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O uso do brinquedo pela enfermagem como recurso terapêutico na assistência à criança hospitalizada

RESUMO

Objetivos:

descrever o uso do brinquedo pela enfermagem durante a assistência à criança na unidade de internação; analisar os fatores que influenciam a utilização do brinquedo terapêutico pela enfermagem no cuidado da criança hospitalizada.

Métodos:

pesquisa qualitativa, realizada em um hospital pediátrico do Rio de Janeiro entre julho e agosto de 2019. O procedimento metodológico foi a entrevista semiestruturada e análise temática.

Resultados:

os 12 enfermeiros e 7 técnicos de enfermagem revelam como principais benefícios minimizar o medo, aliviar a tensão e criar vínculo entre criança e profissional e; utilizam como recursos: brinquedos da criança, materiais hospitalares, desenhos animados e vídeos infantis. A alta demanda de trabalho e o déficit de recursos humanos e materiais lúdicos apropriados são fatores que interferem no uso do brinquedo como recurso terapêutico.

Considerações Finais:

embora os participantes reconheçam a importância do brinquedo enquanto recurso terapêutico, não há sistematização de sua utilização na prática pediátrica.

Descritores:
Jogos e Brinquedos; Criança Hospitalizada; Unidades de Internação; Cuidados de Enfermagem; Enfermagem Pediátrica.

ABSTRACT

Objectives:

to describe the use of toys by nursing during the care of children in the inpatient unit; to analyze the factors that influence the use of therapeutic toys by nursing in the care of hospitalized children.

Methods:

qualitative research, conducted in a pediatric hospital in Rio de Janeiro between July and August 2019. Semi-structured interview and thematic analysis were used as methodological procedure.

Results:

the 12 nurses and 7 nursing technicians revealed minimizing fear, relieving tension, and creating a bond between the child and the professional as the main benefits; they use as resources: children’s toys, hospital materials, cartoons, and children’s videos. The high demand for work, deficit of human resources, and appropriate ludic materials are factors that interfere with the use of toys as a therapeutic resource.

Final Considerations:

although the participants recognize the importance of the toy as a therapeutic resource, there is no systematization of its use in pediatric practice.

Descriptors:
Games and Toys; Hospitalized Children; Inpatients Units; Nursing Care; Pediatric Nursing.

RESUMEN

Objetivos:

describir uso del juguete por la enfermería durante la atención al niño en unidad de internación; analizar los factores que influencian la utilización del juguete terapéutico por la enfermería en la atención al niño hospitalizado.

Métodos:

investigación cualitativa, realizada en un hospital pediátrico de Rio de Janeiro entre julio y agosto de 2019. Procedimiento metodológico fue la entrevista semiestructurada y análisis temático.

Resultados:

los 12 enfermeros y 7 técnicos de enfermería revelan como principales beneficios minimizar miedo, aliviar tensión y construir vínculo entre niño y profesional; utilizan como recursos: juguetes del niño, materiales hospitalarios, dibujos animados y videos infantiles. La alta demanda de trabajo y el déficit de recursos humanos y materiales lúdicos apropiados son factores que interferen en el uso del juguete como recurso terapéutico.

Consideraciones Finales:

aunque los participantes reconozcan la importancia del juguete mientras recurso terapéutico, no hay sistematización de su utilización en la práctica pediátrica.

Descriptores:
Juego e Implementos de Juego; Niño Hospitalizado; Unidades de Internación; Atención de Enfermería; Enfermería Pediátrica.

INTRODUÇÃO

O processo de hospitalização é um difícil enfrentamento para a criança e seus familiares. A rotina à qual a criança está habituada sofre alterações, e a permanência no ambiente hospitalar desencadeia estresse, medo, ansiedade e, por muitas vezes, trauma emocional. Nesse sentido, tal situação pode comprometer a sua saúde física e psicológica, além de dificultar a capacidade de lidar com procedimentos, causar mudanças no comportamento e prejudicar a recuperação(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
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2 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm Atual Derm. 2019;88(26):1-8. Available from: http://www.revistaenfermagematual.com.br/index.php/revista/article/view/129
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3 Oliveira LE, Correa Júnior AJS, Martins RS, Moura AAA, Nascimento CL, Novais TAM, Paranhos SB. Atividades lúdicas desenvolvidas pela enfermagem em um hospital materno infantil. Rev Ciênc Ext [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 15];14(3):159-69. Available from: https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/1659
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-44 Topan A, Sabin OO. Evaluation of efficiency of puppet show in decreasing fears of school-age children against medical procedures in Zonguldak (Turkey). J Pak Med Assoc [Internet]. 2019 [cited 2022 Sep 15];69(6):817-822. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31189288/
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).

