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Construção e validação de instrumento avaliativo para atendimento ao HIV na Atenção Primária à Saúde

RESUMO

Objetivo:

construir e validar um instrumento de avaliação do processo de descentralização do atendimento às pessoas vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde.

Métodos:

estudo metodológico, desenvolvido em quatro etapas: elaboração do modelo lógico baseado na tríade Estrutura-Processo-Resultados; construção do instrumento; validação de conteúdo por juízes especialistas e revisores técnicos; e validação semântica. Utilizaram-se questionários on-line e, para análise, o índice de Kappa.

Resultados:

o instrumento, com 68 itens e 8 fatores, foi submetido à validação por juízes especialistas que recomendaram a exclusão de 3 itens e mudança de 2 fatores. Na validação por revisores técnicos, foram excluídos 2 itens e pontou-se 6 fatores, o índice de concordância foi ≥0,75. Na validação semântica 87,3% responderam “concordo totalmente” para os itens apresentados.

Conclusões:

O instrumento encontra-se validado quanto ao conteúdo, possui 63 itens e potencial para avaliação do atendimento às pessoas vivendo com HIV na Atenção Primária à Saúde.

Descritores:
HIV; Síndrome da Imunodeficiência Adquirida; Atenção Primária à; Saúde; Estudo de validação; Avaliação em saúde

ABSTRACT

Objective:

To develop and validate an instrument to evaluate the decentralization process of care for People Living with HIV in Primary Health Care.

Method:

Methodological study, developed in four stages: elaboration of the logical model based on the triad Structure-Process-Outcomes; development of the instrument; content validation by expert judges and technical reviewers; and semantic validation. Online questionnaires were used, and the Kappa index was used for analysis.

Results:

The instrument with 68 items and 8 factors was submitted to validation by expert judges who recommended the exclusion of 3 items and the alteration of 2 factors. In the validation by technical reviewers, 2 items were excluded and 6 factors were highlighted; the agreement index was ≥0.75. In the semantic validation, 87.3% of the judges answered “totally agree” for the items presented.

Conclusion:

The instrument is validated for its content, has 63 items and has the potential to assess the care provided for people living with HIV in Primary Health Care.

Descriptors:
HIV; Acquired Immunodeficiency Syndrome; Primary Health Care; Validation Study; Health Evaluation

RESUMEN

Objetivo:

Construir y validar un instrumento para la evaluación del proceso de descentralización de la atención a personas conviviendo con VIH en la Atención Primaria de Salud.

Métodos:

Es un estudio metodológico desarrollado en cuatro etapas: elaboración del modelo lógico basado en la tríada Estructura-Proceso-Resultados; construcción del instrumento; validación del contenido por jueces especialistas y revisores técnicos; y validación semántica. Se utilizaron cuestionarios en línea y el índice de Kappa para el análisis.

Resultados:

El instrumento con 68 ítems y 8 factores fue sometido a validación por jueces expertos que recomendaron la exclusión de 3 ítems y el cambio de 2 factores. En la validación por parte de los revisores técnicos, se excluyeron 2 ítems y se puntuaron 6 factores; el índice de acuerdo fue ≥0,75. En la validación semántica, el 87,3% respondió “totalmente de acuerdo” a los ítems presentados.

Conclusiones:

El instrumento se encuentra validado cuanto al contenido, posee 63 ítems y potencial para la evaluación de la atención de personas conviviendo con VIH en la Atención Primaria de Salud.

Descriptores:
VIH; Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirido; Atención Primaria de Salud; Estudio de Validación; Evaluación en Salud

INTRODUÇÃO

Em 2014, o Ministério da Saúde propôs uma alteração no modelo de atendimento às pessoas vivendo com HIV (PVHIV), considerando a Atenção Primária à Saúde (APS) como a porta de entrada e ordenadora do atendimento. A proposta de alteração no modelo de assistência prevê o aumento da acessibilidade aos serviços de saúde por estes usuários(11 Ministério da Saúde (BR). Cinco passos para a prevenção combinada ao HIV na Atenção Básica [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017[cited 2022 Mar 29]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64662/cinco_passos_para_a_prevencao_combinada_ao_hiv_na_42165.pdf?file=1&type=node&id=64662&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...
). Evidencia-se que esse processo de atendimento, no Brasil, ainda é incipiente, suscita esforços, discussões e avaliações que possibilite verificar os desafios e potencialidades desse modelo de atenção à saúde, uma vez que, trata-se de uma inovação no modelo de assistência às PVHIV(22 Araújo WJ, Quirino EMB, Pinho CM, Andrade MS. Perception of nurses who perform rapid tests in Health Centers. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 1):631-6. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0298
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0...
-33 Melo EA, Maksud I, Agostini R. Cuidado, HIV/Aids e atenção primária no Brasil: desafio para a atenção no Sistema Único de Saúde? Rev Panam Salud Publica. 2018;42:e151. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.151
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).

O processo de atenção às PVHIV na APS já está bem consolidado em outros países, principalmente em países africanos, de baixa renda, onde há alta prevalência da infecção pelo HIV(44 Abongomera G, Kiwuwa-Muyingo S, Revill P, Chiwaula L, Mabugu T, Phillips AN, et al. Impact of decentralisation of antiretroviral therapy services on HIV testing and care at a population level in Agago District in rural Northern Uganda: results from the Lablite population surveys. Inter Health. 2017;9(2):91-99. https://doi.org/10.1093/inthealth/ihx006
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5 Bilinski A, Birru E, Peckarsky M, Herce M, Kalanga N, Neumann C, et al. Distance to care, enrollment and loss to follow-up of HIV patients during decentralization of antiretroviral therapy in Neno District, Malawi: a retrospective cohort study. PLoS One. 2017;12(10):e0185699. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0185699
https://doi.org/10.1371/journal.pone.018...

