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Projeto Termômetro Social COVID-19: articulações transnacionais para aproximação das populações em situação de vulnerabilidade social

A COVID-19 é uma doença infecciosa que impactou significativamente diferentes contextos em todo mundo, de maneira direta e/ou indireta, e em maior escala nos países pobres e/ou em desenvolvimento(11 World Health Organization. WHO Coronavirus (COVID-19) Dashboard [Internet]. Geneva: WHO; 2021 [cited 2022 Dec 10]. Available from: https://covid19.who.int/
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). Não sabemos ao certo os efeitos acumulativos da COVID-19 às populações (transtornos mentais, insênia, ansiedade, trombose, déficit cognição, problemas de memória, etc.) depois de expostas à infecção pelo vírus SARS-CoV-2, principalmente as populações em situação de vulnerabilidade social (PSVS), que foram as mais afetadas, além de serem aquelas que não se sabe como têm conseguido alcançar recursos e/ou tecnologias para mitigar esses efeitos e se proteger quanto aos novos episódios de infecção e/ou reinfecção.

É fato que as condições insalubres de grande densidade populacional e áreas subnormals, como favelas, têm sido nichos importantes para o elevado índice de transmissibilidade e infecção pelo vírus(22 Angelo JR, Leandro BBS, Périssé ARS. Monitoramento da Covid-19 nas favelas cariocas: vigilância de base territorial e produção compartilhada de conhecimento. Saúde Debate. 2021;45(spe2):123-41. https://doi.org/10.1590/0103-11042021E209l
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), principalmente devido à falta de acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas e culturais que provêm recursos, colocando determinados grupos em situação de desvantagem(33 Negreiros DJ, Gomes ID, Colaço VFR, Ximenes VM. Risco e vulnerabilidade: pontos de convergência na produção brasileira sobre juventudes. Desidades [Internet]. 2018[cited 2022 Dec 10];(18):20-33. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/desi/n18/n18a03.pdf
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, 44 Carmo ME, Guizardi FL. O conceito de vulnerabilidade e seus sentidos para as políticas públicas de saúde e assistência social. Cad Saúde Pública 2018;34(3):e00101417. https://doi.org/10.1590/0102-311X00101417
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).

Desse modo, tornou-se relevante investigar como a COVID-19 tem impactado as PSVS, haja vista que, no Brasil, o número de pessoas em extrema pobreza foi crescente, principalmente depois da adoção de políticas de austeridade e cortes dos Programas de Proteção Social.

Para tanto, conformou-se um projeto entre a Escola Nacional de Saúde da Universidade Nova de Lisboa (ENSP-UNL), a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade São Paulo (EERP-USP) e a Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz (ENSP-FIOCRUZ). A primeira adaptação ao contexto brasileiro foi mudar o nome do projeto, o qual passou de Barómetro Social (Portugal) para Termômetro Social (Brasil). No Brasil, o projeto assumiu características transnacionais, com adaptações culturais e apelo às questões ético-políticas e humanitárias, haja vista a anunciada catástrofe entre grupos vulneráveis. Para a implementação do projeto, criou-se uma rede de cooperação em pesquisa com a participação de pesquisadores, trabalhadores, gestores da saúde e a sociedade civil organizada (movimentos sociais e/ou organizações comunitárias), oriundos das cinco macrorregiões do país e estrangeiros (Portugal, Estados Unidos, Espanha, Chile, Argentina e Colômbia).

Entre os objetivos do Termômetro Social, o principal foi evidenciar os impactos da COVID-19 na população geral e PSVS que residem no Brasil. Reconhecemos a preocupação e importância do projeto, especialmente para as PSVS, haja vista que elas têm ficado aquém das políticas públicas, com acesso muito prejudicado aos serviços de saúde, estando em mais desvantagem quando comparadas à população geral. Embora todos estejamos em risco de infecção pela COVID-19, os mecanismos e/ou recursos que dispomos para nos proteger dela e da reabilitação das sequelas é diferenciado, o que faz disso uma iniquidade socialmente determinada.

O projeto vem avançando em todas as capitais dos 26 estados e Distrito Federal, utilizando uma metodologia híbrida para aplicação de um instrumento à população de referência por entrevistador treinado: pesquisa online junto à população geral, com questionário autoaplicável, ou off-line, com pesquisa de campo nas áreas e populações sem acesso à internet utilizando para essa última a mobilização da sociedade civil organizada e/outras organizações, sendo abordados quatro grupos de PSVS: população em situação de rua, residentes de favelas e/ou comunidades, de assentamentos e/ou acampamentos e migrantes estrangeiros.

Até o momento, tivemos 2.293 respondentes na população geral. Entre os grupos das PSVS, 751 pessoas pertencem à população em situação de rua, 700 residem em favelas e/ou comunidades, 127 moram em assentamentos e/ou acampamentos e 317 são migrantes estrangeiros. Alguns resultados preliminares das PSVS mostram que: 1.138 (60%) dos entrevistados eram do sexo masculino; 1.324 (70%) eram da raça/cor preta ou parda; cerca de 562 (30%) pessoas receberam algum tipo de auxílio governamental; 1.140 (60%) indivíduos utilizaram os telejornais para se manter informado sobre a COVID-19; 779 (41%) consultaram a internet; 482 (25%) consultaram profissionais de saúde; 768 (40%) informaram estado de saúde mental como bem; 592 (31%) informaram estado de saúde mental como razoável; 1.641 (87%) se vacinaram; e 81 (4%) daqueles que não se vacinaram pretendem se vacinar.

Os resultados têm forte poder para contribuir às formulações de políticas públicas e gerar protocolos aos serviços de saúde, visando uma melhor atenção a essas populações. Ainda, destaca-se a originalidade do projeto, com base em aspectos valoráveis, tais como a articulação com uma equipe interprofissional e com a sociedade civil organizada, o que dá amplitude à investigação e permite que o objeto de estudo seja analisado sob uma perspectiva social, cultural e política. A abordagem às PSVS é de extrema relevância na composição do projeto, pois essas populações necessitam de um olhar holístico, considerando o sujeito singular e o coletivo, que carecem de estratégias objetivas e resolutivas, tendo em vista todo o contexto histórico-estruturais no qual estão inseridos.

REFERENCES

  • 1
    World Health Organization. WHO Coronavirus (COVID-19) Dashboard [Internet]. Geneva: WHO; 2021 [cited 2022 Dec 10]. Available from: https://covid19.who.int/
    » https://covid19.who.int/
  • 2
    Angelo JR, Leandro BBS, Périssé ARS. Monitoramento da Covid-19 nas favelas cariocas: vigilância de base territorial e produção compartilhada de conhecimento. Saúde Debate. 2021;45(spe2):123-41. https://doi.org/10.1590/0103-11042021E209l
    » https://doi.org/10.1590/0103-11042021E209l
  • 3
    Negreiros DJ, Gomes ID, Colaço VFR, Ximenes VM. Risco e vulnerabilidade: pontos de convergência na produção brasileira sobre juventudes. Desidades [Internet]. 2018[cited 2022 Dec 10];(18):20-33. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/desi/n18/n18a03.pdf
    » http://pepsic.bvsalud.org/pdf/desi/n18/n18a03.pdf
  • 4
    Carmo ME, Guizardi FL. O conceito de vulnerabilidade e seus sentidos para as políticas públicas de saúde e assistência social. Cad Saúde Pública 2018;34(3):e00101417. https://doi.org/10.1590/0102-311X00101417
    » https://doi.org/10.1590/0102-311X00101417

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2023
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