Construção e validação de cenários clínicos para capacitação de cuidadores informais de pessoas dependentes

RESUMO

Objetivo:

Construir e validar três cenários clínicos para capacitação de cuidadores informais de pessoas dependentes.

Métodos:

Estudo metodológico, realizado entre janeiro e agosto de 2021, em um município no noroeste do estado do Paraná. Foi desenvolvido em duas etapas: construção dos cenários; e validação do conteúdo por experts (n = 12). Para estimar o grau de concordância entre os juízes, utilizou-se o índice de validade de conteúdo, e considerou-se o valor de 80% como uma taxa aceitável de concordância.

Resultados:

Os cenários de simulação mostraram-se apropriados, obtendo valor médio de 91,6%. No entanto, foram feitos alguns ajustes em sua organização no que tange à clareza na redação das orientações, conforme sugestão dos juízes.

Conclusões:

A construção e validação dos cenários clínicos mostraram-se adequadas e relevantes, de modo que eles podem ser utilizados na capacitação de cuidadores informais de pessoas dependentes.

Descritores:
Tecnologia; Cuidadores; Atividades de Capacitação; Estudo de Validação; Enfermagem.

ABSTRACT

Objective:

To construct and validate three clinical scenarios for training dependent persons’ informal caregivers.

Methods:

Methodological study, conducted between January and August 2021, in a municipality in the northwest of the state of Paraná. It was developed in two stages: construction of scenarios; and content validation by experts (n = 12). To estimate the degree of agreement between the experts, the content validity index was used, and 80% was considered an acceptable rate of agreement.

Results:

The simulation scenarios proved appropriate, obtaining an average value of 91.6%. However, some adjustments were made in their organization pertaining clarity in the wording of guidelines, as suggested by the expert validators.

Conclusions:

The construction and validation of the clinical scenarios proved to be adequate and relevant for use in the training of informal caregivers of dependent persons.

Descriptors:
Technology; Caregivers; Training Activities; Validation Study; Nursing.

RESUMEN

Objetivo:

Construir y validar tres escenarios clínicos para capacitación de cuidadores informales de personas dependientes.

Métodos:

Estudio metodológico, realizado entre enero y agosto de 2021, en un municipio en el noroeste de Paraná. Fue desarrollado en dos etapas: construcción de los escenarios; y validez de contenido por expertos (n = 12). Para estimar el grado de concordancia entre los jueces, se utilizó el índice de validez de contenido, y se consideró el valor de 80% como una tasa aceptable de concordancia.

Resultados:

Los escenarios de simulación se mostraron apropiados, obteniendo valor mediano de 91,6%. Sin embargo, fueron hechos algunos ajustes en su organización en lo que tange a la claridad en la redacción de las orientaciones, conforme sugestión de los jueces.

Conclusiones:

La construcción y validación de los escenarios clínicos se mostraron adecuadas y relevantes, de modo que pueden ser utilizados en la capacitación de cuidadores informales de personas dependientes.

Descriptores:
Tecnología; Cuidadores; Enseñanza; Estudio de Validación; Enfermería.

INTRODUÇÃO

Devido ao aumento insidioso das doenças crônico-degenerativas no Brasil, observa-se uma alteração no perfil dos pacientes que demandam cuidados à saúde. Essa alteração tem causado grande impacto na sociedade, em particular nos sistemas de saúde, que apresentam déficit de recursos humanos e materiais para atender essa clientela; diante disso, a organização da oferta da Atenção Domiciliar (AD) no Brasil vem passando por transformações nos últimos anos(¹).

A premissa sobre a assistência no domicílio considera que as práticas de cuidado devem conceber a família em seu espaço social privado e doméstico, respeitando o movimento e a complexidade das relações familiares. No que concerne a envolvimento do profissional de saúde na dinâmica de pessoas que são assistidas pela AD, ele necessita compreender a conjuntura social e cultura do arranjo familiar do paciente e de suas necessidades individuais. As intervenções realizadas integralmente a pessoas dependentes de cuidado necessitam ser abrangentes e integrar aspectos que são intrínsecos ao processo saúde-doença da pessoa dependente de cuidado e de seus familiares, promovendo melhor gestão e organização do processo de trabalho dos profissionais de saúde(²).

