Percepção dos enfermeiros portugueses: supervisão clínica e indicadores de qualidade na assistência de enfermagem

RESUMO

Objetivos:

descrever a percepção dos enfermeiros acerca da influência da supervisão clínica na melhoria dos indicadores de qualidade na assistência de enfermagem.

Métodos:

pesquisa exploratória de abordagem qualitativa, realizada com 16 enfermeiros utilizando o focus group. O processamento de dados emergiu da análise textual lexicográfica, recorrendo à Classificação Hierárquica Descendente e análise de similitude.

Resultados:

retenção de 80,0% de 185 segmentos de texto com construção de seis classes. As palavras foram representadas por quatro grafos (supervisor, auditoria, cuidado e processo); e três subgrafos (implementação, partilha e conhecimento).

Considerações Finais:

na percepção dos enfermeiros, a supervisão influencia os indicadores de qualidade na assistência de enfermagem.

Descritores:
Enfermeiros; Supervisão de Enfermagem; Assistência de Enfermagem; Auditoria de Enfermagem; Avaliação dos Resultados.

ABSTRACT

Objectives:

to describe nurses’ perception of the influence of clinical supervision on improving quality indicators in nursing care.

Methods:

exploratory research with a qualitative approach, carried out with 16 nurses using the focus group. Data processing emerged from lexicographical textual analysis, resorting to Descending Hierarchical Classification and similarity analysis.

Results:

80.0% retention of 185 text segments with six-class construction. The words were represented by four graphs (supervisor, audit, care, and process); and three subgraphs (implementation, sharing and knowledge).

Final Considerations:

in the perception of nurses, supervision influences quality indicators in nursing care.

Descriptors:
Nurses; Nursing Supervision; Nursing Assistance; Nursing Audit; Evaluation of the Results.

RESUMEN

Objetivos:

describir la percepción de los enfermeros acerca de la influencia de la supervisión clínica en la mejoría de los indicadores de calidad en la atención de enfermería.

Métodos:

investigación exploratoria de enfoque calitativo, realizada con 16 enfermeros utilizando el focus group. El procesamiento de datos emergió del análisis textual lexicográfico, recurriendo a la Clasificación Jerárquica Descendiente y análisis de similitud.

Resultados:

retención de 80,0% de 185 segmentos de texto con construcción de seis clases. Las palabras fueron representadas por cuatro grafos (supervisor, auditoría, cuidado y proceso); y tres subgrafos (implementación, partición y conocimiento).

Consideraciones Finales:

en la percepción de los enfermeros, la supervisión influencia los indicadores de calidad en la atención de enfermería.

Descriptores:
Enfermeros; Supervisión de Enfermería; Atención de Enfermería; Auditoría de Enfermería; Evaluación de Resultados.

INTRODUÇÃO

O envolvimento das equipes de enfermagem na avaliação das práticas assistenciais e o reconhecimento de níveis de excelência refletem a compreensão dos profissionais em face da importância da qualidade e segurança e de seu impacto nos pacientes(¹). Esse processo, por um lado, incentiva o desenvolvimento de estratégias de monitorização e a avaliação da prática diária; e, por outro lado, promove o desenvolvimento pessoal e profissional por meio da reflexão sobre as práticas assistenciais(²).

É com uma visão de liderança organizacional na prática assistencial que um grupo de saúde privado em Portugal, constituído por vários hospitais de assistência a pacientes do foro médico cirúrgico, promove de forma continuada uma cultura diferenciadora de qualidade e excelência ao aplicar um modelo de auditorias à qualidade da assistência em enfermagem nas suas unidades.

Esse modelo foi adaptado do trabalho de Haddad sobre “Qualidade de Assistência de enfermagem - O processo de avaliação em hospital universitário público”, aplicado no Hospital Universitário de Londrina (HUL) no âmbito de uma tese de doutoramento(³), com a classificação da qualidade assistencial de enfermagem por meio de indicadores, da seguinte forma: Qualidade Desejada (≥90.0% e <100.0%), Qualidade Adequada (≥81.0% e <90.0%), Qualidade Segura (=80.0%), Qualidade Mínima (≥71.0% e <80.0%) e Qualidade Não Adequada (<70.0%), resultantes de índices sensíveis de positividade.

