Empreendedorismo entre estudantes de graduação em enfermagem de uma universidade pública

RESUMO

Objetivos:

identificar a tendência empreendedora de estudantes de graduação em Enfermagem de uma universidade pública.

Métodos:

estudo transversal, de abordagem quantitativa, com 135 acadêmicos de enfermagem de uma universidade pública do interior do estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Dados foram coletados por meio do formulário de caracterização socioprofissional e teste de Tendência Empreendedora Geral, tendo sido analisados mediante estatística descritiva.

Resultados:

entre as cinco tendências empreendedoras, os estudantes apresentaram resultado igual ou acima da média em duas dimensões: Impulso e determinação (82,2%) e Necessidade de sucesso (51,1%). A Tendência criativa foi a dimensão com maior percentual de participantes abaixo da média (68,9%). Porém, estudantes inseridos em grupos de pesquisa ou extensão tiveram pontuação igual ou acima da média nas cinco tendências empreendedoras.

Conclusões:

os estudantes apresentaram baixa tendência empreendedora, o que indica necessidade de uma abordagem mais ampla do tema na formação em Enfermagem.

Descritores:
Mercado de Trabalho; Empreendedorismo; Estudantes de Enfermagem; Educação em Enfermagem; Escolas de Enfermagem

ABSTRACT

Objectives:

to identify undergraduate nursing students' entrepreneurial tendency at a public university.

Methods:

cross-sectional study, with a quantitative approach, with 135 undergraduate nursing students from a public university in the interior of the state of Rio Grande do Sul, Brazil. Data were collected using a socio-professional characterization form and a General measure of Enterprising Tendency test and analyzed using descriptive statistics.

Results:

among the five entrepreneurial tendencies, students presented results equal or above average in two dimensions: Drive and Determination (82.2%) and Need for Success (51.1%). The Creative tendency was the dimension with the highest percentage of participants below the average (68.9%). However, students in research or extension groups scored equal or above average in all five entrepreneurial tendencies.

Conclusions:

students showed low entrepreneurial tendencies, indicating the need for a broader approach to the subject in nursing education.

Descriptors:
Job Market; Entrepreneurship; Students, Nursing; Education, Nursing; Schools, Nursing

RESUMEN

Objetivos:

identificar la tendencia emprendedora de estudiantes de grado en Enfermería de una universidad pública.

Métodos:

estudio transversal, de abordaje cuantitativo, con 135 académicos de enfermería de una universidad pública del interior del estado de Rio Grande do Sul, Brasil. Datos fueron recogidos por medio del formulario de caracterización socioprofesional y test de Tendencia Emprendedora General, analizados mediante estadística descriptiva.

Resultados:

entre las cinco tendencias emprendedoras, los estudiantes presentaron resultado igual o arriba de la mediana en dos dimensiones: Impulso y determinación (82,2%) y Necesidad de éxito (51,1%). La Tendencia creativa fue la dimensión con mayor porcentual de participantes abajo de la mediana (68,9%). Pero, estudiantes inseridos en equipos de investigación o extensión tuvieron puntuación igual o arriba de la mediana en las cinco tendencias emprendedoras.

Conclusiones:

los estudiantes presentaron baja tendencia emprendedora, lo que indica necesidad de un abordaje más amplio del tema en la formación en Enfermería.

Descriptores:
Mercado de Trabajo; Emprendimiento; Estudiantes de Enfermería; Educación en Enfermería; Facultades de Enfermería

INTRODUÇÃO

O empreendedorismo costuma ser associado ao ramo dos negócios, e o empreendedor é visto principalmente como o sujeito que cria uma empresa com a finalidade de fonte de renda e lucro^(1-2). Porém, em uma perspectiva mais ampla, o empreendedorismo remete ao desenvolvimento de algo novo ou ainda ao aperfeiçoamento de alguma coisa já existente, com base na identificação de necessidades ou oportunidades e proposição de soluções inovadoras. Nesse sentido, o empreendedorismo acontece, por exemplo, quando o colaborador de uma empresa desenvolve uma inovação visando ao aprimoramento do seu trabalho, o que é denominado "intraempreendedorismo". O empreendedor também pode ser aquele que atua em prol da transformação social, configurando-se o "empreendedorismo social"^(2-3).