Em face desse cenário, a família apresenta-se como importante aliada no cuidado de pacientes dependentes, revelando-se um recurso inestimável, principalmente por seus membros configurarem se como cuidadores informais, sendo responsáveis por promover o bem-estar da pessoa adoecida(³). Na maioria dos casos, pessoas dependentes de cuidados, em AD, possuem o familiar e/ou pessoas que ofertam cuidados, caracterizando-se como cuidadores informais(²-³). As práticas assistenciais a pessoas que demandam o uso de tecnologias exigem cuidados diários e contínuos, para os quais nem sempre os cuidadores informais estão preparados tecnicamente. Por vezes encontram-se, repentinamente, obrigados a prestar cuidados que antes só eram realizados no ambiente hospitalar e por uma equipe de saúde especializada(⁴-⁵).

Estudo quase experimental apresentou evidências de que o preparo ainda em ambiente hospitalar do cuidador informal de pessoas dependentes de cuidado no domicílio e o acompanhamento destes durante a oferta de cuidado na residência propicia a redução de práticas de cuidado inadequadas ao contexto das necessidades individuais do paciente. A falta de apoio educacional e de demonstração das intervenções ao paciente também contribui na incidência de utilização de serviços de urgência e de reinternações hospitalares por cuidado inadequado, prestado por cuidadores informais despreparados(⁶-⁷).

Dessa forma, faz-se necessário que os cuidadores sejam bem orientados e capacitados para realizar um atendimento domiciliar adequado ao paciente dependente. Os profissionais de saúde, em especial o enfermeiro, possuem um importante papel no suporte aos cuidadores por meio de estratégias eficazes de educação em saúde, que garantam, no ambiente domiciliar, a qualidade do cuidado e a segurança das pessoas dependentes. Nessa perspectiva, considerando as necessidades multifacetadas e interdisciplinares, essenciais para ações de cuidado transicional de pessoas dependentes tanto de cuidado (do hospital ao domicílio) quanto das abordagens que exigem recursos especiais para a sobrevivência do paciente, as estratégias de capacitação com materiais tecnológicos e visuais necessitam ser evidenciadas(⁷-⁹).

A utilização de cenários simulados como ferramenta educacional tem se mostrado promissora, com evidências positivas no seu uso para prevenir eventos adversos acarretados por cuidados potencialmente inadequados. A simulação clínica potencializa o desenvolvimento de habilidades relacionadas ao conhecimento, adaptação e preparo e que são competências alusivas ao cuidador informal, condicionadas aos fatores cognitivos, psicomotores, relacionais e emocionais(⁸-⁹). Ademais, essas competências estão atreladas à organização do manejo clínico por parte dos profissionais de saúde, o qual exige comunicação efetiva e tomada de decisão para as ações de intervenção, sustentadas pelo pensamento crítico e aprendizado clínico(¹⁰-¹²).

Na simulação clínica como ferramenta educacional, a construção do cenário com linguagem visual de acordo com a necessidade das pessoas é uma das sequências metodológicas do processo que requer criatividade e objetividade. Nesse sentido, o realismo da simulação clínica decorre da potencialidade estrutural dos laboratórios, que necessitam ofertar recursos materiais para manejo das ações de alta complexidade, que influenciam a validade e confiabilidade da interface educativa a ser promovida(¹²-¹⁴).

A construção do cenário deve conter elementos substanciais para caracterização oportuna da temática a ser simulada, considerando tanto o contexto clínico e pedagógico quanto a experiência em simulação, interação e dinâmica entre facilitador e participante. Dessa forma, o indivíduo pode compreender seu papel na ferramenta de simulação e, posteriormente, obter os resultados esperados dos cenários(¹²). Por conseguinte, o cenário de simulação necessita ser avaliado e validado por experts na temática abordada para que possua confiabilidade sobre a contextualização da temática e contribuição dele na melhoria da intervenção educacional, considerando as evidências científicas expostas na literatura(¹³-¹⁴).

OBJETIVO

Construir e validar três cenários de simulação clínica direcionados à capacitação de cuidadores informais de pessoas dependentes.

MÉTODOS

Aprovação ética

Estudo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade Estadual de Maringá.

Desenho do estudo e período

Trata-se de um estudo descritivo de construção e validação de conteúdo de três cenários de simulação clínica direcionados a cuidadores informais de pessoas dependentes.

Estudo metodológico, de abordagem quantitativa, realizado entre janeiro e agosto de 2021 e desenvolvido em duas etapas distintas: construção dos cenários; e validação do conteúdo por experts.

Construção dos cenários

O percurso metodológico para a produção dos cenários ocorreu em três fases - pré-produção, produção e pós-produção - baseadas no estudo de Flemming, Reynolds e Wallace(¹⁵) e adaptadas por Braga e colaboradores(¹⁶). Na etapa de pré-produção, definiu-se o tema de pesquisa: orientação do familiar cuidador à pessoa dependente. Em seguida, estabeleceu-se o objetivo educacional dos vídeos: capacitar o familiar cuidador sobre higiene e conforto, cuidados com sondas enterais e com oxigenoterapia. O conteúdo disponibilizado nos vídeos foi definido nessa fase.