6 Conan N, Coulborn RM, Simons E, Mapfumo A, Apollo T, Garone DB, et al. Successes and gaps in the HIV cascade of care of a high HIV prevalence setting in Zimbabwe: a population-based survey. J Inter AIDS Soc. 2020;23(9):e25613. https://doi.org/10.1002/jia2.25613
https://doi.org/10.1002/jia2.25613...
-77 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Prevailing against pandemics by putting people at the centre - World AIDS Day report 2020 [Internet]. 2020 [cited 29 Mar 2022]. Available from: https://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/prevailing-against-pandemics_en.pdf
https://www.unaids.org/sites/default/fil...
). No Brasil, observam-se experiências municipais de descentralização do cuidado às PVHIV para APS em diferentes estágios de consolidação. Trata-se, ainda, de um modelo em implantação, que demostra uma possibilidade de ampliação do acesso às PVHIV aos serviços de saúde(88 Ministério da Saúde (BR). Portaria nº2.436, de 21 de setembro de 2017 [Internet]. 2017 [cited 29 Mar 2022]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...

9 Melo EA, Agostini R, Damião JJ, Filgueiras SL, Maksud I. Cuidado de pessoas vivendo com HIV na atenção primária à saúde: reconfigurações na rede de atenção à saúde? Cad Saúde Pública. 2021;37(12):e00344120. https://doi.org/10.1590/0102-311X0034
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-1010 Zambenedetti G, Silva RAN. Descentralização da atenção em HIV-Aids para a atenção básica: tensões e potencialidades. Physis: Rev Saúde Coletiva. 2016;26(3):785-806. https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000300005
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).

Esta ampliação do acesso pode proporcionar um aumento da testagem, do diagnóstico, do início do tratamento, além do incremento das atividades de prevenção da infecção pelo HIV, através da profilaxia pré-exposição (PrEP) e pós exposição (PEP)(88 Ministério da Saúde (BR). Portaria nº2.436, de 21 de setembro de 2017 [Internet]. 2017 [cited 29 Mar 2022]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
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9 Melo EA, Agostini R, Damião JJ, Filgueiras SL, Maksud I. Cuidado de pessoas vivendo com HIV na atenção primária à saúde: reconfigurações na rede de atenção à saúde? Cad Saúde Pública. 2021;37(12):e00344120. https://doi.org/10.1590/0102-311X0034
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-1010 Zambenedetti G, Silva RAN. Descentralização da atenção em HIV-Aids para a atenção básica: tensões e potencialidades. Physis: Rev Saúde Coletiva. 2016;26(3):785-806. https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000300005
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). Além de possibilitar o aumento do vínculo entre profissionais e pacientes, otimização das ações voltadas para educação em saúde e adesão ao tratamento, sendo possível alcançar metas de controle da infecção pelo HIV. Entretanto, percebe-se que, para a consolidação desse processo, ainda é necessário vencer entraves de ordem técnica, de política, de gestão organizacional e de prática de cuidado para, assim, consolidar o êxito da reorganização dos serviços de saúde(1010 Zambenedetti G, Silva RAN. Descentralização da atenção em HIV-Aids para a atenção básica: tensões e potencialidades. Physis: Rev Saúde Coletiva. 2016;26(3):785-806. https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000300005
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11 Lima MCL, Pinho CM, Dourado CARO, Silva MAS, Andrade MS. Diagnostic aspects and in-service training in the decentralization of care to people living with HIV. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e20210065. https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0065
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-1212 Onwujekwe O, Chikezie I, Mbachu C, Chiegil R, Torpey K, Uzochukwu B. Investigating client perception and attitude to decentralization of HIV/AIDS treatment services to primary health centres in three Nigerian states. Health Expect. 2016;19(5):1111-20. https://doi.org/10.1111/hex.12403
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).

Assim, para a consolidação desse modelo de assistência, são necessários maiores investimentos no que tange à estruturação das Unidades Básicas de Saúde, fornecimento de materiais e insumos, qualificação profissional e apoio matricial(22 Araújo WJ, Quirino EMB, Pinho CM, Andrade MS. Perception of nurses who perform rapid tests in Health Centers. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 1):631-6. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0298
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-33 Melo EA, Maksud I, Agostini R. Cuidado, HIV/Aids e atenção primária no Brasil: desafio para a atenção no Sistema Único de Saúde? Rev Panam Salud Publica. 2018;42:e151. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.151
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). Nesta perspectiva, a avaliação dos serviços de saúde é de grande importância na consolidação de novos modelos de assistência e pode contribuir para identificação de problemas, possibilitando, assim, propor soluções com vistas à utilização dos recursos de modo mais eficiente e eficaz, bem como reorganizar as práticas em saúde, dentro de um contexto político, econômico, social e profissional(1313 Chaves LDP, Tanaka OY. Nurses and the assessment in health system management. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(5):1274-8. https://doi.org/10.1590/S0080-62342012000500033
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).