Esse modelo de gestão de processos e resultados teve em conta os padrões de qualidade da Join Comission Internacional (JCI), Sistema de Gestão da Qualidade (SGS), Norma Europeia EN ISO 9001:2015, Normas de Qualidade na Saúde da Direção-Geral da Saúde (DGS) de Portugal e do modelo de desenvolvimento profissional da Ordem dos Enfermeiros Portugueses. Tudo isso permite, em equipe, analisar e refletir de forma adequada e clara sobre os índices de positividade sensíveis, para implementar ações de melhoria(⁴-⁶) na obtenção da qualidade desejada (≥90.0% e <100.0%).

Nessa perspectiva de eficiência e de apoio integral na melhoria contínua da qualidade assistencial, surge o conceito de supervisão clínica de enfermagem como estratégia facilitadora em processos de mudança de atitudes, comportamentos e práticas.

A supervisão clínica é estratégica na reflexão e transformação do pensar e do agir na construção da prática assistencial. Ao ser encarada como um processo formal e adequado ao contexto, implica a interação dos enfermeiros no acompanhamento, planejamento, avaliação e implementação de ações de melhoria. Por outra via, é fundamental que ela ocorra num ambiente sistemático e interpessoal favorável às aprendizagens, à partilha de saberes e à tomada de decisão autônoma e responsável(⁷-⁹).

A adoção da supervisão clínica permite ainda aumentar o capital humano, potenciar as competências interpessoais, emocionais e profissionais com ganho efetivo para os intervenientes, ou seja o supervisor e o supervisionado(⁹-¹²).

Durante o processo supervisivo, de acordo com padrões pré-definidos, o profissional mais experiente ou supervisor interage, partilha, acompanha e orienta de forma efetiva um profissional menos experiente ou supervisionado, facilitando o desenvolvimento contínuo de competências, a mediação e concretização de ações promovendo o sentido de responsabilidade e autonomia(¹⁰-¹¹,¹³).

Essa dinâmica deverá ocorrer segundo uma vertente formativa e não de controle, para que ocorra a reflexão, o feedback e relações interpessoais de partilha na equipe a fim de monitorar as necessidades e adequar ou adotar as melhores práticas segundo o contexto, com benefícios para o profissional, equipe e organização(¹³-¹⁶).

Entretanto, para legitimar a prática da supervisão clínica de enfermagem nas organizações, é necessário conhecer a cultura organizacional assim como as características pessoais e profissionais dos supervisores e supervisionados com o objetivo de estimular e aprofundar a prática reflexiva baseada na evidência(¹¹,¹⁷).

Dessa forma, os processos de supervisão clínica em enfermagem demonstram ter influência na obtenção de resultados desejáveis com impacto na prática assistencial de enfermagem, elevando a satisfação e a segurança dos pacientes com a organização de saúde(¹⁸-¹⁹).

Diante do exposto e levando em consideração o indicador de qualidade das auditorias das práticas assistenciais de enfermagem que a instituição de saúde privada realiza mensalmente, as quais revelaram índices sensíveis ou não conformes de qualidade com impacto direto nos pacientes, surge a necessidade de refletir com as equipes sobre o modelo institucional de auditorias e obter sua percepção acerca da supervisão clínica de enfermagem como estratégia de desenvolvimento pessoal e profissional mediante o acompanhamento das práticas assistenciais para a melhoria dos resultados.

Isso nos conduziu à questão do estudo: Será que a implementação da supervisão clínica de enfermagem nas equipes influencia os indicadores da qualidade assistencial de enfermagem aos pacientes do foro médico-cirúrgico em contexto de uma unidade de saúde privada?

