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Suporte aos estudantes de enfermagem diante de incidentes de segurança do paciente: pesquisa qualitativa

RESUMO

Objetivos:

conhecer o suporte ofertado ao estudante de enfermagem após um incidente de segurança do paciente.

Métodos:

pesquisa qualitativa, desenvolvida com 23 estudantes de um curso de bacharelado de enfermagem do Sul do Brasil. Os dados foram coletados entre setembro e novembro de 2021 e submetidos à análise textual discursiva, com a utilização do software Iramuteq.

Resultados:

os estudantes relataram que receberam apoio principalmente dos colegas e professores das disciplinas do campo de prática, mas demonstraram desconhecer qualquer tipo de suporte organizacional, protocolo ou apoio quando se encontram na condição de segunda vítima desses incidentes.

Considerações Finais:

foram identificadas as principais fontes de apoio quando o estudante de enfermagem se envolve em incidentes de segurança do paciente. Destaca-se a incipiência dos recursos de suporte oferecidos a esse estudante, tanto nacional como internacionalmente, sendo prementes mais pesquisas direcionadas a essas potenciais vítimas, bem como recursos de suporte para mitigar esse fenômeno.

Descritores:
Estudantes de Enfermagem; Segurança do Paciente; Gestão de Riscos; Estágio Clínico; Pesquisa Qualitativa

ABSTRACT

Objectives:

to identify the support provided to nursing students after a patient safety incident.

Methods:

qualitative study developed with 23 students attending an undergraduate nursing program in southern Brazil. Data were collected between September and November 2021 and submitted to textual discursive analysis using the Iramuteq software.

Results:

the students reported that mainly classmates and professors of the practical courses provided support. The students showed no knowledge of organizational support or protocols available to students who become second victims of such incidents.

Final Considerations:

the primary support sources available to nursing students involved in patient safety incidents were identified. Note that support provided to nursing students is still incipient both in Brazil and internationally. Hence, further studies are needed to address potential victims and support resources to mitigate this phenomenon.

Descriptors:
Students; Nursing; Patient Safety; Risk Management; Clinical Clerkship; Qualitative Research

RESUMEN

Objetivos:

conocer el soporte ofrecido al estudiante de enfermería después de un incidente de seguridad del paciente.

Métodos:

investigación cualitativa, desarrollada en el curso de licenciatura de enfermería en el Sur de Brasil, con 23 estudiantes. Los datos fueron recolectados entre septiembre y noviembre de 2021 y sometidos al análisis textual discursivo, con la utilización del software Iramuteq.

Resultados:

los estudiantes relataron que recibieron apoyo principalmente de los compañeros y profesores de las materias del campo de práctica; también, ellos demostraron no conocer ningún tipo de soporte organizacional, protocolo o apoyo cuando son por segunda vez víctimas de esos incidentes.

Consideraciones Finales:

se identificaron las principales fuentes de apoyo, cuando el estudiante de enfermería se envuelve en incidentes de seguridad del paciente. Se destaca la insipiencia de los recursos de soporte ofrecidos al estudiante de enfermería, tanto en el ámbito nacional como internacional; así, es necesario realizar más investigaciones dirigidas a esas potenciales víctimas e proporcionar recursos de soporte para mitigar ese fenómeno.

Descriptores:
Estudiantes de Enfermería; Seguridad del Paciente; Gestión de Riesgo; Prácticas Clínicas; Investigación Cualitativa

INTRODUÇÃO

A temática da segurança do paciente ganhou notoriedade nas últimas duas décadas, com destaque para o avanço nas discussões, reflexões e pesquisas entre os gestores, membros dos serviços da qualidade em saúde, órgãos governamentais, profissionais e usuários. O relatório To Err is Human: Building a Safer Health Care System do Institute of Medicine (IOM) pode ser considerado o marco de confluência da segurança do paciente internacionalmente, pois mostrou ao mundo como são altas as incidências de eventos adversos nas instituições hospitalares, em decorrência de uma assistência insegura. Dessa forma, tal relatório reforçou a importância de reestruturar o modelo de assistência à saúde e melhorar a qualidade dos serviços(11 Kohn LT, Corrigan JM, Donaldson MS. To err is human: building a safer health system. Whashington: National Academy Press; 2000. https://doi.org/10.17226/9728
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).

No contexto nacional, o Ministério da Saúde (MS) instituiu o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), por meio da Portaria MS/MG n.529, de 1 de abril de 2013, com o objetivo de favorecer a qualificação do cuidado em saúde. A segurança do paciente tem como propósito reduzir os riscos de danos associados aos cuidados em saúde a um mínimo aceitável e, por conseguinte, evitar incidentes de segurança do paciente ou Evento Adverso (EA)(22 Ministério da Saúde (BR). Documento de referência para o programa nacional de segurança do paciente [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014[cited 2022 Jan 20]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/documento_referencia_programa_nacional_seguranca.pdf
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).

De acordo com a Classificação Internacional para Segurança do Paciente (CISP), os incidentes são eventos ou circunstâncias que poderiam resultar, ou resultaram, em dano desnecessário ao paciente. Podem ser classificados como quase erro ou near miss, incidente sem dano e incidente com dano (EA). O EA é toda ação inesperada, que poderia ser evitada, e que causa dano ao paciente(33 Makary MA, Daniel M. Medical error-the third leading cause of death in the US. BMJ. 2016;353:i2139. https://doi.org/10.1136/bmj.i2139
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). Nos Estados Unidos, um em cada 10 pacientes internados sofre EA, sendo que o erro decorrente da assistência é a terceira causa de morte no país, com 400.000 óbitos por ano(44 Wu AW. Medical error: the second victim. The doctor who makes the mistake needs help too. BMJ. 2000;320(7237):726-7. https://doi.org/10.1136/bmj.320.7237.726
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).

