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Síndrome Congênita do Zika Vírus: cuidado à luz dos princípios do Sistema Único de Saúde

RESUMO

Objetivo:

conhecer a percepção de profissionais de saúde acerca das ações de cuidado dispensadas às crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus e suas famílias.

Métodos:

estudo qualitativo, realizado em uma capital do centro oeste brasileiro, fundamentado nos preceitos teóricos do Sistema Único de Saúde. Os dados foram coletados em setembro e outubro de 2020, mediante entrevistas audiogravadas junto a 12 profissionais de saúde de um serviço especializado e submetidos à análise de conteúdo, modalidade temática.

Resultados:

a implementação de ações de cuidado junto a essas crianças ocorre mediante avaliação multidimensional da criança e sua família, utilização do Projeto Terapêutico Singular, intervenções terapêuticas para o desenvolvimento da criança e a comunicação e troca de experiências interprofissional e com a família, além de considerar o conhecimento prévio do profissional e a sua busca por ele.

Considerações finais:

crianças com SCZ e suas famílias necessitam de cuidados individualizados, frequentes, integrados e contínuos.

Descritores:
Zika Vírus; Cuidado da Criança; Doença Crônica; Integralidade em Saúde; Sistema Único de Saúde

ABSTRACT

Objective:

to know health professionals’ perceptions about care actions provided to children with Congenital Zika Virus Syndrome and their families.

Methods:

this is a qualitative study, carried out in a capital of center-western Brazil, based on the Unified Health System theoretical precepts. Data were collected in September and October 2020, through audio-recorded interviews with 12 health professionals from a specialized service and submitted to analysis of content, thematic modality.

Results:

the implementation of care actions with these children occurs through multidimensional assessment of children and their families, use of the Unique Therapeutic Project, therapeutic interventions for the development of children and the communication and exchange of interprofessional and family experiences, in addition to considering professionals’ prior knowledge and their search for it.

Final considerations:

children with CZS and their families need individualized, frequent, integrated and continuous care.

Descriptors:
Zika virus; Child Care; Chronic Disease; Comprehensive Care; Unified Health System

RESUMEN

Objetivo:

conocer la percepción de los profesionales de la salud sobre las acciones de atención que se brindan a los niños con Síndrome congénito del Virus Zika y sus familias.

Métodos:

estudio cualitativo, realizado en una capital del centro occidente brasileño, basado en los preceptos teóricos del Sistema Único de Salud. Los datos fueron recolectados en septiembre y octubre de 2020, a través de entrevistas grabadas con 12 profesionales de la salud de un servicio especializado y sometido a análisis de contenido, modalidad temática.

Resultados:

la implementación de acciones de cuidado con estos niños se da a través de la evaluación multidimensional del niño y su familia, uso del Proyecto Terapéutico Singular, intervenciones terapéuticas para el desarrollo del niño y la comunicación e intercambio de experiencias interprofesionales y familiares, además de considerar la los conocimientos previos del profesional y su búsqueda.

Consideraciones finales:

los niños con SCZ y sus familias necesitan cuidados individualizados, frecuentes, integrados y continuos.

Descriptores:
Virus Zika; Cuidado del Niño; Enfermedad Crónica; Integralidad en Salud; Sistema Único de Salud

INTRODUÇÃO

Passados cinco anos da emergência em saúde pública causada pelo Zika Vírus (ZIKV) e seu poder teratogênico, concluiu-se que a microcefalia era apenas “a ponta do iceberg”, o que levou, posteriormente, a uma definição mais ampla denominada Síndrome Congênita do Zika Vírus (SCZ)(11 Moore CA, Staples JE, Dobyns WB, Pessoa A, Ventura CV, Fonseca EB, et al. Congenital zika syndrome: characterizing the pattern of anomalies for pediatric healthcare providers. JAMA Pediatr. 2017;171(3):288-95. https://doi.org/10.1001/jamapediatrics.2016.3982
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). À medida que as crianças acometidas crescem, surge uma gama de anormalidades associadas, como malformações musculoesqueléticas, convulsões, disfagia, deficiências auditivas e visuais(22 Kelly AH, Lezaun J, Löwy I, Matta GC, Nogueira CO, Rabello ET. Uncertainty in times of medical emergency: Knowledge gaps and structural ignorance during the Brazilian Zika crisis. Soc Sci Med. 2020;246:112787. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2020.112787
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). Desse modo, o desafio de prover cuidados às crianças que vivenciam o adoecimento crônico e suas famílias é potencializado pelas particularidades da SCZ, cujos desdobramentos clínicos, sociais e políticos se descortinam ao longo do tempo(33 Mendes AG, Campos DS, Silva LB, Moreira MEL, Arruda LO. Facing a new reality from the Zika Virus Congenital Syndrome: the families’ perspective. Cienc Saude Colet. 2020;25(10):3785-94. https://doi.org/10.1590/1413-812320202510.00962019
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).

As ações de cuidado desenvolvidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) visam à estimulação e reabilitação de acordo com a extensão do acometimento pela síndrome, necessitam de fluxos viáveis entre a demanda e a oferta de serviços especializados articulados com os demais pontos de atenção à saúde. Ademais, essas ações requerem acompanhamento multiprofissional e a implementação de padrões robustos de suporte às famílias que são responsáveis pela continuidade e manutenção do cuidado no domicílio(44 Peiter PC, Pereira RS, Moreira MCN, Nascimento M, Tavares MFL, Franco VC, et al. Zika epidemic and microcephaly in Brazil: challenges for access to health care and promotion in three epidemic areas. PLoS One. 2020;15(7):e0235010. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0235010
https://doi.org/10.1371/journal.pone.023...
).

Por essa razão, os profissionais que acompanham crianças com necessidades de cuidados múltiplos e contínuos carecem de qualificação permanente que lhes permitam transcender o cuidado biomédico e desenvolver uma prática assistencial holística que considere a família como uma unidade de cuidado e reconheça o seu protagonismo no estímulo ao desenvolvimento da criança(55 Dias BC, Ichisato SM, Marchetti MA, Neves ET, Higarashi IH, Marcon SS. Challenges of family caregivers of children with special needs of multiple, complex and continuing care at home. Esc Anna Nery. 2019;23(1):e20180127. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2018-0127
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).

Além disso, indivíduos com condições crônicas acessam, frequentemente, os diferentes pontos da Rede de Atenção à Saúde e demandam intervenções que considerem o conceito ampliado de saúde e promovam qualidade de vida. Para tanto, torna-se necessário o seguimento contínuo e articulado entre as equipes e entre os diferentes serviços, de modo que as ações sejam orientadas pelas necessidades singulares, com vistas à consolidação de uma assistência universal, integral e equânime, consoante aos princípios do SUS(66 Vaz EMC, Collet N, Cursino EG, Forte FDS, Magalhães RKBP, Reichert APS. Care coordination in Health Care for the child/adolescent in chronic condition. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 6):2612-9. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0787
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0...
-77 Souza AP, Rezende K, Marin MJ, Tonhom S. Family health strategy and care integrality: professionals’ perception. Rev Baiana Enferm. 2020;34:e34935. https://doi.org/10.18471/rbe.v34.34935
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).