A fim de direcionar o conteúdo para a elaboração dos cenários, foi realizada uma revisão integrativa de literatura sobre cuidados no atendimento ao paciente dependente, com os seguintes Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e Medical Subject Headings (MeSH): “educação em saúde”, “vídeos educativos” e “cuidadores”. Os cenários elaborados foram fundamentados em artigos científicos sobre os supracitados procedimentos para o cuidado e em cadernos de atenção domiciliar do Ministério da Saúde(¹⁷-¹⁸).

Validação do conteúdo descritivo dos cenários

Os experts foram identificados por conveniência, respeitando os critérios adaptados de Fehring(¹⁹). Foram selecionados os que atingiram 5 pontos ou mais em um total de 16 pontos, assim distribuídos: título de doutor (4 pontos), título de mestre (3 pontos), ter desenvolvido dissertação ou tese na área de interesse (3 pontos), especialista na área de interesse (2 pontos), publicação em periódico indexado sobre a temática de interesse do estudo (1 ponto), prática clínica na área de interesse de, no mínimo, cinco anos (2 pontos), participação em grupos de pesquisa/projetos que envolvam a área de interesse (1 ponto)(¹⁹). Considerou-se área de interesse do estudo a capacitação de cuidadores informais e/ou ensino/pesquisa com tecnologias ativas de aprendizagem.

Os convites para a participação dos experts foram enviados por e-mail. Uma vez que aceitavam, eles recebiam um link de acesso à plataforma com auxílio da ferramenta Google Forms^®. Ao abrir o link, aparecia o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Somente após o aceite, os participantes tinham acesso aos roteiros dos cenários clínicos, juntamente com os instrumentos. Dos 15 experts convidados, 12 concordaram em participar do estudo e retornaram o instrumento preenchido por via eletrônica dentro do prazo estipulado.

Aos experts, foi orientado que avaliassem todos os itens em cada bloco do instrumento, observando se as dimensões a serem abordadas foram contempladas pelo conjunto de itens, em escala intervalar do tipo Likert. O instrumento de validação, adaptado de Souza e colaboradores(²⁰), avaliou a pertinência da temática abordada no guia da simulação, como também a contribuição dos juízes sobre a necessidade de inclusão de conteúdo para melhor abrangência contextual e manter sua autenticidade. Os temas centrais avaliados foram sobre o cuidado com higiene e conforto do paciente, cuidados com sondas enterais e cuidados com a oxigenoterapia, além de conter espaço para sugestões.

Após o retorno da avaliação, os dados foram digitados em uma planilha do Excel^®. Para tratamento dos dados, utilizou-se o índice de validade de conteúdo (IVC)(²¹). Os itens foram representados por uma escala do tipo Likert, que possuía pontuação variando entre 1 e 3 (1 - totalmente inadequado; 2 - adequado; e 3 - totalmente adequado). Para cálculo dos resultados, considerou-se a soma da concordância dos itens avaliados como “adequados” e “totalmente adequados” pelos experts (IVC = concordância com pontuação “2” ou “3” / número de questões)(²¹).

RESULTADOS

Construção dos cenários

A construção dos cenários seguiu itens propostos por Braga e colaboradores (2014)(¹³). O Quadro 1 apresenta um dos cenários validados. Está descrito o roteiro com os recursos, preparo do cenário, desenvolvimento, debriefing e avaliação.

Quadro 1
Descrição do cenário dos cuidados com higiene e conforto, Maringá, Paraná, Brasil, 2022