Apesar de diversas iniciativas para mitigar os incidentes e eventos adversos, estes continuam presentes no cuidado, devido à condição imutável dos profissionais da saúde de cometer equívocos. Dessa forma, quando acontece um incidente, ou EA, o paciente e a família são considerados a “primeira vítima”, e os profissionais envolvidos no cuidado podem ser vítimas dos seus próprios erros, sendo denominados “segunda vítima”(44 Wu AW. Medical error: the second victim. The doctor who makes the mistake needs help too. BMJ. 2000;320(7237):726-7. https://doi.org/10.1136/bmj.320.7237.726
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).

A pessoa responsável, direta ou indiretamente pelo cuidado, que desenvolve algum sofrimento ou trauma após envolvimento em incidentes de segurança do paciente passa a ser uma segunda vítima. Portanto, a definição de segunda vítima, utilizada como referência para este estudo, direciona-se a profissionais de diversas áreas, acadêmicos, gestores e professores, os quais também podem ser considerados uma segunda vítima(55 Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider "second victim" after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. https://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
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).

Nessa perspectiva, o termo “terceira vítima” faz referência a organizações de saúde, profissionais da gestão e instituições de ensino não diretamente envolvidos no erro, mas que também podem sofrer prejuízos em decorrência deste(66 Holden J, Card AJ. Patient safety professionals as the third victims of adverse events. J Patient Saf Risk Manag. 2019;24(4):166-75. https://doi.org/10.1177%2F2516043519850914
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).

Quando um profissional enfrenta uma experiência com evento adverso, principalmente com danos graves ao paciente, ele desenvolve muitas experiências negativas após o evento, por estresse, exposição, preceitos éticos e punições legais a que está exposto. Nesse ínterim, o fato de um estudante que está iniciando sua prática profissional presenciar ou se envolver com essa experiência pode causar transtornos ainda mais graves do que nos profissionais, os quais precisam ser identificados e tratados precocemente(77 Díaz PC, Salvadores FP, Jiménez GE. Addressing medical errors: an intervention protocol for nursing professionals. Rev Esc Enferm USP. 2019;530:e03463. https://doi.org/10.1590/S1980-220X2018012703463
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).

Os estudantes da área da saúde vivenciam altos níveis de estresse quando se envolvem em uma situação de EA, sendo observadas manifestações, psicológicas e fisiológicas ainda mais intensas entre graduandos de enfermagem. Estes se sentem vulneráveis a diversas demandas universitárias, como os problemas relacionados ao ambiente educacional, situações pessoais, incerteza quanto ao futuro profissional, crescente volume de informações e estresse resultante das atividades práticas, principalmente quando se envolvem em uma situação de erro(88 Carleto CT, Moura RCD, Santos VS, Pedrosa LAK. Adaptação à universidade e transtornos mentais comuns em graduandos de enfermagem. Rev Eletr Enferm. 2018;20:v20a01. https://doi.org/10.5216/ree.v20.43888
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).

Assim, considerando a gravidade e extensão dos impactos psicológicos, físicos e psicossociais que o fenômeno da “segunda vítima” pode causar nos profissionais de enfermagem e, principalmente, nos acadêmicos, torna-se imprescindível que as instituições de saúde e de ensino ofereçam um suporte a essas vítimas, com o intuito de modificar e atenuar os sintomas e atitudes por elas apresentados após esses eventos.

O impacto do fenômeno da segunda vítima e a oferta de recursos de suporte para os profissionais de saúde já foram objetos de pesquisas desenvolvidas em alguns países como China, Estados Unidos, Dinamarca, Coreia e Argentina(99 Chen J, Yang Q, Zhao Q, Zheng S, Xiao M. Psychometric validation of the Chinese version of the Second Victim Experience and Support Tool (C-SVEST). J Nurs Manag. 2019;27(7):1416-22. https://doi.org/10.1111/jonm.12824
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10 Brunelli MV, Estrada S, Celano C. Cross-Cultural Adaptation and Psychometric Evaluation of a Second Victim Experience and Support Tool (SVEST). J Patient Saf. 2021;17(8):e1401-e1405. https://doi.org/10.1097/pts.0000000000000497
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11 Kim EM, Kim SA, Lee JR, Burlison JD, Oh EG. Psychometric Properties of Korean Version of the Second Victim Experience and Support Tool (K-SVEST). J Patient Saf. 2020;16(3):179-86. https://doi.org/10.1097/pts.0000000000000466
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-1212 Knudsen T, Abrahamsen C, Jørgensen JS, Schrøder K. Validation of the Danish version of the Second Victim Experience and Support Tool. Scand J Public Health. 2021. https://doi.org/10.1177/14034948211004801
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). Entretanto, especificamente no que diz respeito ao estudante de enfermagem, este tema permanece pouco explorado na literatura nacional e internacional.

OBJETIVOS

Conhecer o suporte ofertado ao estudante de enfermagem após um incidente de segurança do paciente.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Este estudo foi submetido à Plataforma Brasil e obteve parecer consubstanciado de aprovação pelo Comitê de Ética. O desenvolvimento do estudo respeitou os preceitos éticos de participação voluntária, esclarecida e consentida de modo que os participantes recrutados foram resguardados mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), respeitando-se sua autonomia, dignidade e anonimato, conforme determina a Resolução no 510 de 07 de abril de 2016 do Conselho Nacional de Saúde.