Assim, o empreendedorismo é uma terminologia que tem sido amplamente discutida na contemporaneidade, tendo em vista o seu potencial de melhorar as relações e interações entre as pessoas bem como entre elas e o contexto em que estão inseridas^(2-3). Na área da saúde, também há um interesse crescente em inovação e empreendedorismo. Os sistemas e serviços de saúde encontram cada vez mais problemas complexos que não têm soluções óbvias e exigem novas estratégias de enfrentamento, o que aponta para a importância de fomentar a qualidade empreendedora entre os profissionais desses setores⁽⁴⁾.

Na Enfermagem, o empreendedorismo tem assumido características tanto comerciais quanto sociais, relacionadas à (re)criação de algo para gerar benefícios de mercado. Também está ligada à capacidade de promover processos e associações criativas visando à emancipação de indivíduos, famílias e comunidades. Nessa direção, o cuidado empreendedor de enfermagem é um fenômeno complexo, sistematizado por meio de múltiplas relações, interações e associações sistêmicas, com foco na promoção do viver saudável de forma integral e articulado aos demais setores da sociedade⁽⁵⁾.

O enfermeiro pode contribuir para o desenvolvimento social sustentável mediante o cuidado empreendedor, relacionado à ampliação de oportunidades e possibilidades reais de indivíduos, famílias e comunidades, constituindo-se um apelo prospectivo para o avanço da ciência de enfermagem. Assim, esse profissional desempenha um papel proativo na identificação de necessidades de cuidado da população e na promoção e proteção da saúde dos indivíduos em suas múltiplas dimensões⁽⁵⁾.

O empreendedorismo também possibilita a reconfiguração da profissão, a partir criação de inovações, novos negócios e serviços⁽⁶⁾. A atividade autônoma de assessoria e consultoria, abertura de consultórios e atendimento domiciliar são alguns exemplos de avanços já alcançadas em relação ao empreendedorismo em enfermagem. Porém, ainda há novas possibilidades para serem desenvolvidas, principalmente em relação ao desenvolvimento de tecnologias e inovações⁽¹⁾.

O empreendedorismo não é explicitamente uma competência para a formação do enfermeiro, porém as diretrizes curriculares e políticas institucionais reforçam o protagonismo desse profissional no sistema de saúde⁽⁵⁾. Nesse sentido, é importante que o ensino em enfermagem seja pautado na criatividade, inovação e empreendedorismo para atender não somente as necessidades do mercado de trabalho, como também as rápidas mudanças da área da saúde^(7-8). Ademais, o empreendedorismo pode auxiliar no desenvolvimento de habilidades relacionadas à gestão do cuidado, liderança, gestão de conflitos e inteligência emocional, cada vez mais valorizadas na formação e atuação do enfermeiro^(2-3,8-9).

Apesar disso, revisões de literatura sobre empreendedorismo na enfermagem em bases internacionais, como SciVerse Scopus (Scopus), Publisher Medline (PubMed), Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL) e Education Resource Information Center (ERIC), evidenciaram a lacuna existente na abordagem do tema na formação em Enfermagem^(2,8). A produção científica também é escassa em comparação com outras linhas de pesquisa e áreas de atuação do enfermeiro. No Brasil, por exemplo, identificaram-se dois estudos publicados em 2020 sobre a tendência empreendedora de estudantes de graduação em Enfermagem, os quais foram desenvolvidos na capital⁽⁷⁾ e interior do estado de São Paulo⁽¹⁰⁾. Ambos pontuam a importância de novas pesquisas sobre o tema a fim de ampliar as discussões sobre empreendedorismo na enfermagem, possibilitando comparações regionais e inferências científicas mais sólidas^(7,10).