OBJETIVOS

Descrever a percepção dos enfermeiros acerca da influência da supervisão clínica de enfermagem como estratégia na melhoria dos indicadores de qualidade da assistência em enfermagem.

MÉTODOS

Aspetos éticos

Esta pesquisa teve aprovação do Comitê de Ética da organização envolvida. Todos os participantes foram informados e esclarecidos sobre o conteúdo da pesquisa. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi devidamente preenchido e assinado por cada um dos participantes e devolvido aos investigadores.

O formulário de caracterização dos participantes foi igualmente preenchido e devolvido em envelope fechado e colocado em local próprio. No estudo, foram garantidos a confidencialidade dos dados e o anonimato dos participantes bem como dos serviços envolvidos. Nesse sentido, cada serviço foi representado por uma letra (A e B); e os participantes, pela letra E (Enfermeiro).

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo exploratório de abordagem qualitativa.

Seu desenvolvimento foi norteado pelo guia Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ), recomendado para relatos de pesquisa que coletam dados por meio de entrevistas ou grupos. É um estudo integrado num projeto de investigação de doutorado que pretende avaliar o impacto da supervisão clínica em enfermagem na elevação dos indicadores de qualidade na assistência de enfermagem a pacientes do foro médico-cirúrgico em contexto de internamento numa unidade de saúde privada.

Cenário do estudo

A pesquisa apresentada foi realizada entre agosto e outubro de 2019. A primeira etapa decorreu num hospital privado da região de Lisboa, Portugal, nos serviços de internamento médico cirúrgico, onde é aplicado o modelo das auditorias da qualidade da assistência em enfermagem.

Esse modelo consiste na aplicação de uma grelha de observação e análise de registos de pacientes do foro médico-cirúrgico com taxa de internamento superior a 24 horas, visando controlar e monitorar a qualidade assistencial das equipes de enfermagem.

Desse modelo, resultam evidências de conformidades ou desvios nos procedimentos com impacto na prática assistencial, denominados “índices de positividade” e, posteriormente, categorizados em indicadores sensíveis à qualidade, da seguinte forma: Qualidade Desejada (QD), Qualidade Adequada (QA), Qualidade Segura (QS), Qualidade Mínima (QM) e Qualidade Não Adequada (QNA). Por essa via, são definidas ações de melhoria contínua.

Fonte de dados

Os participantes da pesquisa são os enfermeiros que integram as equipes dos serviços de internamento médico-cirúrgico. Foram selecionados para a pesquisa elementos amostrais de forma estratificada de acordo com a equidade da representação dos serviços e realização das sessões de focus group. Os critérios de inclusão foram: ser enfermeiro de um dos dois serviços de internamento cirúrgico e médico independentemente da categoria profissional (júnior, enfermeiro I, enfermeiro II, sênior, perito, gestor), ter pelo menos três anos de exercício profissional no serviço e na organização e pelo menos um ano de exercício na profissão.

Coleta e organização dos dados

Para a coleta de dados, utilizou-se a metodologia de focus group, sendo construído um guia para refletir sobre as temáticas: percepção da qualidade da assistência em enfermagem, percepção da importância da auditoria da qualidade na assistência em enfermagem, percepção de supervisão clínica de enfermagem e percepção do processo supervisivo e seus intervenientes. A coleta dos dados foi efetuada por um pesquisador treinado, que conhecia o ambiente hospitalar onde decorreu a investigação. A realização do focus group se deu em dois momentos a fim de cumprir os requisitos dessa metodologia(²⁰), que recomenda um máximo de seis a oito participantes por momento.

Os momentos de focus group ocorreram em ambiente confortável e de espontaneidade para os participantes em local e horário previamente definidos. A moderação foi feita por um dos investigadores, conhecedor da profissão e da cultura organizacional, e teve a duração média de cerca de 90 minutos. Foi garantida a cada participante a oportunidade de intervir no focus group. Para o registro das falas, foi utilizada gravação de áudio e imagem para posterior análise dos dados(²⁰-²¹).