Na prática hospitalar pediátrica, é comum serem disponibilizados brinquedos na unidade de internação ou sala de brinquedos ou brinquedoteca, onde as crianças brincam livremente ou sob a responsabilidade de um profissional de pedagogia. Todavia, os brinquedos podem e devem ser utilizados pela equipe de enfermagem a fim de facilitar a interação, comunicação e expressão de sentimentos(22 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm Atual Derm. 2019;88(26):1-8. Available from: http://www.revistaenfermagematual.com.br/index.php/revista/article/view/129
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-33 Oliveira LE, Correa Júnior AJS, Martins RS, Moura AAA, Nascimento CL, Novais TAM, Paranhos SB. Atividades lúdicas desenvolvidas pela enfermagem em um hospital materno infantil. Rev Ciênc Ext [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 15];14(3):159-69. Available from: https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/1659
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), bem como de ajudar no enfrentamento do processo de hospitalização e no preparo de procedimentos diagnósticos e terapêuticos(55 Barreto LMSC, Maia EBS, Depianti JRB, Melo LL, Ohara CVS, Ribeiro CA. Giving meaning to the teaching of Therapeutic Play: the experience of nursing students. Esc Anna Nery. 2017;21(2):e20170038. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20170038
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6 Depianti JRB, Melo LL, Ribeiro CA. Playing to continue being a child and freeing itself from the confinement of the hospitalization under precaution. Esc Anna Nery. 2018;22(2):e20170313. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2017-0313
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-77 Paula ME, Garcia TMB, Anders JC, Luz JH, Rocha PK, Souza S. Playful activities in health care for children and adolescents with cancer: the perspectives of the nursing staff. Esc Anna Nery. 2016;20(3):e20160073. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20160073
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).

Oferecer à criança a oportunidade de utilizar brinquedos simulando os procedimentos realizados propicia o esclarecimento de possíveis dúvidas, assim como minimiza o medo e a insegurança além de facilitar a compreensão acerca do que será executado(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
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).

Conforme a Resolução do Conselho Federal de Enfermagem nº. 546/2017 em seu primeiro artigo, compete à equipe de enfermagem atuante na área pediátrica a utilização da técnica do brinquedo/brinquedo terapêutico (BT) na assistência à criança e família hospitalizadas. No parágrafo único, recomenda-se que essa técnica, ao ser utilizada pelo técnico de enfermagem, seja prescrita e supervisionada pelo enfermeiro(88 Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Resolução nº. 546 de 09 de maio de 2017. Atualiza norma para utilização da técnica do brinquedo/brinquedo terapêutico pela equipe de enfermagem na assistência à criança hospitalizada [Internet]. 2017 [cited 2019 Jul 4]. Available from: http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2017/05/Resolu%C3%A7%C3%A3o-546-17.pdf
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).

Estudo desenvolvido em um hospital materno-infantil revela que o principal motivo relatado pelas enfermeiras para que o brinquedo não fosse incluído rotineiramente em suas ações de cuidado com a criança relacionava-se à redução de recursos humanos e materiais e à rotina de trabalho do pessoal de enfermagem, a qual, comumente, se divide entre ações burocrático administrativas e ações assistenciais(55 Barreto LMSC, Maia EBS, Depianti JRB, Melo LL, Ohara CVS, Ribeiro CA. Giving meaning to the teaching of Therapeutic Play: the experience of nursing students. Esc Anna Nery. 2017;21(2):e20170038. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20170038
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).

Um estudo realizado em unidades pediátricas de internação de um hospital universitário no município de São Paulo revelou que, embora o enfermeiro reconheça os diversos benefícios do uso do brinquedo/BT, a utilização ocorre de forma não sistematizada e heterogênea, portanto há necessidade de capacitação desses profissionais e implementação efetiva de modo a sistematizar sua prática(66 Depianti JRB, Melo LL, Ribeiro CA. Playing to continue being a child and freeing itself from the confinement of the hospitalization under precaution. Esc Anna Nery. 2018;22(2):e20170313. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2017-0313
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).

Diante da importância da temática (a competência do enfermeiro na utilização do brinquedo/BT), elaborou-se como objeto de estudo: a utilização do brinquedo pela equipe de enfermagem como recurso terapêutico em unidade de internação hospitalar.

OBJETIVOS

Descrever o uso do brinquedo/BT pela equipe de enfermagem durante a assistência à criança como um processo terapêutico; analisar os fatores que influenciam a utilização do brinquedo terapêutico pela enfermagem no cuidado da criança hospitalizada.

MÉTODOS

Aspectos éticos

A coleta de dados ocorreu após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição participante. Aprovado o projeto, os participantes foram consultados, informados acerca dos objetivos da pesquisa e convidados a participar, quando foi assinado voluntariamente o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O estudo atendeu às Resoluções nº 466/2012 e nº 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.

Tipo de estudo

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, que se fundamenta no aspecto subjetivo e nas relações dentro da realidade na qual os atores sociais estão inseridos, buscando os significados, motivos, valores e crenças(99 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14 ed. São Paulo: Hucitec; 2014.). Ao adotar esse tipo de abordagem, tem-se a possibilidade de captação do significado da implementação do brinquedo/brinquedo terapêutico na assistência de enfermagem às crianças hospitalizadas. Foi utilizado o instrumento COREQ (Consolidated criteria for reporting qualitative research).