Além disso, investigações sobre empreendedorismo podem contribuir para o preenchimento de lacunas no ensino de graduação visando à preparação dos futuros enfermeiros para desafios e oportunidades da prática profissional ou no próprio local de trabalho. Diante do exposto, delineou-se como questão norteadora deste estudo: Qual é a tendência empreendedora de estudantes de graduação em Enfermagem de uma universidade pública?

OBJETIVOS

Identificar a tendência empreendedora de estudantes de graduação em Enfermagem de uma universidade pública.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição de referência. A realização da pesquisa obedeceu à Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo transversal, descritivo e com abordagem quantitativa, que atende às diretrizes do STROBE para sua apresentação. Foi desenvolvido no segundo semestre de 2018, no curso de graduação em Enfermagem de uma universidade federal no interior do estado do Rio Grande do Sul, Brasil.

População ou amostra

A população de estudo englobou os 170 alunos estudantes regularmente matriculados no curso de graduação em que o estudo foi desenvolvido. O critério de inclusão utilizado foi estar regularmente matriculado no curso de graduação em Enfermagem. Foram excluídos os participantes que estivessem com o curso trancado ou ausentes em razão de falta ou atestado médico durante o período de coleta de dados. Do total de 170 estudantes abordados, 135 (79,4%) participaram da pesquisa, o que corresponde a uma amostra não probabilística por conveniência.

Protocolo do estudo

Para coleta de dados, os alunos foram abordados nos intervalos dos horários de aulas no campus da universidade. Os dados foram coletados manualmente por meio de questionários impressos e, depois, transpostos para planilhas digitais.

Foi aplicado um instrumento com três partes. A primeira continha questões sobre aspectos sociodemográficos e acadêmicos para caracterização da amostra (idade, sexo, estado civil, curso técnico de enfermagem, participação em grupo de pesquisa ou extensão, bolsa de pesquisa, bolsa de extensão e atividade remunerada).

A segunda parte do instrumento avaliou a percepção dos estudantes quanto à relação entre empreendedorismo e enfermagem, por meio de três assertivas: 1) O empreendedorismo aplica-se à enfermagem; 2) O conteúdo de empreendedorismo é importante na formação do enfermeiro; e 3) O empreendedorismo é abordado durante o curso de graduação em Enfermagem. Para cada uma, o respondente deveria indicar a sua concordância por meio de uma escala de 0 a 10.

Na terceira parte do questionário, utilizou-se o Teste de Tendência Empreendedora Geral (TEG)^(11-12), que possui 54 assertivas divididas em cinco dimensões ou características empreendedoras: Necessidade de sucesso, Necessidade de autonomia/independência, Tendência criativa, Propensão a riscos calculados e Impulso e determinação. O TEG foi desenvolvido em 1988, por Sally Caird e Cliff Johnon, da Durham University Business School, Estados Unidos. Possui foco comportamentalista e apresenta crescente utilização em pesquisas brasileiras⁽¹²⁾.

Análise dos resultados e estatística

A análise dos dados foi realizada por meio de estatística descritiva no software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0. Na segunda parte do instrumento, quanto maior o valor indicado, maior a concordância. Para fins de análises, consideraram-se as respostas de 0 a 4 como "discordo"; e 6 a 10 como "concordo". O 5 foi considerado "resposta neutra".

O TEG é composto de assertivas para as quais o respondente deve marcar "concordo" ou "discordo". Nas questões ímpares, soma-se um ponto para cada desacordo assinalado; nas perguntas pares, soma-se um ponto para a concordância indicada. Assim, soma-se a pontuação de cada pergunta e tem-se o total de cada dimensão. Para a dimensão Necessidade de realização, a pontuação máxima do TEG é 12, e a pontuação média é 9. Na dimensão Necessidade de autonomia/independência, a pontuação máxima é 6, e a média é 4. Para as demais dimensões, a pontuação máxima é 12, e a média é 8. Portanto, a tendência empreendedora aumenta quanto maior a pontuação média em cada dimensão⁽¹¹⁾.