Procedimentos metodológicos

Efetuou-se a transcrição dos conteúdos dos momentos do focus group e utilizou-se o software IraMuTeQ - Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ^R)(²²-²³) como ferramenta de apoio ao processamento de dados na pesquisa qualitativa.

O IraMuTeQ é desenvolvido na linguagem Python com funcionalidades providas pelo software estatístico R, o que permite fazer a estatística de textos obtidos de entrevistas, documentos, entre outras fontes e os transformar em análises textuais lexicográficas de acordo com a Classificação Hierárquica Descendente (CHD) e similitude.

O software é uma ferramenta de processamento dos dados, e não um método de pesquisa, o que torna os resultados instrumentos de exploração e associação do material em estudo.

Análise de dados

Para efetuar a análise lexical, foi preparado o corpus textual, sobre o qual o software procedeu a cortes a cada 40 caracteres, formando os segmentos de texto analisados. Para refletir a homogeneidade do corpus, consideraram-se os segmentos de texto analisados com retenção ≧75%. Como critério de inclusão das palavras nas classes, foram consideradas todas as palavras com frequência maior que o dobro da média de ocorrência no corpus textual.

De acordo com a CHD dos agrupamentos, os segmentos de texto foram sucessivamente particionados em função da coocorrência de formas lexicais, originando classes lexicais com valores percentuais representadas em dendrograma.

A associação com a classe foi considerada pelo valor do qui-quadrado (χ²)≧3.84 com um ponto de corte (f) superior ou igual ao do dobro da frequência da média (f>12) e p<0.0001, que representam correlações fortes entre as palavras; para a análise de similitude, foram interpretados os resultados das relações e conectividade dos objetos em determinado conjunto(²⁴-²⁵).

A análise estatística subdividiu-se em duas fases. A primeira consistiu numa abordagem preliminar exploratória com enfoque na análise estrutural temática no sentido de medir a relação entre os conteúdos “auditoria” e “supervisão clínica”. A segunda fase correspondeu à análise estrutural monotemática com o propósito de aprofundar a compreensão do significado dos fenômenos do estudo propriamente dito.

RESULTADOS

O número total de participantes dos três serviços foi de 16 enfermeiros, dos quais 12 do gênero feminino, com uma média de idade de 40 anos. No tocante à categoria profissional, eram enfermeiros gestores (n=3), enfermeiro I (n=3), enfermeiro II (n=3), enfermeiro júnior (n=3) e enfermeiro sênior (n=4) e tinham uma média de tempo no serviço de 16,5 anos.

Quanto ao grau acadêmico, nove dos profissionais são apenas licenciados, dois são licenciados e com pós-graduação em supervisão clínica, e cinco têm grau de mestre e pós graduação em supervisão clínica.

Da análise do corpus textual de abordagem temática, a CHD permitiu obter 6.979 ocorrências apresentadas em 1.088 formas distintas. Dos 194 segmentos de texto, houve uma retenção de 84,5% com a construção de cinco classes semânticas sobre os conceitos de “Supervisão clínica” e “Modelo da auditoria da qualidade assistencial de enfermagem”, representadas no dendrograma (Figura 1 - Dendrograma da análise temática de classes e suas correlações segundo a Classificação Hierárquica Descendente).

Figura 1
Dendrograma da análise temática de classes e suas correlações segundo a Classificação Hierárquica Descendente, Lisboa, Portugal, 2021

No dendrograma, o corpus textual foi dividido em três subcorpora, em que a Classe 1 se articula com a Classe 2; e, em seguida, esses subcorpora associam-se à Classe 5, que se relaciona com as Classes 3 e 4, as quais interagem entre si. Ou seja, o Processo Supervisivo e o Perfil de Supervisor estão associados à Supervisão Clínica e integrados no Modelo de Auditoria da qualidade assistencial de enfermagem.