Procedimentos metodológicos

Foi usada a técnica da entrevista semiestruturada(1010 Lüdke M, André MEDA. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. 2 ed. Rio de Janeiro: E.P.U; 2013.), a qual permite que outras perguntas sejam acrescentadas com o objetivo de aprofundar respostas, possibilitando um diálogo mais dinâmico. O roteiro de entrevista constou das seguintes perguntas: Qual a sua experiência na utilização do brinquedo/BT durante a assistência à criança? Que estratégias ou dinâmicas são utilizadas por você na ausência do brinquedo/BT? Quais as facilidades e dificuldades encontradas por você na utilização do brinquedo/BT durante a assistência de enfermagem?

Cenário do estudo

O cenário do estudo foi a unidade de internação de um hospital pediátrico localizado no município do Rio de Janeiro. A referida unidade é composta por seis enfermarias pediátricas divididas por faixas etárias e conta com 46 leitos.

A escolha desse cenário se justifica por ser um setor de internação de crianças de diferentes faixas etárias (entre 29 dias e 13 anos incompletos) e com diversos diagnósticos clínicos e cirúrgicos que demandam cuidados de enfermagem além da realização de procedimentos dolorosos e invasivos.

Fontes de dados

Participaram do estudo enfermeiros e técnicos de enfermagem atuantes na unidade de internação pediátrica. Todos os convidados participaram voluntariamente e trabalhavam no serviço diurno ou noturno. Não houve recusa na participação nem solicitação para se retirar do estudo após a coleta de dados. Como critério de inclusão, participaram os profissionais de enfermagem que trabalhavam no setor há, no mínimo, seis meses e que se encontravam disponíveis no momento da coleta. Foram excluídos os profissionais de enfermagem que atuavam no setor temporariamente para cobrir férias ou licenças de outros profissionais.

Visando manter o anonimato dos participantes, eles foram identificados com códigos formados pelas iniciais da profissão (ENF para enfermeiros e TEC para técnicos de enfermagem), seguidas por números indicando a ordem das entrevistas. Cada entrevista teve duração média de dez minutos.

Para a saturação teórica, foram utilizados cinco passos(1111 Nascimento LCN, Souza TV, Oliveira ICS, Moraes JRMM, Aguiar RCB, Silva LF. Theoretical saturation in qualitative research: an experience report in interview with schoolchildren. Rev Bras Enferm. 2018;71(1):228-33. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0616
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): 1 - registro de dados brutos (fontes primárias: transcrição das entrevistas); 2 - imersão nos dados (leitura flutuante); 3 - compilação das análises individuais de cada entrevista e agrupamento temático (organização dos dados por meio da codificação colorimétrica); 4 - alocação dos temas e tipos de enunciados em um quadro temático (identificação da regularidade dos achados nos depoimentos, de acordo com os temas, e verificação da consistência dos enunciados); e 5 - constatação da saturação teórica dos dados por meio da identificação de ausência de elementos novos em cada agrupamento temático.

Coleta e organização dos dados

A coleta dos dados se deu nos meses de julho e agosto de 2019. Antes de iniciar a entrevista, as pesquisadoras realizaram a leitura do TCLE, quando foram informados os objetivos do estudo e feito o convite para participação. Após o aceite, os participantes assinavam e rubricavam o TCLE, sendo entregue ao profissional uma cópia do documento. Destaca-se que, neste momento, as pesquisadoras agendaram dia e horário para as entrevistas, que ocorreram em sala reservada previamente, com o objetivo de possibilitar audiogravação (em arquivo digital) sem ruídos e/ou interferências da própria unidade de internação. A cada entrevista, foi realizada a transcrição das gravações em documento do software Microsoft Word. Em seguida, entrava-se em contato com o participante para proceder à leitura do material a fim de verificar a veracidade dos dados fornecidos e a necessidade de alteração, assegurando, assim, a validade interna dos dados.

Análise dos dados

A análise dos dados fundamentou-se na análise temática(99 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14 ed. São Paulo: Hucitec; 2014.) e percorreu as seguintes etapas: “pré análise”, que consiste na leitura flutuante e exaustiva do material, formulação e reformulação de questões norteadoras e atendimento dos objetivos; “exploração do material”, que tem por finalidade a compreensão do texto analisado e organização do conteúdo em categorias teóricas ou empíricas; e a terceira e última etapa, denominada “tratamento e interpretação dos dados obtidos”, na qual o pesquisador faz inferências e interpretações sobre os resultados.

Desse modo, as categorias foram denominadas “O brinquedo e seus benefícios: a utilização pela equipe de enfermagem como recurso terapêutico” e “Fatores que interferem na implementação do brinquedo/brinquedo terapêutico”.

RESULTADOS

Fizeram parte da amostra, 12 enfermeiros e 7 técnicos de enfermagem.

O brinquedo e seus benefícios: a utilização pela equipe de enfermagem como recurso terapêutico

Este tópico aborda os benefícios do uso do brinquedo durante a assistência de enfermagem na unidade de internação pediátrica, bem como a sua utilização como recurso terapêutico.