Desenho, período e local de estudo

Estudo exploratório e descritivo, com abordagem qualitativa. Para condução deste estudo seguiu-se Consolidated criteria for report qualitative research (COREQ), conforme o guia para estudos com abordagem qualitativa. A pesquisa foi realizada com 23 estudantes de enfermagem selecionados por amostragem não probabilística. O cenário do estudo foi o curso de bacharelado em enfermagem de uma universidade federal do estado do Rio Grande do Sul. A carga horária total do curso é de 4.140 horas, em regime por disciplinas desenvolvidas em dez semestres, sendo o último semestre composto por 960 horas de estágios clínicos supervisionados(1313 Universidade Federal do Rio Grande. Curso de Graduação em Enfermagem. Projeto político-pedagógico. (FURG). Rio Grande: FURG, 2018.).

População ou amostra, critérios de inclusão e exclusão

Foram incluídos como participantes da pesquisa os estudantes regularmente matriculados no último ano do curso de bacharelado de enfermagem, do nono e décimo semestres, que durante a assistência de enfermagem vivenciaram, direta ou indiretamente, incidentes de segurança do paciente. Foram excluídos da amostra aqueles que estavam em outra mobilidade acadêmica ou em trancamento por alguma razão pessoal.

Importante mencionar que não houve uma pergunta específica para identificar qual discente vivenciou essa circunstância, uma vez que os estudantes, quando adentram no cenário clínico, estão passíveis de serem autores de algum incidente, propriamente dito, ou de presenciarem um colega ou até mesmo um profissional de saúde cometer um incidente. Dessa forma, todos os estudantes que se encontravam realizando os estágios finais foram convidados a participar do estudo.

Coleta e organização dos dados

Para coleta de dados foram realizadas entrevistas semiestruturadas, tanto presencialmente como na modalidade on-line, sendo 18 na forma presencial, em local reservado do Hospital Universitário, atendendo todas as medidas e protocolos sanitários de distanciamento, uso de máscara e álcool em gel. Cinco estudantes aceitaram participar da pesquisa com agendamento de horário para modalidade on-line, por meio de ligação por chamada de vídeo. Salienta-se que a coleta foi interrompida após atingir a saturação teórica e empírica dos dados.

Após autorização dos participantes e assinatura do TCLE, foram realizadas as entrevistas, as quais foram gravadas em áudio para garantir maior fidedignidade das falas e, em seguida, transcritas. Para garantir o anonimato dos participantes, optou-se por codificá-los com a letra “E”, de estudante, seguida por números sequenciais, correspondentes à ordem de realização das entrevistas (por exemplo,“E1, E2 e E3.”). As entrevistas tiveram duração média de 20 minutos.

O questionário utilizado foi composto por questões fechadas para caracterização dos participantes e questões abertas, com ênfase nos aspectos relacionados à experiência em incidentes de segurança do paciente e no suporte oferecido após essa experiência. Inicialmente, escolheu-se contextualizar a entrevista perguntando aos entrevistados qual percepção tinham a respeito da ocorrência de incidentes no cenário da saúde. Em seguida, foram inseridas questões para elucidar o tipo de suporte acadêmico e organizacional disponibilizado após o envolvimento em incidentes de segurança do paciente e quais estratégias o estudante identificava como importantes para minimizar as consequências do fenômeno da segunda vítima: “Você recebeu suporte da organização de saúde?”, “Você recebeu suporte da universidade?”, “Que apoio você acredita ser importante para o aluno ou profissional que teve essa experiência?”.

Análise dos dados

Para análise profunda dos dados, utilizou-se a análise textual discursiva. Trata-se de uma abordagem de análise de dados que transita entre duas formas consagradas de análise na pesquisa qualitativa, que são a análise de conteúdo e a análise de discurso. Pode ser descrita como um processo que se inicia com uma unitarização, categorização e captação do novo emergente. A unitarização consistiu na desconstrução e fragmentação do texto para apreender as unidades de significado, as quais foram agrupadas em categorias de análise na etapa de categorização. O processo foi finalizado com a elaboração do metatexto contendo as novas interpretações que emergiram sobre o fenômeno pesquisado(1414 Moraes R, Galiazzi MC. Análise Textual Discursiva. Ijuí: Unijuí; 2013.).

O software Iramuteq tem sido utilizado nas pesquisas de abordagem qualitativa para auxiliar nas duas primeiras etapas da análise textual discursiva, sendo disponibilizado de forma gratuita na internet. Realizou-se a análise dos dados obtidos por meio das entrevistas com auxílio do software Iramuteq desenvolvido na linguagem Python e foram utilizadas funcionalidades providas pelo software estatístico R. Cabe reforçar que o software realiza apenas o processamento de dados, não sendo um método de análise de pesquisa(1515 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Lowen IMV, Peres AM. The use of IRAMUTEQ software for data analysis in qualitative research. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03353. https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017015003353
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).

Para fins deste estudo, utilizou-se a técnica de análise lexical dos dados método de REINERT ou Classe hierárquica descendentes (CHD), em que os textos foram classificados em função de seus respectivos vocabulários e o conjunto deles se dividiu pela frequência das formas reduzidas. O corpus geral foi oriundo da tese de doutorado intitulada “O fenômeno da segunda vítima no contexto dos estudantes de graduação em enfermagem”. A partir dos 23 textos, originaram-se 937 ST (segmentos de textos), com aproveitamento de 839 ST (89,54%). O corpus geral originou cinco classes lexicais: classe 1 com 96 ST (11,44%), classe 2 com 133 ST (15,85%), classe 3 com 219 ST (26,1%), classe 4 com 164 ST (19,55%) e classe 5 com 227 ST (27,06%). As classes identificadas pelo Iramuteq deram origem ao dendrograma abaixo e às suas relações entre si (Figura 1).