No caso de crianças com a SCZ, por exemplo, é fundamental garantir o acesso universal aos serviços de saúde nos diferentes pontos da rede, a garantia da equidade e o cuidado integral ao longo dos diferentes ciclos de vida. Para tal alcance, os profissionais devem ser formados e frequentemente qualificados para atuar mediante os princípios do SUS, com enfoque em uma prática avançada, permeada por decisões complexas alicerçadas em competências clínicas para o cuidado, e ainda, possuir capacidade para desenvolver ações de promoção da saúde, prevenção de doenças, tratamento e reabilitação dentro da sua realidade e do seu espaço de atuação(88 Furtado MCDC, Mello DF, Pina JC, Vicente JB, Lima PR, Rezende VD. Nurses' actions and articulations in child care in primary health care. Texto Contexto Enferm. 2018;27(1):e0930016. https://doi.org/10.1590/0104-07072018000930016
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).

No que concerne à temática central do estudo, a literatura apresenta vasta abordagem sobre o mecanismo de infecção, diagnóstico e prevenção para o ZIKV, além das características epidemiológicas e clínicas da síndrome(99 Siddique R, Liu Y, Nabi G, Sajjad W, Xue M, Khan S. Zika virus potentiates the development of neurological defects and microcephaly: challenges and control strategies. Front Neurol. 2019;10:319. https://doi.org/10.3389/fneur.2019.00319
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10 Casale TB, Teng MN, Morano JP, Unnasch T, Lockwood CJ. Zika virus: an emerging infectious disease with serious perinatal and neurologic complications. J Allergy Clin Immunol. 2018;141(2):482-90. https://doi.org/10.1016/j.jaci.2017.11.029
https://doi.org/10.1016/j.jaci.2017.11.0...

11 Karkhah A, Nouri HR, Javanian M, Koppolu V, Masrour-Roudsari J, Kazemi S, et al. Zika virus: epidemiology, clinical aspects, diagnosis, and control of infection. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2018;37(11):2035-43. https://doi.org/10.1007/s10096-018-3354-z
https://doi.org/10.1007/s10096-018-3354-...
-1212 Escosteguy CC, Medronho RE, Rodrigues RC, Silva LDR, Oliveira BA, Machado FB, et al. Microcefalia e alterações do sistema nervoso central relacionadas à infecção congênita pelo vírus Zika e outras etiologias infecciosas no estado do Rio de Janeiro: estudo transversal, 2015 a 2017. Rev Panam Salud Publica. 2020;44:e151. https://doi.org/10.26633/RPSP.2020.151
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). Em um contexto mais subjetivo, os estudos com abordagem qualitativa, em sua maioria, exploram as experiências de mulheres com diagnóstico de infecção pelo ZIKV durante a gravidez e os sentimentos vivenciados por elas no cuidado à criança com SCZ(1313 Gomez HM, Mejia Arbelaez C, Ocampo Cañas JA. A qualitative study of the experiences of pregnant women in accessing healthcare services during the Zika virus epidemic in Villavicencio, Colombia, 2015-2016. Int J Gynaecol Obstet. 2020;148(Suppl 2):29-35. https://doi.org/10.1002/ijgo.13045
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14 Marbán-Castro E, Villén-Gonzalvo A, Enguita-Fernàndez C, Marín-Cos A, Menéndez C, Maixenchs M, et al. Uncertainties, fear and stigma: perceptions of Zika virus among pregnant women in Spain. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(18):6643. https://doi.org/10.3390/ijerph17186643
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15 Silva DA, Silva ÉQ. Saúde mental no enfoque das mulheres afetadas pelo Zika vírus: um estudo etnográfico no Estado do Pará, Brasil. Cad Saude Publica. 2020;36(8):e00100019. https://doi.org/10.1590/0102-311x00100019
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-1616 Hamad GBNZ, Souza KVD. Special child, special mother: the sense of strength in mothers of children with congenital zika vírus syndrome. Esc Anna Nery. 2019;23(4):e20190022. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2019-0022
https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-20...
). Entretanto, estudos que investigam a prática de cuidado à criança e à família, bem como as estratégias utilizadas pelas equipes dos serviços especializados para esse cuidado, ainda são incipientes.

OBJETIVO

Conhecer a percepção de profissionais de saúde acerca das ações de cuidado dispensadas às crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus e suas famílias.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo atendeu os preceitos éticos disciplinados pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, sob Parecer favorável. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para garantir-lhes o anonimato, os registros das falas foram codificados com a letra “P” e um número indicativo da ordem de realização das entrevistas.

Tipo de estudo

Estudo descritivo, de natureza qualitativa, que utilizou como base conceitual os preceitos teóricos do SUS e cuja descrição seguiu o Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ).

Procedimentos metodológicos

Cenário do estudo

Pesquisa realizada em uma instituição filantrópica especializada em reabilitação, diagnóstico, tratamento, concessão, adaptação e manutenção de tecnologia assistiva, situada em uma capital da Região Centro-Oeste do Brasil. O serviço dispõe de equipe multiprofissional composta por médicos, enfermeiros fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, nutricionistas, técnicos em órteses e próteses e educadores físicos. É referência municipal e estadual para a Rede de Atenção à Saúde de pessoas com deficiência intelectual, auditiva, visual e física. Os atendimentos são gratuitos e a admissão no serviço ocorre, exclusivamente, mediante encaminhamento via Sistema Nacional de Regulação e a frequência dos atendimentos é determinada diante das necessidades de cada paciente.

Fonte de dados

Foram incluídos no estudo profissionais de saúde com ensino superior que realizam/realizaram atendimento à criança com SCZ e suas famílias e que, por ocasião da coleta de dados, não estavam afastados, pela contingência adotada pela instituição, durante a pandemia causada pelo coronavírus. Por sua vez, adotou-se como critério de exclusão a indisponibilidade do profissional após três tentativas de agendamento de entrevista, em dias e horários distintos.

Coleta e organização dos dados

Inicialmente, a pesquisadora principal consultou o cadastro geral de pacientes da instituição a fim de identificar as crianças que já foram ou são acompanhadas como SCZ (nove) no período 2015 a junho de 2020. Posteriormente, por meio dos históricos de atendimentos semanais e mensais dessas crianças, identificaram-se 30 profissionais elegíveis para o estudo. Desses, 15 estavam em atividade por ocasião da coleta de dados (um médico, um enfermeiro, um nutricionista, um assistente social, dois psicólogos, cinco fisioterapeutas e quatro terapeutas ocupacionais). Em seguida, a pesquisa foi divulgada a esses profissionais com apoio dos supervisores das categorias envolvidas no cuidado e todos foram convidados pessoalmente pela pesquisadora a participarem do estudo, sendo que um não aceitou participar e dois não conseguiram disponibilidade para a entrevista após três tentativas de agendamento.

