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A pós-pandemia de COVID-19: perspectivas da atuação profissional na enfermagem

Durante a pandemia de COVID-19, os trabalhadores de enfermagem foram essenciais na prestação de cuidados à saúde, diante do elevado número de pessoas infectadas pelos vírus SARS-CoV-2 e adoecidos pela COVID-19 e pela Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Neste contexto, os serviços de saúde ficaram sobrecarregados, e muitos de seus profissionais adoeceram e morreram.

A enfermagem mostrou-se essencial durante a fase crítica desta emergência sanitária, atuando diretamente na assistência, na chamada “linha de frente”, chamando a atenção para a sua qualidade valorativa. Sua atuação voltou-se para a recuperação e adaptação dos pacientes com limitações funcionais, motoras, psicossociais e espirituais, devido à restrição de algumas ações em decorrência da doença(11 Castro BS, Silva MCT, Lima JA. Sequelas da COVID-19 e o papel da enfermagem no enfrentamento dos pacientes acometidos por essa situação. RSD [Internet]. 2022 [cited 2023 Jul 23];11(16):e597111638895. Disponível em: https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/38895
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).

Transcorridos meses e, após o término da pandemia decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 5 de maio de 2023(22 Organização Mundial da Saúde (OMS). Escritório Regional para as Américas da Organização Mundial da Saúde. OMS declara fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional referente à COVID-19 [Internet]. 2023[cited 2023 Jul 23]. https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-2023-oms-declara-fim-da-emergencia-saude-publica-importancia-internacional-referente
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), este editorial busca chamar a atenção dos profissionais de enfermagem para o que tem sido evidenciado como problemas relacionados à pós-pandemia.

Quão importantes têm se mostrado os trabalhadores de enfermagem nas etapas de atendimento dos pacientes sobreviventes da COVID-19?

A análise do perfil dos óbitos registrados em profissionais de medicina e de enfermagem, que representam 72,5% dos óbitos identificados entre os trabalhadores especializados que compõem a área da saúde no Brasil, mostrou que a vulnerabilidade identificada foi consequência de sobrecarga e da precarização do trabalho, da dificuldade de acesso aos equipamentos de proteção individual nos meses iniciais da pandemia, entre outros fatores relacionados ao trabalho cotidiano. Os trabalhadores de nível médio (auxiliares e técnicos) e negros (pretos e pardos) constituíram-se, na maioria, entre os mortos nas equipes de enfermagem no período pandêmico(33 Machado MH, Teixeira EG, Freire N, Pereira EJ, Minayo MCS. Óbitos de Médicos e da equipe de Enfermagem por COVID-19 no Brasil: uma abordagem sociológica. Cienc Saude Colet [Internet]. 2022 [cited 2023 Jul 23];28(2):id18473. Available from: http://cienciaesaudecoletiva.com.br/artigos/obitos-de-medicos-e-da-equipe-de-enfermagem-por-covid19-no-brasil-uma-abordagem-sociologica/18473?id=18473
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).

Os profissionais de enfermagem também direcionaram atenção e cuidados de enfermagem aos pacientes pós-COVID-19, apresentando problemas considerados como a Síndrome Pós-COVID-19 (SPCV-19), definida como manifestações clínicas novas, recorrentes ou persistentes, presentes após a infecção aguda por SARS-CoV-2, e não atribuídas às outras causas. Na literatura, essas manifestações clínicas também podem ser descritas como COVID longa, pós-COVID aguda, efeitos de longo prazo da COVID, COVID crônica(44 Secretaria Municipal da Saúde de Ribeirão Preto. Protocolo de manejo da síndrome pós-COVID na atenção primária à saúde [Internet]. 2022[cited 2023 Jul 23]. Versão 1. 25 https://www.ribeiraopreto.sp.gov.br/portal/pdf/saude1325202302.pdf
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).

