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Redes de apoio social e fase do ciclo vital de famílias imigrantes venezuelanas

RESUMO

Objetivo:

Compreender as estruturas das redes sociais de famílias imigrantes venezuelanas interiorizadas e a fase do ciclo vital em que se encontram.

Métodos:

Estudo qualitativo de múltiplos casos com famílias do Programa de Interiorização residentes na Grande Florianópolis, Brasil. A triagem ocorreu por meio de redes sociais e informantes-chave. Para a coleta de dados, utilizou-se a técnica de photovoice e entrevistas semiestruturadas, categorizadas com a ajuda do software Atlas.ti. Foram elaborados genogramas e ecomapas.

Resultados:

Das 4 famílias entrevistadas, totalizando 7 membros com filhos pequenos, identificou-se a família nuclear como principal rede de apoio informal. As redes formais incluíram escolas, igrejas e sociedade civil.

Considerações finais:

As famílias dependem fortemente de sua estrutura nuclear para apoio, com instituições formais atuando como recursos secundários. A fase do ciclo vital predominante está focada em famílias com filhos pequenos. Mais esforços são necessários para fortalecer as redes de apoio formais.

Descritores:
Análise de Rede Social; Estágios do Ciclo de Vida; Enfermagem Familiar; Determinantes Sociais da Saúde; Deslocamento Forçado

ABSTRACT

Objective:

To understand the structures of social networks of interiorized Venezuelan immigrant families and the life cycle stage they are in.

Methods:

Qualitative multiple-case study with families from the Interiorization Program residing in the Greater Florianópolis, Brazil. Screening occurred through social networks and key informants. For data collection, the photovoice technique and semi-structured interviews were used, categorized with the help of the Atlas.ti software. Genograms and ecomaps were elaborated.

Results:

Of the 4 families interviewed, totaling 7 members with young children, the nuclear family was identified as the main informal support network. Formal networks included schools, churches, and civil society.

Conclusion:

Families rely heavily on their nuclear structure for support, with formal institutions acting as secondary resources. The predominant life cycle stage is focused on families with young children. More efforts are needed to strengthen formal support networks.

Descriptors:
Social Network Analysis; Life Cycle Stages; Family Nursing; Social Determinants of Health; Forced Displacement

RESUMEN

Objetivo:

Comprender las estructuras de las redes sociales de familias inmigrantes venezolanas interiorizadas y la fase del ciclo de vida en la que se encuentran.

Métodos:

Estudio cualitativo de múltiples casos con familias del Programa de Interiorización residentes en la Gran Florianópolis, Brasil. La selección se realizó a través de redes sociales e informantes clave. Para la recopilación de datos, se utilizó la técnica de fotovoz y entrevistas semiestructuradas, categorizadas con la ayuda del software Atlas.ti. Se elaboraron genogramas y ecomapas.

Resultados:

De las 4 familias entrevistadas, totalizando 7 miembros con hijos pequeños, se identificó a la familia nuclear como principal red de apoyo informal. Las redes formales incluyeron escuelas, iglesias y sociedad civil.

Conclusiones:

Las familias dependen en gran medida de su estructura nuclear para el apoyo, con las instituciones formales actuando como recursos secundarios. La fase predominante del ciclo de vida se centra en familias con hijos pequeños. Se requieren más esfuerzos para fortalecer las redes de apoyo formales.

Descriptores:
Análisis de Redes Sociales; Estadios del Ciclo de Vida; Enfermería de la Familia; Determinantes Sociales de la Salud; Desplazamientos Forzados

INTRODUÇÃO

Segundo o último relatório anual da Agência das Nações Unidas para Refugiados, Global Trends (2022), 100 milhões de pessoas estavam deslocadas forçadamente em todo o mundo. Esses dados ainda não contabilizavam pessoas deslocadas do Afeganistão após a saída dos Estados Unidos nem da Ucrânia, com o início da guerra(11 Alto Comissariado das Nações Unidas Para os Refugiados (Acnur). Tendências Globais: deslocamento forçado[Internet]. 2021[cited 2023 Mar 12]. Available from: https://www.unhcr.org/62a9d1494/global-trends-report-2021
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).

Na América Latina, devido à crise política, econômica e humanitária, a migração de venezuelanos soma um total de 4 milhões de pessoas, sendo considerado o maior êxodo da história da região(22 Okumura A, Espinoza MDC, Boudesseul J, Heimark K. Venezuelan Forced Migration to Peru During Sociopolitical Crisis: an analysis of perceived social support and emotion regulation strategies. J Int Migr Integr. 2022;23(3):1277-310. https://doi.org/10.1007/s12134-021-00889-z
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).