Figura 1
Dendrograma de Classificação Hierárquica Descendente, Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil, 2021

A classe 4 deu origem a três categorias, a saber: “Sofrimentos de estudantes de enfermagem após incidente de segurança do paciente”, “Apoio recebido pelo estudante de enfermagem durante o incidente de segurança do paciente” e “Suporte esperado pelos estudantes de enfermagem”. Essas duas últimas categorias, por sua vez, originaram este artigo, intitulado “Suporte aos estudantes de enfermagem e incidentes de segurança do paciente: pesquisa qualitativa”.

RESULTADOS

Com relação à caracterização dos 23 participantes, todos eram mulheres, com idade entre 20 e 46 anos. Destaca-se que nove delas cursavam o nono semestre do curso e as demais o décimo semestre. Da amostra, quatro alunas referiram ter experiência como técnicas de enfermagem.

Apoio recebido pelo estudante de enfermagem após incidente de segurança do paciente

Essa categoria apresenta o apoio que os estudantes de enfermagem relataram ter recebido durante e após o envolvimento com incidentes de segurança do paciente, inclusive por aqueles que chegaram a ter experiência com incidentes que causaram dano grave ao paciente.

Os alunos evidenciaram que os professores das práticas e estágios são as primeiras e principais pontos de apoio. Esse apoio foi considerado, na maioria das vezes, suficiente para tranquilizá-los depois do incidente de segurança com o paciente.

Os professores entraram em contato assim, conversaram com ela e deram todo apoio que ela precisou nesse momento [...]. (E12)

Eu me senti bem mal, bem triste. Eu conversei com a professora, ela me tranquilizou um pouco naquele dia [...] aquilo me deixou muito chateada [...]. (E9)

A professora depois conversou e orientou todos nós juntos, mas eu não sei te dizer depois [...]. (E19)

Então, no primeiro momento eu contei pra minha professora, que estava comigo, porque eu me senti muito mal naquele momento, de ter que corrigir uma enfermeira e do jeito que ela falou comigo depois. (E9)

As falas demonstram como a abordagem dos professores durante o estágio pode ser crucial para o bem-estar do estudante. Quando eles têm boa abertura para relatar o incidente e são recebidos sem julgamento, esse apoio durante o acontecimento torna-se determinante para promoção do bem-estar físico e mental, assim como para mitigação dos impactos negativos que esta experiência pode causar no processo de formação:

No dia eu me senti meio uma m[...], mas aí depois a professor sentou comigo e falou que poderia acontecer isso com qualquer um, eu tive uma recepção boa da professora [...]. (E11)

[...] eu conversei com a professora também, ela ficou chocada com o que aconteceu, mas elogiou também a minha postura. (E2)

Destaca-se ainda que, ao se envolver em incidentes com desfechos mais sérios, evento adverso com dano grave para o paciente, o estudante precisou recorrer à coordenação do curso, a qual também forneceu apoio:

Recebi suporte da escola de enfermagem, porque eu falei que tinha acontecido uma situação, até eu pedi pra ficar uns dias em casa [...] porque nesses estágios não pode faltar. (E2)

Outro apoio que os estudantes de enfermagem relataram ter recebido durante esta experiência foi dos colegas de turma. Segundo eles, os colegas de estágio podem ser uma importante fonte de apoio, por não realizarem julgamentos e estarem no mesmo nível hierárquico.

Ela ficou se sentindo bastante mal, agora não lembro, mas lembro que ela ficou bem mal mesmo. Ela até comentou comigo durante semana que ela quase causou um dano ao paciente, quase que fizemos a coisa errada. (E20)

[...] depois eu conversei com mais algumas colegas também, porque aquela situação me chateou bastante [...]. (E9)

[...] por exemplo, eu não sou técnica, então a gente que não é técnico [...]. Quando a gente fazia alguma coisa, a gente ia pro nosso colega técnico para pedir pra eles nos ajudarem, para gente reverter porque a gente tinha medo de falar pro professor, por alguns professores que a gente passou no começo da faculdade [...]. (E23)

Outro aspecto que emergiu dos depoimentos foi o suporte fornecido pela equipe do hospital. Nos discursos, evidenciou-se que, em algumas situações, houve apoio da enfermeira e das médicas da unidade. No entanto, em alguns casos, a equipe não mostrou abertura e nem forneceu apoio para os estudantes que sofriam com alguma experiência indesejável, e esse comportamento partiu, principalmente, da equipe de enfermagem:

Eu acho que foi tranquilo assim, eu refleti bem depois, eu conversei com as enfermeiras antigas da unidade [...]. Conversei com as médicas também, foi um rolo aquele dia, as médicas também me deram um suporte assim, porque, na hora, eu até me senti errada de ter feito aquilo [...]. No momento eu até pedi desculpas para as médicas, eu conversei com elas depois, elas que foram me aconselhando, tanto que a equipe médica me abraçou mais, porque com a enfermeira estava difícil [...]. Da equipe da enfermagem não tive apoio, a chefe da unidade, a doutora do setor, ela conversou comigo também, me acalmou, disse que eu estava sendo super elogiada. (E2)

Suporte esperado pelos estudantes de enfermagem após incidente de segurança do paciente

Nesta categoria, os estudantes expuseram qual tipo de apoio gostariam de ter recebido, ou consideravam importante para quem se envolve nesta experiência. Destacou-se ainda que uma parte dos estudantes desconhece qualquer tipo de suporte organizacional, protocolo ou apoio quando se encontram na condição de segunda vítima desses incidentes.