Por meio da aplicação do teste do qui-quadrado (χ²), na Classe 1- Qualidade dos Cuidados (17,6%), as palavras com maior número de correlações apresentadas são: qualidade (40,0; p<0,0001), cuidado (32,1; p<0,0001) e paciente (34,4; p<0,0001). Na Classe 2- Modelo de Auditoria (16,5%), as palavras são positivo (178,1; p<0,0001) e realização (128,9; p<0,0001); já para a Classe 5- Supervisão Clínica (20,7%), são conceito (67,8; p<0,0001) e enfermagem (62,1; p<0,0001).

Por último, na Classe 3- Perfil do Supervisor (22,6%), as palavras são competência (7,1; p<0,0001), positivo (14,6; p<0,0001); e na Classe 4- Processo Supervisivo (22,6%), são acompanhamento (27,5; p<0,0001), feedback (8,7; p<0,0001) e implementação (55,1; p<0,0001).

Quanto à qualidade assistencial de enfermagem por classe (Tabela 1), a Classe 1 Qualidade de Cuidados é percebida como a assistência de enfermagem de acordo com os padrões pré-determinados pela organização, garantindo a segurança dos pacientes inseridos no contexto. Para a Classe 2- Modelo de auditoria, em prática este é visto como uma ferramenta importante na identificação de índices de positividade sensíveis, ao permitir implementar ações de melhoria na assistência de enfermagem.

Tabela 1
Percepção dos enfermeiros quanto à qualidade da assistência de enfermagem, conforme cada classe, Lisboa, Portugal, 2021

Classes	Exemplo das respostas dos participantes
Classe 1 Qualidade de Cuidados	É a prestação de cuidados com qualidade dentro de procedimentos e padrões definidos de acordo com normas e guidelines atuais e de acordo com a expectativa do paciente. (FG1, E1) É prestar cuidados em segurança de acordo com conhecimentos científicos e com as necessidades do paciente e família. (FG2, E14)
Classe 2 Modelo de Auditoria	Ferramenta que identifica o que tem de se melhorar ou que se deve trabalhar com mais afinco, para garantir que todos trabalham o melhor que sabem e que é balizado o caminho a seguir. (FG2, E10) Instrumento que nos ajuda a melhorar e que nos diz onde estamos. (FG1, E7) São momentos de aprendizagens e de reforço. (FG2, E16)
Classe 3 Perfil do Supervisor	Comunicador que goste de ensinar, relacionar, levar o outro ao pensamento crítico, desenvolver a reflexão para promover as aprendizagens. É saber partilhar e levar à descoberta do saber. (FG1, E4) Acompanhamento e orientação de procedimentos e de pessoas, com feedback construtivo. (FG1, E1)
Classe 4 Processo Supervisivo	Processo desenvolvido por enfermeiros para enfermeiros com evidência da curva de aprendizagem ou feedback de acordo com as necessidades. (FG2, E15) Desenvolvido numa lógica de desenvolvimento de competências e numa lógica de desenvolver conhecimento. (FG2, E16)
Classe 5 Supervisão Clínica	Aprendizagem duradoura ao longo do tempo [...] ancorada nos conhecimentos [...] é uma lógica de partilha de crescimento profissional e pessoal. (FG1, E8) Partilha entre supervisor e supervisionado de conhecimento numa lógica de reflexão sobre partilha de valores relacionados com a profissão e com a organização. (FG1, E7)

No tocante à Classe 3- Perfil do Supervisor, os enfermeiros identificam-na como a capacidade de integrar, acompanhar e orientar de forma assertiva, adequada e competente novos profissionais. Na Classe 4- Processo Supervisivo, este é visto como estratégia de acompanhamento da prática diária promotora de momentos de partilha individual e em equipe. Por último, a Classe 5 Supervisão Clínica é identificada como um motor de transmissão de conhecimento, aprendizagens, partilha e reflexão, o que permite o desenvolvimento de competências integradas na prática.