No Brasil, sabe-se que a população venezuelana tem como principal porta de entrada o estado de Roraima(33 Arruda-Barbosa L, Neta ELMS, Teixeira LDG, Silva SM, Brasil CO, Leal NAC. Aspectos gerais da vida de imigrantes em abrigos para refugiados. Rev Bras Promoç Saúde[Internet]. 2020 [cited 2023 Jan 5];33.Available from: https://ojs.unifor.br/RBPS/article/view/10734
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, 44 Alves JQPL. Cotidiano e coletividade: dinâmicas nos abrigos para refugiados venezuelanos em Roraima. Rev Cad Pesqui Esc Cid[Internet]. 2020 [cited 2022 Feb 8];9:127-43. Available from: http://ojs.escoladacidade.org/index.php/cadernos/article/view/25/24
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). Após a passagem pela fronteira, muitos recém-chegados não encontram uma rede de apoio em solo brasileiro, situação que evidencia o despreparo para o acolhimento do grande contingente de pessoas que chega em um curto espaço de tempo(33 Arruda-Barbosa L, Neta ELMS, Teixeira LDG, Silva SM, Brasil CO, Leal NAC. Aspectos gerais da vida de imigrantes em abrigos para refugiados. Rev Bras Promoç Saúde[Internet]. 2020 [cited 2023 Jan 5];33.Available from: https://ojs.unifor.br/RBPS/article/view/10734
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, 44 Alves JQPL. Cotidiano e coletividade: dinâmicas nos abrigos para refugiados venezuelanos em Roraima. Rev Cad Pesqui Esc Cid[Internet]. 2020 [cited 2022 Feb 8];9:127-43. Available from: http://ojs.escoladacidade.org/index.php/cadernos/article/view/25/24
http://ojs.escoladacidade.org/index.php/...
, 55 Dias RS. As implicações da imigração venezuelana sobre o trabalho dos agentes comunitários de saúde do município de Pacaraima [Dissertação]. Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz; 2019 [cited 2022 Feb 23].79p. Available from: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/32499/Rivena_Dias_EPSJV_Mestrado_2019.pdf?sequence=2&isAllowed=y
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). A partir de 2018, o governo brasileiro e agências internacionais iniciaram a Operação Acolhida com o objetivo de oferecer ordenamento nas fronteiras, abrigamento e interiorização(66 Presidência da República (BR). Casa Civil. Operação Acolhida[Internet]. 2018[cited 2022 Apr 14]. Avaliable from: https://www.gov.br/casacivil/pt-br/acolhida/sobre-a-operacao-acolhida-2
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).

O Programa de Interiorização é direcionado aos imigrantes que, voluntariamente, querem se deslocar do estado de Roraima para outros estados brasileiros. Para isso, são fornecidas passagens aéreas a indivíduos e suas famílias que se encaixam em alguma das categorias do programa, sendo estas: institucional (abrigo-abrigo), reunião social, reunião familiar e com vaga de emprego sinalizada(66 Presidência da República (BR). Casa Civil. Operação Acolhida[Internet]. 2018[cited 2022 Apr 14]. Avaliable from: https://www.gov.br/casacivil/pt-br/acolhida/sobre-a-operacao-acolhida-2
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). Desde 2018, foram interiorizados aproximadamente 96 mil imigrantes, dos quais 88% viajavam em grupos familiares, sendo o estado de Santa Catarina o que mais recebeu venezuelanos interiorizados(77 Ministério da Cidadania (BR). Painel De Interiorização [Internet]. 2022 [cited 2022 Dec 15]. Available from: http://aplicacoes.mds.gov.br/snas/painel-interiorizacao/
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).

A presença de novos fluxos migratórios para o Brasil tem levantado questões sobre Direitos Humanos, sendo o acesso à saúde e a integração desta população na sociedade e no mercado de trabalho identificados como problemas a serem estudados(88 Granada D, Carreno I, Ramos N, Ramos MCP. Discutir saúde e imigração no contexto atual de intensa mobilidade humana. Interface (Botucatu) [Internet]. 2017 [cited 2023 Mar 15];21(61):285–96. https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0626
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). O processo migratório envolve distintos riscos à saúde das pessoas e, no contexto familiar, a migração pode ser considerada um processo não normativo (inesperado no ciclo vital), permeado por situações de estresse, violência ou perseguição, em que a pessoa ou grupo migra de forma não planejada(99 Cavalcante Neto AS, Oliveira MACOC. Health of Venezuelan immigrants: scoping review. Cienc Cuid Saúde [Internet]. 2022 [cited 2023 Jan 5];200. Available from: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/CiencCuidSaude/article/view/56000
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, 1010 Walsh F. Processos Normativos da Família: diversidade e complexidade. Porto Alegre: Artmed; 2016. 608 p.).

Segundo Sharon Denham, a vida e saúde das famílias são afetadas por relações dinâmicas entre vários sistemas, que incluem desde o sistema familiar e de vizinhança (microssistema) até o sistema cultural e político (macrosistema)(1111 Denham SA. Family health: a framework for nursing. Philadelphia: F.A. Davis Company; 2002. 313p.).

Dentro desta perspectiva, a rede de apoio social pode ser definida como a soma das relações que um indivíduo percebe como significativas e constitui-se como elemento importante na sua experiência de identidade, bem-estar, hábitos de cuidado, saúde e capacidade de adaptação em uma crise(1212 Sluzki C. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1997. 137p.).

