Escala de avaliação dos métodos de trabalho dos enfermeiros: um estudo de validação de conteúdo

RESUMO

Objetivo:

Construir e validar o conteúdo da Escala de Avaliação dos Métodos de Trabalho dos Enfermeiros.

Métodos:

Estudo metodológico realizado entre janeiro e fevereiro de 2022, baseado nos Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem e no referencial de Imogene King. Para construção da Escala, realizou-se previamente revisão de literatura. A validação de conteúdo contou com 23 peritos.

Resultados:

A versão inicial continha 40 itens, organizados nos quatro métodos de trabalho identificados na literatura. Na primeira dimensão, dos dez itens, foram considerados sete e um foi reformulado. Na segunda, dos dez iniciais, foram considerados sete. A terceira dimensão constituiu-se por sete itens. Na quarta dimensão, reformularam-se três e excluíram-se três, ficando sete. A versão final ficou com 28 itens, cujo Índice de Validade de Conteúdo oscilou entre 0,83 e 1.

Conclusões:

Recorrer aos peritos tornou-se fundamental na construção e validação dos itens, conferindo segurança à continuidade dos procedimentos psicométricos.

Descritores:
Estudos de Validação; Cuidados de Enfermagem; Trabalho; Enfermeiras e Enfermeiros; Pesquisa em Administração de Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To develop and validate the content of the Nurses’ Work Methods Assessment Scale.

Methods:

Methodological study conducted between January and February 2022, based on the Quality Standards for Nursing Care and Imogene King’s framework. A literature review was previously undertaken to design the scale. The content validation was carried out by 23 experts.

Results:

The initial version consisted of 40 items organized in four work methods identified in the literature. In the first dimension, from ten items, seven were considered, and one was reformulated. Seven of the initial ten items were considered in the second version. The third dimension consisted of seven items. In the fourth dimension, three items were reformulated, and three were excluded, leaving seven items. The final version ended with 28 items, whose Content Validity Index ranged between 0.83 and 1.

Conclusions:

The involvement of experts has become pivotal in the development and validation of the items, providing confidence to the continuity of psychometric procedures.

Descriptors:
Validation Studies; Nursing Care; Work; Female and Male Nurses; Nursing Administration Research

RESUMEN

Objetivo:

Construir y validar contenido de Escala de Evaluación de Métodos de Trabajo de Enfermeros.

Métodos:

Estudio metodológico realizado entre enero y febrero de 2022, basado en Estándares de Calidad de Atención de Enfermeríay referencial de Imogene King. Para construcción de Escala, realizado previamente revisión de literatura. La validez de contenido contó con 23 peritos.

Resultados:

La versión inicial contenía 40 items, organizados en cuatro métodos de trabajo identificados en la literatura. La primera dimensión, de diez items, fueron considerados siete y uno fue reformulado. La segunda, de diez iniciales, fueron considerados siete. La tercera dimensión constituída por siete ítems. La cuarta dimensión, reformulados tres y excluidos tres, quedando siete. La versión final quedó con 28 items, cuyo Índice de Validez de Contenido osciló entre 0,83 y 1.

Conclusiones:

Recorrer a peritos volvió fundamental en la construcción y validez de los items, confiriendo seguridad a continuidad de procedimientos psicométricos.

Descriptores:
Estudios de Validación; Atención de Enfermería; Trabajo; Enfermeras y Enfermeros; Investigación en Administración de Enfermería

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, uma das preocupações das organizações de saúde em nível mundial tem-se centrado na qualidade dos cuidados, assim como na segurança do paciente. Efetivamente, os resultados dos trabalhos de autores ao longo dos tempos fazem emergir, no domínio da saúde, a presença de pessoas cada vez mais exigentes, a existência de dinâmicas de trabalho complexas e um rápido desenvolvimento tecnológico, perante um mundo cada vez mais globalizado e com reflexo no exercício de cada profissional(¹, ²). Nesse sentido, a Organização Mundial da Saúde alerta que os domínios da segurança e qualidade dos cuidados têm melhorado com a implementação de diretrizes baseadas em evidência com eficácia comprovada(³).

No âmbito dos cuidados de enfermagem, os enfermeiros, desde sempre e em todo o mundo, estiveram na vanguarda da prestação de cuidados, numa perspectiva de conceber e executar cuidados de qualidade, seguros e acessíveis, em face das inovações e avanços que a ciência reflete nos cuidados de saúde(⁴).