CENÁRIO DO VIDEO EDUCATIVO SOBRE HIGIENE E CONFORTO
Recursos humanos Atriz (Patrícia Bossolani Charlo): apresenta o vídeo e grava as cenas em que são fornecidas as orientações pela profissional de saúde sobre cuidados com higiene e conforto do paciente - o banho de leito, hidratação da pele e mudança de decúbito. Atriz (Rosely Marcão Coutinho): interpretará o papel de paciente. Equipamentos e material de consumo: bacias; água morna; cobertor e lençol; lençol móvel; sabonete; toalhas limpas em abundância; luvas, se necessário; loção hidratante; travesseiros e/ou coxins. Local: espaço interno do Laboratório de Simulação clínica e Habilidades (SimuLab) do Centro Universitário de Maringá (UniCesumar).
Cena 1. Abertura do vídeo - Olá, sejam bem-vindos ao primeiro vídeo educativo direcionado a cuidadores informais de pessoas dependentes de tecnologias. Sou a enfermeira Patrícia e, no vídeo de hoje, eu vou explicar para vocês como é realizado o banho de leito, a hidratação da pele e a mudança de decúbito.
Cena 2. Apresentação do paciente A enfermeira entra no quarto e se dirige à paciente; a câmera acompanha a entrada da atriz (enfermeira). Mulher deitada na cama hospitalar; câmera enquadra os dois personagens. - Olá, Rosely meu nome é Patrícia, sou enfermeira e vou realizar o banho de leito em você. Vou garantir a sua privacidade, não deixando as pessoas entrarem no quarto, ok? No momento, Patrícia se dirige até as portas e janelas e as fecha para garantir que não haja correntes de ar. - Vou preparar o material e em seguida retorno, está bem?
Cena 3. Preparando o banho Câmera mostra Patrícia reunindo o material para o preparo do banho. Os materiais reunidos para o banho de leito foram: duas bacias, jarra com água morna, toalha de rosto, toalha de banho, compressa, luva, sabonete, pente, camisola ou pijama, roupas de cama. A enfermeira enche as duas bacias com água em temperatura morna, que foi utilizada para lavar e enxaguar o paciente. A temperatura da água foi testada com a região do antebraço (cotovelo). A água estava agradável ao toque. Patrícia, ao escolher o sabonete, dá preferência para o tipo neutro e evita aqueles esfoliantes e à base de álcool, pois ressecam a pele. Ela prefere colocar o sabonete em uma das bacias para lavagem, mas também pode aplicar diretamente na pele do paciente. Reforça que esponjas ou esfoliantes podem machucar ou eliminar a barreira natural da pele, portanto seu uso deve ser evitado. Patrícia mantém todo o material perto da cama, com toalhas e compressas em abundância para situações em que a água derrame sobre o paciente ou os materiais citados anteriormente fiquem sujos. A fim de evitar desconforto com a cama molhada, Patrícia coloca duas toalhas embaixo de Rosely. Para colocar as toalhas embaixo da paciente, a enfermeira a vira de lado e posiciona a toalha embaixo dela, a retornando em decúbito horizontal e repetindo o procedimento do outro lado da paciente. Visando garantir que a paciente se mantenha aquecida e em privacidade, Patrícia utiliza um lençol sobre o corpo de Rosely durante todo o período em que o banho foi realizado. O início do banho deu-se pela retirada da roupa de Rosely, quando se dobrou o lençol e este foi colocado sobre sua parte inferior. Retirou-se sua camisa e realizou-se o mesmo procedimento com a parte inferior da paciente, cobrindo sua parte superior e retirando o vestuário de baixo. A enfermeira atentou-se para deixar a paciente coberta o mais possível enquanto retirava sua vestimenta. Seguiu a técnica de utilizar o mesmo modo de limpeza e enxágue por todo corpo de Rosely, aplicando o sabonete sobre sua pele. Patrícia utilizou uma toalha de rosto, molhada com água e sabonete para limpeza e retirada de sujidade e usou outra toalha com água limpa da segunda bacia para enxágue e posteriormente secou-a. A enfermeira utilizou recursos materiais com bastante delicadeza para não ser desconfortável com a pele da paciente. O mesmo processo foi realizado em todo corpo de Rosely e foram trocadas as águas das bacias quando Patrícia julgava necessário. Todo o processo foi apresentado, de forma minuciosa, na “Cena 4”.
Cena 4. Realizando o banho de leito Câmera aponta para a Patrícia, que se aproxima de Rosely com o objetivo de alcançar a comadre. Logo após Patrícia abaixa a cabeceira da cama e remove o travesseiro. Rosto - Delicadamente Patrícia inicia o banho lavando o rosto, as orelhas e a região do pescoço com água e sabonete. Logo em seguida ela enxágua e seca a área limpa com toalhas distintas para os dois processos. Cabelo - A enfermeira ergue a cabeça da paciente com cuidado e coloca-a por cima da bacia, despejando água sobre a cabeça para lavar o couro cabeludo, utilizando xampu e mantendo cautela para que a água não caia na região dos olhos e dentro do ouvido de Rosely. Patrícia segue o processo, enxaguando com água limpa e secando o cabelo da paciente com uma toalha seca. Ombro e braço esquerdo - A enfermeira dobra o lençol que cobre o corpo de Rosely até a altura do quadril. Posteriormente coloca uma toalha por baixo do braço para expor a região e inicia o processo de lavar com sabonete, enxaguar com água limpa e secar, sendo esses três processos com toalhas diferentes. Patrícia redobra os cuidados com o banho na região da axila para