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Grupo de apoio para famílias de crianças em unidade de terapia intensiva pediátrica

RESUMO

Objetivo:

Descrever o processo de criação e implementação de grupo de apoio às famílias de crianças em unidade de terapia intensiva pediátrica.

Métodos:

Relato de experiência profissional descrito mediante uma ferramenta de gerenciamento e planejamento.

Resultados:

Trata-se de iniciativa pioneira no hospital. A utilização da ferramenta possibilitou o delineamento do escopo, justificativa, local, frequência, responsáveis, abordagem e orçamento. Após sua implantação, o grupo está possibilitando interação significativa profissionais de saúde-famílias e famílias-famílias, favorecendo a formação de vínculo terapêutico e estimulando redes de apoio social e emocional.

Conclusão:

A ferramenta foi eficaz no planejamento do grupo e destacou os efeitos deste no enfrentamento familiar e nos relacionamentos entre profissionais e famílias.

Descritores:
Grupos de Apoio; Família; Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica; Criança Hospitalizada; Enfermagem Pediátrica

ABSTRACT

Objective:

To describe the process of creating and implementing a support group for families with children in a pediatric intensive care unit.

Methods:

A professional experience report described using a management and planning tool.

Results:

This is a pioneering initiative in the hospital. The application of the tool enabled the delineation of the scope, justification, location, frequency, responsible persons, approach, and budget. After its implementation, the group enables significant interaction between health professionals-families and families-families, favoring the formation of therapeutic bonds and stimulating social and emotional support networks.

Conclusion:

The tool effectively planned the group and highlighted its effects on family coping and the relationships between professionals and families.

Descriptors:
Self-help groups; Family; Intensive Care Units, Pediatric; Child, Hospitalized; Pediatric Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Describir el proceso de creación e implementación de equipo de apoyo a las familias de niños en unidad de cuidado intensivo pediátrico.

Métodos:

Relato de experiencia profesional descripto mediante una herramienta de gestión y planeamiento.

Resultados:

Se trata de iniciativa pionera en el hospital. La utilización de la herramienta posibilitó el delineamento del objetivo, justificativa, local, frecuencia, responsables, abordaje y presupuesto. Después de su implantación, el equipo está posibilitando interacción significativa profesionales de salud-familias y familias-familias, favoreciendo la formación de vínculo terapéutico y estimulando redes de apoyo social y emocional.

Conclusión:

La herramienta fue eficaz en el planeamiento del equipo y destacó los efectos de este en el enfrentamiento familiar y en la relaciones entre profesionales y familias.

Descriptores:
Grupos de Autoayuda; Familia; Unidades de Cuidado Intensivo Pediátrico; Niño Hospitalizado; Enfermería Pediátrica

INTRODUÇÃO

A unidade de terapia intensiva pediátrica (UTIP) é um local cercado por rotinas que restringem a família no cuidado direto à criança, o que pode ser assustador e ameaçador para os seus membros. Nesse contexto, a família busca por apoio para suportar a carga emocional e evitar o esgotamento. Esse suporte pode ser proveniente dos próprios familiares, da família extensa, dos amigos, das outras famílias que vivenciam situação semelhante, comunidade ou líder espiritual, com possibilidade de estender-se também aos membros da equipe de saúde (11 Hagstrom S. Family stress in pediatric critical care. J Pediatr Nurs. 2017;32:32-40. https://doi.org/10.1016/j.pedn.2016.10.007
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.

A rede social de apoio é compreendida como a soma de todas as relações que um indivíduo percebe como significativas ou diferenciadas da massa anônima da sociedade. Muitas dessas redes de apoio são formadas dentro do hospital, com ênfase no apoio familiar oferecido por profissionais e na rede formada entre as mães das crianças hospitalizadas, as quais interagem e somam forças, no intuito de apoiar a família no enfrentamento da doença da criança22 Molina RCM, Higarashi IH, Marcon SS. Importância atribuída à rede de suporte social por mães com filhos em unidade intensiva. Esc Anna Nery. 2014;18(1):60-7. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20140009
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.