Na enfermagem, a rede de apoio social é um elemento-chave para a avaliação no cuidado, buscando compreender o contexto de vida e conhecer os recursos a serem mobilizados nos momentos do ciclo vital e de saúde-doença de indivíduos e famílias(1313 Fernandes GCM, Boehs AE, Heidemann ITSB. O suporte social durante a transição familiar no pós-desastre natural. Texto Contexto Enferm[Internet]. 2013[cited 2023 Mar 10];22(4):1098–105. https://doi.org/10.1590/S0104-07072013000400028
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).

OBJETIVO

Compreender as estruturas das redes sociais de famílias imigrantes venezuelanas interiorizadas e a fase do ciclo vital em que se encontram.

MÉTODO

Aspectos éticos

O estudo foi conduzido de acordo com as diretrizes éticas nacionais e internacionais e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, cujo parecer está anexado à presente submissão. O Consentimento Livre e Esclarecido foi obtido de todos os indivíduos envolvidos no estudo por meio escrito e traduzido para o idioma espanhol.

Os participantes receberam codinomes de acordo com a numeração de identificação de cada família: F1/F2/F3/F4 e dos membros que participaram das entrevistas: (A) avó, (F) filha, (M) mãe, (P) pai. (TF1) = tia da família 1.

Referencial teórico-metodológico

Para este estudo, utilizou-se o referencial teórico de Rotinas e Rituais de Saúde da Família de Sharon Denham. Segundo a autora, as redes de apoio social podem ser divididas em Redes Informais (família, amigos, vizinhos) e Redes Formais (serviços de saúde, assistência social, educação e igrejas)(1111 Denham SA. Family health: a framework for nursing. Philadelphia: F.A. Davis Company; 2002. 313p.).

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo com abordagem qualitativa, com desenho de estudo de casos múltiplos e análise narrativa, utilizando-se do instrumento Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ) como norteador para descrição dos procedimentos metodológicos.

Cenário do estudo

Os locais de estudo foram as cidades da Grande Florianópolis: Biguaçu, Florianópolis e São José, no estado de Santa Catarina. A escolha do local ocorreu em função do estado ser a unidade da federação com maior número de interiorizados desde o início da operação(77 Ministério da Cidadania (BR). Painel De Interiorização [Internet]. 2022 [cited 2022 Dec 15]. Available from: http://aplicacoes.mds.gov.br/snas/painel-interiorizacao/
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).

Amostra

A população do estudo consistiu em núcleos imigrantes de nacionalidade venezuelana, idade superior a 18 anos, que participaram do Programa de Interiorização da Operação Acolhida. Foram excluídas do estudo as famílias venezuelanas que não participaram da Estratégia de Interiorização.

Embora o fluxo migratório de venezuelanos seja considerado um fluxo migratório forçado, devido às condições de crise em que ocorre, é mencionado como um fluxo misto, onde há pessoas solicitantes de refúgio (com pedido ainda sem decisão), refugiados reconhecidos, residentes temporários e permanentes, entre outros. Por este motivo, optamos por não considerar o status migratório dos participantes da pesquisa(11 Alto Comissariado das Nações Unidas Para os Refugiados (Acnur). Tendências Globais: deslocamento forçado[Internet]. 2021[cited 2023 Mar 12]. Available from: https://www.unhcr.org/62a9d1494/global-trends-report-2021
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).

A seleção dos participantes ocorreu por meio de busca ativa em redes sociais, em perfis e comunidades com o objetivo de reunir venezuelanos, bem como pela divulgação de chamadas online também via redes sociais.

Coleta e organização dos dados

A partir de três informantes-chave iniciais, encontrados nas redes sociais, foram indicadas outras famílias que participaram do Processo de Interiorização. Do total de 12 famílias indicadas pelos informantes-chave, cinco aceitaram inicialmente participar da pesquisa, mas uma desistiu devido à indisponibilidade de tempo para entrevistas.

A coleta de dados ocorreu entre os meses de abril e novembro de 2021, nos domicílios das famílias. Foram empregadas as técnicas de photovoice(1414 Gomes NN, Silva JGD, Queiroz ABA, Ferreira MDA, Apostolidis T, Silva RCD. Imagens e representações sociais: a fotolinguagem e photovoice na produção de dados sobre fenômenos de saúde. Esc Anna Nery. 2021;26. https://doi.org/10.1590/2177-9465-EAN-2021-0291
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) e entrevista semiestruturada, divididas em dois momentos: no primeiro, a coleta de dados por meio de imagens (fotos); no segundo, realizaram-se entrevistas semiestruturadas nos domicílios de cada família.

Foram observados os cuidados de precaução devido ao período de pandemia, com conversas em ambientes abertos e ventilados, uso de máscaras e álcool em gel. Para os registros fotográficos, orientou-se a atividade a partir da questão norteadora: “Quais rotinas de sua família representam o cuidado à sua saúde?” As entrevistas, com duração de 30 a 50 minutos, foram audiogravadas e posteriormente transcritas e traduzidas para o idioma espanhol, a fim de privilegiar o rigor na validação dos dados junto aos migrantes. Após a coleta dos dados de genogramas e ecomapas de cada família, os diagramas foram elaborados usando o software GenoPro.