RESULTADOS

Os 135 estudantes que participaram da pesquisa tinham idade média de 22,2 (±5,9) anos, e a maioria era do sexo feminino (90,4%). Quanto ao ano, identificou-se uma distribuição homogênea dos estudantes entre os quatro anos de formação. A maioria não referiu participação em grupo de pesquisa ou extensão (66,7%) nem desenvolvimento de atividade profissional remunerada (88,9%) (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização socioprofissional dos participantes da pesquisa, Palmeira das Missões, Rio Grande do Sul, Brasil, 2018

Variável	n (%)
Idade (n = 111)
até 20 anos	72 (53,3)
21-22 anos	32 (23,7)
23-24 anos	6 (4,4)
25 anos ou mais	25 (18,5)
Sexo
Masculino	13 (9,6)
Feminino	122 (90,4)
Formação como técnico em enfermagem
Sim	18 (13,3)
Não	117 (86,7)
Participação em grupo de pesquisa ou extensão
Sim	45 (33,3)
Não	90 (66,7)
Ano do curso
1°	24 (21,6)
2°	33 (29,7)
3°	26 (23,4)
4°	28 (25,2)
Atividade profissional remunerada
Sim	15 (11,1)
Não	120 (88,9)

Quanto à relação entre empreendedorismo e enfermagem, os estudantes consideraram majoritariamente que o tema é aplicável (83,7%) e importante para a profissão (92,59%). Porém, a maioria percebe uma abordagem limitada da temática na graduação em Enfermagem (62,2%) (Tabela 2).

Tabela 2
Relação entre empreendedorismo e enfermagem, Palmeira das Missões, Rio Grande do Sul, Brasil, 2018

Questão	Discordo		Neutro		Concordo
	n	%	n	%	n	%
O conteúdo de empreendedorismo é aplicável à enfermagem.	5	3,7	17	12,5	113	83,7
O conteúdo de empreendedorismo é importante para a formação do enfermeiro.	5	3,7	5	3,7	125	92,5
O empreendedorismo é abordado durante o curso de graduação em Enfermagem.	84	62,2	17	12,5	34	25,1

Na análise da tendência empreendedora, os estudantes apresentaram resultado igual ou acima da média em duas dimensões: Impulso e determinação; e Necessidade de sucesso. A Tendência criativa foi a dimensão com maior percentual de participantes abaixo da média (Tabela 3).

Tabela 3
Distribuição dos participantes conforme a pontuação nas cinco tendências empreendedoras gerais, Palmeira das Missões, Rio Grande do Sul, Brasil, 2018

Tendências empreendedoras gerais	Abaixo da média		Igual ou acima da média
	n	%	n	%
Necessidade de sucesso	65	48,5	69	51,5
Necessidade de autonomia	84	62,2	51	37,8
Tendência criativa	93	69,4	41	30,6
Propensão a riscos	87	64,4	48	35,6
Impulso e determinação	24	17,8	111	82,2

A distribuição dos participantes conforme variáveis de caracterização socioprofissional e pontuação igual ou acima da média nas cinco tendências empreendedoras gerais está apresentada na Tabela 4. Apenas os participantes inseridos em grupos de pesquisa ou extensão tiveram pontuação igual ou acima da média nas cinco tendências empreendedoras.

Tabela 4
Distribuição dos participantes conforme variáveis de caracterização socioprofissional e pontuação igual ou acima da média nas cinco tendências empreendedoras gerais, Palmeira das Missões, Rio Grande do Sul, Brasil, 2018