O uso da tecnologia de grupos de apoio em pediatria tem sido adotada como uma forma útil de estimular a interação, fornecer apoio, viabilizar relações interpessoais e favorecer a adaptação à situação de ter uma criança hospitalizada na família. Além disso, propicia um espaço para expressão de sentimentos, necessidades, expectativas e angústias, estimulando a formação de redes de apoio social33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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.

Compreendendo os aspectos mencionados acima e considerando o contexto da unidade de terapia intensiva em que foi desenvolvido o estudo, foi identificada a necessidade de fornecer apoio, por iniciativa de enfermeiros da própria unidade, apoiando-se nos resultados de dois estudos nela conduzidos, nos quais foi evidenciada a falta de apoio e dificuldade de relacionamento entre equipe e família44 Moraes ES, Mendes-Castillo AMC. A experiência dos avós de crianças hospitalizadas em Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03395. https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017040003395
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-55 Silva CC, Souza MA, Cabeça LPF, Melo LL. Ways of being of nursing professionals in the pediatric intensive therapy: experiences with families. Rev Mineira de Enferm. 2020;24:e-1305. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20200042
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.

O primeiro dos estudos realizados na unidade foi conduzido com avós de crianças hospitalizadas e constatou que as demandas não atendidas são fontes de dor e sofrimento, especialmente a de não terem informações a respeito da saúde do neto44 Moraes ES, Mendes-Castillo AMC. A experiência dos avós de crianças hospitalizadas em Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03395. https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017040003395
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. O segundo, desenvolvido com base nas vivências de profissionais de enfermagem em relação à presença da família na unidade, revelou que a inclusão desses membros no cuidado não ocorre de fato, pois a equipe de enfermagem transparece que não compreende verdadeiramente a importância da família55 Silva CC, Souza MA, Cabeça LPF, Melo LL. Ways of being of nursing professionals in the pediatric intensive therapy: experiences with families. Rev Mineira de Enferm. 2020;24:e-1305. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20200042
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. Nesse cenário, as famílias não possuíam qualquer tipo de estratégia de apoio, acolhimento nem recursos para a permanência em tempo integral junto da criança.

Dessa forma, após a identificação da necessidade de modificações na unidade, foi necessária a utilização de uma ferramenta de gestão de qualidade para viabilizar as ações gerenciais e delinear o planejamento de uma ação. Nesse sentido, a 5W2H foi a ferramenta escolhida. Ela pode ser utilizada em diversas áreas para análise e resolução de problemas, operacionalização de projetos, plano de ação e de melhoria66 Seleme R, Stadler. Controle da qualidade: as ferramentas essenciais. Curitiba: IBPEX; 2008.; e tem sido amplamente usada pela enfermagem como facilitadora para a implementação das ações de melhoria, sendo fundamental para definição de padrões assistenciais e gerenciais.

OBJETIVO

Descrever o processo de criação e implementação de grupo de apoio às famílias de crianças em unidade de terapia intensiva pediátrica.

MÉTODOS

Trata-se de um relato de experiência profissional sobre a criação e implementação do grupo de apoio em uma UTIP de hospital-escola, de uma universidade no interior do estado de São Paulo (SP), que conta atualmente com 20 leitos. Nessa unidade, durante a hospitalização da criança, a presença da família ocorre no período diurno, sendo permitido apenas um acompanhante familiar. Há também dois horários de visita diários, das 11h às 12h e das 16h às 17h, permitindo-se até duas pessoas por horário.

A criação do grupo se deu após a análise dos resultados de dois estudos conduzidos na unidade, que estimularam as enfermeiras a promover uma intervenção com objetivo de atender a demandas de cuidado das famílias de crianças em UTIP44 Moraes ES, Mendes-Castillo AMC. A experiência dos avós de crianças hospitalizadas em Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03395. https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017040003395
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-55 Silva CC, Souza MA, Cabeça LPF, Melo LL. Ways of being of nursing professionals in the pediatric intensive therapy: experiences with families. Rev Mineira de Enferm. 2020;24:e-1305. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20200042
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. Inicialmente, foram realizadas reuniões com a equipe multiprofissional da unidade, chefias e docentes para apresentar a proposta e delinear as etapas de sua execução.