A Ordem dos Enfermeiros de Portugal, no ano de 2001, evidenciou a necessidade de os profissionais nortearem o seu exercício profissional com base nos Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem. Esse instrumento regulador indica à sociedade o que se pode esperar em termos de cuidados de enfermagem, e aos enfermeiros o que se espera no seu conjunto e o que cada um deve fazer para um exercício profissional de qualidade(⁵, ⁶). No sentido de concretizar esses padrões, o mesmo órgão regulador apresenta seis enunciados descritivos, que permitem a orientação do exercício profissional dos enfermeiros e a reflexão sobre os cuidados prestados, tomada de decisão em enfermagem e definição do papel do enfermeiro junto dos pacientes, dos outros profissionais, dos decisores políticos e da sociedade em geral(⁶). Destacam-se a satisfação do paciente; a promoção da saúde; a prevenção de complicações; o bem-estar e o autocuidado; a readaptação funcional; e a organização dos cuidados de enfermagem.

No que concerne à organização dos cuidados de enfermagem, salienta-se a necessidade de os enfermeiros adotarem metodologias que promovam a qualidade(⁵) e reflitam a segurança dos cuidados prestados. Num estudo internacional, a constatação dos autores foi: os enfermeiros identificaram que a metodologia de organização dos cuidados de enfermagem usada no seu serviço era majoritariamente promotora da qualidade e apenas uma minoria discordava dessa opinião(⁷).

Um método de trabalho é descrito por abordagens independentes ou colaborativas dos enfermeiros para prestar cuidados diretos e atender às necessidades do paciente(⁸, ⁹). Ao longo do tempo, os métodos de trabalho foram evoluindo de acordo com a inovação e tecnologia, bem como a exigência dos pacientes por cuidados de qualidade; e esses métodos foram tradicionalmente conceitualizados como método de trabalho funcional, método de trabalho individual, método de trabalho de equipe e método de trabalho de enfermeiro de referência(¹⁰). No entanto, podem variar entre eles, atendendo à filosofia, concepção, carga de trabalho, equipe de enfermagem, organização dos pacientes, combinação de habilidades e custos, mas têm por objetivo melhorar a qualidade da assistência de enfermagem(¹¹). Na verdade, a escolha de um método de trabalho traduz uma perspectiva, uma filosofia de cuidado, uma forma de pensar e organizar o cuidado dos enfermeiros e da equipe de enfermagem, sendo determinante para a segurança dos pacientes e para a qualidade dos cuidados de enfermagem(¹⁰, ¹¹).

Numa recente revisão, os autores confirmaram que o uso de um método de trabalho faz emergir implicações para o paciente, para os próprios enfermeiros e para as instituições, permitindo mostrar o trabalho e percurso formativo do enfermeiro e as características institucionais dos diferentes contextos de cuidados(⁶).

Diante da importância que essa questão assume para o exercício profissional dos enfermeiros e à luz da literatura sobre a forma como os enfermeiros organizam o seu trabalho, tornou-se premente a construção de um instrumento. Para tal, recorreu-se à Teoria de Alcance de Metas de Imogene King. De acordo com a autora, a enfermagem dedica-se ao estudo do cuidado dos seres humanos, em resposta às necessidades percebidas pelos pacientes e pelos enfermeiros, com intuito de avaliar as possibilidades de autocuidado e explorar os meios para atingir uma meta(¹²). Nesse sentido, King demonstrou preocupação com a natureza da enfermagem, chegando ao entendimento de que a forma como os enfermeiros atuam e cuidam das pessoas, ao longo do desempenho profissional, diferencia a enfermagem das outras profissões da área da saúde. A autora mostrou também a importância de que os enfermeiros adotassem um método de trabalho, assim como um sistema de documentação que garantisse a coleta de dados, a identificação de problemas, a implementação e a avaliação da eficácia dos cuidados de enfermagem(¹², ¹³).