Variáveis	Necessidade de sucesso		Necessidade de autonomia		Tendência criativa		Propensão a riscos		Impulso e determinação
	n	%	n	%	n	%	n	%	n	%
Idade
até 20 anos	28	38,9	25	34,7	19	26,4	23	31,9	56	77,8
21-22 anos	19	59,4	11	34,4	11	34,4	12	37,5	26	81,2
23-24 anos	5	83,3	4	66,7	1	16,7	2	33,3	6	100
25 anos ou mais	17	70,8	11	44,0	10	41,7	11	44	23	92
Sexo
Feminino	63	52,1	45	36,9	38	31,4	41	33,6	103	84
Masculino	6	46,2	6	46,2	3	23,1	7	53,8	8	61,5
Ano do curso
1°	11	37,9	11	37,9	9	32,1	7	24,1	24	82,8
2°	19	42,2	15	32,6	14	30,4	17	37	33	71,7
3°	19	63,3	11	36,7	8	26,7	10	33,3	26	86,7
4°	20	66,7	14	46,7	10	33,3	14	46,7	28	93,3
Formação como técnico em enfermagem
Sim	11	61,1	6	33,3	7	41,2	8	44,4	17	94,4
Não	58	50,0	45	38,5	34	29,1	40	34,2	94	80,3
Participação em grupo de pesquisa ou extensão
Sim	28	63,6	24	53,3	23	51,1	23	51,1	41	91,1
Não	41	45,6	27	30,0	18	20,2	25	27,8	70	77,8
Atividade profissional remunerada
Sim	8	57,1	6	40,0	5	35,7	5	33,3	12	80
Não	61	50,8	45	37,5	36	30	43	35,8	99	82,5

DISCUSSÃO

Quanto à caraterização socioprofissional, os resultados apresentados são similares aos achados de estudos anteriores com estudantes de Enfermagem^(7,10). Em comparação com o perfil dos estudantes da modalidade de educação presencial do Exame Nacional de Estudantes da área de Enfermagem, os participantes deste estudo são mais jovens do que a média nacional. O percentual de estudantes que exerciam atividade remunerada e tinham formação profissionalizante de nível médio também foi menor em relação aos dados nacionais⁽¹³⁾.

Considerando as diretrizes de interpretação do TEG e a frequência com que os participantes atingiram ou superaram a média de pontuação nas dimensões, pode-se dizer que a tendência empreendedora é baixa entre os participantes. Entretanto, quando questionados sobre a aplicabilidade e a importância do empreendedorismo na enfermagem, os dados sugerem interesse, indicando que estão abertos ao tema.

A baixa tendência empreendedora dos estudantes indica que o tema ainda é pouco abordado nos cursos de graduação, como apontado pela maioria dos participantes deste estudo. A educação empreendedora tem potencial para estimular a intenção dos enfermeiros de empreender^(2,4,8). Porém, a temática ainda não é abordada em muitas instituições de ensino, sendo necessária a revisão e o aprimoramento de currículos e conteúdos visando à incorporação de uma cultura empreendedora no ensino de enfermagem^(1,4).

O incentivo ao empreendedorismo do enfermeiro é fundamental para a profissão, pois possibilita a visualização de novas perspectivas de atuação, seja pela inovação no contexto de serviços e organização de saúde, seja pela atuação autônoma⁽²⁾. Nesse sentido, estudo indica que profissões mais recentes, como a Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional, têm-se destacado em relação à Enfermagem quanto ao número de profissionais atuando de forma autônoma no mercado de trabalho⁽¹⁴⁾.

Na Tabela 3, constatou-se que Necessidade de autonomia, Tendência criativa e Propensão a riscos foram as dimensões em que os participantes apresentam pontuação abaixo da média, enquanto nas dimensões Necessidade de sucesso e Impulso e determinação, a pontuação está acima. Essas duas dimensões também obtiveram os melhores resultados como características empreendedoras de estudantes de Enfermagem de São Paulo, Brasil⁽⁷⁾. Assim, pode-se considerar que os estudantes de Enfermagem demonstram determinação e comprometimento com seu processo de formação, bem como motivação na busca por sucesso e realização profissional.