evitar que a pele tenha irritação e proliferação de microrganismos infectantes, mantendo Rosely coberta e aquecida sempre que possível. Ombro e braço direito - O mesmo processo realizado no lado esquerdo foi efetuado no lado direito de Rosely. Tórax, abdômen e laterais - Para lavar esta região anatômica, Patrícia dobra um lençol até a cintura de Rosely e, com movimentos suaves, lava e enxágua o tórax, tendo cuidado com a região mamária, barriga e laterais do corpo de Rosely, já que são regiões onde pode haver microrganismos refestelado. Pernas - Patrícia descobre a perna direita de Rosely até a parte da cintura e inicia o banho com a sequência das técnicas de lavagem, enxágue e secagem, entre a região da perna até o pé. O mesmo procedimento foi realizado na perna esquerda. Nesse momento, a enfermeira percebe a necessidade de trocar a água das bacias, considerando que a paciente já teve metade do seu corpo limpo. Patrícia pediu a Rosely que virasse seu corpo de lado, e ela apresentou dificuldade. A enfermeira observa se a paciente está próxima da beirada da cama para evitar que ela caia e inicia auxílio para virar de lado. Patrícia aproxima a comadre e a coloca sob Rosely. Deve atentar-se para a manipulação de sondas, drenos e cateteres de Rosely, que podem ser acidentalmente mobilizados e até removidos durante o procedimento. Ao movimentar a paciente no leito, Patrícia tem o cuidado para não a arrastar no colchão. Evitar a fricção é muito importante, pois a pele está mais suscetível a lesão. Costas e nádegas - Para expor e lavar as costas, Patrícia dobra o lençol, lava, enxágua e seca a desde a parte ventral do pescoço, seguindo pelas costas e chegando até a região das nádegas. Área genital e ânus - Patrícia coloca luvas descartáveis de látex e oferece a compressa com o sabonete para proceder à higiene íntima. Rosely sente dificuldade para fazer isso, então Patrícia ergue a perna da paciente para lavá-la, sendo o movimento realizado de frente para trás e posteriormente enxágua e seca com toalhas diferentes. A enfermeira se atenta a secar as regiões de difícil acesso, como as dobras, para se certificar de que foram limpas e secas. Após o término, Patrícia veste Rosely com roupas limpas e inicia o procedimento de hidratação da pele. Manter as roupas limpas, secas e esticadas é importante na profilaxia de úlceras de decúbito. ATENÇÃO: Durante o banho, Patrícia observa as condições da pele e proeminência ósseas para a prevenção de lesão. Também se certifica de que não há curativos para serem realizados, pois se houvesse, deveria protegê-los e depois trocá-los(21-22).
Cena 5. Hidratação da pele após o banho Após o banho de leito, Patrícia informa a Rosely que irá hidratar a sua pele, pois isso ajuda na ativação da circulação sanguínea, ajuda a manter a elasticidade da pele, evitando lesões e ressecamento. Com o auxílio de hidratante ou ácido graxo essencial (AGE), ou mais conhecido como óleo de girassol, Patrícia aplica uma quantidade mínima do produto, espalha pelas mãos e massageia todo o corpo de Rosely com movimentos suaves e firmes. ATENÇÃO: Os hidratantes após o banho devem ser estimulados; e os talcos (preferidos por muitos idosos) devem ser evitados por aumentarem o ressecamento e contribuírem para a obstrução de poros, o que prejudicará a função de transpiração da pele(21-22).
Cena 6. Mudança de decúbito Patrícia, por último, realiza a mudança de decúbito em Rosely, que, por estar acamada, possui permeabilidade vascular alterada/reduzida. Ao realizar a inspeção na pele durante o banho, a enfermeira notou pontos de pressão na pele, os quais podem resultar em lesões, com a possibilidade de acarretar novas infecções. Patrícia avalia cautelosamente as regiões de proeminência óssea, como a região sacral, trocânteres, calcanhares e/ou tornozelos para verificar as posições de menor pressão e em que Rosely sente-se mais confortável. As mudanças de decúbito são ferramentas utilizadas na prevenção de lesão por pressão, principalmente em pessoas com mobilidade reduzida ou que estão na mesma situação de Rosely. Em situações de pessoas acamadas, a mudança postural no leito necessita ser realizada em rodízio de horários e de posições anatômicas, o que foi necessário ser realizado com Rosely. Decúbito lateral direito/esquerdo - Patrícia escolheu posicionar Rosely para o lado direito e utilizar um travesseiro ou cobertor enrolado na região dorsal, reposicionando a cabeça no travesseiro. Patrícia utilizou almofadas entre as regiões de contato de proeminência ósseas, como os joelhos, para evitar fricção e cisalhamento e dar maior conforto para Rosely. Decúbito dorsal: Após algumas horas, que em média são de duas a três horas, Patrícia realizou mudança de decúbito, mantendo Rosely com o abdômen voltado para cima. A enfermeira utilizou um travesseiro para reposicionar a cabeça e os ombros e para manter as pernas e joelhos elevados. ATENÇÃO: Patrícia evita movimentações que propiciem a fricção, a qual pode comprometer a integridade da pele frágil de Rosely. Além disso, a enfermeira realiza mudança de decúbitos de acordo com a posição em que a paciente se sente mais confortável na cama, o que reduz a incidência de fissuras na pele que acarretam lesão por pressão. Nota: Adaptado Smith(22) e Timby(23)