Dos 19 participantes da pesquisa, 7 destacam que o brinquedo confere vários benefícios durante a hospitalização da criança, entre eles: minimiza os sentimentos de tristeza ou traz alegria; auxilia na recuperação da criança; facilita a interação com o profissional; minimiza a dor e o desconforto durante o procedimento; provoca estímulos sensoriais; deixa a criança mais tranquila e menos estressada, facilitando a aceitação do procedimento; propicia a criação de vínculo e fortalece a confiança no profissional:

[…] é fundamental para quem trabalha com pediatria porque as crianças se alegram e saem da tristeza por conta desse método […]. (TEC 1)

Eu acho que o brinquedo ajuda na recuperação da criança […] a criança […] aceita mais também […]. (TEC 3)

[…] é visível e notório a eficácia do brincar durante o procedimento; muitas vezes a gente consegue conquistar a criança com o brincar […]. (ENF 2)

Bom, eu, particularmente, uso com a intenção de tentar minimizar a dor e o desconforto da criança durante a realização de algum procedimento. (ENF 8)

[…] utilização do brinquedo interfere na mudança de comportamento da criança; e hoje a gente tem uma ampla variedade de brinquedos que realmente estimulam a criança: eles são coloridos, estimulam a parte numérica e o estímulo sensorial. Então, a gente vê o quanto isso é válido no dia a dia. (TEC 7)

[…] faz com que a criança fique mais calma, mais tranquila, diminuindo assim o estresse gerado por esse procedimento […] então isso ajuda muito na criação de vínculo entre a criança e o profissional, e a criança acaba tendo uma confiança maior quando nos aproximamos do que é normal para ela, que é o brincar, o lúdico. (ENF 11)

[…] é uma forma de estar tentando acalmar a criança e de deixá-la um pouco mais segura. (ENF 12)

Constata-se que alguns participantes fazem comentários acerca de objetos e características da roupa e utilizam os recursos encontrados na unidade da criança, como batom, boneca, luva de procedimento ou dispositivos médicos, livro, desenhos animados e vídeos infantis, conforme as falas a seguir:

[…] eu tento brincar, falar do batom, da roupa, sei lá, tento interagir mais […]. (ENF 1)

[…] geralmente ela tem uma boneca perto, aí eu pego a boneca e faço ela fazer o curativo na boneca primeiro […] e eu vou fazer nela […]. (ENF 2)

[…] durante […] uma punção venosa periférica, ele não queria nem pegar no brinquedo, então, […] eu utilizei um vídeo com música infantil em que ele se acalmou […]. (ENF 3)

[…] às vezes, utilizo essa dinâmica de brincar com o boneco […]. (ENF 4)

[…] a gente pega os próprios instrumentos que a gente usa de trabalho para fazer brinquedinho, como a luva […] usamos vídeos infantis […]. (ENF 5)

[…] em algumas situações como, por exemplo, antes de procedimentos cirúrgicos, onde a criança tem um tempo de espera maior, aí eu tento interagir com um livro ou utilizo a sala da brinquedoteca pra criança poder brincar enquanto espera. (ENF 9)

Eu […] mostro para ela os materiais que eu vou utilizar e, se possível, deixo ela tocar para ver como é […]. (ENF 12)

[…] um desenho […] ajuda bastante porque ela fica distraída, nem repara no que você está fazendo. (TEC 2)

[…] aqui, às vezes, a gente coloca um desenho para criança ver, canta uma música, essas coisas assim. (TEC 4)

Na fala da técnica de enfermagem 5, evidencia-se que entreter ou comentar algo que possa divertir a criança fica a critério de cada profissional:

[…] sempre que possível a gente procura estar brincando, estar fazendo alguma coisa para as crianças se divertirem, mas isso fica por nossa conta, entendeu? (TEC 5)

Fatores que interferem na implementação do brinquedo/brinquedo terapêutico

Este tópico aborda os fatores que interferem na implementação do brinquedo como recurso terapêutico, tais como: demanda de trabalho alta; déficit dos recursos materiais e humanos; e ambiente inapropriado.

Dos 19 entrevistados, 3 referiram que as demandas de trabalho e/ou intercorrências, rotina dos procedimentos e o fazer mecânico dos cuidados, bem como a falta de tempo pelo processo de trabalho contribuem para que o referido profissional não valorize o uso do brinquedo como um recurso:

[…] eu acho que a demanda de trabalho acaba por interferir, porque às vezes é muita, então, quando está muito ruim, um dia de muito procedimento, de muitas intercorrências, aí eu acho que é até inviável, sabe? (ENF 4)

[…] acaba caindo na rotina do dia a dia, dos procedimentos, o tempo de ter que dar conta de tudo, de fazer tudo, aí a gente acaba deixando de lado […]. (ENF 6)