A implantação do grupo foi descrita de acordo com a ferramenta de gerenciamento e de planejamento chamada 5W2H. Ferramentas de gerenciamento como esta são provenientes dos estudos de administração; ela realiza o gerenciamento eficaz bem como registra de maneira sistemática e ordenada os fluxos de trabalho e ações para o desenvolvimento de pequenos ou grandes projetos. É um plano de ação qualificado, estruturado e prático, com etapas bem definidas, a saber: a etapa “o quê” (what) define o delineamento do escopo; “por quê” (why) estabelece a justificativa da intervenção; “onde” (where) define o local em que será realizado; “quando” (when) refere-se à frequência de realização da intervenção; “quem” (who) determina os responsáveis por conduzir as atividades; “como” (how) apresenta as estratégias de abordagem; e a etapa “custos” (how much) prevê o orçamento necessário66 Seleme R, Stadler. Controle da qualidade: as ferramentas essenciais. Curitiba: IBPEX; 2008..

Esta é uma iniciativa pioneira no referido hospital e foi iniciada em novembro de 2017, destinada a todos os familiares que estivessem presentes no ambiente hospitalar e desejassem participar da atividade. O plano de ação, conhecido e aprovado pela diretoria da unidade, compreendeu as seguintes etapas:

Quadro 1
Etapas da ferramenta 5W2H para implementação do grupo de apoio, Campinas, São Paulo, Brasil, 2021(6)

RESULTADOS

A ferramenta 5W2H possibilitou a operacionalização da ideia inicial, sendo capaz de delimitar e subsidiar todos as etapas necessárias para sua implantação, prevendo desde o objetivo, responsáveis, local, atividades que seriam realizadas bem como o orçamento necessário para o desenvolvimento e manutenção das atividades semanais, com o intuito de observar falhas que pudessem impedir a adequada implementação do projeto.

A gestão e organização do grupo são realizadas por duas das enfermeiras líderes e contemplam a elaboração de cronogramas mensais que ofertem as diversas atividades, de modo a atender às demandas das famílias, ressaltando a importância da multidisciplinaridade, ainda que haja momentos particulares com cada um dos diferentes profissionais envolvidos. As organizadoras também são responsáveis pela reserva e agendamento do local, divulgação semanal das atividades, gerenciamento dos recursos financeiros e materiais.

Desde a sua implantação, já ocorreram 120 encontros do grupo. A cada vez, todos os membros da família são incentivados pelos profissionais de saúde a participar. Embora já tenha havido a participação de pais e avós, a mais expressiva é das mães. Em relação à frequência de participação, para cada encontro houve em torno de 80% a 100% dos familiares presentes durante a hospitalização da criança, isto é, de 16 a 20 familiares por encontro.

As atividades desenvolvidas pelo grupo envolvem diversos temas. Há encontros cujos objetivos são da ordem do compartilhamento de informações. São esclarecidas as principais dúvidas dos participantes, as quais costumam ser sobre normas e rotinas da instituição e também em relação a termos médicos, dispositivos e tratamento. Nesses encontros, todos os membros da equipe multiprofissional participam.

Outros encontros são realizados com o propósito de fortalecer a religiosidade e espiritualidade, e isso ocorre por meio de cultos ecumênicos, comandados pela equipe da capelania. Há também as reuniões estruturadas no formato de rodas de conversa e dinâmicas de grupo, utilizadas para acolhimento, integração e expressão de sentimentos, sendo conduzidas tanto pelos enfermeiros quanto por psicólogos e fisioterapeutas.