Instrumentos de avaliação em saúde que permitam aferir o atendimento ao HIV na APS ainda é algo incipiente, em comparação aos que apontam os desafios e potencialidades do modelo de atenção(22 Araújo WJ, Quirino EMB, Pinho CM, Andrade MS. Perception of nurses who perform rapid tests in Health Centers. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 1):631-6. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0298
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3 Melo EA, Maksud I, Agostini R. Cuidado, HIV/Aids e atenção primária no Brasil: desafio para a atenção no Sistema Único de Saúde? Rev Panam Salud Publica. 2018;42:e151. https://doi.org/10.26633/RPSP.2018.151
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4 Abongomera G, Kiwuwa-Muyingo S, Revill P, Chiwaula L, Mabugu T, Phillips AN, et al. Impact of decentralisation of antiretroviral therapy services on HIV testing and care at a population level in Agago District in rural Northern Uganda: results from the Lablite population surveys. Inter Health. 2017;9(2):91-99. https://doi.org/10.1093/inthealth/ihx006
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5 Bilinski A, Birru E, Peckarsky M, Herce M, Kalanga N, Neumann C, et al. Distance to care, enrollment and loss to follow-up of HIV patients during decentralization of antiretroviral therapy in Neno District, Malawi: a retrospective cohort study. PLoS One. 2017;12(10):e0185699. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0185699
https://doi.org/10.1371/journal.pone.018...
-66 Conan N, Coulborn RM, Simons E, Mapfumo A, Apollo T, Garone DB, et al. Successes and gaps in the HIV cascade of care of a high HIV prevalence setting in Zimbabwe: a population-based survey. J Inter AIDS Soc. 2020;23(9):e25613. https://doi.org/10.1002/jia2.25613
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,99 Melo EA, Agostini R, Damião JJ, Filgueiras SL, Maksud I. Cuidado de pessoas vivendo com HIV na atenção primária à saúde: reconfigurações na rede de atenção à saúde? Cad Saúde Pública. 2021;37(12):e00344120. https://doi.org/10.1590/0102-311X0034
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10 Zambenedetti G, Silva RAN. Descentralização da atenção em HIV-Aids para a atenção básica: tensões e potencialidades. Physis: Rev Saúde Coletiva. 2016;26(3):785-806. https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000300005
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11 Lima MCL, Pinho CM, Dourado CARO, Silva MAS, Andrade MS. Diagnostic aspects and in-service training in the decentralization of care to people living with HIV. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e20210065. https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0065
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12 Onwujekwe O, Chikezie I, Mbachu C, Chiegil R, Torpey K, Uzochukwu B. Investigating client perception and attitude to decentralization of HIV/AIDS treatment services to primary health centres in three Nigerian states. Health Expect. 2016;19(5):1111-20. https://doi.org/10.1111/hex.12403
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-1313 Chaves LDP, Tanaka OY. Nurses and the assessment in health system management. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(5):1274-8. https://doi.org/10.1590/S0080-62342012000500033
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). Destaca-se a existência de um estudo nacional que realizou a construção e validação de um instrumento para avaliar as ações de enfrentamento do HIV/aids desenvolvidas pelos profissionais de saúde na APS(1414 Castro RR, Oliveira SS, Pereira IRBO, Santos WN, Fernandes SF, Silva RAR. Construct validation: coping with HIV/AIDS in Primary Health Care. Rev Bras Enferm. 2019;72(5):1237-46. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0734
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). Dessa forma, o uso de instrumentos que permitam realizar a avaliação dos serviços de saúde, no qual o processo de descentralização já esteja instalado, assim como auxiliar na estruturação das unidades de saúde que ainda não aderiram às recomendações, poderá contribuir para a consolidação desse modelo de atenção à saúde, considerando as especificidades e a complexidade que a consolidação de um novo modelo de assistência à saúde demandam.

OBJETIVO

Construir e validar um instrumento de avaliação do processo de descentralização do atendimento às Pessoas Vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Foram respeitados os preceitos éticos da Resolução 466/2012. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (HUOC)/Pronto Socorro Cardiológico Universitário de Pernambuco - Prof. Luiz Tavares (PROCAPE).

Desenho, período e local do estudo

Estudo metodológico desenvolvido em quatro etapas: elaboração do modelo lógico para a construção do instrumento de avaliação do processo de descentralização do atendimento às PVHIV para APS; construção do instrumento; validação de conteúdo e face por juízes especialistas e por revisores técnicos; e validação semântica.

Para elaboração do modelo lógico, utilizou-se como referencial teórico a tríade Estrutura-Processo-Resultados de Avenis Donabedian(1515 Donabedian A. The criteria and standards of quality. Ann Arbor, Michigan: Health administration Press; 1980. 504 p.). Para construção do instrumento de avaliação em saúde, utilizou como referência o protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos(1616 Ministério da Saúde (BR). Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas para manejo da infecção pelo HIV em adultos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2018 [cited 30 Mar 2022]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64484/pcdt_adulto_12_2018_web.pdf?file=1&type=node&id=64484&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...
) e o kit HIV/aids na Atenção Básica à Saúde lançado pelo Ministério da Saúde em 2017(1717 Ministério da Saúde (BR). Cinco passos para a construção de linhas de cuidado para Pessoas Vivendo com HIV/Aids - Guia para grupos locais [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 30 Mar 2022]. Available from:http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64662/cinco_passos_para_a_prevencao_combinada_ao_hiv_na_23554.pdf?file=1&type=node&id=64662&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...

18 Ministério da Saúde (BR). Prevenção Combinada do HIV [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 30 Mar 2022]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64901/prevencao_combinada__bases_conceituais_web.pdf?file=1&type=node&id=64901&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...

19 Ministério da Saúde (BR). Cinco passos para o monitoramento e avaliação (M&A) das ações de IST, HIV/aids e hepatites virais [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 30 Mar 2022]. Available from:http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64662/cinco_passos_para_a_prevencao_combinada_ao_hiv_na_10100.pdf?file=1&type=node&id=64662&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...

20 Ministério da Saúde (BR). Diretrizes para organização do CTA no âmbito da prevenção combinada e nas redes de atenção à saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 30 Mar 2022]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64988/diretrizes_para_organizacao_do_cta.pdf?file=1&type=node&id=64988&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...

21 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Nota informativa nº 007/2017 - DDAHS/SVS/MS [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 30 Mar 2022]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/legislacao/2017/-notas_informativas/nota_informativa_007_protocolo_de_uso_arv_2017_29907.pdf?file=1&type=node&id=64351&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/legisl...
-2222 Ministério da Saúde (BR). Cinco passos para a implantação das linhas de cuidado para Pessoas Vivendo com HIV/Aids: manual para profissionais de saúde [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 30 Mar 2022]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/64662/cinco_passos_para_a_prevencao_combinada_ao_hiv_na_30970.pdf?file=1&type=node&id=64662&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...
). A construção e validação do instrumento ocorreram no período de janeiro de 2020 a março de 2021, na cidade do Recife, no estado de Pernambuco, Brasil.

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

Para a validação de conteúdo, foram convidados 10 juízes especialistas, destes 9 aceitaram participar da pesquisa. Utilizou-se como critério de elegibilidade: a) possuir graduação em curso de saúde; b) possuir no mínimo uma especialização stricto sensu ou lato sensu em saúde coletiva, saúde pública, saúde da família, infectologia e epidemiologia; c) possuir no mínimo 1 ano de experiência na área do HIV/Aids e infecções sexualmente transmissíveis (IST).