Análise dos dados

A análise dos dados seguiu as etapas da Análise Temática. O processo de organização e categorização dos dados foi auxiliado pelo software Atlas.ti. As categorias foram descritas e discutidas à luz da literatura. A partir dos dados analisados, distinguiram-se categorias apresentadas a seguir.

RESULTADOS

Composição e Fase do Ciclo Familiar

A partir dos dados sobre a estrutura familiar de quatro núcleos imigrantes venezuelanos, que somam seis adultos, foram identificados aspectos ligados à rede de apoio, composição familiar, formação educacional e fase de desenvolvimento. Os núcleos familiares eram compostos por 3 casais heterossexuais, sendo que em um deles a esposa residia em Santa Catarina e o esposo ainda vivia em Manaus. Um dos núcleos era monoparental feminino. Foram entrevistadas 5 mulheres, com idades entre 25 e 50 anos, e 1 homem de 32 anos. Todas as famílias participantes do estudo tinham crianças entre 0 e 11 anos, totalizando 7 crianças.

O tempo total de migração foi, em média, de 5 anos desde a chegada ao Brasil, e variou de 2 anos a 1 mês para chegar a Santa Catarina. Esse tempo leva em consideração apenas os familiares que chegaram pelo processo de interiorização, excluindo aqueles que vieram por meios próprios, como no caso da mãe da família 1 (MF1).

Em relação ao grau de instrução: na primeira família, a tia tinha ensino superior e pós-graduação; a mãe, ensino superior; e a avó, ensino médio completo. Na família 2, pai e mãe tinham ensino superior incompleto. Na família 3, pai e mãe concluíram o ensino médio, e na família 4, a mãe cursou ensino técnico. Nenhum dos entrevistados trabalhava na área de formação, mesmo tendo experiência. Em todos os casos, os participantes expressaram insatisfação por não atuarem em suas respectivas áreas.

No Quadro 1, são apresentados os genogramas e ecomapas construídos a partir das informações das quatro famílias venezuelanas. Estes diagramas fornecem dados que caracterizam os núcleos quanto à fase de desenvolvimento familiar em que se encontravam no momento da migração. A fase do ciclo vital das famílias migrantes venezuelanas é marcada principalmente pela presença de filhos pequenos. Essa caracterização evidencia as particularidades do processo migratório com crianças e suas demandas por cuidados, bem como a presença de uma rede de apoio informal, frequentemente representada pelas avós.

Quadro 1
Genogramas e ecomapas das famílias participantes do estudo

Outro ponto notável, ilustrado nos genogramas, é a identificação dos núcleos migrantes das famílias. Os fluxos de migração são diferenciados, conforme as cores indicadas na legenda: núcleos que atualmente residem em Santa Catarina devido ao processo de interiorização, núcleos que estão em Santa Catarina mas que não foram interiorizados, e núcleos que vivem no Brasil fora de Santa Catarina.

Neste contexto, fica claro que as migrações são transições que ocorrem em diferentes núcleos das famílias ao longo do ciclo vital.

No que se refere à categoria temática de redes de apoio dos migrantes, constata-se, a partir dos ecomapas e entrevistas, a identificação de 4 subcategorias:

  1. Rede Familiar,

  2. Rede de Amigos/Conhecidos,

  3. Rede Comunitária (trabalho/Organizações Não Governamentais/Igrejas/escola),

  4. Redes de Saúde.

Entre as famílias entrevistadas, a principal rede de apoio é estabelecida pela articulação direta dos próprios membros, independentemente de terem migrado no mesmo momento da Venezuela para o Brasil. Essa rede proporciona segurança emocional durante a trajetória de migração e nos períodos de adaptação após a chegada aos destinos. O suporte da rede familiar não se destina apenas ao núcleo mais próximo, mas também à família extensa que reside em outro estado ou país. No seio do núcleo familiar migrante, a figura da avó materna desempenha um papel fundamental nas atividades domésticas diárias, na educação, no cuidado direto dos netos e também é respeitada por transmitir valores, práticas culturais de saúde e manter rituais religiosos.

A mãe fica responsável de tudo que tem a ver com as crianças, fazer o café da manhã, o almoço, dar banho ou auxiliar no banho, porque eles tomam o banho sozinhos, mas mesmo assim elas têm que ajudar [...] e tem que fazer o almoço, sentar com ele [a criança]. Então, principalmente quem fica com mais estresse da casa é a mãe [avó da criança]. (TF1)

Em algumas experiências de migração das avós maternas, cuja significativa função familiar se reflete na adaptação à nova etapa da vida em outro país, emergem relatos de um vazio de integração e socialização das idosas com a comunidade. Coincidentemente, durante o período da pesquisa, em duas famílias, as avós maternas optaram por retornar à Venezuela; em outra, houve relato de uma avó que também regressou ao país natal:

Uma das coisas que minha mãe deseja é ir embora, porque ela quer voltar para Venezuela. Ela fala assim: “eu lá na Venezuela, saía, trabalhava, eu procurava alguma coisa para fazer e aqui não, aqui não conheço, aqui não entendo, não sei falar, aqui quero sair e não posso sair porque não conheço nada. (MF3)

A rede familiar “estendida” fornece apoio menos recorrente, contudo os membros parecem exercer um papel fundamental na ajuda financeira para a continuidade da transição dos núcleos em fluxo migratório:

A tia dele que morava aqui e falou que aqui tinha um emprego, que a gente ia ganhar, não lembro, na época, 2 mil reais por mês, em 2016 [...] então, a gente falou: vamos para o Brasil e depois de seis meses a gente volta. (MF4)

A coesão entre o casal surge como um fator significativo de apoio no núcleo familiar durante o trajeto migratório. Em uma das famílias, as adversidades encontradas fortaleceram a relação conjugal:

Sabe aquele parceiro que tu tem, que passou muita dificuldade contigo e mesmo assim a gente se uniu mais e aqui estamos, né. (MF2)

O meu esposo é que transmite paz e segurança pra gente. A gente fica tranquilo com ele, a gente fica em paz. (MF4)

Por outro lado, os contratempos no processo migratório sinalizam para a frustração, como no caso da família F1, mono-parental, em que ambas as filhas adultas enfrentaram separações conjugais. Nesse cenário, a separação impacta a rede de apoio para o cuidado das crianças, exigindo que desempenhem papéis e tarefas familiares independentemente:

Minha filha é uma criança muito feliz, apesar de sentir muita falta do pai dela. Ele é presente na vida das crianças. Só em mensagem e áudio. Mas economicamente não. (TF1)

Nesse contexto monoparental, observa-se a solidariedade entre as irmãs adultas em relação ao apoio financeiro, cuidado com as crianças e manutenção da avó. A irmã mais velha, sendo a chefe da família, iniciou a migração por meios próprios e foi responsável por trazer, subsequentemente, outros membros da família: a irmã mais nova, a avó, os filhos da irmã mais velha e uma sobrinha, filha de um irmão residente no Equador:

Eu não posso deixar as crianças assim. Até porque eles me chamam de mãe. Então, eu recebo amor e carinho deles como mãe, então eu tenho a responsabilidade. (TF1)

Enquanto a rede familiar configura-se como o principal suporte psicossocial, a rede de amigos e conhecidos está intrinsecamente ligada ao projeto migratório. Eles estabelecem contatos com pessoas previamente estabilizadas e, baseados nos comentários sobre as características dos estados e municípios, decidem migrar. Ao chegar, são acolhidos e assistidos por essas redes:

Eu não tinha decidido vir para Santa Catarina, agora eu tenho uma amiga. Ela foi mostrando as fotos, as fotos também mostram que aqui é bem melhor, bem tranquilo, a segurança, e assim, eu fui me interessando, até vir pra cá. (MF4)

Apesar de essa rede se mostrar fundamental no processo de migração, algumas situações de desamparo geram vulnerabilidade, sobretudo na chegada ao destino. Aí, podem ocorrer desencontros entre os migrantes conhecidos ou, até mesmo, frustrações ao não terem suas expectativas atendidas no local escolhido:

Aí, o rapaz que ia me receber aqui me disse, tu tem que chegar na sexta, porque eu vou para a Venezuela. Se tu não chegar na sexta, tu não vai ter onde dormir, porque eu quero deixar você com meu filho aqui. Eu falei, ah tudo bem. E atrasou para sábado [...] só que o filho dele nunca apareceu. Eu escrevi, escrevi, escrevi e nunca apareceu. A gente chegou no sábado e ele apareceu na terça. (MF2)

A reestruturação da vida em Santa Catarina exige que se busque por contatos pessoais locais, que se acessem equipamentos sociais e que se estabeleça uma rede comunitária. Esta é, principalmente, representada pelo apoio recebido no ambiente de trabalho, nas igrejas, escolas e em Organizações Não Governamentais (ONGs). As ONGs oferecem suporte crucial nos primeiros dias de chegada das famílias e auxiliam na construção de uma realidade concreta de assentamento local, seja através da doação de móveis, da locação de moradias, da informação sobre ofertas de emprego ou do auxílio nos primeiros dias:

Daí o pastor falou assim, olha só “quem tem família aqui? Aí muita gente falou, eu, eu. Aí eu chorava. Eu falava, eu não tenho ninguém. Estava um frio, um frio, um frio. Aí o pastor falou assim: “então eu vou deixar 3 pessoas para pagar o hotel, só que amanhã de meio dia vocês tem que sair. (MF2)

Para as crianças, os pais reconhecem que a rede de maior importância e que promove a integração são as escolas. O papel do professor e dos colegas, como agentes integradores da nova cultura, pode atenuar as dificuldades durante o processo de migração, especialmente quando as famílias transitam por diferentes lugares ou cidades:

É porque assim, ela estuda em uma escola e o transporte quem ajuda é uma professora de lá, e ela vem trazer aqui e ela demora mais um pouquinho pra sair daqui porque tem que esperar a profe. (TF1)