Ainda, outra importante atividade do grupo consiste na realização de oficinas de artesanatos dirigidas por membros da equipe de enfermagem. Nelas, diversos materiais são elaborados, sendo alguns destinados às próprias crianças da UTIP, como máscaras de personagens e acessórios (laços e gravatas). Ademais, para outros membros familiares, são confeccionados itens como chaveiros, móbiles, bijuterias, flores em tecido, bordados simples, conforme demonstrado na Figura 1. As oficinas dessa natureza têm se mostrado uma excelente ferramenta de distração, bem como de expressão de sentimentos e angústias. Cabe também mencionar as reuniões dirigidas pelas fisioterapeutas, em que o objetivo é voltado ao relaxamento e alongamento muscular.

Figura 1
Alguns dos produtos desenvolvidos nas oficinas de artesanato, Campinas, São Paulo, Brasil, 2021

Dedicamos atenção especial para as atividades em datas comemorativas, como Natal, Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia das Crianças e Páscoa, com a intenção de oferecer conforto como um modo de diminuir os sentimentos de tristeza comumente intensificados nessas ocasiões. Para isso, usualmente associamos momentos de religiosidade com pequenos artesanatos, ou utilizamos pequenos presentes, de valor emocional, como cartões confeccionados pelos acompanhantes, fotos das crianças fantasiadas, em que a máscara da fantasia foi elaborada pela própria família, juntamente com homenagens realizadas por toda equipe multiprofissional de saúde envolvida nas atividades.

Dentre o amplo espectro de atividades que são possíveis e têm sido realizadas nos encontros do grupo, as que mais ocorreram desde a sua criação foram as oficinas de artesanato, seguidas de reuniões informativas e de compartilhamento de informação. Vale ressaltar que, embora a idealização inicial dos encontros tenha sido a de concentrar as atividades para as reuniões informativas, algumas outras atividades surgiram por demanda das famílias envolvidas: momentos de cuidados de beleza, como fazer as unhas; e momentos de recreação, como projeção de filmes e bingos realizados com doações das próprias famílias envolvidas. Esse direito das famílias de participar no planejamento das atividades é importante já que são protagonistas e receptoras de tais ações de cuidado.

Como resultados dos encontros, podemos destacar: a oportunidade de esclarecimento de dúvidas com relação à hospitalização; o desenvolvimento de interação e vínculo terapêutico entre profissionais e família e entre as famílias; apoio; e a facilitação de formação de rede de suporte entre as famílias.

Dessa forma, o grupo incentivou a equipe de saúde a ser sensível e atenta às necessidades das famílias, identificando e sendo capaz de oferecer apoio e suporte necessários. Devido a essas interações, o relacionamento entre as famílias e a equipe clínica apresentou significativa melhora, observada pelos membros da equipe por meio de menos obstáculos e barreiras de relacionamento com as famílias, bem como redução de demandas em ouvidoria.

Além disso, o grupo também possibilitou interação entre as próprias famílias, proporcionando momentos de comunicação e convívio, facilitando a formação de redes de apoio social mútuas durante a hospitalização e que, não raro, persistem mesmo após a alta hospitalar ou transferência da criança.

Nos primeiros encontros após a implementação do grupo, encontramos resistência de algumas famílias em participar, especialmente as recém-admitidas na unidade. Entretanto, esse entrave foi gerenciado pelos organizadores do grupo por meio de divulgação das atividades e também dos desfechos do grupo, visando incentivar a participação. Apesar desses esforços da equipe, cabe ressaltar que, sem dúvida, o fator mais relevante para melhorar a adesão veio com o tempo, mediante os relatos de famílias que já haviam participado das reuniões e que incentivaram outras famílias.

DISCUSSÃO

A comunicação e o compartilhamento de informações são necessidades das famílias no contexto da hospitalização da criança, sendo que falhas nesse processo podem causar ansiedade e medo. Os pais esperam e precisam de feedback regular e frequente sobre o progresso e condição do filho e entendem como parte de seu papel parental adquirir informações sobre o tratamento da criança66 Seleme R, Stadler. Controle da qualidade: as ferramentas essenciais. Curitiba: IBPEX; 2008..