A coleta de dados ocorreu entre setembro e outubro de 2020 mediante entrevistas previamente agendadas, conforme a disponibilidade dos participantes, de modo a não interferir na rotina de trabalho e realizadas em sala reservada na própria instituição. Elas foram audiogravadas após autorização, tiveram duração média de 60 minutos e realizadas pela pesquisadora principal, utilizando um roteiro constituído por questões relacionadas à caracterização dos participantes, uma questão norteadora, “Como ocorre o cuidado às crianças com SCZ e suas famílias?”, e algumas questões de apoio abordando estratégias para execução e manutenção do cuidado, atuação multiprofissional e conhecimento sobre a síndrome.

O encerramento da coleta seguiu o critério de suficiência quando o número de interlocutores e a qualidade de seus relatos já permitia refletir as múltiplas dimensões do objeto, a partir da reincidência e complementaridade das informações(1717 Minayo MCS. Amostragem e saturação em pesquisa qualitativa: consensos e controvérsias. Rev Pesqui Qual [Internet]. 2017[cited 2021 Feb 18];5(7):01-12. Available from: https://editora.sepq.org.br/rpq/article/view/82
https://editora.sepq.org.br/rpq/article/...
).

Análise dos dados

Todas as entrevistas foram transcritas na íntegra e submetidas à análise de conteúdo, modalidade temática, seguindo as etapas propostas(1818 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2016.). Na pré-análise, ocorreu a sistematização das ideias iniciais mediante organização do material, seguida de leitura exaustiva, com a identificação dos núcleos de sentido ante o objetivo do estudo. Na etapa de exploração do material, procedeu-se ao agrupamento em núcleos temáticos mediante um processo minucioso de leitura, classificação e agregação das unidades de significação(1818 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2016.), sendo elas: necessidades das famílias para manutenção do cuidado; planejamento das ações de cuidado; orientação das intervenções frente à condição crônica; atuação e comunicação da equipe multiprofissional; capacitação do profissional para o cuidado à criança com SCZ e suas famílias.

Por fim, na etapa de tratamento dos resultados(1818 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2016.), após a articulação dos dados empíricos com o material teórico ancorados no objetivo da pesquisa e nos temas identificados, emergiu a categoria “A construção do cuidado às crianças com SCZ e suas famílias” constituída pelas subcategorias “Planejamento das ações de cuidado”, “Implementação do cuidado” e “Conhecimento frente à Síndrome Congênita do Zika Vírus”.

RESULTADOS

Os 12 participantes em estudo tinham idade entre 26 e 46 anos (média de 35,6 anos), sendo 11 do sexo feminino, quatro fisioterapeutas, quatro terapeutas ocupacionais, dois psicólogos, um assistente social e um nutricionista. O tempo de formação variou de três a 18 anos (média de 11,6 anos) e o de atuação na instituição de 11 meses a nove anos (média de 5,3 anos). Entre os participantes, 10 declararam ter alguma especialização.

A categoria “A construção do cuidado às crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus e suas famílias” aborda os aspectos constituintes do planejamento, execução e o conhecimento acerca das ações de cuidado direcionadas às crianças com SCZ e suas famílias e está constituída por três subcategorias, as quais serão descritas a seguir.

Planejamento das ações de cuidado

Nesta subcategoria, os participantes apontaram alguns elementos e estratégias utilizadas para o planejamento das ações de cuidado:

Inicialmente, o porquê que essa pessoa está aqui, porque, muitas vezes, ela não sabe, por mais que venha escrito no papel o porquê ela foi encaminhada, às vezes até o médico que encaminhou comentou alguma coisa, o cuidador não entende o porquê estar aqui, então a primeira coisa que eu faço no acolhimento é perguntar o porquê que veio [...]. (P10)

Fazemos uma avaliação multidimensional, que também avalia se essa família é uma barreira ou um facilitador, o ambiente que ele convive que é a escola, também se ele tem acesso ao serviço de saúde, à parte social [...]. (P11)

A gente precisa saber renda, se tem moradia e se o paciente já está recebendo benefício, porque, se ele não tem como vir, a gente já tem que providenciar isso para eles mais rápido [...] pelo menos, para minimizar que ele não falte nos atendimentos [...]. (P5)

Observou-se que esta etapa se inicia com o acolhimento, o conhecimento e aproximação do contexto biopsicossocial das crianças com SCZ e suas famílias.

Os entrevistados destacaram também a necessidade de resgatar o histórico gestacional, a história clínica e estado atual da criança:

Como foi o período gestacional dessa mãe, se realizou um pré-natal, se foi apontado nos exames de ultrassom algum tipo de alteração ou não [...] e a gente pergunta também sobre a história atual da criança, como que essa mãe sente o dia a dia com ela, [...]. (P1)

Normalmente, você ouve um pouco do histórico da criança, como foi aquela gestação, mas as informações principais são como está, o que a mãe está notando em casa, quais são as medicações que ela está tomando, porque, dependendo da medicação, isso vai interferir se essa criança está sonolenta, vai interferir nos nossos atendimentos [...] são essas informações que eu colho e que em cima daquilo eu vou desenvolver todo meu plano de tratamento, a forma que eu vou conduzir [...]. (P6)

Para tanto, a utilização de testes e instrumentos de avaliação durante favorece o planejamento das ações de cuidado:

[...] aí vem a avaliação específica da fisioterapia, a gente tem alguns testes de reflexo, a gente aplica na criança de acordo com a idade que ela apresenta no momento da avaliação, e, através disso, a gente vai traçando uma conduta. (P1)

Para mim, uma anamnese é o principal para um bom resultado. Aplicando os instrumentos de avaliação adequados para aquela criança, a gente consegue até ver, enxergar melhor um prognóstico, explicar melhor para essa família [...]. (P12)

A queixa da família e suas expectativas e perspectivas são fundamentais neste planejamento:

Toda vez que a gente avalia o paciente, a gente pergunta o que a mãe espera da nossa terapia, o que ela quer que a criança faça que a criança ainda não faz, essas coisas para gente saber e poder direcionar. (P2)

No tocante às ferramentas utilizadas para o planejamento, os participantes ressaltaram a importância da utilização do Projeto Terapêutico Singular (PTS):

A gente consegue fazer o que a gente chama de Projeto Terapêutico Singular, que é o planejamento. Você vê através dessa reflexão, desses objetivos, o que a mãe espera. A gente consegue fazer esse trabalho de corresponsabilização da equipe onde todos participam, então todos que eu digo a equipe multiprofissional e o familiar [...]. (P12)

[...] sempre vai ter um profissional que é responsável e acompanha esse paciente da entrada até a alta; por exemplo, se a maior necessidade desse paciente na avaliação for cognitiva, então o responsável pelo PTS é um psicólogo que atende e é ele que vai gerenciar esse PTS, é ele que vai fazer a discussão com os outros profissionais, é ele que vai sentar com a família e vai traçar os objetivos em conjunto [...]. (P11)

Os relatos mostram que, quando utilizado rotineiramente, o PTS pode subsidiar as intervenções e o trabalho em equipe.