Nesta etapa, além da avaliação pelos juízes especialistas, o instrumento foi avaliado por revisores técnicos. Dos 4 revisores técnicos convidados, 3 aceitaram avaliar o instrumento. Os critérios de inclusão para os revisores técnicos foram: a) ser profissional de saúde; b) de nível superior; c) possuir no mínimo 5 anos de experiência na área de gestão ou em coordenação do Programa de IST/HIV/Aids.

A validação semântica foi realizada por 55 estudantes. Utilizaram-se como critério de seleção: a) estar cursando as graduações em medicina ou enfermagem; b) ter idade ≥18 anos; c) ter cursado uma das disciplinas: Atenção primária à saúde, Saúde coletiva, Saúde da família, Doenças infecciosas e parasitárias. Foram excluídos aqueles que cursavam outros cursos na área de saúde. Justifica-se a inclusão dos estudantes de medicina e enfermagem, uma vez que, esses estudantes têm vivência de aulas teórico-práticas nas disciplinas de Atenção primária à saúde, saúde coletiva e saúde da família, no primeiro período do curso de graduação.

Protocolo do estudo

Após a elaboração do modelo lógico(1515 Donabedian A. The criteria and standards of quality. Ann Arbor, Michigan: Health administration Press; 1980. 504 p.), iniciou-se a construção do instrumento de avaliação do processo de descentralização do atendimento às PVHIV na APS. A construção do instrumento foi realizada por 4 pesquisadoras, todas enfermeiras. Nesta etapa, foi elaborado um instrumento constituído por 68 itens distribuídos em 8 fatores, sendo eles: Recursos físicos; Vigilância e notificação; Exames de diagnóstico e rotina; Tratamento; Prevenção em saúde; Educação permanente; Educação em saúde e Rede de Atenção à Saúde. Os itens foram avaliados considerando uma escala tipo Likert.

Na etapa de validação de conteúdo, realizada por 9 juízes especialistas, a coleta de dados ocorreu através de formulário eletrônico do Google form. Foi estabelecido o prazo de 30 dias para cada avaliador aceitar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e responder o instrumento, contados a partir do dia do envio do documento. Para seleção do primeiro juiz foi utilizado um informante chave que atuava no Programa de IST/HIV/Aids da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco e, para os demais, utilizou-se a estratégia “snowball”, que consiste na indicação de um novo juiz, a partir das indicações fornecidas pelo juiz anterior. Aos juízes especialistas foi solicitado que, ao avaliar o item, marcasse o fator que melhor se enquadrava no item. Além disso, tinha uma opção “outro” para o caso de os juízes sugerirem um novo fator e “observações” para que os juízes colocassem suas sugestões acerca da relevância, clareza, compreensão e reformulação do item ou exclusão deste. Nesta etapa, foram sugeridos a mudança de dois fatores e exclusão de 3 itens. Assim, na avaliação de conteúdo pelos juízes especialistas, o instrumento ficou com 65 itens e 7 fatores.

Após a conclusão dessa etapa, o instrumento foi submetido a 3 revisores técnicos. A coleta dos dados foi feita por via eletrônica no período de setembro a novembro de 2020. Foi sugerido pelos revisores técnicos a exclusão de 2 itens e 1 fator. Assim, na avaliação pelos revisores técnicos o instrumento ficou com 63 itens e 6 fatores. Após a revisão técnica, o instrumento passou por uma revisão da Língua portuguesa.

A etapa de validação semântica deu-se com a participação de 55 estudantes da Universidade de Pernambuco, sendo 21 graduandos de medicina e 34 graduandos de enfermagem. Os participantes da pesquisa receberam o convite via eletrônica. Esta etapa se deu no período de dezembro de 2020 a março de 2021. Para validação semântica, solicitou-se que os estudantes avaliassem cada item acerca da compreensão verbal e respondesse através de uma escala tipo likert, apenas uma opção, sendo elas: 1) Não compreendo totalmente; 2) Não compreendo parcialmente; 3) Compreendo parcialmente; 4) Compreendo; 5) Compreendo totalmente.

Análise dos resultados e estatística

Para análise do Instrumento de “Avaliação do Processo de descentralização do atendimento às Pessoas Vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde”, foram consideradas as normas apresentadas pelas instituições American Educational Research Association (AERA), American Psychological Association (APA) e National Council on Measurement in Education (NCME)(2323 American educational research association et al. Standards for educational and psychological testing. American Educational Research Association, 2014.) para validação. Seus preceitos indicam que, para um instrumento ser válido quanto ao seu conteúdo, é necessário realizar algumas etapas de validação. As etapas de validação de conteúdo por juízes especialistas e/ou revisores técnicos e validação semântica foram aplicadas neste estudo.

A coleta de dados realizadas por meio de formulário disponibilizado no Google forms permitiu a geração de banco de dados em formato de planilha eletrônica, utilizando o software Microsoft Excel. Realizou-se as análises de frequência, medidas de tendência central e dispersão para caracterização da amostra e o coeficiente de Kappa (valor de referência ≥0,75)(2424 Cohen J. A Coefficient of Agreement for Nominal Scales. Educational and Psychological Measurement. 1960;20(1):37-46. https://doi.org/10.1177/001316446002000104
https://doi.org/10.1177/0013164460020001...
-2525 Cohen J. Weighted kappa: nominal scale agreement provision for scaled disagreement or partial credit. Psycholl Bull. 1968;70(4):213-20. https://doi.org/10.1037/h0026256
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) nas etapas de validação de conteúdo por juízes especialistas, revisores técnicos e validação semântica. Para realização das análises estatística foi utilizado o software SPSS® (Statistical Package for Social Science) versão 26.0.

RESULTADOS

Para construção do instrumento “Avaliação do processo de descentralização do atendimento às Pessoas Vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde”, foi elaborado um modelo lógico apresentado na Figura 1 levando em consideração a tríade Estrutura - Processo - Resultados proposta por Avedis Donabedian(1515 Donabedian A. The criteria and standards of quality. Ann Arbor, Michigan: Health administration Press; 1980. 504 p.). Com base no modelo lógico, foram identificados e propostos, inicialmente, 68 itens de avaliação distribuídos em 8 fatores.