Com base nos depoimentos, observou-se que os estudantes acreditam ser fundamental o fornecimento de suporte psicológico para amenizar os efeitos da segunda vítima. Além disso, reconhecem a enfermeira da unidade e os professores como pontos de apoio para tranquilizá-los em qualquer situação, tais como para revisar e orientar sobre a forma mais adequada de conduzir os cuidados de enfermagem:

Eu pensei bem isso, no apoio psicológico e, no caso ali, do quase erro, seria rever a técnica com as professoras [...]. (E3)

Muitas vezes, nós estamos com dilemas, nos sentimos inseguros quando estamos ali no estágio. Agora, dessa vez que nós fomos sem as supervisoras da universidade, eu me senti bastante insegura, ainda bem que tinha os enfermeiros lá pra nos passar segurança, mas acho que é muito importante esse suporte psicológico pra nos ajudar também [...]. (E12)

Eu acho que as pessoas precisam sim de um apoio, tanto das professoras como da enfermeira da unidade. Se eu fizer alguma coisa de errado, alguém vai vim me corrigir, mas também, se a pessoa souber me explicar, conversar, vai fazer eu me sentir melhor, eu não vou me sentir tão culpada por ter causado um dano no paciente, se tu vieres falar comigo, me explicar como eu poderia ter feito, o que eu poderia fazer, vai me ajudar sim. (E20)

[...] porque quando tu fazes uma coisa errada, tu te culpas muito e se vir alguém tentando redimir a culpa, te ajudando, dizendo que tu podia fazer assim, dá uma aliviada [...]. (E20)

Outro achado importante foi a deficiência de suporte organizacional ou protocolo estabelecido entre as instituições de ensino e de saúde para atender o estudante vítima dos efeitos de erro ou quase erro. Percebe-se que o aluno desconhece quais são suas fontes de apoio ou recursos, o que aumenta a sua sensação de vulnerabilidade:

[...] eu sei que tem no hospital, as psicólogas e na universidade já ofereceram também. Eu conheço colegas que se consultavam, eu não sei como é que esta agora, mas que elas faziam acompanhamento com psicólogo na universidade. (E12)

[...] não que eu me lembre assim, mas eu acho que eu já ouvi alguma coisa, sobre algum apoio, o nome eu não sei exatamente, mas eu já ouvi [...]. (E20)

Eu não sei de nenhum suporte para o aluno, acho que ninguém da minha turma nunca precisou. Eu sei que a Pró-Reitoria tem alguns psicólogos quando os alunos precisam, tu fazes um cadastro e eles dão esse apoio psicológico para os alunos. (E23)

Observou-se que, apesar de compartilharem dos mesmos sentimentos, insegurança e desejo de um suporte organizacional adequado para atendimento nesses casos, os alunos apresentaram divergências quanto à concepção de quem seria o responsável por oferecer esse suporte:

Eu acho que o apoio deve partir dos dois, tanto do hospital como da universidade, principalmente da escola de enfermagem. (E23)

Eu acho que o suporte deve ser primeiro da escola de enfermagem, deve acompanhar esse aluno e ver o que está acontecendo porque que aconteceu isso, tu não estavas num dia bom, como está teu psicológico [...]. (E22)

Eu acho que só a universidade que deve dar esse suporte, na minha cabeça só a universidade. Porque a ligação que a gente tem é com a universidade, a relação que a gente tem é com a universidade então, eu acredito que é só a universidade [...]. (E22)

DISCUSSÃO

Durante a formação, os estudantes de enfermagem se deparam com uma realidade diferente de suas expectativas, em que há sistemas de saúde complexos, sucateados, exaustivas jornadas de trabalho e escassez de recursos humanos e materiais. Esses entraves são responsáveis por diminuir a segurança e confiança dos alunos em desempenharem seu papel, além de contribuírem para um cuidado inseguro, na medida em que favorecem a ocorrência de erros provenientes da assistência ao paciente e, consequentemente, podem torná-los vítimas dos seus próprios erros(1616 Tartaglia A, Matos MAA. Second victim: after all, what is this?. Einstein. 2020;18:eED5619. https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2020ED5619
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).

Na Bélgica, estudo com 844 estudantes de enfermagem evidenciou que um terço (38,4%) deles se envolveu em incidentes de segurança do paciente e, destes, 84,7% apresentaram sintomas do fenômeno da segunda vítima. Os sintomas mais relatados pelos estudantes foram hipervigilância, estresse e dúvidas sobre seus conhecimentos e habilidades. Concluiu-se que os estudantes podem se tornar a segunda vítima diante de incidentes de segurança do paciente e que merecem receber um suporte respeitoso e adequado para alívio desses sintomas(1717 L Van Slambrouck, R Verschueren, D Seys, et al. Second victims among baccalaureate nursing students in the aftermath of a patient safety: an exploratory cross-sectional study. J Profess Nurs. 2021;37(4):765-70. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
).