Porém, situações de xenofobia também são vivenciadas, até mesmo dentro das escolas, conforme relatado por uma das famílias:

Até que a gente sentiu pena dela, porque dia do Índio, parabenizaram ela. Aí parabenizaram ela. “Ah parabéns!” e ela “ué, mas hoje não é meu aniversário”, “ah, mas é o dia do índio. (TF1)

As famílias venezuelanas acessam os serviços de saúde de diferentes formas, sendo comumente motivadas por questões específicas, como acompanhamento de gestação, doenças ou emergências que demandem atendimento médico. O vínculo dessas famílias com os centros de saúde é frágil; usualmente, a porta de entrada para os serviços públicos é a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) ou os setores de urgência/emergência dos hospitais. Durante a pandemia, todas as famílias relataram que algum membro foi infectado pelo coronavírus:

Eu acho que eu já te contei que a gente passou pelo COVID e nós passamos todos e eu fiquei internada e fiquei até na UTI e a mãe não quis ir para o hospital. (TF1)

Alguns membros, ao adoecerem de Covid-19, optaram por não buscar atendimento nos serviços de saúde, temendo a hospitalização e o consequente afastamento de seus familiares ou, ainda, enfrentando barreiras de comunicação devido ao idioma. A língua se apresenta como um obstáculo na decisão de procurar serviços de saúde, até mesmo em outras circunstâncias de cuidado. No entanto, os entrevistados salientam que o acesso aos serviços de saúde, em geral, é influenciado pela qualidade do acolhimento profissional. Contudo, a disponibilidade para ir até o serviço, por conta da rotina de trabalho, pode ser um empecilho:

Eu pensava que todos que iam, tinham que ficar na UTI, então eu pensava assim “E as crianças?” Entende? Então, estava muito mal, mas assim agradecer primeiramente a Deus, e assim, elas cuidaram de mim também. Ela [menina] tem 7 anos e ele [menino] tem 4, mas eles passam no quarto, na cama, a cada momento. (AF1)

A minha irmã tinha que tomar insulina, porque ela tem uma coisa… como diz… [...] diabetes [...] Ela ainda não se preocupou com essa parte. E ela tem outras coisas, que ela fez cirurgia e eu, também tenho que ir para o médico e eu fui deixando, fui deixando. (TF1)

Tem um médico aqui, que é colombiano. E é ele que me vê né? E ele deixa mais em conta pra mim, por eu ser estrangeira, e ele tomou isso como parceria. Como ele é estrangeiro, também. (MF2)

As famílias comparam o acesso aos serviços de saúde entre os diferentes locais por onde passaram em sua trajetória migratória. Elas notam melhorias ao acessar esses serviços, mesmo sem contar com uma equipe de saúde referenciada em suas experiências de cuidado. Em parte, isso se justifica pelas frequentes mudanças de residência, motivadas pela busca por condições de moradia mais alinhadas à sua realidade econômica:

Eu mudei muito o posto de saúde, porque como a gente mudou. Estava se mudando, né? Eu fui primeiro em Coqueiros e depois por último, terminei aqui (Areias) o pré-natal. Aqui em São José. (MF3)

DISCUSSÃO

A presença de uma rede de apoio social e afetivo robusta está associada à prevenção contra a violência e ao fortalecimento de competências. A eficácia dessa rede é manifesta pelas respostas que denotam uma significativa redução de sintomas, como depressão e sentimento de desamparo. Na ausência desta rede, pode-se observar um aumento da vulnerabilidade das pessoas diante de situações de risco, como nos fluxos migratórios forçados(1515 Juliano MCC, Yunes MAM. Reflexões sobre rede de apoio social como mecanismo de proteção e promoção de resiliência. Ambient Soc. 2014;17(3):135–54. https://doi.org/10.1590/S1414-753X2014000300009
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).

O processo migratório é, em si, um fenômeno comunitário, no qual a rede informal se organiza para que o indivíduo migre. Muitas vezes, este migra sozinho, em outras ocasiões em grupo, e ao longo da trajetória estabelece suas próprias redes de apoio(1616 Fazito D. A configuração estrutural dos arranjos familiares nos processos migratórios: a força dos laços fortes para a intermediação[Internet]. 2005[cited 2023 Mar 10]:21-22. Available from: https://www.researchgate.net/profile/Dimitri-Fazito/publication/267546999_A_configuracao_estrutural_dos_arranjos_familiares_nos_processos_migratorios_a_forca_dos_lacos_fortes_para_a_intermediacao/links/591b467aa6fdcc701fd177d4
https://www.researchgate.net/profile/Dim...
). A estabilidade e a força das redes influenciam como se dará o processo de migração, que nem sempre é influenciado por aspectos financeiros, mas pelos contextos das redes já estabelecidas no destino. Estas são vistas como suporte nos primeiros dias de chegada(1717 Truzzi O. Redes em processos migratórios. Tempo Social. 2008;20(1):199-218. https://doi.org/10.1590/S0103-20702008000100010
https://doi.org/10.1590/S0103-2070200800...
, 1818 Silva SA. Imigração e redes de acolhimento: o caso dos haitianos no Brasil. Rev Bras Estud Popul [Internet]. 2017 [cited 2022 Jan 5];34(1):99-117. Available from: https://rebep.org.br/revista/article/view/873
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), sentimento explicado pelo senso de pertencimento cultural e linguístico e pela vivência compartilhada das mesmas experiências do grupo migrante. Isso se reflete na sensação de compreensão mútua das adversidades enfrentadas durante a trajetória(1717 Truzzi O. Redes em processos migratórios. Tempo Social. 2008;20(1):199-218. https://doi.org/10.1590/S0103-20702008000100010
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, 1818 Silva SA. Imigração e redes de acolhimento: o caso dos haitianos no Brasil. Rev Bras Estud Popul [Internet]. 2017 [cited 2022 Jan 5];34(1):99-117. Available from: https://rebep.org.br/revista/article/view/873
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). Uma das prováveis razões para o maior número de interiorizações ter ocorrido é a opção “Reunião Social”.