Relativamente à análise de similitude, esta conduziu à composição de quatro núcleos centrais representados pelas palavras cuidado, auditoria, processo e supervisor, que denotam a percepção atribuída pelos enfermeiros à supervisão clínica e ao modelo de auditoria organizacional.

A ramificação entre os núcleos demonstra termos fortemente interligados entre si, revelando que os enfermeiros entendem a supervisão clínica como um elemento facilitador no processo de acompanhamento, feedback e reflexão sobre a qualidade assistencial de enfermagem.

No núcleo de Auditoria, os ramos com maior conexidade são o modelo e auditor, seguidos dos termos feedback, garantir e avaliar, que se interligam com o núcleo Cuidado com maior conexidade para qualidade, como referido na Classe 1- Qualidade de Cuidados e Classe 2 Modelo de Auditoria.

No núcleo Processo, os ramos com maior conexidade são a supervisão clínica com ramos homogêneos nos termos acompanhar e refletir, como referido na Classe 4- Processo Supervisivo e Classe 5- Supervisão Clínica, em que é possível acompanhar, refletir e dar feedback à equipe de enfermagem quando implementado o processo supervisivo. Por último, tem-se o agrupamento Supervisor com maior conexidade nos ramos perfil, competência, acompanhamento, enfermeiro e equipe, em que três subgrafos emergem para o exterior do eixo com os termos implementação e obstáculo, partilha, crescimento pessoal, conhecimento, enfermagem, transmitir e conceito. Isso representa a percepção dos enfermeiros sobre as características fundamentais do Perfil do Supervisor, tal como referido na Classe 3.

Garantida a fiabilidade desses resultados da supervisão clínica de enfermagem na melhoria da assistência de enfermagem, segue-se a compreensão do significado do fenômeno propriamente dito. Para a abordagem monotemática, foram analisadas 6.808 ocorrências, com 1.088 formas distintas e com ponto de corte f>12. Dos 185 segmentos de texto analisados, houve uma retenção de 80,0%, com a construção de seis classes (Figura 2 - Dendrograma, análise monotemática de classes e suas correlações segundo a Classificação Hierárquica Descendente).

Figura 2
Dendrograma, análise monotemática de classes e suas correlações segundo a Classificação Hierárquica Descendente, Lisboa, Portugal, 2021

No dendrograma, o corpus textual foi dividido em quatro subcorpora, em que surge a Classe 1, articulada com a Classe 2 e 5, relacionadas entre si; e a Classe 6, que se articula com as Classes 3 e 4, as quais se relacionam. Ou seja, o Processo Supervisivo e Perfil de Supervisor estão associados à Supervisão Clínica e estão integrados ao Modelo e Processo de Auditoria na assistência de enfermagem em uso na organização.

Relativamente à percepção dos enfermeiros quanto à qualidade da assistência de enfermagem, conforme cada classe (Tabela 2) e por meio da aplicação do teste do qui-quadrado (χ²), na Classe 1- Qualidade dos Cuidados (15,8%), as palavras com maior número de correlações apresentadas são: prestar (45,7; p<0,0001), cuidado (41,9; p<0,0001) e paciente (65,3; p<0,0001). Para a Classe 2- Processo de Auditoria (19,6%), as palavras são: permitir (27,5; p<0,0001), positivo (24,0; p<0,0001) e melhorar (15,9; p<0,0001). Já na Classe 5 Modelo de Auditoria (12.6%): serviço (9,7; p<0,0001) e enfermagem (59,7; p<0,0001).