Resultados semelhantes em relação ao TEG foram observados ainda em estudo com residentes de enfermagem, o que sugere o desejo de colocar-se profissionalmente e a disposição para trabalhar duro, se necessário, porém em vias tradicionais de carreira, como a assistência de enfermagem, na condição de empregados do setor privado ou do Estado⁽¹⁵⁾. De forma similar, pesquisa sobre as pretensões para o futuro profissional de estudantes de Enfermagem do Brasil e Chile após a graduação identificou a continuidade dos estudos (65%) e atuação em hospitais públicos (51,6%) como prioridades. Somente cerca de 6% referiu interesse no empreendedorismo, por meio da abertura de negócio próprio⁽¹⁰⁾.

A Tendência criativa foi a dimensão com maior percentual de participantes abaixo da média. Esse domínio pode ser definido como a tendência de ser imaginativo, inovador, curioso e versátil. A medida tem a intenção de acessar a avaliação subjetiva dos respondentes em relação a esses critérios. Baixos escores sugerem preferência por estabilidade, orientação prática e preferência por implementar ideias alheias⁽¹¹⁾.

Para mudar esse panorama, é importante considerar que o ensino do empreendedorismo apenas por meio disciplinas relacionadas ao conhecimento e exploração do tema per se é insuficiente, tendo em vista que a tendência empreendedora, mais do que conhecimento, elucida características, crenças e atitudes⁽¹⁶⁾. Uma estratégia que pode ser explorada para uma aprendizagem experiencial é a simulação, que permite ao aluno vivenciar experiências orientadas por professores com base em aspectos e situações reais relacionados à área da saúde, conforme a aprendizagem esperada em seu percurso educacional⁽¹⁷⁾.

No contexto internacional, a abordagem de conteúdos teóricos e práticos sobre empreendedorismo na grade curricular de um curso de Enfermagem da Coreia do Sul inclui realização de palestras com enfermeiros empreendedores e desenvolvimento de programas de estágio em clínicas e/ou junto a profissionais autônomos. Os pesquisadores também ressaltam a importância de cursos complementares sobre marketing, liderança e contabilidade financeira⁽¹⁸⁾.

Outro exemplo é um programa voltado à inovação nos cuidados de saúde criado por uma escola de enfermagem norte-americana. A principal estratégia adotada é a elaboração de um plano de negócio ou inovação, em que o estudante descreve uma necessidade clínica da inovação, o mercadoalvo, usuários finais e/ou compradores da inovação, concorrência no mercado e estratégia de implementação. Assim, é possível fomentar conhecimentos, habilidades e atitudes dos futuros enfermeiros voltadas à identificação e resolução de problemas para o atendimento das necessidades de cuidados de saúde de pacientes⁽¹⁹⁾.

Fora da área da enfermagem, estudo chinês também apontou o efeito da educação para o empreendedorismo no contexto do ensino superior. Quanto mais formação para o empreendedorismo os estudantes universitários têm em faculdades e universidades, mais forte é sua intenção empreendedora, principalmente entre alunos das áreas de economia e gestão⁽²⁰⁾.

Os dados da Tabela 4 destacam as dimensões e características dos participantes com pontuação igual ou acima da média e permitem uma análise de características individuais ou contextuais que poderiam afetar o desenvolvimento das dimensões. Observou-se que, nas dimensões Necessidade de autonomia e Propensão a riscos, o sexo masculino tem pontuação igual ou acima da média com maior frequência, enquanto o sexo feminino tem pontuação igual ou acima da média com maior frequência nas dimensões Necessidade de sucesso e Impulso e determinação.

A dimensão Necessidade de autonomia/independência é definida como a necessidade de dizer e fazer o que se prefere, independentemente das expectativas alheias. Baixos escores sugerem dependência, crença de que o sucesso depende do destino, da sorte ou de oportunidades dadas por outros, em suma, uma visão de mundo controlada por fatores externos ao indivíduo. A dimensão Propensão ao risco é definida pela capacidade de lidar com informações incompletas e agir de acordo com uma opção arriscada. Pontuações baixas sugerem deliberação mais lenta, cautela na tomada de decisão e preferência por ambientes com incerteza reduzida⁽¹¹⁾.