Figura 1
Modelo lógico de construção do instrumento de avaliação do atendimento às Pessoas Vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde, Recife, Pernambuco, Brasil, 2022

1PrEP - Profilaxia Pré-exposição; 2PEP - Profilaxia Pós-Exposição; 3ARV - Antirretroviral; 4CV - Carga Viral; 5IST - Infecção Sexualmente Transmissível; 6TARV - Terapia Antirretroviral; 7UDM - Unidade Dispensadora de Medicamentos; 8SAE - Serviço de Assistência Especializada


Para etapa de validação de conteúdo por juízes especialistas, dos 9 juízes especialistas, 6 (66,7%) eram do sexo feminino e 3 (33,3%) do sexo masculino. A idade variou entre 27 e 36 anos, com média de idade de 30,78 anos (DP = 2,906). O tempo de atuação no âmbito das IST/HIV/Aids, variou entre 2 e 12 anos, com tempo médio de 4,22 anos (DP=3,492).

Todos os juízes especialistas são formados em enfermagem com especialização, sendo 5 (55,6%) com especialização lato sensu em infectologia 3 (33,3%) em saúde coletiva e 1 (11,1%) em saúde pública. A especialização stricto sensu foi relata por 5 (55,6%) pessoas, nas áreas de Biotecnologia, Enfermagem, Saúde Pública, Vigilância e Promoção à Saúde e Vigilância em Saúde.

Os juízes especialistas sugeriram a alteração do fator “recursos físicos” por “recursos físicos, materiais e humanos” e junção dos fatores “vigilância e notificação” e “prevenção em saúde”, tornando-se “vigilância e prevenção em saúde”, totalizando 7 fatores.

Após análise dos juízes foram excluídos três itens: (1) “É realizada consulta de enfermagem para os casos positivos para HIV”; (2) “É realizada consulta médica para os casos positivos para HIV”. Ambas obtiveram o menor percentual de concordância entre os juízes especialistas de 22,2%; e (3) “O preservativo feminino é bem aceito pela população adstrita da unidade”, totalizando 65 itens.

Foi verificado que o índice Kappa, para verificar os níveis de concordância entre os juízes especialistas, foi inferior ao preconizado na literatura(2424 Cohen J. A Coefficient of Agreement for Nominal Scales. Educational and Psychological Measurement. 1960;20(1):37-46. https://doi.org/10.1177/001316446002000104
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-2525 Cohen J. Weighted kappa: nominal scale agreement provision for scaled disagreement or partial credit. Psycholl Bull. 1968;70(4):213-20. https://doi.org/10.1037/h0026256
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), que indica um valor de 0,75 para que a concordância apresente um nível de excelência. Todos os juízes especialistas apresentaram valores inferiores a esse, o que orientou a uma necessidade de nova coleta, considerando-se uma amostra técnica que apresentasse maior conhecimento prático (Tabela 1).

Tabela 1
Índice Kappa de concordância entre os juízes especialistas participantes da etapa de validação de conteúdo e face do instrumento de avaliação do processo de descentralização do atendimento às Pessoas Vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde, Recife, Pernambuco, Brasil, 2022

Na etapa de validação de conteúdo por revisores técnicos, contou-se com a participação de 3 respondentes, sendo todos do sexo feminino, com idade média de 47 anos (DP = 13,527) variando entre 33 e 60 anos. O tempo médio de atuação foi de 17 anos (DP=10,44), variando de 5 a 24 anos de experiência. Verificou-se, por meio do índice Kappa, concordância de 0,75 entre as juízas 1 e 2; 0,78 entre as juízas 1 e 3 e 0,75 entre as juízas 2 e 3.

Após análise dos revisores técnicos, foi proposta a exclusão de dois itens: (1) “É realizada estratificação dos pacientes diagnosticados com HIV em sintomáticos e assintomáticos” e (2) ‘A Unidade de Saúde da Família oferta teste rápido por fluído oral para HIV, sífilis e hepatites virais?”, uma vez que não houve consenso nos fatores respondidos pelos revisores técnicos, sendo excluídos estes 2 itens, totalizando ao final desta etapa 63 itens, em 6 fatores, sendo eles: 1) “Recursos físicos, materiais e humanos” (itens de 1 a 10), 2) “Vigilância e prevenção em saúde” (itens de 11 a 22), 3) “Exames de diagnóstico e de rotina” (itens de 23 a 37), 4) “Educação permanente” (itens de 38 a 41), 5) “Educação em saúde” (itens de 42 a 52) e 6) “Rede de Atenção à Saúde” (itens de 53 a 62).

O item 63 “A Unidade de Saúde da Família disponibiliza de medicamentos antirretrovirais?” foi o único que obteve consenso no fator Tratamento, sendo assim sugerido que este fator não seja considerado. Nesta perspectiva, o item 63 deve ser mantido para novas análises, mas neste aspecto da validação de conteúdo, este não deve ser mantido, uma vez que um fator deve ter no mínimo 3 itens(2626 Pasquali L. Validação dos testes psicológicos: será possível reencontrar o caminho?. Psicol: Teor Pesqui. 2007;23(esp):99-107. https://doi.org/10.1590/S0102-37722007000500019
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). Sendo assim, prosseguiu-se para a validação semântica.

Para a validação semântica contou-se com uma amostra formada por 55 estudantes, com idade entre 19 e 38 anos (Média = 22,45 e DP = 2,860). A amostra foi formada por 34 (61,8%) estudantes de graduação em Enfermagem e 21 (38,2%) em Medicina. Estava cursando o 6º período 30,9% (17) com Média de 5,82 e DP de 1,857. Verificou-se que > 87,3% dos estudantes responderam a opção “Compreendo Totalmente”, para todos os itens do instrumento de avaliação.

Considerando as análises apontadas anteriormente, é possível considerar que o instrumento apresenta validade de conteúdo, conforme preconizado pelas instituições AERA, APA e NCME(2323 American educational research association et al. Standards for educational and psychological testing. American Educational Research Association, 2014.).