[…] às vezes, a gente fica muito mecanicista, fazendo o procedimento de forma muito mecânica, por exemplo: entra um, punciona, aí sai, aí entra outro, aí, às vezes, a gente acaba omitindo essas estratégias […]. (ENF 7)

[…] o dia é sempre muito corrido, com muitas tarefas […]. (ENF 9)

Outra dificuldade revelada diz respeito à falta de recursos materiais próprios para a utilização do BT durante os procedimentos técnicos, levando os profissionais de enfermagem a utilizarem seus objetos pessoais:

Acho que a dificuldade é o fato de não ter nenhum objeto de uso coletivo. Seria bom a criação desses objetos, porque às vezes a gente faz coisas que não pode, como usar o nosso objeto pessoal para entreter […]. (TEC 5)

O déficit de recursos humanos foi citado também como uma forma de dificultar a utilização do brinquedo/BT:

[…] a escassez de profissionais no local de trabalho, porque isso acarreta muito no andamento do serviço […]. (TEC 6)

A enfermeira 5 justifica utilizar os instrumentos de trabalho por não ter acesso à brinquedoteca (espaço destinado às brincadeiras e recreação).

[…] porque acaba que a gente não tem muito acesso a brinquedoteca, então dificulta a gente usar os brinquedos. (ENF 5)

A enfermeira 10 relata que houve treinamento na unidade da hematologia sobre o uso de um boneco como BT, no entanto, ao tentar fazer a implementação, não se conseguiu por dois motivos: a criança atendida na hematologia passa por variados setores, nos quais não foi possível o treinamento dos profissionais para o uso do boneco; e a criança não portava o boneco ao sair de um setor e ir para o outro:

[…] teve uma época que eles resolveram implementar o brinquedo terapêutico aqui na instituição com as crianças da hematologia […]. Nesse treinamento, a gente percebeu que aqui o ambiente não é propício porque a criança da hemato passa por vários setores diferentes, como o banco de sangue, o aquário carioca, a enfermaria, o hospital dia e a emergência, e nem todos receberam o treinamento do boneco, por esse motivo acho que não foi implementado. A gente chegou a receber alguns bonecos, algumas pessoas chegaram a implementar, mas as crianças não estavam trazendo o boneco, então acabou sendo de muito pouca valia o boneco em si. (ENF 10)

Em contrapartida, de acordo com as falas de duas enfermeiras, além de não possuírem a experiência do uso do brinquedo/BT, não identificam essa utilização no cenário estudado:

Aqui […] eu não tive muito essa experiência de brinquedo terapêutico e nem vejo sendo utilizado. (ENF 7)

[…] eu nunca vi o brinquedo terapêutico no local onde eu trabalho […] eu sei que tem essa utilização, que algumas instituições utilizam o brinquedo terapêutico […] que é um brinquedo montado para um determinado procedimento, que é direcionado para um determinado caso, porém eu não utilizo […]. (ENF 12)

DISCUSSÃO

Para as crianças hospitalizadas, o processo de internação pode tornar-se uma experiência traumatizante, visto que sofrem diversas mudanças no seu cotidiano, como do ambiente familiar, da escola e dos amigos; são submetidas a algumas restrições, a diversos procedimentos invasivos, desconfortáveis e dolorosos; e são confrontadas a vivenciar experiências novas que geram sentimentos de diferentes ordens, como medo, raiva, insegurança e incerteza(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
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,1212 Tolocka RE, Corrêa RE, Lima MM, Colombo CEM, Poletto JE. To Play and Children With Cancer: what is this relationship? Licere. 2019; 22(1). https://doi.org/10.35699/1981-3171.2019.12327
https://doi.org/10.35699/1981-3171.2019....
-1313 Zengin M, Yayan EH, Düken ME. The effects of a therapeutic play/play therapy program on the fear and anxiety levels of hospitalized children after liver transplantation. J Perianesth Nurs. 2021;36(1):81-85. https://doi.org/10.1016/j.jopan.2020.07.006
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). Além disso, é preciso considerar que há limitação de contato com outras crianças e que sua interação com os adultos nas brincadeiras não ocorre da mesma forma quando estão com seus pares(1414 Aranha BF, Souza MA, Pedroso GER, Maia EBS, Melo LL. Using the instructional therapeutic play during admission of children to hospital: the perception of the family. Rev Gaúcha Enferm. 2020;41:e20180413. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2020.20180413
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).

Uma das modalidades lúdicas bastante utilizadas pela equipe de enfermagem é o BT, que, além de distrair, ajuda a criança a aceitar os cuidados, especialmente no tocante às experiências que costumam causar medo e ameaça(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
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,1313 Zengin M, Yayan EH, Düken ME. The effects of a therapeutic play/play therapy program on the fear and anxiety levels of hospitalized children after liver transplantation. J Perianesth Nurs. 2021;36(1):81-85. https://doi.org/10.1016/j.jopan.2020.07.006
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). Este também auxilia na diminuição de sua ansiedade decorrente de situações ameaçadoras e atípicas, auxiliando-a a enfrentar as mudanças na rotina. Além disso, pode ser implementado para avaliar a compreensão da criança sobre as experiências num ambiente diferente do seu habitual e sempre que ela tenha necessidade de entender e lidar com os acontecimentos do dia a dia(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
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-22 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm Atual Derm. 2019;88(26):1-8. Available from: http://www.revistaenfermagematual.com.br/index.php/revista/article/view/129
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).