Sendo a enfermagem uma profissão majoritariamente feminina e identificando-se desde o ano 2000 crescimento em estudos sobre empreendedorismo com recorte de gênero⁽²¹⁾, é pertinente aprofundar a investigação desses aspectos investindo em desenhos pedagógicos que permitam a exploração das fortalezas e pontos de melhoria dos estudantes em diversos aspectos. Tal afirmação encontra suporte, por exemplo, em estudo realizado em Portugal no qual se argumenta que, apesar de um aumento progressivo de jovens mulheres em pós-graduações em praticamente todas as áreas científicas, elas tendem a escolher áreas de negócio ou autoemprego em serviços de baixo valor. Ou seja, mesmo apresentando maiores qualificações que os homens, as mulheres ainda não se arriscam com frequência no mercado de trabalho⁽²²⁾.

Quanto à Tendência criativa, obteve-se pontuação maior ou acima da média em estudantes mais velhos, nos anos mais avançados do curso e naquele que possuem formação de nível médio em Enfermagem. Isso sugere que a experiência pode ampliar a tendência empreendedora do indivíduo, pois a vivência de atividades empreendedoras, imprevistos que surgem no caminho, avanços e fracassos formam o que se chama de "aprender fazendo", na prática⁽³⁾. Ratificando isso, estudo com professores de enfermagem de uma universidade pública identificou tendência empreendedora de média a alta, o que pode reforçar o ponto de que experiências e idade são capazes de exercer influência na disposição para o empreendedorismo⁽²³⁾.

Um resultado interessante do presente estudo foi que estudantes inseridos em grupos de pesquisa ou extensão alcançaram pontuação igual ou acima da média nas cinco tendências empreendedoras analisadas. Embora essa relação seja pouco explorada na literatura, estudo norteamericano destacou a importância da participação em projetos de pesquisa durante a graduação em Enfermagem para a formação dos enfermeiros. Os autores evidenciaram que as atividades científicas contribuíram para o desenvolvimento de habilidades de comunicação, autoconfiança e tomada de decisão. Também fomentaram questionamentos sobre o status quo dos ambientes clínicos de prática profissional⁽²⁴⁾. Desse modo, é possível considerar que a participação em grupos de pesquisa ou extensão contribui positivamente para o desenvolvimento de características empreendedoras.

Limitações do estudo

O estudo realizado apresentou limitações quanto ao tamanho da amostra e ao contexto do estudo, circunscrito a um único local de coleta de dados. Em que pesem as potencialidades do Teste de Tendência Empreendedora Geral, também é preciso ponderar que, originalmente, o instrumento não tem como foco estudantes ou profissionais de enfermagem, o que pode limitar a mensuração de especificidades relacionadas à prática do empreendedorismo na profissão.

Contribuições para a área da Enfermagem

Este estudo destaca a necessidade da abordagem de conteúdos sobre empreendedorismo na formação em enfermagem, a fim de contribuir com o desenvolvimento e aprimoramento de competências empreendedoras para atuação do enfermeiro no mercado de trabalho em saúde. Além disso, reforça-se a importância das universidades e dos professores apresentarem aos estudantes de enfermagem o empreendedorismo como uma possibilidade de inserção profissional, contribuição social e valorização da profissão.

CONCLUSÕES

A tendência empreendedora é baixa entre os estudantes de Enfermagem de uma universidade pública. Os melhores resultados foram obtidos nas dimensões Determinação e Busca de sucesso profissional. Estudantes que participavam de grupos de pesquisa ou extensão obtiveram pontuação igual ou acima da média nas cinco dimensões do Teste de Tendência Empreendedora Geral. O resultado abaixo da média em algumas tendências empreendedoras indica necessidade de uma abordagem mais ampla do tema na formação em Enfermagem.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Ana Fátima Fernandes

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Set 2021
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  21 Jan 2021
• Aceito
  20 Mar 2021