DISCUSSÃO

A proposta de descentralização do atendimento às PVHIV para a APS foi resultante da garantia do tratamento e da boa resposta aos ARV(2727 Ministério da Saúde (BR). Portaria nº542, de 22 de dezembro de 1986 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 1986 [cited 30 Mar 2022]. Available from: http://www3.crt.saude.sp.gov.br/arquivos/arquivos_biblioteca_crt/Portarian542de22dez86.pdf
http://www3.crt.saude.sp.gov.br/arquivos...

28 Safren SA, Mayer KH, Ou SS, McCauley M, Grinsztejn B, Hosseinipour MC, et al. Adherence to early antiretroviral therapy. J Acquir Immune Defic Syndr. 2015;69(2):234-40. https://doi.org/10.1097/QAI.0000000000000593
https://doi.org/10.1097/QAI.000000000000...
-2929 Cohen MS, McCauley M, Gamble TR. HIV treatment as prevention and HPTN 052. Curr Opin HIV AIDS. 2012;7(2):99-105. https://doi.org/10.1097/COH.0b013e32834f5cf2
https://doi.org/10.1097/COH.0b013e32834f...
). Para alcançar os resultados desejados, as PVHIV devem estar engajadas nos cuidados com a saúde e ter acesso ao tratamento de modo ininterrupto(3030 Thompson MA, Horberg MA, Agwu AL, Colasanti JA, Jain MK, Short WR, et al. Primary Care Guidance for Persons With Human Immunodeficiency Virus: 2020 Update by the HIV Medicine Association of the Infectious Diseases Society of America. Clin Infect Dis. 2021;73(1):e3572-e3605. https://doi.org/10.1093/cid/ciaa1391
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). Assim, o atendimento às PVHIV na APS pode possibilitar um maior controle da transmissão da doença, uma vez que, permite a implantação de duas estratégias fundamentais para o controle da transmissão da infecção pelo HIV que são o aumento da testagem e cobertura de tratamento com os antirretrovirais (ARV)(44 Abongomera G, Kiwuwa-Muyingo S, Revill P, Chiwaula L, Mabugu T, Phillips AN, et al. Impact of decentralisation of antiretroviral therapy services on HIV testing and care at a population level in Agago District in rural Northern Uganda: results from the Lablite population surveys. Inter Health. 2017;9(2):91-99. https://doi.org/10.1093/inthealth/ihx006
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,1212 Onwujekwe O, Chikezie I, Mbachu C, Chiegil R, Torpey K, Uzochukwu B. Investigating client perception and attitude to decentralization of HIV/AIDS treatment services to primary health centres in three Nigerian states. Health Expect. 2016;19(5):1111-20. https://doi.org/10.1111/hex.12403
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).

Experiências bem sucedidas com esse modelo de atenção foi evidenciado em outros países, como por exemplo, na África do Sul, em estudo realizado em Zimbábue, resultados de 87,4% das PVHIV com conhecimento acerca do seu status sorológico, 95,3% em tratamento para o HIV e 83,2% em supressão viral, chegando próximo a meta 95-95-95, proposta para o controle da infecção pelo HIV no mundo(66 Conan N, Coulborn RM, Simons E, Mapfumo A, Apollo T, Garone DB, et al. Successes and gaps in the HIV cascade of care of a high HIV prevalence setting in Zimbabwe: a population-based survey. J Inter AIDS Soc. 2020;23(9):e25613. https://doi.org/10.1002/jia2.25613
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-77 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Prevailing against pandemics by putting people at the centre - World AIDS Day report 2020 [Internet]. 2020 [cited 29 Mar 2022]. Available from: https://www.unaids.org/sites/default/files/media_asset/prevailing-against-pandemics_en.pdf
https://www.unaids.org/sites/default/fil...
).

A descentralização da atenção ao HIV para a APS em países de baixa e média renda já é uma realidade, como por exemplo, na África Subsaariana, uma vez que cerca de 54% da população vive com HIV. Tal medida visa facilitar o tratamento, aumentando a adesão aos ARV e supressão viral, como também reduzir as possíveis barreiras para o atendimento e sobrecarga nos serviços ambulatoriais(3131 McHugh G, Brunskill A, Dauya E, Bandason T, Bwakura T, Duri C, et al. A comparison of HIV outpatient care in primary and secondary healthcare-level settings in Zimbabwe. Public Health Action. 2020;10(3):92-96. https://doi.org/10.5588/pha.20.0006
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).

Esse novo arranjo em saúde, que anteriormente era centrado nos serviços especializados, coloca a APS como porta de entrada e ordenadora do cuidado e os Serviços de Assistência Especializada (SAE) como serviços matriciais, sendo compartilhado o cuidado entre os dois níveis de assistência(3232 Ministério da Saúde (BR). Cinco passos para implantação do manejo da infecção pelo HIV na atenção básica [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2014 [cited 2022 Mar 29]. Available from: http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/2016/59352/coordendores_pdf_46953.pdf?file=1&type=node&id=59352&force=1
http://www.aids.gov.br/system/tdf/pub/20...
). As recomendações acerca do acompanhamento das PVHIV na APS indicam a criação de um ambiente acolhedor, singular, centrado na figura do paciente e livre de estigmas(3030 Thompson MA, Horberg MA, Agwu AL, Colasanti JA, Jain MK, Short WR, et al. Primary Care Guidance for Persons With Human Immunodeficiency Virus: 2020 Update by the HIV Medicine Association of the Infectious Diseases Society of America. Clin Infect Dis. 2021;73(1):e3572-e3605. https://doi.org/10.1093/cid/ciaa1391
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).