A SPCV-19 foi estudada em um painel internacional envolvendo pacientes, médicos, pesquisadores e funcionários da OMS com o objetivo de desenvolver uma definição de consenso para essa condição, e chegou-se à seguinte conclusão: a SPCV-19 acontece em indivíduos com histórico de infecção provável ou confirmada por SARS-CoV-2, geralmente três meses desde o início, com sintomas que duram pelo menos dois meses e não podem ser explicados por um diagnóstico alternativo. Entre os sintomas comuns, incluem-se fadiga, falta de ar e disfunção cognitiva e, geralmente, os pacientes apresentam impactos em seu desempenho diário. Os sintomas podem ser novos, após a recuperação inicial de um episódio agudo de COVID-19, ou persistir desde a doença inicial; também podem flutuar ou recidivar ao longo do tempo. Podem acontecer, então, alterações nas tarefas cotidianas na maioria dos casos(55 Soriano JB, Murthy S, Marshall JC, Relan P, Diaz JV, WHO Clinical Case Definition Working Group on Post COVID-19 Condition. A clinical case definition of post COVID-19 condition by a Delphi consensus. Lancet Infect Dis. 2022;22(4):e102-e107. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(21)00703-9
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), o que inclui, obviamente, as atividades laborais.

Além desses parâmetros apresentados pela OMS, estudos têm sido desenvolvidos envolvendo a etapa pós-COVID, confirmando e/ou encontrando outros fatores que vêm provocando fadiga, sintomas cardiopulmonares, disfunções físicas, alterações cognitivas/psicossomáticas, limitações funcionais variadas, sequelas hemostáticas, deterioração na qualidade de vida, Diabetes Mellitus, manifestações neurológicas, entre outras, inferindo-se que há, além disso, um campo vasto e inexplorado para a realização de pesquisa científica referente à COVID-19.

Então, com estudos ainda sendo conduzidos e múltiplos enfoques a serem considerados, há um profícuo campo de interesse e que necessita da atuação, tanto dos profissionais de saúde em geral quanto dos trabalhadores de enfermagem, relacionada à SPCV-19. Ou seja, a importância dessa profissão continua a ser mostrada nas etapas de atendimento dos pacientes sobreviventes da COVID-19.

Há muito ainda a ser profissionalmente feito, e a participação da enfermagem é inequívoca. Exemplifica-se: os enfermeiros especializados em reabilitação podem buscar múltiplas intervenções em pacientes sequelados; os profissionais envolvidos no cuidado aos pacientes com doenças crônicas-degenerativas podem realizar numerosas ações/orientações aos indivíduos hipertensos, diabéticos, com dores variadas; os especialistas em enfermagem hematológica podem auxiliar no tratamento e reabilitação dos indivíduos que adquiriram sequelas; os profissionais de enfermagem que atuam no cuidado em saúde mental certamente conseguirão amenizar as alterações neuropsiquiátricas e psicológicas que ainda acometem os sobreviventes deste surto infeccioso; os que são especialistas na saúde dos trabalhadores poderão contribuir para a promoção de ações voltadas à maior segurança em seus ambientes de trabalho, visando minimizar os seus próprios adoecimentos e de seus tutelados, entre outros. Além disso, os pesquisadores da profissão continuarão a investigar outras facetas da pós-pandemia.

Assim, a COVID-19, em seu auge de contaminação e agora, tendo sido considerada finalizada(22 Organização Mundial da Saúde (OMS). Escritório Regional para as Américas da Organização Mundial da Saúde. OMS declara fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional referente à COVID-19 [Internet]. 2023[cited 2023 Jul 23]. https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-2023-oms-declara-fim-da-emergencia-saude-publica-importancia-internacional-referente
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), mostrou a importância dos trabalhadores de enfermagem nas etapas de atendimento dos pacientes infectados. Acabaram divulgando e publicizando todo o seu valor e importância, pois, mesmo vivenciando insegurança, adoecimentos e mortes em seus ambientes laborais, mostraram-se resilientes, superando seus problemas e atendendo a praticamente todas as suas demandas, aumentando, inclusive, a sua visibilidade e o seu reconhecimento a nível mundial.

REFERENCES

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023
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