Implementação do cuidado

Os participantes destacaram que o reconhecimento da SCZ como uma condição crônica também constitui um elemento importante para a construção do cuidado a estas crianças e suas famílias:

[...] por mais que a gente não consiga estabelecer um padrão de normalidade para essas crianças, a gente consegue dar o máximo de qualidade de vida e de funcionalidade, então é importante porque assim como a doença que ela vai ter para a vida toda, esses cuidados também vão permanecer para a vida toda [...]. (P1)

Isso, porque o foco é a oferta de ações que favoreçam a qualidade de vida e que levam em consideração as limitações nos diferentes estágios do desenvolvimento. Nesse contexto, os profissionais salientaram a necessidade de estimulação precoce e monitoramento longitudinal, a fim de que melhores resultados sejam alcançados:

Quando essa criança chega para nós em idade precoce, a criança já torna uma criança de monitoramento longitudinal [...], por exemplo, se ela [criança] tem meses e vem para cá, a gente consegue acompanhar o desenvolvimento cronológico e ir estimulando o que ele apresentar de atraso, agora com sete anos, vai ter uma distância da idade cronológica e a gente vai demorar mais tempo, inclusive a gente não vai conseguir talvez colocar todos os apoios que ele precisa para se desenvolver de forma plena. (P11)

Além disso, as intervenções são desenvolvidas frente às diferentes necessidades de saúde e especificidades que a SCZ pode acarretar:

A gente trabalha mais as limitações que são causadas pelas sequelas que o Zika vírus causa, então a gente trabalha assim através da estimulação, da prevenção de deformidades, dos estímulos, tanto sensorial, motor, cognitivo [...] estimulação visual, auditiva, tudo isso a gente estimula através do brincar, através de movimentos, alongamentos, manuseio. (P3)

Dentre as ações de cuidado implementadas, os participantes realçaram aquelas que favorecem a realização das atividades básicas da vida diária e as adaptações frente às limitações causadas pela SCZ:

Essa criança também precisa ter o cognitivo estimulado para ver se através disso, ela consiga ter um bom desempenho de coordenação motora, até para a gente poder conseguir ver se essa criança consegue escovar um dente, pentear o cabelo, colocar uma roupa [...]. (P6)

Aqui, na terapia ocupacional, oferece tudo para a criança, tudo que ela precisa para ter um cotidiano mais próximo do adequado possível; terapia ocupacional trabalha com a realidade, a readaptação desse indivíduo, então a gente vai adaptar em uma nova realidade, habilitá-la na verdade, nessa nova realidade dele, porque eles não estão sendo reabilitados e sim habilitados, a gente trabalha mais nesse contexto também. (P4)

Ademais, os profissionais apontaram a necessidade de buscarem o feedback da família em relação às ações de cuidado implementadas, para identificação de fatores influentes no tratamento e planejamento de novos direcionamentos:

Quando as mãezinhas chegam, eu sempre pergunto como está, como passou na semana, teve alguma evolução, está fazendo todas as orientações que foram passadas, aí elas me contam “Ah, começou a ficar de pé, ah, começou a fazer isso, ah, está muito danado, nossa, melhorou bastante”, então a gente precisa dessa devolutiva [...]. (P7)

Para tanto, fizeram referência à utilização de recursos alternativos que auxiliam a família no feedback em relação à evolução da criança:

[...] porque a família está todos os dias com a criança, ela consegue perceber de uma forma mais simples algumas coisas que a criança precisa no seu dia a dia, muitas vezes eu utilizo dos recursos de vídeos caseiros e me ajuda muito, quando também é possível, diário, eu não pego caderno nada, uma folha simples, quando a família consegue escrever, [...] e eu consigo identificar, nesses relatos, um desenvolvimento ou um plano terapêutico para essa criança também me ajuda muito, porque, nesses relatos, às vezes, colocam coisas que não foram ditas durante o atendimento. (P10)

Do mesmo modo, destacaram a importância da comunicação frequente entre os próprios profissionais envolvidos no cuidado:

A gente precisa ter uma sequência, a equipe multi é uma engrenagem e um vai complementando o trabalho do outro; então acho que quando você troca essas informações, essa engrenagem é mais fácil de ser conectada [...]. (P6)

É importante para evolução mesmo do paciente, porque, muitas vezes, eu posso estar vendo alguma coisa que a fisio não está vendo, que a fono não está vendo, ou senão ela mesma pode estar me passando algo que eu não consegui observar [...]. (P7)

Isso porque, quando o fluxo de comunicação é estabelecido de forma clara, há possibilidades de ampliação e de avanços no desenvolvimento das crianças com SCZ.

Conhecimento frente à Síndrome Congênita do Zika Vírus

Nesta categoria, os relatos mostram as dificuldades vivenciadas nos primeiros tempos após o surgimento da SCZ decorrentes do desconhecimento e das especificidades das deficiências apresentadas.

Vieram as crianças [com SCZ] para a gente fazer o atendimento, fui fazer pesquisas, estudar sobre o assunto, conhecer quais eram os aspectos neurológicos afetados e como que seria essa demanda, para poder estar atendendo e acolher esse paciente que estaria atendendo. (P10)

[...] um colega chega e fala “eu vi tal coisa, assim na parte da micro, é interessante”, a gente vai procurar também. Conversando com os colegas aqui dentro, com os médicos, que a gente começa “fiz tudo o que eu podia fazer até agora, tem alguma coisa que você conhece?” [...]. (P9)

Além disso, a experiência de atuação profissional no atendimento à criança com sequelas semelhantes à SCZ foi apontada como base para a oferta das ações de cuidados dispensadas a esse público:

[...] e também pela experiência que a gente já tem no atendimento motor da criança e estimulação precoce, porque muitas coisas que eu vi nos cursos, já são coisas que a gente tem como bagagem da graduação, da pós-graduação, da vivência clínica, a gente aprende muito mais atendendo; teve outros tipos de capacitação, mas não específica para o Zika. (P8)

A gente vai direto na parte de prognóstico, que é o que a criança apresenta, se apresenta algum atraso, a gente trabalha em cima disso, como esse tipo de criança nasce com essa sequela, é muito parecido com a sequela da microcefalia, então a gente trabalha no mesmo tipo de linhagem de uma criança com paralisia cerebral [...]. (P4)

Neste contexto, a parceria com instituições de ensino e pesquisa foi identificada como importante elemento para a construção do conhecimento e para a proposição de ações de cuidado em relação à SCZ:

A nossa neurologista é a doutora [nome da médica], ela participa do laboratório do Zika Vírus e a gente tem a residência multi aqui e a reabilitação, os nossos residentes também participam do laboratório do Zika Vírus em parceria com a universidade, então a gente teve bastante conhecimento na área. (P11)

No entanto, mostraram-se desejosos por capacitações específicas:

[...] se a gente fez capacitação para o autismo, para Síndrome de Down, por que não fazer também para essas outras doenças que estão chegando até nós? É uma doença nova, começou há pouco tempo. (P5)

É um público que, apesar de estar apresentando bastantes projetos, as pessoas estão ainda estudando o neurodesenvolvimento, como que essa criança se comporta, porque é recente, de cinco anos para cá, ainda tem muita coisa que ainda desconhecemos, então é importante capacitar essas equipes. (P12)

Observa-se nos relatos que os profissionais reconhecem a importância de se aproximar da temática para realizar ações de cuidado mais qualificadas para esse público, em decorrência das suas especificidades.