OBJETIVO

Construir e validar o conteúdo da Escala de Avaliação dos Métodos de Trabalho dos Enfermeiros.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O desenvolvimento deste estudo atendeu aos preceitos legais e éticos, conforme o preconizado pelas Normas Nacionais e Internacionais de Ética para a realização de pesquisas que envolvam seres humanos. Todos os envolvidos foram esclarecidos acerca dos objetivos e finalidade do estudo e assinaram o consentimento informado, havendo compromisso dos investigadores em garantir a confidencialidade e o anonimato na utilização da informação coletada. Importa referir que este estudo está alicerçado numa investigação mais ampla, designada de “Métodos de Trabalho dos Enfermeiros no Contexto Hospitalar: Contributos para a Qualidade e Segurança dos Cuidados” e aprovada por um Comitê de Ética, com o número 421-21, em fevereiro de 2022.

Desenho, local do estudo e período

Estudo metodológico com vista à construção e validação de conteúdo de um instrumento que permite avaliar os métodos de trabalho dos enfermeiros em contexto hospitalar.

O estudo foi realizado numa instituição hospitalar de referência, localizada no Norte de Portugal. Destaca-se que essa instituição, em consonância com os Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem(⁶), tem investido nas metodologias de organização dos cuidados de enfermagem.

A coleta de dados dos peritos ocorreu entre janeiro e fevereiro de 2022, mediante um questionário eletrônico, via Google Forms. Para além da proposta dos vários itens a incluir na Escala de Avaliação dos Métodos de Trabalho dos Enfermeiros (EAMTE), foi também realizada a caracterização sociodemográfica e profissional dos peritos.

Amostra, critérios de inclusão e exclusão

Para seleção dos peritos, utilizou-se uma amostragem não probabilística do tipo intencional, definindo-se como critérios de inclusão os profissionais enfermeiros, enfermeiros especialistas, enfermeiros gestores e docentes de enfermagem, com exercício profissional igual ou superior a seis meses e que aceitassem participar do estudo. De um total de 29 peritos selecionados, foram obtidas 23 respostas (79,3%). O convite para participar foi enviado por correio eletrônico, ressalvando-se que, antes de dar início ao preenchimento do questionário, os peritos tiveram de consentir, de forma livre e esclarecida, a sua participação.

Protocolo do estudo

Para a construção dos itens a serem incluídos no instrumento, numa fase inicial, recorreu-se a uma revisão do tipo scoping, no sentido de mapear a evidência científica sobre os métodos de trabalho dos enfermeiros em contexto hospitalar. Os Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem(⁶) da Ordem dos Enfermeiros de Portugal (nomeadamente o enunciado descritivo “Organização dos Cuidados de Enfermagem”) e a Teoria de Alcance de Metas de Imogene King(¹²) foram os referenciais teóricos usados. Consequentemente, os achados foram organizados de acordo com cada tipo de método de trabalho relacionado com o desempenho profissional do enfermeiro(¹⁰): método de trabalho funcional, método de trabalho individual, método de trabalho de equipe e método de trabalho de enfermeiro de referência.

Após essa etapa, a primeira versão da EAMTE ficou constituída por 40 itens: 10 itens por cada método de trabalho.

A validação de conteúdo dos itens incluídos no instrumento foi realizada com recurso a uma análise de peritos (juízes) apresentada neste estudo. Nessa fase, para apreciação de cada item da escala, utilizou-se uma escala do tipo Likert graduada em três pontos(¹⁴): discordo; nem discordo/nem concordo; concordo. Consideraram-se três critérios: a relevância para o construto; a clareza e a semelhança com outros itens. Além dos critérios anteriores, cada perito podia tecer a sua opinião sobre a necessidade de reformulação, exclusão ou reposicionamento.

Análise dos resultados e estatística

No tocante aos critérios de avaliação de cada item, a afirmação era mantida sempre que a relevância e a clareza fossem superiores a 80%. Em caso de referência a alguma semelhança com outros itens, o respectivo item era removido. Recorreu-se ao cálculo do Índice de Validade de Conteúdo (IVC)(¹⁴, ¹⁵) para perceber a concordância dos peritos quanto à representatividade de cada item em relação ao conteúdo abordado. Dessa forma, se o IVC era ≥ 0,80, o item em análise era considerado como válido e, como tal, deveria ser mantido no instrumento(¹⁵). O cálculo do IVC de cada item resultou da divisão do número de peritos que concordaram com o item pelo número total desses profissionais(¹⁴).