²²²³

Validação dos cenários

Os participantes desta pesquisa foram profissionais experts em tecnologias ativas de aprendizagem e/ou no cuidado com pacientes dependentes. Participaram da validação dos cenários, 12 experts que atuam no cuidado domiciliar, dos quais 11 enfermeiros e 1 médico. A maioria deles são mulheres (75%) e têm média de idade de 31 anos (mínima de 26 e máxima de 45 anos). O tempo de formação variou entre 7 e 17 anos. Quanto à titulação acadêmica, quatro (33,3%) eram doutores, quatro (33,3%) mestres, três (25%) especialistas e apenas um (8,3%) possuía graduação.

O instrumento apresentou escore médio de concordância de 91,6%, variando entre os itens avaliados (Tabela 1).

Tabela 1
Porcentagem do índice de validade de conteúdo dos cenários clínicos dos vídeos educativos por item, Maringá, Paraná, Brasil, 2022

Itens avaliados	1	2	3	IVC
Quanto ao roteiro de conteúdo apresentado, os tópicos abordados são pertinentes aos cuidados a pacientes dependentes.	1	2	9	91,6
Quanto ao conteúdo apresentado referente ao banho de leito	1	1	10	91,6
Quanto ao conteúdo apresentado referente a hidratação da pele	1	1	10	91,6
Quanto ao conteúdo apresentado referente a mudança de decúbito	1	2	9	91,6
Quanto ao conteúdo apresentado referente a sonda de alimentação	1	4	7	91,6
Quanto ao conteúdo apresentado referente a oxigenoterapia	1	2	9	91,6

Para validação do conteúdo do roteiro, os profissionais avaliaram: a pertinência dos temas abordados no roteiro e necessidade de inclusão de novos temas; a autenticidade dos conteúdos relacionados aos temas: cuidados com higiene e conforto do paciente; cuidados com sondas enterais e cuidados com a oxigenoterapia.

Os experts destacaram elementos importantes da prática profissional, que contribuíram para que a construção dos cenários clínicos se aproximasse da realidade e que o resultado atingisse os objetivos propostos deste estudo. Com base no conhecimento científico, o roteiro foi validado pelos profissionais, cujo propósito foi buscar soluções para os problemas vivenciados no ambiente domiciliar.

DISCUSSÃO

Com o aumento do número de pessoas dependentes de cuidado em ambiente domiciliar, os serviços de saúde se deparam com o desafio de prestar assistência a indivíduos cujo perfil é marcado por limitações funcionais que influenciam negativamente a qualidade de vida dessas pessoas. A AD é um programa estratégico com complexas ações de cuidado, que visam garantir qualidade de vida e segurança do paciente de acordo com suas necessidades em saúde e considerando sua conjuntura social e familiar(²).

As evidências disponibilizadas na literatura apontam que, quando pacientes dependentes e seus cuidadores recebem treinamento para enfrentar as limitações intrínsecas à condição de saúde da pessoa em tratamento, as habilidades e práticas assistenciais tornam-se adequadas, precisas e resolutivas, culminando na redução da sobrecarga de cuidado e dos eventos estressores relacionados ao cuidado(^{24 25}). Como ferramenta nesse contexto, pela sua capacidade de comunicação e transmissão de informações, a internet mostra-se útil, por se tratar de uma tecnologia que vem sendo utilizada de forma promissora nos serviços de saúde, principalmente como aparato educacional para prevenção de agravos à saúde e interação entre pacientes, familiares e/ou cuidadores informais e profissionais de saúde(²⁶).