DISCUSSÃO

A assistência a indivíduos com condições crônicas, nos diferentes âmbitos do SUS, perpassa fatores biopsicossociais diversos que influenciam na consolidação e continuidade das ações de cuidados realizadas pelos profissionais da saúde e familiares. Quando essa condição ocorre na infância, o desafio se torna ainda maior, uma vez que o desenvolvimento é influenciado por fatores individuais, comportamentais, genéticos, ambientais, sociais e políticos, os quais são revelados gradativamente ao longo do tempo(33 Mendes AG, Campos DS, Silva LB, Moreira MEL, Arruda LO. Facing a new reality from the Zika Virus Congenital Syndrome: the families’ perspective. Cienc Saude Colet. 2020;25(10):3785-94. https://doi.org/10.1590/1413-812320202510.00962019
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).

Nesse contexto, os participantes do presente estudo enfatizaram que o planejamento do cuidado deve iniciar com a identificação das diferentes necessidades experienciadas pelas crianças acometidas pela SCZ e suas famílias e do contexto no qual elas estão inseridas, sobretudo condições favoráveis e desfavoráveis para a execução e manutenção do cuidado. Nesse sentido, com vistas ao desenvolvimento de intervenções de cuidado eficazes e sustentáveis a longo prazo, os profissionais devem considerar as possíveis limitações vivenciadas/apresentadas por aqueles que serão assistidos(1919 Kuper H, Smythe T, Duttine A. Reflections on health promotion and disability in low and middle-income countries: case study of parent-support programmes for children with congenital Zika syndrome. Int J Environ Res Public Health. 2018;15(3):514. https://doi.org/10.3390/ijerph15030514
https://doi.org/10.3390/ijerph15030514...
).

Cabe salientar que, por vezes, a vida de crianças com condições crônicas complexas é marcada pela invisibilidade de sua presença em espaços de vida comum e restritas a ambientes hospitalares ou espaços de reabilitação(2020 Moreira MCN, Albernaz LV, Sá MRC, Correia RF, Tanabe RF. Guidelines for a line of care for children and adolescentes with complex chronic health conditions. Cad Saude Publica. 2017;33(11):e00189516. https://doi.org/10.1590/0102-311X00189516
https://doi.org/10.1590/0102-311X0018951...
). No entanto, essas crianças e suas famílias necessitam ser acolhidas pelos diferentes pontos de atenção à saúde no SUS, especialmente pela equipe que atua no território onde residem, a fim de favorecer o acompanhamento das ações de cuidado que requerem a continuidade pela família, pois elas são complementares àquelas realizadas no serviço de reabilitação.

De forma enfática, os participantes mencionaram a importância e a necessidade de compreender a vivência e o conhecimento que a família tem sobre a condição da criança, o que corrobora pesquisa realizada com enfermeiros da Atenção Primária à Saúde (APS), os quais apontaram que, para a assistência às crianças com necessidades especiais de saúde, é importante acolher as famílias, reconhecer suas limitações e esclarecer dúvidas, pois essas ações impactam de forma significativa a qualidade do cuidado ofertado(2121 Favaro LC, Marcon SS, Nass EMA, Reis P, Ichisato SMT, Bega AG, et al. Percepção do enfermeiro sobre assistência às crianças com necessidades especiais de saúde na atenção primária. REME. 2020;24:e-1277. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20200006
https://doi.org/10.5935/1415-2762.202000...
).

Destarte, conhecer as condições socioeconômicas da família constitui elemento importante para o planejamento do cuidado, pois, quando desfavorável, aumenta a vulnerabilidade e dificulta o acesso ao tratamento. Esses aspectos são agravados pela inexistência de mecanismos formais de apoio às famílias e revelam uma importante lacuna na promoção do cuidado integral a esse público(2222 Duttine A, Smythe T, Sá MRC, Ferrite S, Zuurmond M, Moreira ME, et al. Congenital Zika Syndrome-Assessing the Need for a Family Support Programme in Brazil. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(10):3559. https://doi.org/10.3390/ijerph17103559
https://doi.org/10.3390/ijerph17103559...
-2323 Albuquerque MSV, Lyra TM, Melo APL, Valongueiro SA, Araújo TVB, Pimentel C, et al. Access to healthcare for children with Congenital Zika Syndrome in Brazil: perspectives of mothers and health professionals. Health Policy Plan. 2019;34(7):499-507. https://doi.org/10.1093/heapol/czz059
https://doi.org/10.1093/heapol/czz059...
).

Após mais de 30 anos da criação do SUS, a SCZ tem forçado um debate sobre a relevância dos fatores que influenciam no acesso aos serviços diante das necessidades de saúde múltiplas e complexas(2424 Barreiros CFC, Gomes MASM, Mendes Júnior SCS. Children with special needs in health: challenges of the single health system in the 21st century. Rev Bras Enferm. 2020;73(Suppl 4):e20190037. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0037
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0...
). Os participantes deste estudo referiram que o acesso aos serviços de saúde, educacionais e sociais é prioritário na orientação do cuidado, o que reforça resultado de pesquisa realizada em Pernambuco e no Rio de Janeiro, a qual identificou que na perspectiva de mães de crianças com SCZ e dos profissionais da rede pública as dificuldades de acesso são inúmeras e permeiam a acessibilidade organizacional, sociocultural, geográfica e econômica(2323 Albuquerque MSV, Lyra TM, Melo APL, Valongueiro SA, Araújo TVB, Pimentel C, et al. Access to healthcare for children with Congenital Zika Syndrome in Brazil: perspectives of mothers and health professionals. Health Policy Plan. 2019;34(7):499-507. https://doi.org/10.1093/heapol/czz059
https://doi.org/10.1093/heapol/czz059...
).