RESULTADOS

Participaram do estudo 23 peritos, sendo 69,6% enfermeiros, enfermeiros especialistas ou enfermeiros gestores e 30,4% docentes da área de enfermagem, majoritariamente do sexo feminino (69,6%), casados ou a viver em união estável (78,3%). Verificou-se que a idade média foi 43,5 anos, desvio-padrão de 9,6, sendo a idade mínima de 30 anos e a idade máxima de 62 anos. Relativamente ao grau acadêmico, 30,4% eram licenciados, 39,1% possuíam o mestrado, e 30,5% eram doutores. Quanto à profissão, 21,8% eram enfermeiros; 26,1 %, enfermeiros especialistas; 21,8%, enfermeiros gestores; 26,1 %, professores adjuntos; e 4,3%, professores coordenadores. O tempo de exercício profissional apresentou uma média de 21,5 anos, desvio-padrão de 10,2, variando entre os 7 e os 41 anos.

O questionário submetido à validação dos peritos era composto por 40 itens distribuídos por quatro dimensões que correspondem aos quatro métodos de trabalho adotados pelos enfermeiros e identificados na revisão da literatura(¹⁰): método de trabalho funcional, método de trabalho individual, método de trabalho de equipe e método de trabalho de enfermeiro de referência.

Decorrente da avaliação realizada pelos peritos na dimensão Método deTrabalho Funcional, dos dez itens propostos, sete foram considerados como adequados, com necessidade de reescrever um dos itens. A repetição de informações, a redação confusa e a existência de aspectos difíceis de quantificar determinaram a exclusão de três itens. Com intuito de perceber a pertinência de cada item quanto ao construto, foi calculado o IVC dos dez itens, cujos resultados estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Concordância dos peritos relativamente à representatividade do construto dos itens da dimensão Método de Trabalho Funcional

Itens da dimensão “Método de trabalho funcionar”	IVC
1. Durante o turno, há intervenções de enfermagem que executo a todos os doentes internados no serviço.	0,91
2. Aquando da admissão de um doente no serviço, divido as intervenções com os restantes enfermeiros, para facilitar o trabalho.	0,87
3. O foco de atenção do meu trabalho centra-se na execução de procedimentos previamente definidos e padronizados.	0,91
4. Sinto que o meu trabalho é reconhecido por meio da realização de intervenções padronizadas.	0,91
5. Durante o planeamento e implementação das intervenções, dedico-me exclusivamente à sua execução, sem nenhum envolvimento do doente nos cuidados.	0,91
6. Durante o planeamento e implementação das intervenções, dedico-me exclusivamente à sua execução, sem envolvimento do cuidador/familiar cuidador.	1,00
7. O resultado dos cuidados de enfermagem que presto está direcionado para o cumprimento das intervenções.	0,83

No âmbito da dimensão Método de Trabalho Individual, da análise dos peritos, foram considerados sete itens adequados de um total de dez. A ausência de conteúdo relevante e a repetição de informações determinaram a exclusão de três itens. Dessa forma, a segunda versão da dimensão ficou constituída por sete itens. Em relação ao construto, a Tabela 2 salienta a relevância de cada item do Método deTrabalho Individual, segundo o IVC.

Tabela 2
Concordância dos peritos relativamente à representatividade do construto dos itens da dimensão Método de Trabalho Individual

Itens da dimensão Método de Trabalho Individual	IVC
1. Durante um turno de trabalho, assumo a total responsabilidade por conceber e executar cuidados aos doentes que me estão atribuídos.	0,87
2. O foco de atenção do meu trabalho é a conceção e a implementação de cuidados ao doente durante um turno.	0,87
3. Na organização dos cuidados de enfermagem, privilegio a integração do doente em detrimento da execução de intervenções padronizadas.	0,96
4. Considero que o acompanhamento dos mesmos doentes ao longo de um turno garante uma assistência de enfermagem mais humanizada e personalizada.	0,91
5. A organização dos cuidados de enfermagem que presto está direcionada ao atendimento integral do doente.	0,91
6. No planeamento e na implementação das intervenções, contemplo o envolvimento da família/familiar cuidador.	0,83
7. Em cada turno de trabalho, realizo a avaliação dos resultados das intervenções, de modo a reformular o plano de cuidados.	0,96

No que concerne à dimensão Método deTrabalho de Equipe, dos dez itens propostos para análise dos peritos, três foram excluídos devido à repetição e à presença de informação avaliada como não relevante, motivo pelo qual foram considerados sete itens como adequados. Um dos itens foi reformulado por aspectos relacionados à sintaxe. A Tabela 3 apresenta o cálculo do IVC para cada item do Método de Trabalho de Equipe.