Nesse aspecto, as mídias digitais possuem alto impacto pedagógico e estão presentes no cotidiano das pessoas, que consomem informações a todo momento. A inserção de metodologias por meio da informática, utilizando vídeos educativos com informações pertinentes às mudanças ou ensinamentos sobre autocuidado e cuidado às pessoas dependentes, são estratégias que podem ter impacto direto na qualidade de vida da população e redução da demanda nos serviços de saúde por pessoas com morbidades e com falta de informação resultante de acompanhamento profissional inadequado(²⁷-²⁹).

A literatura avança sobre tal temática; e estudos realizados em diferentes países reforçam a utilização dessa estratégia como promissora na disseminação de educação em saúde, considerando as necessidades específicas da população e as principais dificuldades que pessoas, principalmente com nível de escolaridade reduzido, possuem em obter, processar e entender as informações(³⁰-³²). O vídeo, por sua natureza, permite fornecer instruções simples e úteis dentro de cenários clínicos, reforçando o papel dos cuidadores familiares na tarefa de cuidar e na suplementação assistencial dos profissionais de saúde. Ademais, seu caráter informativo e inclusivo potencializa as orientações sobre aspectos do cuidado e dúvidas dos cuidadores familiares, a fim de torná-los mais proficientes e menos ansiosos, reduzindo complicações e necessidade de recorrência aos serviços de saúde(³³).

Os recursos de ensino, aprendizagem e pesquisa de domínio público, como materiais educacionais disponíveis na internet, são atualmente utilizados no mundo todo. Conhecidos como recursos educacionais abertos, representam a possibilidade de acesso ao ensino. Por meio de tecnologias como a internet e ambientes de aprendizagem virtuais, é possível disponibilizar recursos educacionais na web, necessários para o seu uso pedagógico(³⁴).

Universidade de Harvard e Massachusetts Institute of Technology (MIT) estão avançando em questões metodológicas e de tecnologia de ensino(³⁴). O Brasil também tem progredido na área de tecnologias educacionais, utilizando plataformas específicas para o desenvolvimento de conteúdo para educação continuada e permanente de profissionais de saúde, disponíveis, por meio do Acervo de Recursos Educacionais em Saúde (ARES), produzido por instituições vinculadas à Rede UNA SUS(³⁵).

Salienta-se que o desenvolvimento de ambientes de ensino apoiados pela tecnologia constitui um campo de inovação permanente, buscando favorecer o processo de ensinar e aprender, caracterizado pelo dinamismo e interação(³²). Portanto, esses ambientes têm sido adotados como uma das estratégias para permitir o acesso ao conhecimento por um contingente maior de pessoas, em diversos setores da sociedade, dentre eles a área da saúde. Diante disso, a adoção de instrumentos informatizados pode tornar-se uma importante ferramenta de apoio ao planejamento de cuidadores na área da saúde, pois permite que diferentes ações sejam implantadas e disponibilizadas aos cuidadores no seu próprio ambiente, com intuito de facilitar o processo educacional dessas pessoas(^{34 36}).

Neste estudo, a construção dos cenários é direcionada aos cuidadores para auxiliar na tomada de decisão em saúde, com a finalidade de reduzir a ansiedade quanto a realização dos procedimentos, fornecer meios para lidar com situações inesperadas e capacitá-los para práticas assistenciais seguras e resolutivas. O cenário de simulação realística, quando bem elaborado, tem potencial de desenvolver raciocínio clínico rápido, otimização das práticas de cuidados e habilidades técnicas, que proporcionam a tomada de decisão. A educação baseada em simulação desempenha, a cada dia, um papel cada vez mais importante na educação em saúde no mundo, pois, além de proteger o paciente de possíveis riscos, é capaz de criar condições que otimizam o aprendizado(³⁷).

Nesse sentido, considera-se de extrema importância que os profissionais de saúde, especialmente enfermeiros, estejam com ações voltadas ao desenvolvimento e usabilidade de novas tecnologias, de acordo com a área de atuação e nível de atenção de saúde. O avanço na temática abordada mediante estudos científicos que acentuem vídeos como estratégia educativa em saúde é de extrema importância pelo seu impacto direto na mudança dos hábitos de vida e estímulo de práticas de prevenção com base no autocuidado(¹²).

Os cenários clínicos foram avaliados pelos experts com valor alto de fidedignidade, principalmente em relação à promoção e segurança do paciente, corroborando estudos com resultados semelhantes(³⁷-³⁹). Os resultados da validação foram bastante positivos, e as sugestões dos experts agregaram maior qualidade ao cenário (competências técnicas e não técnicas); ou seja, é importante que o cenário envolva o participante em um contexto amplo de raciocínio clínico e tomada de decisão(¹²).