No que se refere às estratégias e ferramentas utilizadas para o planejamento da assistência, os profissionais relataram a realização de testes e aplicação de instrumentos específicos e adequados para a avaliação da criança. Diante do conhecimento limitado sobre a história natural da SCZ nos primeiros anos da infância, o uso sistemático e regular de instrumentos padronizados de triagem ou avaliação, acompanhados do histórico gestacional e de saúde, observação clínica e conhecimento das possíveis complicações secundárias à SCZ, apresentam-se como aliados potenciais na construção do cuidado(2525 Bailey DB Jr, Ventura LO. The likely impact of congenital Zika syndrome on families: considerations for family supports and services. Pediatrics. 2018;141(Suppl 2):S180-7. https://doi.org/10.1542/peds.2017-2038G
https://doi.org/10.1542/peds.2017-2038G...
).

Do mesmo modo, os profissionais destacaram a relevância em considerar a queixa principal da família e suas perspectivas no que concerne à evolução da criança. Cabe salientar que, embora necessidades médicas e terapêuticas das crianças com SCZ recebam atenção especial da equipe de saúde, os anseios, prioridades e preocupações da família também necessitam de igual atenção(2525 Bailey DB Jr, Ventura LO. The likely impact of congenital Zika syndrome on families: considerations for family supports and services. Pediatrics. 2018;141(Suppl 2):S180-7. https://doi.org/10.1542/peds.2017-2038G
https://doi.org/10.1542/peds.2017-2038G...
). Contudo, estudo realizado em uma instituição de referência no atendimento à saúde da mulher e da criança com SCZ, localizada na Região Norte do Brasil, apontou que as intervenções de saúde para esse público, por vezes, continuam centralizadas na doença e a família ainda é percebida apenas como receptora de informações(1515 Silva DA, Silva ÉQ. Saúde mental no enfoque das mulheres afetadas pelo Zika vírus: um estudo etnográfico no Estado do Pará, Brasil. Cad Saude Publica. 2020;36(8):e00100019. https://doi.org/10.1590/0102-311x00100019
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).

Com vistas à realização do cuidado integral, o trabalho colaborativo entre os profissionais com diferentes formações também constitui elemento favorável. A construção conjunta do PTS foi apontada como importante estratégia, o que corrobora achados de revisão que apontou o PTS como ferramenta que favorece estratégias ampliadas de cuidado a partir de práticas de saúde articuladas e que contemplam o indivíduo em sua totalidade e singularidade(2626 Rocha EN, Lucena AF. Single Therapeutic Project and Nursing Process from an interdisciplinary care perspective. Rev Gaucha Enferm. 2018;39:e20170057. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2018.2017-0057
https://doi.org/10.1590/1983-1447.2018.2...
). Ressalta-se que o PTS deve ser coordenado por um profissional de referência, ou seja, aquele que possuir maior vínculo com o usuário(2727 Baptista JÁ, Camatta MW, Filippon PG, Schneider JF. Singular therapeutic project in mental health: na integrative review. Rev Bras Enferm. 2020;73(2):e20180508. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0508
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).

O reconhecimento da SCZ como condição crônica pelos participantes do presente estudo reflete diretamente no modo como eles planejam as ações de cuidado, pois, nesses casos, priorizam práticas voltadas a favorecer qualidade de vida. Embora sejam escassas informações sobre as consequências subsequentes da SCZ, as deficiências funcionais e mentais ao longo da vida(2828 Miranda RN, Ximenes R, Gebretekle GB, Bielecki JM, Sander B, RADAM-LAC Research Team. Health-related quality of life in neurological disorders most commonly associated with Zika-virus infection: a systematic review. Value Health. 2020;23(7):969-976. https://doi.org/10.1016/j.jval.2020.03.004
https://doi.org/10.1016/j.jval.2020.03.0...
), o que se sabe até o momento revela a necessidade de serem utilizadas abordagens de cuidados extensivos às crianças e suas famílias(2525 Bailey DB Jr, Ventura LO. The likely impact of congenital Zika syndrome on families: considerations for family supports and services. Pediatrics. 2018;141(Suppl 2):S180-7. https://doi.org/10.1542/peds.2017-2038G
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,2929 Ferreira HNC, Schiariti V, Regalado ICR, Sousa KG, Pereira SA, Fechine CPNS, et al. Functioning and disability profile of children with microcephaly associated with congenital Zika virus infection. Int J Environ Res Public Health. 2018;15(6):1107. https://doi.org/10.3390/ijerph15061107
https://doi.org/10.3390/ijerph15061107...
).

Desse modo, reitera-se o desafio imposto ao SUS de oferecer/realizar ações de cuidado compartilhadas pelos profissionais atuantes nos diferentes pontos de atenção à saúde. Essas crianças e suas famílias, embora realizem acompanhamento nos serviços especializados, também carecem de ações que contemplem a promoção da saúde e o cuidado articulado pela APS(3030 Marcon SS, Dias BC, Neves ET, Marcheti MA, Lima RAG. (In)visibility of children with special health needs and their families in primary care. Rev Bras Enferm. 2020;73(Supp4):e20190071. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0071
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0...
). Todavia, é preciso articular intervenções não apenas para o nascimento ou até os três anos de vida, previstas nas diretrizes de estimulação precoce, mas também para as transições de cuidados, serviços escolares e de lazer(3131 Ministério da Saúde (BR). Diretrizes de estimulação precoce: crianças de zero a 3 anos com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor. Brasília, DF: MS [Internet];2016 [cited 2021 Feb 19]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_estimulacao_criancas_0a3anos_neuropsicomotor.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
-3232 Porter S, Mimm N. Infants with congenital Zika virus infection: a new challenge for early intervention professionals. Infants Young Child. 2017;30(1):17-27. https://doi.org/10.1097/IYC.0000000000000084
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), a fim de contemplar a integralidade que constitui uma premissa básica do SUS.

Ademais, com vistas à elaboração de intervenções que promovam o desenvolvimento da criança em seu potencial máximo, minimizem as consequências e contribuam substancialmente para a qualidade de vida das crianças(3333 Dantas MSA, Nobrega VM, Fechine CPNS, Torquato IMB, Assis WD, Collet N. Professional care for children with cerebral palsy and their families. Rev Enferm UERJ. 2017;25:e18331. https://doi.org/10.12957/reuerj.2017.18331
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), torna-se necessária a inclusão de estratégias capazes de prever a continuidade das ações e estímulos à criança no domicílio.

A exposição pré-natal ao ZIKV pode se manifestar em diferentes níveis de comprometimento do neurodesenvolvimento, o que acarreta encaminhamento precoce para avaliação e cuidados multiprofissionais especializados(3434 Silva PFS, Eickmann SH, Ximenes RAA, Montarroyos UR, Lima MC, Martelli CMT, et al. Pediatric neurodevelopment by prenatal Zika virus exposure: a cross-sectional study of the Microcephaly Epidemic Research Group Cohort. BMC Pediatr. 2020;20:472. https://doi.org/10.1186/s12887-020-02331-2
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). Cabe destacar que, embora o conceito de microcefalia tenha sido útil no momento inicial de descoberta da síndrome como marcador de lesão cerebral para direcionar os esforços científicos, a literatura já demonstrou a diversidade de efeitos deletérios causados pela SCZ e o papel fundamental da intervenção precoce, a fim de promover resultados mais eficazes no neurodesenvolvimento(3535 Waldorf KMA, Olson EM, Nelson BR, Little M-E, Rajagopal L. The aftermath of Zika: need for long-term monitoring of exposed children. Trends Microbiol. 2018;26(9):729-32. https://doi.org/10.1016/j.tim.2018.05.011
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).