Estudos desenvolvidos com grupos de pais de crianças em unidade intensiva neonatal e pediátrica evidenciaram que esse espaço foi identificado como uma oportunidade para o esclarecimento de dúvidas da família sobre as condições clínicas do filho e procedimentos que são realizados para o tratamento. As informações por parte dos profissionais possibilitam aos membros da família se sentirem seguros para assim organizar a vida emocional, mobilizando recursos internos para o enfrentamento da situação33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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,77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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Nesses momentos de compartilhamento de informações e esclarecimento de dúvidas, as famílias participantes observaram o comportamento e as reações de outras famílias que passam por experiências semelhantes e identificaram-se com os problemas dos outros. Esses estudos demonstraram que a família atribui significado positivo ao participar do grupo, se identificando com as dúvidas de outros participantes e alcançando o esclarecimento necessário33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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,77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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-88 Hillier A, Torg E. Parent participation in a support group for families with transgender and gender-nonconforming children: “Being in the company of others who do not question the reality of our experience”. Transgend Health. 2019;4(1):168-75. https://doi.org/10.1089/trgh.2018.0018
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Nesse sentido, as famílias elaboram estratégias para enfrentar o adoecimento do filho; assim, quase que instintivamente, estabelecem novos relacionamentos no hospital e passam a conviver com outras famílias. Criam vínculos de amizade, tornam-se solidárias e, nesse exercício de solidariedade, compadecem-se do sofrimento do outro, ao mesmo tempo que buscam consolar-se mutuamente22 Molina RCM, Higarashi IH, Marcon SS. Importância atribuída à rede de suporte social por mães com filhos em unidade intensiva. Esc Anna Nery. 2014;18(1):60-7. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20140009
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Dessa forma, ocorre a construção de rede de apoio social comum, para que possam atravessar esse período doloroso da hospitalização dos filhos. Esse processo de consolo e apoio recíproco tem sido evidente nos grupos de apoio44 Moraes ES, Mendes-Castillo AMC. A experiência dos avós de crianças hospitalizadas em Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03395. https://doi.org/10.1590/s1980-220x2017040003395
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Os familiares referem que, ao compartilharem suas experiências durante as atividades do grupo de apoio, acabam se fortalecendo por conseguirem perceber o “outro” que está ao seu lado, potencializando as forças da coletividade77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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. O grupo torna-se um espaço de troca de experiências no qual as famílias identificam-se umas com as outras, aprendem com a vivência de outras famílias, tornando-se mais calmas e mais seguras ao perceberem que outras já passaram pelos mesmos problemas e os superaram33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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. Assim, o apoio mútuo constitui-se em uma estratégia capaz de propiciar o desenvolvimento de novas expectativas, reforçando a esperança diante das situações difíceis22 Molina RCM, Higarashi IH, Marcon SS. Importância atribuída à rede de suporte social por mães com filhos em unidade intensiva. Esc Anna Nery. 2014;18(1):60-7. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20140009
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A troca de experiências, o apoio mútuo e o compartilhamento de informações também estiveram presentes em grupos em situações além da hospitalização. Um estudo recente descreve a importância do grupo de apoio para pais de crianças transgênero, uma vez que os familiares adquiriram e compartilharam conhecimento sobre os aspectos médicos, legais e políticos da paternidade de uma criança trans. Nesses momentos, os familiares entraram em contato com as experiências de outros pais, genitores de filhos mais velhos, e isso os ajudou a compreender intelectualmente as escolhas, possibilitando discussões sobre questões complexas88 Hillier A, Torg E. Parent participation in a support group for families with transgender and gender-nonconforming children: “Being in the company of others who do not question the reality of our experience”. Transgend Health. 2019;4(1):168-75. https://doi.org/10.1089/trgh.2018.0018
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O apoio emocional é um dos maiores impactos dos grupos de apoio, sendo o mais frequentemente citado pelos participantes em diversos cenários33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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,77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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8 Hillier A, Torg E. Parent participation in a support group for families with transgender and gender-nonconforming children: “Being in the company of others who do not question the reality of our experience”. Transgend Health. 2019;4(1):168-75. https://doi.org/10.1089/trgh.2018.0018