Nesse contexto, a avaliação dos cenários clínicos proposta foi realizada por meio de um instrumento que observou diferentes aspectos relacionados aos principais cuidados no domicílio, atingindo níveis satisfatórios de validade. Na avaliação do IVC, os itens avaliados apresentaram valores superiores ao determinado pela metodologia, relacionados à confiabilidade e representatividade dos cenários que foram desenvolvidos. Em pesquisas sobre avaliação de tecnologias, outros pesquisadores também encontraram IVC semelhante ao obtido neste estudo, o que demonstra concordância das respostas dos experts avaliadores(¹²,¹⁹,⁴⁰).

A validação do conteúdo constitui-se como processo imprescindível na construção de cenários realísticos para vídeos educativos, considerando sua questão contextual no que se refere ao público alvo, design, tempo de conteúdo apresentado, a fim de garantir sua confiabilidade e clareza na assimilação do conteúdo idealizado(¹⁴,⁴¹-⁴²). Assim, é fundamental conhecer as principais necessidades da condição clínica dos pacientes, bem como apontar os potenciais ajustes das intervenções educativas, principalmente no entendimento das peculiaridades que envolvem a decisão de cuidados de conforto dos pacientes. Nesse sentido, a utilização de vídeos torna a educação em saúde mais interativa, didática, vista como facilitadora das ações a serem tomadas no processo de cuidado de pessoas com morbidades crônicas em estado avançado(⁴²-⁴³).

Limitações do estudo

O estudo utilizou apenas três cenários, portanto limitou-se pela impossibilidade de incluir outros temas importantes no roteiro. A inserção de novas temáticas, alusivas às práticas de banho no leito a pessoas dependentes em domicílio tornaria o vídeo com duração significativamente maior, o que poderia prejudicar o objetivo principal e fazer com que o público-alvo tivesse uma menor assimilação da temática abordada. Outra questão limitante refere-se à necessidade da avaliação pelo público-alvo para tornar o material mais coeso e aplicável, a fim de configurar o realismo necessário para que o vídeo tenha impacto positivo nas questões educativas.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou políticas públicas

As contribuições do estudo fundamentam-se na possibilidade de redução de prestação da assistência inadequada por cuidadores informais às pessoas dependentes de cuidado no domicílio. Os vídeos educativos, mediados por profissionais de saúde especializados e disseminados pelas mídias sociais, podem acrescer comportamentos apropriados, melhores habilidades técnicas de cuidado e redução da necessidade de consultas de urgência e de internamentos por ocorrências adversas. As estratégias educacionais mediadas por vídeos direcionadas a cuidadores informais se mostraram eficientes em fornecer informações para a implementação assistencial, mediante simulação realística de casos que coincidem com a realidade de determinados pacientes e cuidadores informais(³³,⁴⁴).

CONCLUSÕES

A validação dos cenários clínicos obteve boa avaliação e boa confiabilidade, apresentando valor geral acima de 0,90 entre os experts. Portanto, eles podem ser utilizados em simulações realísticas com intuito educacional e direcionados à capacitação de cuidadores informais. A colaboração dos experts na validação dos cenários tornou o caso mais próximo da realidade do domicílio. O estudo oportunizou a apresentação de novos insights pelos experts, que foram avaliados e aceitos quando pertinentes ao objetivo do estudo.

Os cenários clínicos de simulação realística para o processo educacional e capacitação de cuidadores informais representam uma importante contribuição, sendo uma ferramenta capaz de auxiliar as pessoas que prestam cuidado no domicílio. A busca da inclusão de métodos diferenciados voltados a cuidadores informais surge como uma necessidade, já que muitos cuidadores desconhecem os cuidados com pacientes dependentes.

A realização do cuidado em ambiente domiciliar é complexa e requer habilidades técnicas e competências do cuidador informal. Com base nas práticas pedagógicas de ensino, mediadas por vídeos educativos, as questões cognitivas, emocionais, psicomotoras e relacionais podem melhorar as práticas de cuidado e resultar na redução da necessidade de novas ações em saúde e de reinternações por cuidados inadequados. Isso gera melhoria na qualidade de vida de pessoas dependentes em domicílio e de seus familiares/cuidadores informais e melhor prestação e organização do processo de trabalho por parte dos profissionais de saúde.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Out 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  23 Mar 2022
• Aceito
  04 Jul 2022