Nesse sentido, diante das incertezas sobre o desfecho clínico a longo prazo destas crianças, torna-se relevante o monitoramento contínuo dos parâmetros de desenvolvimento(3232 Porter S, Mimm N. Infants with congenital Zika virus infection: a new challenge for early intervention professionals. Infants Young Child. 2017;30(1):17-27. https://doi.org/10.1097/IYC.0000000000000084
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) para além do acompanhamento ofertado na atenção especializada, uma vez que o enfrentamento da condição crônica requer um cuidado contínuo, resolutivo e longitudinal. Para tanto, garantir esse nível de atenção só é possível mediante a oferta de uma assistência universal, integral e equânime, que promova a corresponsabilização do cuidado e um percurso que atenda às necessidades de saúde(3636 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: MS [Internet]; 2017[cited 2021 Feb 19]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
).

Os profissionais revelaram que as intervenções realizadas na atenção especializada visam favorecer que a criança execute atividades básicas de vida diária, o que corrobora estudo realizado no nordeste brasileiro, o qual apontou que 95% das crianças com SCZ apresentavam extrema dificuldade em realizar movimentos motores finos e não eram capazes de utilizar utensílios ou recipientes para alimentação, ratificando a necessidade de abordagem multidisciplinar e intervenções com tecnologia assistiva(2929 Ferreira HNC, Schiariti V, Regalado ICR, Sousa KG, Pereira SA, Fechine CPNS, et al. Functioning and disability profile of children with microcephaly associated with congenital Zika virus infection. Int J Environ Res Public Health. 2018;15(6):1107. https://doi.org/10.3390/ijerph15061107
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). Isso permite inferir que os cuidados necessitam estimular capacidades e habilidades mínimas das crianças para realização dessas atividades, considerando, inclusive, as adaptações necessárias para uma nova realidade.

Por conseguinte, o acompanhamento das ações implementadas pela equipe de saúde e família é viabilizado por estratégias que possibilitem mensurar a evolução da criança frente ao plano terapêutico proposto. Nesse sentido, considerar a percepção e devolutiva da família pode favorecer a qualidade da assistência ofertada. As experiências da família, principalmente no contexto domiciliar, possibilitam a construção de uma assistência em que as respostas do serviço sejam condizentes com as necessidades dessas famílias e viáveis à continuidade do cuidado(3737 Sá FE, Andrade MMG, Nogueira EMC, Lopes JSM, Silva APÉP, Assis AMV. Parental needs in the care for children with Zika virus-induced microcephaly. Rev Bras Promoc Saude. 2017;30(4):1-10. https://doi.org/10.5020/18061230.2017.6629
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).

Para esse acompanhamento, os participantes referiram fazer uso de registros da família no ambiente domiciliar por meio de imagens e vídeos, os quais, por vezes, constituem um importante aliado na construção e validação do cuidado ao contemplar informações não mencionadas durante os atendimentos. Logo, as ações de cuidar em saúde não podem se limitar à identificação de aspectos restritos aos espaços de reabilitação, pois captar informações sobre adaptação funcional e eventos que interferem na evolução da criança faz parte da avaliação contínua(2525 Bailey DB Jr, Ventura LO. The likely impact of congenital Zika syndrome on families: considerations for family supports and services. Pediatrics. 2018;141(Suppl 2):S180-7. https://doi.org/10.1542/peds.2017-2038G
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).

Outrossim, a troca de informações entre os diferentes profissionais que acompanham a criança e suas famílias foi apontada como preponderante para continuidade do cuidado. Destarte, a comunicação interprofissional é fundamental no processo de integração e corresponsabilização do cuidado, de forma a estabelecer ações e responsabilidades entre os membros da equipe com vistas ao cuidado integral(3838 Ratna H. The Importance of effective communication in healthcare practice. Harv Public Health Rev (Camb). 2019[cited 2021 Feb 18];23:1-6. Available from: https://www.jstor.org/stable/48546767
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-3939 Delmiro ARCA, Pimenta EAG, Nóbrega VM, Fernandes LTB, Barros GC. Equipe multiprofissional no preparo para a alta hospitalar de crianças com condições crônicas. Cienc Cuidado Saúde. 2020;19:e50418. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v19i0.50418
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).

Contudo, a fim de garantir esse cuidado integral, tonar-se substancial uma atuação mais efetiva do profissional enfermeiro também nos serviços de reabilitação. Atuação esta que, com certeza, ocorre, mas que se manifesta de forma fluída e desprovida de registro, o que, por um lado, possivelmente impediu que mais enfermeiros fossem identificados como prestadores de assistência contínua a essas crianças e suas famílias, e por outro, que sua atuação fosse reconhecida e por conseguinte, referida pelos demais membros da equipe multiprofissional. À despeito disto, o enfermeiro tem sido apontado como o articulador do cuidado em diferentes contextos e situações(88 Furtado MCDC, Mello DF, Pina JC, Vicente JB, Lima PR, Rezende VD. Nurses' actions and articulations in child care in primary health care. Texto Contexto Enferm. 2018;27(1):e0930016. https://doi.org/10.1590/0104-07072018000930016
https://doi.org/10.1590/0104-07072018000...
,2121 Favaro LC, Marcon SS, Nass EMA, Reis P, Ichisato SMT, Bega AG, et al. Percepção do enfermeiro sobre assistência às crianças com necessidades especiais de saúde na atenção primária. REME. 2020;24:e-1277. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20200006
https://doi.org/10.5935/1415-2762.202000...
,2626 Rocha EN, Lucena AF. Single Therapeutic Project and Nursing Process from an interdisciplinary care perspective. Rev Gaucha Enferm. 2018;39:e20170057. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2018.2017-0057
https://doi.org/10.1590/1983-1447.2018.2...
,4040 Silva NRN, Macêdo AC, Melo GC, Duprat IP, Santos Sobrinha ES, Silva ALOB, et al. Atuação do enfermeiro na reabilitação da saúde da pessoa com deficiência. Rev Eletron Acervo Sade. 2021;13(2):e5888. https://doi.org/10.25248/reas.e5888.2021
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).