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9 Mitwalli S, Rabaia Y, Kienzler H. Support groups for mothers of children with a handicap: a quantitative and qualitative study. Lancet. 2018;391(Suppl 2):S47. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)30413-6
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-1010 Lauritzen J, Bjerrum MB, Pedersen PU, Sørensen EE. Support groups for carers of a per-son with dementia who lives at home: a focused ethnographic study. J Adv Nurs. 2019;75:2934-42. https://doi.org/10.1111/jan.14151
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. No grupo de apoio para familiares de crianças trans, os pais relataram esse suporte como principal desfecho do grupo, por terem a chance de ouvir os outros e compartilhar suas próprias experiências, o que os ajudou a reduzir a ansiedade e o sentimento de medo, percebendo que não estão sozinhos. Os participantes descreveram os outros pais do grupo de apoio como amigos, “família escolhida” e como parte de sua rede de apoio, assim como relataram que se sentiram felizes em poder compartilhar experiências, sendo que essas relações foram descritas como especialmente importantes88 Hillier A, Torg E. Parent participation in a support group for families with transgender and gender-nonconforming children: “Being in the company of others who do not question the reality of our experience”. Transgend Health. 2019;4(1):168-75. https://doi.org/10.1089/trgh.2018.0018
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Nesse sentido, o apoio emocional é destacado em grupos de apoio para mães de crianças com deficiência, que experimentaram o alívio do estresse na troca de experiências e na sugestão de possíveis soluções em ambiente de cuidado e confiança, além de identificarem a necessidade de momentos de diversão para a melhoria do bem-estar99 Mitwalli S, Rabaia Y, Kienzler H. Support groups for mothers of children with a handicap: a quantitative and qualitative study. Lancet. 2018;391(Suppl 2):S47. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)30413-6
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Estudo conduzido com grupo de apoio para cuidadores de pacientes com demência revelou a interação positiva entre os familiares, o que proporcionou melhora do humor, bem-estar e, também, influenciou positivamente a autoestima, permitindo que os cuidadores lidassem melhor com o cuidar. O processo de discutir experiências positivas no grupo ajudou a manter a motivação e o senso de significado dos cuidadores para continuar prestando os cuidados1010 Lauritzen J, Bjerrum MB, Pedersen PU, Sørensen EE. Support groups for carers of a per-son with dementia who lives at home: a focused ethnographic study. J Adv Nurs. 2019;75:2934-42. https://doi.org/10.1111/jan.14151
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O grupo é um espaço de cuidado ofertado à família para além dos aspectos já mencionados de informação, apoio emocional e suporte social, permitindo também a aproximação dos profissionais de saúde com a família, favorecendo as relações de confiança e ajudando os membros familiares a lidar com os estresses emocionais decorrentes da hospitalização. Assim, eles sentem-se valorizados pela equipe, o que propicia o aumento do vínculo entre ambas as partes77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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Em nossa prática, o grupo de apoio para as famílias proporcionou maior comunicação delas com a equipe e, consequentemente, o desenvolvimento de interações que favorecem a criação de vínculos. Ademais, possibilitou oportunidades e incentivou a equipe a ser mais atenta às necessidades das famílias. Essa realidade também foi descrita em um estudo realizado com grupo de pais em unidade neonatal. O grupo foi caracterizado como cenário facilitador da interação com os profissionais, permitindo que a família se aproximasse destes, tornando a interação próxima e construindo relação de confiança33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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O grupo deste presente estudo foi criado com caráter multidisciplinar, assim como em outros estudos, pela importância das diferentes visões, por facilitar e aprimorar o esclarecimento das dúvidas - já que é possível acessar diretamente os diversos profissionais de saúde - e pela relevância de envolver toda a equipe na rede de apoio e vínculo33 Balbino FS, Yamanaka CI, Balieiro MMFG, Mandetta MA. Grupo de apoio aos pais como uma experiência transformadora para a família em unidade neonatal. Esc Anna Nery. 2015;19(2):297-302. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20150040
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,77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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. Após sua implementação, notou-se maior interesse dos profissionais que ainda não estavam envolvidos, sensibilizando-os para participarem das atividades.