O uso do BT tem um objetivo específico e deve ser incorporado durante o cuidado de enfermagem como meio de estabelecer comunicação e relacionamento com a criança, conhecer seus sentimentos e preocupações, ajudar no alívio de sua tensão e ansiedade, além de prepará-la para procedimentos(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
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-22 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm Atual Derm. 2019;88(26):1-8. Available from: http://www.revistaenfermagematual.com.br/index.php/revista/article/view/129
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,1515 Silva SGT, Santos MA, Floriano CMF, Damião EBC, Campos FV, Rossato LM. Influence of Therapeutic Play on the anxiety of hospitalized school-age children: clinical trial. Rev Bras Enferm. 2017;70(6):1244-9. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0353
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0...
). Assim, a utilização do lúdico em um ambiente hospitalar é um potencializador no processo de adaptação da criança, pois o brincar constitui uma estratégia adequada para o enfrentamento da hospitalização(55 Barreto LMSC, Maia EBS, Depianti JRB, Melo LL, Ohara CVS, Ribeiro CA. Giving meaning to the teaching of Therapeutic Play: the experience of nursing students. Esc Anna Nery. 2017;21(2):e20170038. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20170038
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201700...
-66 Depianti JRB, Melo LL, Ribeiro CA. Playing to continue being a child and freeing itself from the confinement of the hospitalization under precaution. Esc Anna Nery. 2018;22(2):e20170313. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2017-0313
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).

Corroborando essa linha de pensamento, estudos destacam que as ações humanizadas na assistência de enfermagem mediante os recursos lúdicos colaboram para o fortalecimento do vínculo entre os profissionais de enfermagem e a criança, facilitando a comunicação e promovendo uma interação que minimiza os possíveis temores da criança, pois promovem momentos de relaxamento e descontração(33 Oliveira LE, Correa Júnior AJS, Martins RS, Moura AAA, Nascimento CL, Novais TAM, Paranhos SB. Atividades lúdicas desenvolvidas pela enfermagem em um hospital materno infantil. Rev Ciênc Ext [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 15];14(3):159-69. Available from: https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/1659
https://ojs.unesp.br/index.php/revista_p...
,55 Barreto LMSC, Maia EBS, Depianti JRB, Melo LL, Ohara CVS, Ribeiro CA. Giving meaning to the teaching of Therapeutic Play: the experience of nursing students. Esc Anna Nery. 2017;21(2):e20170038. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20170038
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201700...
,1616 Mota ASP, Rodrigues GSN, Pfeifer LI, Garcia LRA, Nascimento LC. O melhor da hospitalização: contribuições do brincar para o enfrentamento da quimioterapia. Av Enferm. 2018;36(3):328-37. https://doi.org/10.15446/av.enferm.v36n3.61319
https://doi.org/10.15446/av.enferm.v36n3...
). Ademais, a brincadeira, quando inserida no contexto do tratamento por exemplo, pode conferir preciosa colaboração para a equipe de saúde(1313 Zengin M, Yayan EH, Düken ME. The effects of a therapeutic play/play therapy program on the fear and anxiety levels of hospitalized children after liver transplantation. J Perianesth Nurs. 2021;36(1):81-85. https://doi.org/10.1016/j.jopan.2020.07.006
https://doi.org/10.1016/j.jopan.2020.07....
,1717 Claus MIS, Maia EBS, Oliveira AIB, Ramos AL, Dias PLM, Wernet M. A inserção do brincar e brinquedo nas práticas de enfermagem pediátrica: pesquisa convergente assistencial. Esc Anna Nery. 2021;25(3):e20200383. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2020-0383
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18 Shrinivasa B, Bukhari M, Ragesh G, Hamza A. Therapeutic intervention for children through play: an overview. Arch Ment Health. 2018;19(2):82-9. https://doi.org/10.4103/AMH.AMH_34_18
https://doi.org/10.4103/AMH.AMH_34_18...
-1919 Ullan AM, Belver MH. Play as a source of psychological well-being for hospitalized children: study review. Int Ped Chi Care. 2019;2(1):92-8. https://doi.org/10.18314/ipcc.v2i1.1613
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).