Pontua-se como aspectos positivos, o aumento da testagem e cobertura aos ARV, redução das distâncias percorridas e dos custos. Destaca-se como aspectos negativos para a descentralização: déficit de funcionários, aumento da demanda de trabalho, carência de experiência profissional, ausência de capacitações e de apoio dos serviços matriciais, medo e desconforto por parte dos pacientes em serem acompanhados próximo de suas residências(44 Abongomera G, Kiwuwa-Muyingo S, Revill P, Chiwaula L, Mabugu T, Phillips AN, et al. Impact of decentralisation of antiretroviral therapy services on HIV testing and care at a population level in Agago District in rural Northern Uganda: results from the Lablite population surveys. Inter Health. 2017;9(2):91-99. https://doi.org/10.1093/inthealth/ihx006
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,1212 Onwujekwe O, Chikezie I, Mbachu C, Chiegil R, Torpey K, Uzochukwu B. Investigating client perception and attitude to decentralization of HIV/AIDS treatment services to primary health centres in three Nigerian states. Health Expect. 2016;19(5):1111-20. https://doi.org/10.1111/hex.12403
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).

Nesta perspectiva, torna-se relevante o diagnóstico situacional, através da avaliação do processo de descentralização do atendimento às PVHIV para APS. Tal avaliação pode ser possível através do uso de instrumentos validados. Sendo assim, a construção de instrumentos validados é de suma importância para alcance dos objetivos de avaliação de determinados fenômenos em diferentes âmbitos. Destaca-se que, para realizar avaliações que possam contribuir para decisões estratégicas e melhorias dos processos de assistência à saúde, é necessário que os instrumentos de avaliação sejam fidedignos e tenham credibilidade(3333 Alexandre NMC, Coluci MZO. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8. https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000800006
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).

Neste estudo, a partir da pesquisa documental, foi possível estruturar o modelo lógico para a construção do instrumento de avaliação do atendimento à PVHIV na APS, baseado na tríade Estrutura-Processo-Resultados. Os modelos lógicos de avaliação são ferramentas que constituem uma representação gráfica do referencial teórico sobre o que é preconizado para a operacionalização na prática. Assim, foi possível elaborar uma proposta do instrumento e realizar a validação(2323 American educational research association et al. Standards for educational and psychological testing. American Educational Research Association, 2014.).

A validade de conteúdo é fundamental no processo de validação, pois, por meio dela, é possível verificar a relevância e representatividade dos itens propostos. O processo de validação por juízes especialistas, trata-se do julgamento a ser realizado por um grupo de peritos com experiência na área temática do instrumento, este tem como objetivo melhorar o conteúdo proposto, tornando-o mais preciso, confiável e válido naquilo que se propõe a analisar(3434 Pasquali L. Psicometria. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(spe):992-999. https://doi.org/10.1590/S0080-62342009000500002
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).

Desse modo, os resultados deste estudo, no que concerne à validação de conteúdo por juízes especialistas, sugeriu a exclusão de 3 itens, 2 destes (23 e 24) investigavam a realização de consultas de enfermagem e médicas a casos positivos de HIV e obtiveram o menor percentual de concordância nesta etapa. O item 40 também foi excluído, uma vez que, para os juízes, este item avaliava a aceitação/opinião por parte dos pacientes acerca do preservativo feminino. Apesar do coeficiente de Kappa ter apresentado resultados inferiores a 0,75, sendo necessária uma nova coleta com revisores técnicos, verifica-se que os juízes especialistas realizaram observações importantes para o aperfeiçoamento do instrumento e discussão da temática.

Pontuaram-se a necessidade de melhor estruturação da APS para a descentralização deste atendimento; a dificuldade em diagnosticar e acompanhar a população-chave, em especial, usuários de drogas; a importância da notificação das IST para o planejamento de ações preventivas, contudo, há a existência de subnotificações, principalmente na população geral, uma vez que há uma priorização da testagem e notificação em gestantes.

Outras questões foram ressaltadas, tais como: o acompanhamento apenas pelos SAE, por se tratar de serviços que dispõe de exames específicos, como TCD4 e carga viral (CV), disponibilização dos ARV e equipe multiprofissional, com exceção de gestantes e crianças co-infectadas, que geralmente são acompanhadas pelos dois níveis de atenção; a realização do teste rápido apenas por enfermeiros, o que vem causando a sobrecarga de trabalho, priorização de população específica, como gestantes e referência da população espontânea para os Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), dado que há a resistência pelos demais profissionais que compõem a APS em realizar a testagem.

Evidencia-se que a adoção de medidas de controle do HIV são mais eficazes em gestantes, contudo, verifica-se a necessidade de medidas de controle mais efetivas quanto à realização da testagem rápida da demanda espontânea, parceiros sexuais daqueles diagnosticados com HIV e mulheres com sinais sugestivos de IST, permitindo o acolhimento de todos os usuários que busquem o serviço, bem como possibilitando ações de prevenção, promoção e diagnóstico em tempo oportuno(1515 Donabedian A. The criteria and standards of quality. Ann Arbor, Michigan: Health administration Press; 1980. 504 p.,3535 Pinho CM, Dourado CARO, Lima MCL, Maia TS, Silva JFAS, Silva EL, et al. Avaliação das medidas de controle do HIV na atenção básica. Rev Eletrôn Acervo Saúde. 2020;12(8):e3462. https://doi.org/10.25248/reas.e3462.2020
https://doi.org/10.25248/reas.e3462.2020...
-3636 Silva ITS, Valença CN, Silva RAR. Mapping the implementation of the rapid HIV test in the Family Health Strategy: the nurses’ perspective. Esc Anna Nery. 2017;21(4):e20170019. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2017-0019
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).

Em estudo nacional, realizado com enfermeiros que atuam na APS, verificou-se que a existência de barreiras acerca do fluxo da rede, precariedade e inadequações na estrutura física das unidades e déficit de materiais e insumos. Também, pontuou-se carência de recursos humanos, com sobrecarga de trabalho e escassez de capacitações(1111 Lima MCL, Pinho CM, Dourado CARO, Silva MAS, Andrade MS. Diagnostic aspects and in-service training in the decentralization of care to people living with HIV. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e20210065. https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0065
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). Pontua-se que, muitas vezes, apenas os enfermeiros realizam as capacitações e executam o teste rápido, o que pode gerar aumento da demanda de trabalho, bem como a interrupção de tal atividade no serviço, prejudicando a assistência(22 Araújo WJ, Quirino EMB, Pinho CM, Andrade MS. Perception of nurses who perform rapid tests in Health Centers. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 1):631-6. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0298
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,1111 Lima MCL, Pinho CM, Dourado CARO, Silva MAS, Andrade MS. Diagnostic aspects and in-service training in the decentralization of care to people living with HIV. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e20210065. https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0065
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).