O processo de implantação evidenciou a resistência de algumas famílias à participação, especialmente aquelas recém-admitidas na unidade. Como evidência disso, estudo desenvolvido em UTIP relata realidade semelhante, o que se deve a diferentes motivos, tais como não querer deixar a criança sozinha, não conseguir se afastar, não saber como funciona, ou ainda, não querer ou não conseguir falar sobre a experiência que estão vivenciando77 Hiiling MG, Ribeiro NRR. Grupo de pais da unidade de terapia intensiva pediátrica: percepção dos familiares. Cienc Cuid Saude. 2012;11(1):58-65. https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v11i1.18859
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.

Entretanto, observou-se que o convite semanal a todas as famílias e a divulgação do grupo em locais onde elas permaneciam têm surtido efeito positivo e melhorado a adesão aos encontros. Cabe salientar também a importância da divulgação e do convite realizado entre os próprios familiares, em que um membro convida o outro, apresentando-lhe o grupo de apoio e os benefícios vivenciados, reforçando, assim, a importância da rede social de apoio desenvolvida no ambiente hospitalar e estimulada pelas ações do grupo.

Limitações do estudo

Trata-se de um relato de experiência profissional, baseado no processo de criação e implementação de um grupo de apoio, portanto são necessários estudos que busquem compreender a perspectiva de profissionais e familiares sobre sua experiência e sobre os desfechos.

Contribuições para enfermagem

Acredita-se que este estudo possa contribuir para a enfermagem em diversas áreas de atuação ao fornecer uma perspectiva para implementação de atividade de cuidados centrados na criança e na família no contexto da unidade de terapia intensiva pediátrica. Consideramos também que este trabalho possa instrumentalizar enfermeiros a delinearem as etapas de implementação dessa intervenção, desde o escopo, justificativa, local, frequência, responsáveis, abordagem e orçamento.

CONCLUSÕES

O objetivo do estudo foi descrever o processo de criação e implementação de grupo de apoio às famílias de crianças em unidade de terapia intensiva pediátrica; dessa forma, por meio da utilização da ferramenta de planejamento 5W2H, delineou-se o projeto em etapas, possibilitando sua operacionalização com foco no escopo, justificativa, responsáveis, orçamento e materiais necessários. Trata-se de uma estratégia simples, rápida e eficaz para organização e gerenciamento, podendo ser aplicada em diversos contextos na área de enfermagem.

Assim, após sua criação e implementação, o grupo de apoio proporciona às famílias mais do que um ambiente para troca de experiências: disponibiliza informação, suporte emocional, redes de apoio social e vínculos importantes durante a vivência dolorosa da hospitalização do filho. Essas possibilidades vêm transformando os relacionamentos já existentes, criando novas redes e viabilizando novas formas de enfrentamento da hospitalização.

Como uma dificuldade encontrada, houve famílias recém-admitidas na unidade que tiveram resistência inicial para participar do grupo. A solução encontrada para essa dificuldade foi realizar cartazes semanais para divulgação das atividades.

No tocante aos profissionais envolvidos, houve construção de interações significativas, facilitando e favorecendo o vínculo, além de sensibilização de outros membros da equipe a se engajarem nas atividades do grupo. Devido a isso, o relacionamento entre as famílias e a equipe clínica apresentou significativa melhora.

Este relato trouxe o processo de implantação do grupo de apoio, incluindo as principais dificuldades dessa fase. Atualmente, o grupo está solidificado na unidade; e foi estabelecido seu vínculo com a equipe. Assim, acreditamos que os próximos passos sejam avaliar os resultados dessas atividades na perspectiva dos familiares e profissionais.

AGRADECIMENTO

Agradecimentos ao Serviço de Enfermagem Pediátrica do Hospital das Clínicas -Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    23 Fev 2021
  • Aceito
    03 Maio 2021
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