Entre os benefícios do lúdico no atendimento da criança, destacam-se a minimização dos efeitos da hospitalização e a potencialização no processo de adaptação, pois o brincar busca alcançar a alegria, a descontração e a formação de um ambiente mais agradável; isso favorece a interação entre o profissional, a criança e sua família, bem como, mesmo que momentaneamente, tira o foco da doença, auxiliando na adaptação e enfrentamento do processo saúde-doença e hospitalização(11 Godino-Iáñez MJ Martos-Cabrera MB, Suleiman-Martos N, Gómez-Urquiza JL, Vargas-Román K, Membrive-Jiménez MJ, et al. Play Therapy as an Intervention In Hospitalized Children: a systematic review. HealthCare (Basel). 2020;8(3):239. https://doi.org/10.3390/healthcare8030239
https://doi.org/10.3390/healthcare803023...
-22 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Rev Enferm Atual Derm. 2019;88(26):1-8. Available from: http://www.revistaenfermagematual.com.br/index.php/revista/article/view/129
http://www.revistaenfermagematual.com.br...
,55 Barreto LMSC, Maia EBS, Depianti JRB, Melo LL, Ohara CVS, Ribeiro CA. Giving meaning to the teaching of Therapeutic Play: the experience of nursing students. Esc Anna Nery. 2017;21(2):e20170038. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20170038
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201700...
,77 Paula ME, Garcia TMB, Anders JC, Luz JH, Rocha PK, Souza S. Playful activities in health care for children and adolescents with cancer: the perspectives of the nursing staff. Esc Anna Nery. 2016;20(3):e20160073. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20160073
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201600...
). Assim, revela-se seu valor terapêutico contribuindo para o bem-estar físico, emocional e recuperação de crianças hospitalizadas(1717 Claus MIS, Maia EBS, Oliveira AIB, Ramos AL, Dias PLM, Wernet M. A inserção do brincar e brinquedo nas práticas de enfermagem pediátrica: pesquisa convergente assistencial. Esc Anna Nery. 2021;25(3):e20200383. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2020-0383
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19 Ullan AM, Belver MH. Play as a source of psychological well-being for hospitalized children: study review. Int Ped Chi Care. 2019;2(1):92-8. https://doi.org/10.18314/ipcc.v2i1.1613
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-2020 Sabino AS, Esteves AVF, Oliveira APP, Silva MVG. The parents’ knowledge on the care process through play. Cogitare Enferm [Internet]. 2018 [cited 2022 Apr 25];23(2):e52849. Available from: https://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/52849/pdf
https://revistas.ufpr.br/cogitare/articl...
).

Segundo estudo, as crianças que receberam intervenções lúdicas no hospital durante sua internação apresentaram menos emoções negativas, assim como níveis mais baixos de ansiedade comparadas àquelas que receberam os cuidados habituais(55 Barreto LMSC, Maia EBS, Depianti JRB, Melo LL, Ohara CVS, Ribeiro CA. Giving meaning to the teaching of Therapeutic Play: the experience of nursing students. Esc Anna Nery. 2017;21(2):e20170038. https://doi.org/10.5935/1414-8145.20170038
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).

Constata-se que o profissional de enfermagem, mesmo relatando algumas dificuldades, busca criar condições para obter melhor interação com a criança, comentando sobre as características da roupa ela utiliza ou fazendo uso de dispositivos médicos que utilizará no procedimento, bonecos que se encontram na unidade da criança, vídeos infantis, desenhos animados e livros.

Se por um lado os participantes referem não ter experiência com o BT e não ver sua utilização na prática, em contrapartida alguns profissionais de enfermagem conseguem utilizar os recursos disponibilizados na unidade da criança. De acordo com algumas falas, o BT é um objeto construído especificamente para determinado procedimento técnico. Já, para outros, pode ser algo improvisado, importando para esse profissional a interação com a criança a fim de minimizar o medo da dor e manter a confiança no profissional, reduzindo o estresse, entre outros problemas; por isso, o brinquedo é considerado um recurso terapêutico.

Os participantes do estudo demonstram ter conhecimento teórico acerca do BT e utilizar alguns poucos recursos existentes na unidade, cenário do estudo, devido a: inexistência de um brinquedo específico para esse fim; grandes demandas de trabalho e/ou intercorrências; escassez de tempo para desenvolver todas as atividades; e déficit de recursos humanos causador de um processo de trabalho que leva a uma prática mecanicista e sem valorização do BT.

De fato, no Brasil, a enfermeira responsabiliza-se por um grande número de atividades burocrático-assistenciais; todavia, reforça-se a necessidade de perceber o brincar como recurso terapêutico tão importante quanto a realização de um procedimento técnico. Por isso, nas suas atividades de organização da assistência de sua unidade, a enfermeira deve prever e planejar o modo de inserir o brincar no plano de cuidado de cada criança(33 Oliveira LE, Correa Júnior AJS, Martins RS, Moura AAA, Nascimento CL, Novais TAM, Paranhos SB. Atividades lúdicas desenvolvidas pela enfermagem em um hospital materno infantil. Rev Ciênc Ext [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 15];14(3):159-69. Available from: https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/1659
https://ojs.unesp.br/index.php/revista_p...
).