Ainda, a maioria dos estudantes da Bélgica identificaram como primeiro apoio a enfermeira da equipe e os professores da disciplina. Para eles, o apoio dos colegas da equipe, inclusive médico, parecia ser mais importante do que conversar com amigos e família(1717 L Van Slambrouck, R Verschueren, D Seys, et al. Second victims among baccalaureate nursing students in the aftermath of a patient safety: an exploratory cross-sectional study. J Profess Nurs. 2021;37(4):765-70. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
). Esses dados corroboram os resultados da presente investigação, visto que, quando questionados sobre o suporte recebido durante o envolvimento em um incidente, os participantes citaram, primeiramente, os colegas de turma, em seguida o professor da disciplina de prática ou estágio e, por último, a enfermeira da unidade.

O fato de terem recorrido primeiramente aos seus colegas e professores sugere uma lacuna de relacionamento com a equipe de saúde. O direcionamento imediato aos colegas evidencia o entendimento dos estudantes de que seus amigos são pontos de desabafo, com os quais esperam aliviar seu sofrimento, pois se identificam com essas pessoas e acreditam que não farão julgamentos. Esses achados são semelhantes aos encontrados em estudo realizado na China, no qual os estudantes de enfermagem demonstraram que discutir o incidente com colegas e profissionais, especialmente aqueles que tiveram experiências semelhantes, os deixou mais relaxados(1818 Huang H, Chen J, Xiao M, Cao S, Zhao Q. Experiences and responses of nursing students as second victims of patient safety incidents in a clinical setting: a mixed-methods study. J Nurs Manag. 2020;28:1317-25. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
).

No que diz respeito ao apoio do professor, algumas vezes, o aluno pode se sentir intimidado para relatar o erro, por vergonha e medo de sofrer retaliações ou consequências negativas associadas ao rendimento acadêmico. No entanto, quando encontram boa abertura para relatar o incidente de segurança do paciente, e são recebidos sem julgamento pelos professores, esse apoio torna-se determinante para promoção de bem-estar físico e mental, assim como para mitigação dos impactos negativos desta experiência no processo de formação(1818 Huang H, Chen J, Xiao M, Cao S, Zhao Q. Experiences and responses of nursing students as second victims of patient safety incidents in a clinical setting: a mixed-methods study. J Nurs Manag. 2020;28:1317-25. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
-1919 Dukhanin V, Edrees HH, Connors CA, Kang E, Norvell M, Wu AW. Case: a second victim support program in pediatrics: successes and challenges to implementation. J Pediatr Nurs. 2018;41:54-9. https://doi.org/10.1016/j.pedn.2018.01.011
https://doi.org/10.1016/j.pedn.2018.01.0...
).

Quanto maior o envolvimento dos profissionais com o paciente, maior o grau de impacto. Considerando a gravidade e extensão dos impactos psicológicos, físicos e psicossociais que o fenômeno da segunda vítima pode causar nos acadêmicos de enfermagem, torna-se imprescindível que as instituições de saúde e as de ensino ofereçam suporte a essas vítimas, com o intuito de modificar e atenuar os sintomas e atitudes dos estudantes(1717 L Van Slambrouck, R Verschueren, D Seys, et al. Second victims among baccalaureate nursing students in the aftermath of a patient safety: an exploratory cross-sectional study. J Profess Nurs. 2021;37(4):765-70. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
).

Observa-se que o psicológico dos estudantes foi o que se mostrou mais impactado após a ocorrência de incidentes de segurança do paciente, e isso pode ser verificado nas respostas dos estudantes, que relataram o suporte psicológico como o mais importante. Nesse sentido, os resultados são semelhantes aos encontrados em estudo realizado na China, que investigou o grau do fenômeno da segunda vítima e o processo de reabilitação entre 147 estudantes, sendo que a maioria confirmou ter apresentado sofrimento psicológico expresso por medo, remorso, preocupação e constrangimento por muito tempo(1717 L Van Slambrouck, R Verschueren, D Seys, et al. Second victims among baccalaureate nursing students in the aftermath of a patient safety: an exploratory cross-sectional study. J Profess Nurs. 2021;37(4):765-70. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
).

Destaca-se que o acompanhamento pelo psicólogo foi o único recurso de suporte formal identificado pelos estudantes de enfermagem neste estudo. Segundo a literatura, a oferta deste suporte é limitada nos serviços de saúde, sobretudo por falha na identificação das possíveis segundas vítimas, intervenções de apoio insuficientes e ausência de uma cultura de segurança do paciente(2020 Quillivan RR, Burlison JD, Browne EK, Scott SD, Hoffman JM. Patient safety culture and the second victim phenomenon: connecting culture to staff distress in nurses. Jt Comm J Qual Patient Saf. 2016;42(8):377-86. https://doi.org/10.1016/s1553-7250(16)42053-2
https://doi.org/10.1016/s1553-7250(16)42...

21 Stewart K, Lawton R, Harrison R. Supporting "second victims" is a system-wide responsibility. BMJ. 2015;350:h2341. https://doi.org/10.1136/bmj.h2341
https://doi.org/10.1136/bmj.h2341...

22 Tsao K, Browne M. Culture of safety: a foundation for patient care. Semin Pediatr Surg. 2015;24(6):283-7. https://doi.org/10.1053/j.sempedsurg.2015.08.005
https://doi.org/10.1053/j.sempedsurg.201...
-2323 Zhang X, Li Q, Guo Y, Lee SY. From organisational support to second victim-related distress: Role of patient safety culture. J Nurs. 2019; 27(8):1818-1825. https://doi.org/10.1111/jonm.12881.
https://doi.org/10.1111/jonm.12881...
). Apesar do apoio entre colegas e professores durante o incidente ser considerado adequado para aliviar o sofrimento dos estudantes, eles reconhecem que há uma orientação limitada da instituição de ensino e da instituição de saúde(1818 Huang H, Chen J, Xiao M, Cao S, Zhao Q. Experiences and responses of nursing students as second victims of patient safety incidents in a clinical setting: a mixed-methods study. J Nurs Manag. 2020;28:1317-25. https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021.04.010
https://doi.org/10.1016/j.profnurs.2021....
).

