência obstétrica também sob seu aspecto neonatal, já que tal prática profissional compromete os benefícios do respeito à hora de ouro para a saúde materno-infantil.

Limitações do estudo

As limitações do estudo foram referentes à abordagem do tema, pois, por se tratar de uma temática em torno da qual já existe um constrangimento, algumas participantes tiveram receio em responder o formulário de entrevista, de modo que não quiseram participar do estudo por medo. Esse episódio fez com a pesquisa tivesse seu prazo alterado, dificultando a conclusão do estudo.

Contribuições para a área da Enfermagem, Saúde ou Política Pública

O presente estudo torna-se relevante em face da comprovação científica, em publicações nacionais e internacionais atuais, da existência de uma modalidade de violência atrelada à qualidade insatisfatória da assistência obstétrica. Isso porque este trabalho busca caracterizar o modelo de atenção desenvolvido em instituições destinadas à formação de profissionais de saúde, promovendo a reflexão acerca do processo de aprendizagem em tais cenários. Nesse sentido, as informações produzidas poderão fornecer subsídios para proporcionar o planejamento de estratégias comprometidas com a atenção obstétrica, visando contribuir com a assistência em consonância com os princípios norteadores do Sistema Único de Saúde (SUS).

CONCLUSÃO

Diante do que foi discutido, identificar que todas as mulheres entrevistadas sofreram ao menos uma modalidade de violência obstétrica requer atenção por parte daqueles que se propõem a cuidar. Dessa forma, torna-se necessário um olhar direcionado a otimizar a formação profissional nesses HEs, tanto no que se refere aos novos profissionais de saúde quanto àqueles já formandos (educação continuada), a fim de garantir o desenvolvimento do cuidado pautado na segurança por meio da consideração de evidências científicas e do protagonismo da mulher e recém-nascido (individualidade e integralidade), desconstruindo modelos pautados na medicalização e patologização da gestação, destacando-se, nessa quebra de paradigma, a figura da(o) enfermeira(o) obstétrica(o) e obstetriz.

  • FOMENTO
    Esta pesquisa recebeu o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (FAPEAL).

MATERIAL SUPLEMENTAR

Oliveira LLF de. Caracterização do cuidado obstétrico em hospitais de ensino de alto risco: um estudo de coorte retrospectivo. 2019. 70 f. Dissertação (Mestrado Enfermagem) - Escola de Enfermagem e Farmácia, Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2019. Disponível em: http://www.repositorio.ufal.br/handle/riufal/5545.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Ana Fátima Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    28 Ago 2020
  • Aceito
    02 Abr 2021
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