Tabela 3
Concordância dos peritos relativamente à representatividade do construto dos itens da dimensão Método de Trabalho de Equipe

Itens da dimensão Método de Trabalho de Equipe	IVC
1. Os cuidados de enfermagem que presto são orientados e supervisionados por um enfermeiro que é designado de líder/chefe de equipa.	0,91
2. Existem reuniões diárias entre os enfermeiros e os enfermeiros líderes/chefe de equipa, para discutir os cuidados de enfermagem a prestar ao doente, visando à continuidade de cuidados.	0,87
3. Existe um líder de equipa com a responsabilidade de garantir cuidados de enfermagem de qualidade e seguros, recorrendo às estratégias de liderança, controlo e técnicas de supervisão.	0,87
4. Valorizo a continuidade de cuidados, por meio da discussão dos planos de cuidados de enfermagem, entre os enfermeiros líderes/ chefes de equipa e os restantes enfermeiros.	0,91
5. As necessidades de cuidados dos doentes são satisfeitas por uma equipa de enfermeiros com diferentes níveis de competência.	1,00
6. Ao longo de cada turno, é comum o planeamento e a implementação de cuidados serem realizados por um grupo de enfermeiros.	0,96
7. O líder de equipa discute com os enfermeiros estratégias para o envolvimento da família/familiar cuidador, no planeamento e implementação de cuidados.	0,87

Já na dimensão Método de Trabalho de Enfermeiro de Referência, a versão final da EAMTE apresenta também sete itens. Antes da avaliação dos peritos, eram dez itens; contudo, após a sua análise, excluíram-se três, bem como houve a necessidade de reformular a redação das três atividades, com vista a uma melhor compreensão. Com base no IVC, a Tabela 4 evidencia o valor relativo a cada item da dimensão Método de Trabalho de Enfermeiro de Referência.

Tabela 4
Concordância dos peritos relativamente à representatividade do construto dos itens da dimensão Método de Trabalho de Enfermeiro de Referência

Itens da dimensão Método de Trabalho de Enfermeiro de Referência	IVC
1. Existe um enfermeiro de referência por cada doente, desde o momento de admissão até à alta hospitalar, e outros enfermeiros que o substituem na ausência desse enfermeiro.	0,91
2. Na ausência do enfermeiro de referência do doente, os cuidados são prestados pelos enfermeiros a ele “associados”.	0,91
3. Sempre que possível, são-me atribuídos os doentes que admiti no serviço.	0,96
4. O enfermeiro de referência do doente planeia e avalia os cuidados prestados por si e pelos enfermeiros associados, sugerindo alterações no planeamento e na implementação dos cuidados, desde a admissão à alta.	0,91
5. A reformulação do planeamento de cuidados é validada pelo enfermeiro de referência.	0,87
6. Durante o planeamento e implementação das intervenções, procuro envolver sempre o doente.	0,91
7. Durante o planeamento e implementação das intervenções de enfermagem, procuro envolver sempre o cuidador/familiar cuidador.	0,83

DISCUSSÃO

A organização dos cuidados de enfermagem constitui um aspecto basilar para uma assistência de enfermagem que garanta ganhos efetivos para o paciente, para o enfermeiro e para a instituição(¹⁰, ¹⁶). Na verdade, a literatura aponta que a seleção de um método de trabalho pelo enfermeiro poderá potencializar a segurança dos pacientes e a qualidade dos cuidados de enfermagem(¹⁰).

Vários autores, em trabalhos anteriores, evidenciam que os métodos de trabalho dos enfermeiros foram evoluindo ao longo dos tempos, acompanhando as diversas exigências que uma prestação de cuidados de qualidade impõe. Efetivamente, é possível identificar quatro métodos de trabalho adotados pelos enfermeiros: método de trabalho funcional, direcionado para a execução de tarefas; método de trabalho de equipe, orientado para a centralidade do paciente; método de trabalho com enfoque na assistência total ao paciente, também designado de individual; e, por fim, o método de trabalho de enfermeiro de referência ou Primary Nursing(¹⁰, ¹⁷).