Na realização da validação de conteúdo por revisores técnicos, observou-se um aumento do nível de concordância e um coeficiente de Kappa superior ao recomendado. Nesta etapa, foram feitas poucas observações, sendo indicada a exclusão de apenas 2 itens (5 e 27). No item 5, cada revisor sugeriu um fator, sendo eles: vigilância em saúde, tratamento e Redes de Atenção à Saúde, o que justificou a exclusão. Quanto ao item 27, foi recomendada sua exclusão devido ao fato de, no estado de Pernambuco, o teste rápido por fluído oral ser realizado apenas para HIV e ofertado somente por ONG, o que dificultaria a resposta da população-meta, segundo os revisores.

Acerca da validação semântica, esta passou por revisão de português antes de seguir para esta etapa. A escolha de estudantes de medicina e enfermagem deu-se pela necessidade de aplicação na população com estrato mais baixo de habilidade, quando comparado à população-meta(3636 Silva ITS, Valença CN, Silva RAR. Mapping the implementation of the rapid HIV test in the Family Health Strategy: the nurses’ perspective. Esc Anna Nery. 2017;21(4):e20170019. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2017-0019
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).

Esta etapa da validação é de suma relevância, posto que traduz a avaliação daqueles que utilizarão o instrumento. Salienta-se que os instrumentos de avaliação devem possuir uma estrutura coesa, organizada, com linguagem adequada e suficiente para sua compreensão. Deve-se respeitar uma sequência lógica, com atenção àquilo que está sendo proposto a ser avaliado(1515 Donabedian A. The criteria and standards of quality. Ann Arbor, Michigan: Health administration Press; 1980. 504 p.,3333 Alexandre NMC, Coluci MZO. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8. https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000800006
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,3737 Pasquali L. Psicometria: Teoria dos testes na psicologia e na educação. 5ª ed. Editora Vozes; 2013. 392 p.-3838 Rodrigues ILA, Nogueira LMV, Pereira AA, Abreu PA, Nascimento LC, Vasconcelos EMR, et al. Learning through play: semantic validation of educational technology on tuberculosis for school children. Esc Anna Nery. 2021;25(4):e20200492. https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2020-0492
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).

Nesta perspectiva, a construção de um instrumento para avaliação do processo de atendimento às PVHIV para APS auxiliará na avaliação do funcionamento do sistema de atenção às PVHIV, posto que, muitas vezes, estes pacientes são condicionados a peregrinações na tentativa de resolução de seus problemas dentro do sistema de saúde. A (re)estruturação da APS para o atendimento às PVHIV poderá proporcionar a continuidade da assistência, com a promoção do vínculo entre profissionais e pacientes, otimização das ações voltadas para educação em saúde, promoção, prevenção, diagnóstico e tratamento do HIV/Aids, sendo possível um maior controle da infecção pelo HIV(44 Abongomera G, Kiwuwa-Muyingo S, Revill P, Chiwaula L, Mabugu T, Phillips AN, et al. Impact of decentralisation of antiretroviral therapy services on HIV testing and care at a population level in Agago District in rural Northern Uganda: results from the Lablite population surveys. Inter Health. 2017;9(2):91-99. https://doi.org/10.1093/inthealth/ihx006
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,1010 Zambenedetti G, Silva RAN. Descentralização da atenção em HIV-Aids para a atenção básica: tensões e potencialidades. Physis: Rev Saúde Coletiva. 2016;26(3):785-806. https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000300005
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).

Limitações do estudo

O processo de descentralização do atendimento às PVHIV na APS, no Brasil, encontra-se com diferentes estágios de implantação. Esse aspecto pode ter dificultado a avaliação pelos juízes especialistas, uma vez que, os itens do instrumento avaliam questões que ficariam mais claras para serem respondidas por profissionais que atuam em serviços implantados de forma integral. Assim, os integrantes da pesquisa podem ter respondido itens ainda não vivenciados na prática da assistência às PVHIV na APS.

Contribuições para a área

Espera-se que o uso deste instrumento possibilite a implantação das ações voltadas ao processo de descentralização do atendimento às PVHIV para APS, como também a identificação das potencialidades e fragilidades do processo. Além disso, que a aplicação desta ferramenta auxilie gestores e profissionais de saúde na estruturação de unidades de saúde que ainda tem o serviço centralizado, bem como aperfeiçoamento das unidades de saúde que já iniciaram o processo de descentralização, com vistas ao êxito do processo de descentralização e cuidado integral às PVHIV.

CONCLUSÕES

O desenvolvimento do modelo lógico subsidiou a construção do instrumento intitulado “Avaliação do processo de descentralização do atendimento a Pessoas Vivendo com HIV para Atenção Primária à Saúde”, sendo possível a identificação das ações voltadas a prevenção da infecção pelo HIV/IST e os componentes a serem utilizados na atenção primária para promoção da acessibilidade e do atendimento de qualidade a estes usuários.

O instrumento encontra-se validado no que concerne o seu conteúdo, de acordo com as recomendações das instituições AERA, APA e NCME. Este é composto por 63 itens distribuídos em 6 fatores, sendo eles: “Recursos físicos, materiais e humanos”; “Vigilância e prevenção em saúde”; “Exames de diagnóstico e de rotina”; “Educação permanente”; “Educação em saúde e Rede de Atenção à Saúde”. O item 63 foi mantido no instrumento, contudo, foi o único que obteve consenso no fator Tratamento, sugerindo-se que este fator não fosse considerado, devendo ser avaliado em novas análises. Recomenda-se a continuidade do estudo acerca da validação de constructo do instrumento.

REFERENCES

Editado por

EDITOR CHEFE: Álvaro Sousa
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    21 Abr 2022
  • Aceito
    09 Out 2022
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