Cabe destacar, ainda, que o enfermeiro contribui com os demais profissionais da equipe multidisciplinar em diferentes cenários e contextos, ao construir e compartilhar conhecimentos, além de ter grande capacidade para liderar o trabalho em equipe e implementar ações educativas e assistenciais em todos os ciclos de vida. Porém, no contexto da reabilitação, considera-se que o seu papel continua indefinido e suas ações limitadas diante do seu potencial(4040 Silva NRN, Macêdo AC, Melo GC, Duprat IP, Santos Sobrinha ES, Silva ALOB, et al. Atuação do enfermeiro na reabilitação da saúde da pessoa com deficiência. Rev Eletron Acervo Sade. 2021;13(2):e5888. https://doi.org/10.25248/reas.e5888.2021
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).

No que concerne aos avanços no conhecimento específico sobre a SCZ, os protocolos clínicos permanecem fluidos, e, à medida que as anormalidades neurológicas e de desenvolvimento se expandem, o cuidado qualificado se torna uma preocupação crescente(4141 Sá MRC, Vieira ACD, Castro BSM, Agostini O, Smythe T, Kuper H, et al. The need to act together in every way possible: inter-sector action in health and education for children living with the congenital Zika syndrome. Cad Saude Publica. 2019;35(12):e00233718. https://doi.org/10.1590/0102-311x00233718
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). Destarte, frisa-se a importância do interesse e disposição do profissional em buscar o conhecimento necessário, uma vez que a responsabilidade pela capacitação e atualização dos profissionais não estão restritas apenas à gestão institucional(2121 Favaro LC, Marcon SS, Nass EMA, Reis P, Ichisato SMT, Bega AG, et al. Percepção do enfermeiro sobre assistência às crianças com necessidades especiais de saúde na atenção primária. REME. 2020;24:e-1277. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20200006
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).

Destaca-se que os profissionais enfatizaram a importância da busca individual por conhecimento sobre a SCZ, a troca de conhecimento entre os profissionais da equipe e a experiência prática com outras doenças que também acometem o neurodesenvolvimento, para subsidiar as condutas dispensadas às crianças e suas famílias. Ou seja, para além do reconhecimento da necessidade de capacitação profissional, destacaram que, diante de uma condição “nova”, é importante desenvolver ações já utilizadas na assistência a crianças com outras doenças com manifestações clínicas semelhantes. Nesse sentido, estudo realizado com pesquisadores do Brasil e Canadá refletiu sobre a necessidade de promover uma reabilitação baseada em evidências e de garantir a formação consistente dos profissionais de saúde que assistem as crianças com SCZ(4242 Longo E, Campos AC, Schiariti V. Zika Virus After Emergency Response: Can the ICF Guide Rehabilitation of Children With Microcephaly?. Pediatr Phys Ther. 2019;31(4):370-2. https://doi.org/10.1097/PEP.0000000000000647
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).

Na perspectiva dos profissionais, outro aspecto que favoreceu o conhecimento sobre as ações de cuidado a serem desenvolvidas/implementadas junto às crianças com SCZ e suas famílias foi a atuação de alunos da residência multiprofissional e de docentes no centro de reabilitação. Esse reconhecimento confere maior sentido e legitimidade à presença de residentes nos serviços de saúde, reforçando a importância da integração ensino-serviço como estratégia significativa para uma reflexão crítica no cotidiano das práticas compartilhadas(4343 Silveira JLGC, Kremer MM, Silveira MEUC, Schneider ACTC. Percepções da integração ensino-serviço-comunidade: contribuições para a formação e o cuidado integral em saúde. Interface (Botucatu). 2020;24:e190499. https://doi.org/10.1590/interface.190499
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), além de encorajar o desenvolvimento de mais propostas que possibilitem práticas de ensino à luz dos princípios do SUS.

Nesse sentido, estudo com profissionais da área materno-infantil nos Estados Unidos, lotados em serviços de atendimento a doenças crônicas, enfatizou ser fundamental continuar a construir uma força de trabalho interdisciplinar voltada às necessidades e especificidades da criança com SCZ(4444 Zai T, Yasuda PM, Rao S, Iizumi S, Vanderbilt DL, Deavenport-Saman A. Assessing the quality of the systems of care for children with congenital Zika virus infection and other neurodevelopmental disabilities in the United States pacific island territories. Hawaii J Health Soc Welf [Internet]. 2020[cited 2021 Feb 18];79(9):279-284. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7477700/
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). Logo, o desejo por qualificação frente à condição crônica ultrapassa os avanços voltados ao diagnóstico e intervenção precoce ao ampliar a necessidade de capacitar o profissional para dispensar cuidados que priorizem a qualidade de vida desse público.

Limitações do estudo

Uma possível limitação do estudo se relaciona à não participação de todas as categorias profissionais que atuam no serviço, sobretudo do enfermeiro, pois, na prática, ele é o coordenador das ações de cuidado, atua como ponte entre todos os profissionais envolvidos na reabilitação e tem papel fundamental na construção do PTS, embora isso nem sempre seja reconhecido.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

O conhecimento gerado pode favorecer a expansão e compreensão dos desafios e facilitadores para realização do cuidado às crianças com SCZ em conformidade com os princípios do SUS, ao demonstrar que é preciso atender as necessidades singulares dessas crianças e de suas famílias, além de planejar e implementar o cuidado com foco no fortalecimento dos vínculos, na corresponsabilidade e no trabalho multi e interprofissional. Ainda como contribuição, o estudo aponta a necessidade de aprimoramento do cuidado no contexto da reabilitação, espaço esse no qual a enfermagem ainda precisa assumir seu protagonismo, além de reconhecer a importância do registro das ações que desenvolve junto a essas crianças e suas famílias, sobretudo aquelas que envolvem tecnologia leve, pois elas representam necessidades genuínas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção do cuidado às crianças com SCZ e suas famílias é viabilizada por ações orientadas pela dimensão dos aspectos biopsicossociais e necessidades que envolvem o enfrentamento de uma condição crônica, associadas à utilização de instrumentos de avaliação e ferramentas como o PTS na gestão do cuidado. Além disso, o apoio de uma equipe integrada e qualificada com práticas voltadas às necessidades individuais da criança e de sua família, com vistas à integralidade e continuidade do cuidado, foi apontado como relevante na consolidação e êxito das intervenções propostas, bem como a importância da ampliação da rede de cuidados dessa criança e família, envolvendo, também, outros sistemas, como o educacional, o social e de lazer.

As crianças afetadas pela SCZ e suas famílias têm um futuro permeado por incertezas e enfrentarão desafios durante toda a vida. Por essa razão, é relevante conhecer e desenvolver intervenções que explorem maneiras alternativas e eficazes de planejamento e execução das ações de cuidado dispensadas pelos profissionais da saúde atuantes no SUS. Portanto, torna-se necessário ampliar a visibilidade dos aspectos que envolvem o cuidado a esses indivíduos no âmbito da atenção especializada e nos demais pontos de atenção à saúde, de modo a concretizar uma assistência em consonância com os princípios do SUS.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2021
  • Aceito
    09 Maio 2021
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