Contudo, atendendo à importância dessa matéria para os enfermeiros, no contexto nacional e no contexto internacional, não se constatou a existência de instrumentos que permitam, para cada método de trabalho, perceber quais atividades de enfermagem os integram. Nesse sentido, o desafio recaiu na necessidade de construir um instrumento que permitisse espelhar a forma como os enfermeiros organizam o seu trabalho, dar visibilidade social ao que os enfermeiros fazem, como também contribuir para o desenvolvimento da enfermagem e do respectivo exercício profissional.

Importa realçar que esta investigação permitiu a validação de conteúdo da Escala de Avaliação dos Métodos de Trabalho dos Enfermeiros, com a intervenção de peritos que tiveram oportunidade de sugerir alterações no que concerne à relevância e clareza de cada item. Assim, conseguiu-se a adequação do instrumento aos contextos da prática clínica.

A opção por selecionar peritos com experiência no ambiente acadêmico e na prática clínica teve a intenção de contribuir para maior robustez do instrumento construído. Dessa forma, foi possível aliar os aspectos da prática clínica aos do contexto acadêmico e selecionar, de forma rigorosa, os itens a incluir em cada dimensão, congruentes com a segurança e qualidade dos cuidados de enfermagem.

No instrumento construído — em consonância com a orientação da Ordem dos Enfermeiros de Portugal no ano de 2001, revista e republicada em 2012(⁶) — e na sequência da revisão da literatura, foram definidas quatro dimensões, relacionadas a cada método de trabalho.

Na dimensão Método deTrabalho Funcional, os sete itens da atual versão da escala centraram-se essencialmente numa prática de enfermagem direcionada para a concretização de tarefas, com separação da concepção e execução e o afastamento do paciente e família ao longo do processo de cuidar. O enfoque desse método volta-se para uma distribuição do trabalho com base na realização de tarefas e procedimentos, em que o alvo da ação não é o paciente, e sim a tarefa(⁹, ¹⁰). Sobre isso, num estudo realizado em 2021, que objetivou analisar os métodos de trabalho dos enfermeiros com suporte nas teorias de enfermagem e de gestão, os autores salientaram que a assistência de enfermagem nesse método alcançava a proficiência por meio da repetição sistemática de técnicas como a administração de fármacos, monitorização de sinais vitais, prestação de cuidados de higiene, havendo por isso uma falta de coordenação entre as partes, representada por intervenções “fragmentadas”(¹¹), tendo sido considerada essa questão na construção das atividades. Importa ainda destacar a dificuldade na inclusão do processo de enfermagem, dada a filosofia de uma prática fragmentada, o que vem corroborar a literatura anterior(¹⁰, ¹¹, ¹⁸).

Ressaltando os métodos de trabalho voltados para o paciente, os sete itens incluídos na dimensão Método de Trabalho Individual foram conceitualizados de acordo com a assistência integral ao paciente, com ênfase na prestação de cuidados individualizada, atendimento integral e satisfação das necessidades do paciente. A literatura aponta que um único enfermeiro tem a responsabilidade pela concepção e execução do cuidado integral a um ou mais pacientes, satisfazendo todas as necessidades destes(¹⁸). Efetivamente, verifica-se a preocupação do envolvimento do paciente e familiar cuidador ao longo do processo de cuidar, fazendo-os parte integrante(¹¹). Ademais, é preciso recorrer ao processo de enfermagem como forma de identificação e satisfação das necessidades do paciente, para cuidados centrados na pessoa e tomada de decisão sustentada(¹⁹); continuidade de cuidados(¹¹); e uma maior segurança e qualidade da assistência de enfermagem(²⁰).

A dimensão Método deTrabalho de Equipe da atual versão da EAMTE, após a avaliação dos peritos, conta com sete itens que refletem a organização do trabalho do enfermeiro sobre o trabalho em equipe, com enfoque na presença de um líder de equipe, na assistência integral ao paciente, na concepção de cuidados e tomada de decisão em equipe, bem como no envolvimento do paciente e familiar cuidador em todo o processo. Num estudo internacional, foi evidenciado que todos os enfermeiros detêm conhecimento das necessidades e/ou problemas do paciente, assistindo-os na sua integralidade e contribuindo de forma particular para o seu bem-estar(²¹). Ainda, a literatura aponta que o fato de os enfermeiros serem divididos em equipes e orientados por líderes de equipe, para além de constituírem uma referência para os enfermeiros, permite que assumam a responsabilidade de maximizar as capacidades do grupo e as diferentes competências individuais de cada enfermeiro(²¹, ²²), aspectos tidos em consideração na construção das atividades desta dimensão.