Nesse sentido, o brincar deve ser disponibilizado em diferentes situações (exame físico, procedimentos de enfermagem, comunicação terapêutica) e espaços hospitalares (leito, brinquedoteca, sala de procedimentos). Torna-se importante também que esteja disponível, de acordo com as idades, diferentes tipos de brinquedos ou estratégias de brincar (tom da voz, uso de estetoscópios coloridos, brinquedos adaptados com dispositivos de saúde) e que ações de prevenção de infecção sejam realizadas de forma que os brinquedos oferecidos às crianças sejam seguros(33 Oliveira LE, Correa Júnior AJS, Martins RS, Moura AAA, Nascimento CL, Novais TAM, Paranhos SB. Atividades lúdicas desenvolvidas pela enfermagem em um hospital materno infantil. Rev Ciênc Ext [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 15];14(3):159-69. Available from: https://ojs.unesp.br/index.php/revista_proex/article/view/1659
https://ojs.unesp.br/index.php/revista_p...
). Para tanto, a equipe de enfermagem deve conhecer os modos de utilizá-los como estratégia de comunicação e interação na assistência, para minimizar possíveis efeitos traumáticos nas crianças causados pela hospitalização(1616 Mota ASP, Rodrigues GSN, Pfeifer LI, Garcia LRA, Nascimento LC. O melhor da hospitalização: contribuições do brincar para o enfrentamento da quimioterapia. Av Enferm. 2018;36(3):328-37. https://doi.org/10.15446/av.enferm.v36n3.61319
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-1717 Claus MIS, Maia EBS, Oliveira AIB, Ramos AL, Dias PLM, Wernet M. A inserção do brincar e brinquedo nas práticas de enfermagem pediátrica: pesquisa convergente assistencial. Esc Anna Nery. 2021;25(3):e20200383. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2020-0383
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).

Para tanto, se faz necessário a consolidação da prática do brincar com as equipes atuantes em unidades pediátricas, em razão dos efeitos benéficos do brincar, que repercutem na confiança da criança e na melhora do humor, bem como fortalecem suas relações com os profissionais de saúde, com a família e consigo mesma, favorecendo o processo de cura(1616 Mota ASP, Rodrigues GSN, Pfeifer LI, Garcia LRA, Nascimento LC. O melhor da hospitalização: contribuições do brincar para o enfrentamento da quimioterapia. Av Enferm. 2018;36(3):328-37. https://doi.org/10.15446/av.enferm.v36n3.61319
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,2121 Pennafort VPS, Queiroz MVO, Gomes ILV, Rocha MFF. Instructional therapeutic toy in the culture care of the child with diabetes type 1. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 3):1334-42. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0260
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). Assim, a valorização e implementação de abordagens que proporcionem um cuidado por meio do brincar têm grande valor, pois propiciam a aproximação, o processo de comunicação e maior interação da equipe de enfermagem com a criança e sua família(1717 Claus MIS, Maia EBS, Oliveira AIB, Ramos AL, Dias PLM, Wernet M. A inserção do brincar e brinquedo nas práticas de enfermagem pediátrica: pesquisa convergente assistencial. Esc Anna Nery. 2021;25(3):e20200383. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2020-0383
https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-20...
,2121 Pennafort VPS, Queiroz MVO, Gomes ILV, Rocha MFF. Instructional therapeutic toy in the culture care of the child with diabetes type 1. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 3):1334-42. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0260
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0...
).

Limitações do Estudo

Por ser qualitativa, a abordagem restringiu-se a apenas uma instituição pública pediátrica, o que não permite a generalização dos resultados. Portanto, recomenda-se a realização de outros estudos, inclusive em que se demonstre a participação da equipe de enfermagem no cenário privado.

Contribuições para a área de enfermagem

O estudo contribui para a assistência de enfermagem no sentido de estimular a reflexão dos profissionais sobre o uso de brinquedos, objetos e roupas da própria criança, dispositivos médicos, vídeos infantis e desenhos animados na perspectiva de uma abordagem lúdica e acolhedora, utilizando-os como recurso terapêutico. Ainda, será uma fonte secundária de pesquisa acerca do tema. Ainda, o estudo estimula o desenvolvimento de novas pesquisas sobre o tema em outros cenários.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os profissionais de enfermagem participantes deste estudo revelaram utilizar alguns brinquedos disponibilizados no leito da criança, bem como materiais hospitalares, desenhos animados e vídeos infantis, além de fazer comentários sobre características da roupa da criança. Todavia, não há uma padronização da técnica, ou seja, isso fica a critério de cada profissional. Tais atividades são executadas com a finalidade de distrair a criança e fazê-la aceitar mais facilmente o procedimento técnico que será desenvolvido; e, ainda, proporcionar alguns benefícios como: minimizar o medo, aliviar a tensão e promover a criação de vínculo entre a criança e o profissional. Entretanto, a alta demanda de trabalho e o déficit de recursos humanos e materiais são alguns fatores que acabam por interferir na implementação de tais recursos.

Por um lado, o profissional de enfermagem entende o uso do BT como uma estratégia para minimizar o medo da dor, para se aproximar da criança e para ela confiar nele. Por outro, a grande demanda de trabalho e a pouca disponibilização desses recursos dificultam sua implementação.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    27 Jul 2022
  • Aceito
    24 Nov 2022
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