No tocante à presença de avós idosas nas famílias, embora isso assegure o cuidado doméstico com as crianças e o apoio informal aos casais para trabalharem fora, os resultados mostraram a ausência de contatos sociais fora do domicílio. Tal situação agravou-se durante a pandemia, com os idosos sendo considerados grupo de risco para o contágio pelo vírus da COVID-19. Embora os idosos imigrantes viajem com seus descendentes, o que poderia reduzir o isolamento social, fatores como rearranjo na estrutura familiar e diferenças culturais podem gerar conflitos geracionais. A sensação de perda do papel social, aliada à falta de proficiência na língua do país anfitrião e ao tempo de permanência, contribui para o isolamento deste membro da família(1919 Johnson S, Bacsu J, McIntosh T, Jeffery B, Novik N. Competing challenges for immigrant seniors: Social isolation and the pandemic. Healthc Manage Forum. 2021;34(5):266-71. https://doi.org/10.1177/08404704211009233
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).

Este resultado evidencia como a migração forçada, sendo uma etapa não planejada do ciclo vital familiar, modifica funções e tarefas dentro das famílias. No caso das avós, observa-se que, ao se dedicarem exclusivamente à criação dos netos, elas podem negligenciar aspectos da própria saúde, rotinas de lazer e até a integração no novo país.

Para as crianças, a rede formal mais acessível ainda é a escola, que também serve como espaço de integração para a família. No entanto, ainda apresenta desafios, como a dificuldade com a nova língua e a xenofobia. A partir deste estudo considera-se que o reforço dessa rede pode transformar a escola em um ambiente mais seguro e promotor de empoderamento social, atenuando a sensação inicial de desamparo e auxiliando na mobilização de recursos internos de enfrentamento. Nesse sentido, a escola também pode ser uma porta de entrada para serviços de saúde.

Em relação à atividade laboral, mesmo os participantes com ensino superior completo ou incompleto estando empregados no momento da pesquisa, a ocupação atual não condiz com sua área de formação. Isso é observado até mesmo para a tia da família 1 (TF1), que possui vasta experiência em recursos humanos. Uma das possíveis justificativas é que migrantes com níveis educacionais mais elevados conseguem empregos mais facilmente, porém em áreas diferentes de sua formação(88 Granada D, Carreno I, Ramos N, Ramos MCP. Discutir saúde e imigração no contexto atual de intensa mobilidade humana. Interface (Botucatu) [Internet]. 2017 [cited 2023 Mar 15];21(61):285–96. https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0626
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, 99 Cavalcante Neto AS, Oliveira MACOC. Health of Venezuelan immigrants: scoping review. Cienc Cuid Saúde [Internet]. 2022 [cited 2023 Jan 5];200. Available from: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/CiencCuidSaude/article/view/56000
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
).

Pode-se perceber, com base nos resultados, que as redes formais, incluindo saúde e assistência social, não foram o primeiro recurso procurado. Tal achado pode estar relacionado à falta de confiança, visto que, neste estudo, esses serviços são buscados apenas em situações emergenciais.