Na dimensão Método de Trabalho de Enfermeiro de Referência, foi dado enfoque à definição de um enfermeiro como responsável pelo processo de cuidar do paciente, desde o momento da admissão até a alta clínica. Na verdade, os sete itens que compõem a dimensão relevam a importância de um cuidado integral, da responsabilidade de um enfermeiro e dos enfermeiros a ele associados, no que concerne à coleta de dados relevantes, planejamento e implementação de intervenções de enfermagem, com envolvimento do paciente e familiar cuidador. Esses itens também destacam a reformulação do plano de cuidados em função dos problemas do paciente, garantindo aspectos relacionados com a segurança e qualidade dos cuidados de enfermagem.

Nesse contexto, num estudo que avaliou a relação entre a implementação do método de trabalho de enfermeiro de referência e a redução dos cuidados de enfermagem omissos, ficou claro que os cuidados de enfermagem perdidos reduziram em 78,5%; isso refletiu numa maior satisfação da equipe de enfermagem e foi possível graças ao maior envolvimento com o paciente e familiar cuidador, identificação mais precisa das necessidades de cuidados, planejamento e implementação das intervenções de enfermagem e, como tal, maior segurança da assistência de enfermagem(²³). Em outro estudo, que analisou o efeito do método de trabalho de enfermeiro de referência na assistência de enfermagem e na precisão da documentação de enfermagem, os autores constataram que a forma como os enfermeiros documentaram os cuidados reflete o processo de enfermagem, especialmente os reais problemas do paciente e a avaliação das intervenções de enfermagem para resolver esses mesmos problemas. Assim, foi dada ênfase à satisfação dos pacientes com os cuidados prestados, à qualidade da assistência de enfermagem e às competências do enfermeiro(²⁴), o que se encontra em consonância com os itens da escala definidos para essa dimensão.

Relativamente aos valores obtidos no IVC, embora a EAMTE tenha revelado uma validade de conteúdo adequada, realçamos que este estudo refere-se a uma das primeiras fases de construção de instrumentos. Sendo assim, será necessária a aplicação desse instrumento à população-alvo com a realização de procedimentos psicométricos, o que efetivamente já está em concretização em estudo multicêntrico. Importa ainda destacar que a EAMTE foi construída com base na prática profissional dos enfermeiros e enfermeiros especialistas, seguindo tantos os Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem preconizados pela Ordem dos Enfermeiros quanto a Teoria de Alcance de Metas de Imogene King. Além disso, a intervenção dos peritos foi fundamental no sentido de validarem a relevância dos itens, fornecerem melhorias quanto à sintaxe e redação das atividades e, dessa forma, realizarem a adequação do instrumento.

Limitações do estudo

Novos instrumentos que fornecem evidências sobre os métodos de trabalho dos enfermeiros permitem acompanhar as práticas e melhorar a qualidade dos cuidados prestados. Nessa direção, consideram-se um limite as circunstâncias (região do país, temporalidade, entre outras) da validação, sendo oportuno validar o instrumento nos cenários das pesquisas que o utilizarem.

Contribuições para a Área

Os 28 itens que englobam a versão atual da EAMTE centram-se nas atividades que poderão integrar os quatro métodos de trabalho adotados pelos enfermeiros, no desempenho do seu exercício profissional. Esses itens são indicativos importantes da forma como cada enfermeiro organiza o seu trabalho, dando subsídios para a visibilidade social do enfermeiro e manutenção da assistência de enfermagem numa lógica de prestação de cuidados seguros e de qualidade.

CONCLUSÕES

O percurso de validação de conteúdo da EAMTE constituiu-se como um meio de confirmação da relevância teórica de cada item incluído nas quatro dimensões da Escala. O caminho percorrido até ao momento possibilita evidenciar o propósito para o qual o instrumento será usado e destaca como necessária a continuidade do processo de construção da Escala no que concerne aos procedimentos inerentes à validação. A EAMTE viabilizará a percepção de como o enfermeiro organiza o seu trabalho, principalmente na forma como se dá a prática da gestão da assistência de enfermagem, a qual se pretende que seja segura e de qualidade.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  06 Fev 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  21 Jul 2022
• Aceito
  05 Out 2022