Nas escolas de enfermagem dos Estados Unidos, os eventos adversos envolvendo estudantes de enfermagem são tratados de forma diferenciada. Identificou-se que a maneira como cada escola lida com a questão do EA pode variar desde situações de aconselhamento até a possibilidade de exclusão do estudante dos estágios(2424 Disch J, Barnsteiner J, Connor S, Brogren F. CE: Original research: exploring how nursing schools handle student errors and near misses. Am J Nurs. 2017;117(10):24-31. https://doi.org/10.1097/01.naj.0000525849.35536.74
https://doi.org/10.1097/01.naj.000052584...
). Algumas utilizam um tipo de formulário para que o aluno relate o acontecimento e reflita sobre possibilidades de prevenir o erro, outros recebem apenas aconselhamento ou advertência pelo professor, há situações em que são convidados a realizar uma revisão da literatura sobre o tópico e, nos casos em que o EA levou o paciente a óbito, o aluno pode ser dispensado do estágio(2424 Disch J, Barnsteiner J, Connor S, Brogren F. CE: Original research: exploring how nursing schools handle student errors and near misses. Am J Nurs. 2017;117(10):24-31. https://doi.org/10.1097/01.naj.0000525849.35536.74
https://doi.org/10.1097/01.naj.000052584...
).

A falta de protocolos instituídos contribui para o não reconhecimento, por parte dos estudantes, de recursos de suportes disponíveis. Nos Estados Unidos, 19% dos estudantes de enfermagem relataram ausência de suporte do hospital, porém identificavam oferta de apoio por parte da universidade e professores. Além disso, 7% mencionaram variedade na forma de lidar com esse evento, de tal modo que não conseguiam identificar precisamente esse tipo de suporte. Grande parte das escolas, 55%, não possuía uma política para gerenciar o aluno após o EA, tampouco dispunham de qualquer ferramenta para relatar erros ou quase erros(2424 Disch J, Barnsteiner J, Connor S, Brogren F. CE: Original research: exploring how nursing schools handle student errors and near misses. Am J Nurs. 2017;117(10):24-31. https://doi.org/10.1097/01.naj.0000525849.35536.74
https://doi.org/10.1097/01.naj.000052584...
).

Infelizmente, constata-se que na maioria das escolas de ensino e instituições de saúde o recurso de apoio para os profissionais e prestadores de cuidados não está disponível. Algumas razões sustentam essa lacuna: a não identificação, por parte do corpo docente, da oferta deste apoio como uma prioridade ou um problema; falta de ciência sobre as ocorrências; ou entendimento de que as políticas atuais são suficientes para lidar com a situação(2424 Disch J, Barnsteiner J, Connor S, Brogren F. CE: Original research: exploring how nursing schools handle student errors and near misses. Am J Nurs. 2017;117(10):24-31. https://doi.org/10.1097/01.naj.0000525849.35536.74
https://doi.org/10.1097/01.naj.000052584...
).

Identifica-se, na literatura internacional, uma série de estratégias de apoio utilizadas para fornecer suporte aos profissionais da área da saúde que desenvolvem sintomas associados à segunda vítima. Podem ser destacados os seguintes programas: forYOU, desenvolvido pela University of Missouri(2525 Edrees HH, Wu AW. Does one size fit all? assessing the need for organizational second victim support programs. J Patient Saf. 2021;17(3):e247-e254. https://doi.org/10.1097/pts.0000000000000321
https://doi.org/10.1097/pts.000000000000...
), Resilience in Stressful Events (RISE), do Johns Hopkins Hospital(2626 Pratt S, Kenney L, Scott SD, Wu AW. How to develop a second victim support program: a toolkit for health care organizations. Jt Comm J Qual Patient Saf. 2012;38(5):235-193. https://doi.org/10.1016/s1553-7250(12)38030-6
https://doi.org/10.1016/s1553-7250(12)38...
) e o Medically Induced Trauma Support Services-MITSS(2727 Ullstrom S, Andreen SM, Hansson J, Ovretveit J, Brommels M. Suffering in silence: a qualitative study of second victims of adverse events. British Med J. 2014;23(4):325-31. https://doi.org/10.1136/bmjqs-2013-002035
https://doi.org/10.1136/bmjqs-2013-00203...
), além de ações e intervenções individuais e coletivas(2828 White RM, Delacroix R. Second victim phenomenon: is 'just culture' a reality? an integrative review. Appl Nurs Res. 2020;56:151319. https://doi.org/10.1016/j.apnr.2020.151319
https://doi.org/10.1016/j.apnr.2020.1513...
-2929 Cohen DL, Stewart KO. The stories clinicians tell: achieving high reliability and improving patient safety. Perm J. 2016;20(1):85-90. https://doi.org/10.7812/TPP/15-039
https://doi.org/10.7812/TPP/15-039...
).