Em relação às explicações pela busca de atendimento em Unidades de Pronto Atendimento e nas emergências/urgências dos hospitais, por exemplo, podemos apontar: a priorização do trabalho, em detrimento dos cuidados com a saúde; a falta de atendimento sensível às questões socioculturais de cada família migrante e as dificuldades de comunicação, que ocasionam medo de não ser entendido e/ou acolhido por ser imigrante. Os motivos apontados podem estar ligados à dificuldade de acesso e à criação de vínculo nos serviços dos centros de saúde da Atenção Primária(33 Arruda-Barbosa L, Neta ELMS, Teixeira LDG, Silva SM, Brasil CO, Leal NAC. Aspectos gerais da vida de imigrantes em abrigos para refugiados. Rev Bras Promoç Saúde[Internet]. 2020 [cited 2023 Jan 5];33.Available from: https://ojs.unifor.br/RBPS/article/view/10734
https://ojs.unifor.br/RBPS/article/view/...
, 44 Alves JQPL. Cotidiano e coletividade: dinâmicas nos abrigos para refugiados venezuelanos em Roraima. Rev Cad Pesqui Esc Cid[Internet]. 2020 [cited 2022 Feb 8];9:127-43. Available from: http://ojs.escoladacidade.org/index.php/cadernos/article/view/25/24
http://ojs.escoladacidade.org/index.php/...
, 55 Dias RS. As implicações da imigração venezuelana sobre o trabalho dos agentes comunitários de saúde do município de Pacaraima [Dissertação]. Rio de Janeiro: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz; 2019 [cited 2022 Feb 23].79p. Available from: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/32499/Rivena_Dias_EPSJV_Mestrado_2019.pdf?sequence=2&isAllowed=y
https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/ha...
, 99 Cavalcante Neto AS, Oliveira MACOC. Health of Venezuelan immigrants: scoping review. Cienc Cuid Saúde [Internet]. 2022 [cited 2023 Jan 5];200. Available from: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/CiencCuidSaude/article/view/56000
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
).

Considerando a fragilidade nas redes sociais formais, convém a proposição de espaços de discussão entre líderes comunitários imigrantes e equipes de saúde. A participação de lideranças comunitárias, profissionais de saúde e agentes locais tomadores de decisão pode contribuir para o esclarecimento das demandas e elaboração de propostas de melhorias dos serviços, visando auxiliar na integração social dos imigrantes.

Nas instituições de atenção à saúde, a participação do usuário é pautada pela maior democratização da informação; pelo reconhecimento, por parte dos profissionais, dos usuários como sujeitos no processo de cuidado à saúde e não apenas como objetos de práticas e prescrições; e pela conscientização dos usuários quanto aos seus direitos e ao seu papel na defesa dos próprios interesses(2020 Andrade GRB, Vaitsman J. Apoio social e redes sociais: conectando solidariedade e saúde. Ciên Saúde Colet. 2002;7(4):925-34. https://doi.org/10.1590/S1413-81232002000400023
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).

A participação dos imigrantes nas ações e serviços de saúde requer empoderamento sobre sua posição e seus direitos. Para isso, a vinculação às equipes, fundamentada pela confiança e no diálogo mútuo, são caminhos para que essa rede seja fortalecida e reconhecida como um apoio social nos locais de destino.

Para incluir a migração nos planos comunitários voltados para o desenvolvimento e a concretização de uma sociedade mais integrada, é necessário conhecer elementos da composição familiar e social, desenvolver perfis locais de migração e realizar exercícios de mapeamento comunitário para facilitar o processo. Isso impedirá que tanto as comunidades receptoras quanto os imigrantes sejam prejudicados.

A Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável reconhece a migração como um motor do desenvolvimento sustentável. No entanto, a relação entre migração e desenvolvimento é complexa, envolvendo processos políticos, e condições econômicas e sociais dos potenciais países de destino(2121 Organização das Nações Unidas (ONU). Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas [Internet]. 2015[cited 2022 Nov 30]. Available from: https://brasil.un.org/pt-br/sdg
https://brasil.un.org/pt-br/sdg...
).

Limitações do Estudo

Este estudo apresenta limitações decorrentes da realização da coleta de dados no contexto da pandemia de COVID-19, afetando tanto a atuação dos pesquisadores quanto a disponibilidade das famílias para participarem.

Contribuições para a área

A partir dos resultados encontrados nesta pesquisa, espera-se lançar luz sobre questões relativas às famílias em situação de fluxo migratório. Deseja-se que mais ações de fortalecimento das redes de apoio formais, que incluem serviços de saúde e serviço social, sejam discutidas. Com uma perspectiva interdisciplinar global, este estudo também contribui para a compreensão de alguns dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), entre eles, saúde e bem-estar (ODS 3), redução das desigualdades (ODS 10), bem como trabalho decente e crescimento econômico (ODS 8).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo permitiu compreender as redes de apoio de famílias imigrantes venezuelanas que participaram do Programa de Interiorização e que se estabeleceram nas cidades da Grande Florianópolis. Observa-se que a principal rede de apoio informal é a família nuclear e, entre as redes formais, destacam-se as escolas, igrejas e a sociedade civil.

No que tange à fase do ciclo vital, todas as famílias encontram-se na etapa considerada de famílias com filhos pequenos. A avó é a principal responsável pelos cuidados diários das crianças e da casa, mesmo com sua própria rede de apoio sendo limitada. A situação deste membro na família imigrante ressalta a necessidade de pesquisas voltadas a esse perfil.

Embora os esforços das redes formais sejam louváveis, percebe-se a existência de lacunas no acolhimento e integração, inclusive no acesso aos serviços de saúde na Atenção Primária à Saúde, uma vez que essa é indicada como uma das mais frágeis.

  • FOMENTO
    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

REFERENCES

Editado por

EDITOR CHEFE: Álvaro Sousa
EDITOR ASSOCIADO: Rafael Silva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2023
  • Aceito
    23 Jul 2023
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