Limitação do estudo

Como em todo estudo, este também possui pontos fortes e pontos fracos. Acredita-se que, por se tratar de um estudo transversal e, ainda, de um tema que resgata sentimentos negativos ou constrangimento para os estudantes, a memória pode ter levado ao esquecimento ou podem ter ocorrido gaps em algumas respostas. Ademais, a falta de um protocolo definido para fornecer suporte ao aluno e o desconhecimento de qualquer tipo de fluxo dentro das instituições limitaram os achados desta investigação. Por outro lado, essas limitações convidam para o desenvolvimento de mais pesquisas no cenário brasileiro, a fim de investigar o fenômeno da segunda vítima não somente entre estudantes de enfermagem, mas com um olhar ampliado para as outras áreas da saúde.

Contribuições para a área

Essas estratégias podem ser utilizadas como referências pelas instituições, para adaptar suportes e oferecê-los aos estudantes. É preciso compreender que, da mesma forma como esse fenômeno acomete os enfermeiros e profissionais da saúde, os estudantes de enfermagem também podem ser prejudicados nas esferas pessoal, acadêmica e de construção da identidade profissional.

Pretende-se destacar a importância de aumentar a rede de apoio para a segunda vítima e a possibilidade de oferecer este apoio de diversas formas, por exemplo, a partir de uma conversa ou discussão com os estudantes que vivenciaram um incidente de segurança do paciente para ajudá-los a reorganizar suas ideias e aprender a partir dos seus erros, com o intuito de minimizar os efeitos do fenômeno. Ademais, faz-se importante conscientizar toda população, pacientes e família, a respeito de como o apoio e a compreensão podem ser fundamentais para minimizar os sintomas entre os estudantes. O esforço, portanto, deve ser no sentido de fortalecer a cultura de segurança do paciente não somente entre as organizações, mas em toda a sociedade(3030 Coughlan B, Powell D, Higgins MF. The second victim: a review. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2017;213:11-6. https://doi.org/10.1016/j.ejogrb.2017.04.002
https://doi.org/10.1016/j.ejogrb.2017.04...
-3131 Mcdaniel L, Morris C. The Second Victim Phenomenon: How Are Midwives Affected? J Midwifery Women’s Health. 2020;65(4):503-11. https://doi.org/10.1111/jmwh.13092
https://doi.org/10.1111/jmwh.13092...
).

Estudos internacionais têm implementado estratégias de suporte aos trabalhadores e alunos para enfrentamento das situações envolvendo incidentes e EAs. A National Quality Forum, agência de pesquisa de cuidado em saúde e qualidade, e outras organizações de saúde recomendam que todas as organizações incorporem programas de apoio aos prestadores de serviço à saúde como segunda vítima(3232 Chung AS, Smart J, Zdradzinski M. Educator toolkits on second victim syndrome, mindfulness and meditation, and positive psychology: the 2017 resident wellness consensus summit. West J Emerg Med. 2018;19(2):327-31. https://doi.org/10.5811/cpcem.2017.11.36179
https://doi.org/10.5811/cpcem.2017.11.36...
). Ressalta-se, portanto, que a responsabilidade pelo cuidado e bem-estar dos pacientes, familiares, profissionais de saúde e estudantes da instituição é das organizações de saúde(2020 Quillivan RR, Burlison JD, Browne EK, Scott SD, Hoffman JM. Patient safety culture and the second victim phenomenon: connecting culture to staff distress in nurses. Jt Comm J Qual Patient Saf. 2016;42(8):377-86. https://doi.org/10.1016/s1553-7250(16)42053-2
https://doi.org/10.1016/s1553-7250(16)42...
,3131 Mcdaniel L, Morris C. The Second Victim Phenomenon: How Are Midwives Affected? J Midwifery Women’s Health. 2020;65(4):503-11. https://doi.org/10.1111/jmwh.13092
https://doi.org/10.1111/jmwh.13092...
-3232 Chung AS, Smart J, Zdradzinski M. Educator toolkits on second victim syndrome, mindfulness and meditation, and positive psychology: the 2017 resident wellness consensus summit. West J Emerg Med. 2018;19(2):327-31. https://doi.org/10.5811/cpcem.2017.11.36179
https://doi.org/10.5811/cpcem.2017.11.36...
).

Nesse ínterim, o Plano de Ação Global de Segurança do Paciente 2021-2030 fornece estratégias para evitar a ocorrência de erros na assistência à saúde e eliminar todas as possibilidades de risco tanto aos pacientes como para os profissionais de saúde. Dessa forma, foram estabelecidos neste plano sete princípios norteadores para desenvolvimento e implementação dessas ações, dos quais se destacam educação, engajamento e proteção aos profissionais de saúde, para que possam contribuir no projeto e entrega de um sistema de saúde seguro(3333 World Health Organization (WHO). Global patient safety action plan 2021-2030: towards eliminating avoidable harm in health care [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2021[cited 2022 Jan 20]. Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789240032705
https://www.who.int/publications/i/item/...
).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo apresenta caráter inédito no cenário brasileiro. Foi possível identificar as principais fontes de apoio nos casos em o estudante de enfermagem se envolve em incidentes de segurança do paciente e que os colegas de estágio e os professores são os primeiros a quem os estudantes recorrem nessas situações.

Além disso, identificou-se que não existem protocolos ou fluxos implantados, de modo que os estudantes não sabem como agir diante de um incidente. Alerta-se para a incipiência dos recursos de suporte oferecidos ao estudante de enfermagem, tanto nacional como internacionalmente, sendo premente o desenvolvimento de mais pesquisas direcionadas a essas potenciais vítimas, bem como recursos de suporte para mitigar esse fenômeno.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Priscilla Valladares Broca

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    26 Fev 2022
  • Aceito
    01 Jul 2022
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