Tabela 2
Percepção dos enfermeiros sobre a qualidade da assistência de enfermagem conforme cada classe, Lisboa, Portugal, 2021

Classes	Exemplo das respostas dos participantes
Classe 1 Qualidade dos Cuidados	É a prestação de cuidados que vai de acordo com todas as normas e procedimentos da instituição, baseada em conteúdos científicos recentes e atualização dos profissionais. (FG1, E4) É ir ao encontro das necessidade e expectativas dos pacientes e dos conteúdos que definem a boa prática e a qualidade, prestando cuidados seguros e efetivos. (FG1, E8)
Classe 2 Processo de Auditoria	Medir objetivamente atos para garantir e assegurar a postura básica de toda a equipe de forma transversal [...] proporcionar momentos de aprendizagem e conhecimento melhor dos processos e dos serviços. (FG1, E8) Permite dar feedback e ter margem de progressão, oportunidade de melhorar. (FG2, E13)
Classe 3 Processo Supervisivo	São um motor de transmissão de conhecimento; a reflexão facilita na implementação de melhoria de ações podendo ser um fio condutor na melhoria dos cuidados. (FG2, E15) Estruturado para pares onde o supervisor apoia e acompanha durante a prestação dos cuidados, identifica ações a melhorar os cuidados; também o supervisionado deve estipular os momentos de reunião com o supervisor para receber o feedback e envolvimento no processo e resultados. (FG1, E6)
Classe 4 Perfil do Supervisor	Ser um líder na gestão de conflitos com uma perspectiva de ajudar no crescimento profissional e pessoal promovendo o autocrescimento. (FG1, E7) Ter a capacidade de apoiar, acompanhar nos momentos e saber explicar o que está a acontecer, estipular o feedback e envolvimento no processo e resultado. (FG1, E6) Ter maturidade na profissão, ter competências na área em que está a supervisionar e promover a passagem desse conhecimento. (FG1, E8)
Classe 5 Modelo de Auditoria	Uma construção feita a pares por quem audita e por quem é auditado. (FG2, E16) Ferramenta que garante melhora e identifica problemas; repensa e estabelece ações de melhoria. (FG2, 11) Benchmarking, para aumentar a competitividade e desenvolvimento de novas competências dos enfermeiros. (FG2, E13)
Classe 6 Supervisão Clínica	Acompanhamento dentro da área de perícia de acordo com os objetivos, para uma construção profissional ao longo da carreira. (FG2, E10) Processo global que permite adaptar a curva de aprendizagem individualizada e sustentada ao longo do tempo da boa prática. (FG1, E3) Lógica de reflexão sobre o fenômeno em que há partilha de valores relacionados com a profissão e organização. (FG1, E7)

Por último, na Classe 4- Perfil do Supervisor (17,6%), as palavras são competência (6,9; p<0,0001), positivo (15,0; p<0,0001); e, na Classe 3- Processo Supervisivo (13,5%), são acompanhamento (11,4; p<0,0001) e supervisionar (13,0; p<0,0001).

Na Classe 1- Qualidade dos Cuidados, relativa ao conceito de qualidade da assistência de enfermagem, os enfermeiros a definem como a prestação de cuidados com segurança clínica de acordo com a prática baseada na evidência, com a constante atualização de competências dos profissionais. Para a Classe 2- Processo de Auditoria e Classe 5- Modelo de Auditoria, os enfermeiros referem que o modelo é realizado com regularidade por enfermeiros (pares) e está orientado para uma cultura de qualidade desejada, ao passo que o processo está orientado para os resultados das práticas dos cuidados.

Na Classe 3- Processo Supervisivo, este é traduzido como um gerador de aprendizagens pessoais e profissionais e promotor da reflexão e partilha sobre a prática na construção de um caminho a par. Já para a Classe 4- Perfil do Supervisor, os enfermeiros referem que este deve ser reconhecido pela organização e ter uma visão formal e informal do processo, estar motivado e motivar, apoiar e partilhar as aprendizagens numa perspectiva de construção profissional mútua.

Por último, na Classe 6 - Supervisão Clínica, os enfermeiros consideram que é a passagem de conhecimento dentro da sua área de perícia, do supervisor para o supervisionado, de acordo com os objetivos do serviço e da organização e que está relacionada com monitorização, acompanhamento e aprendizagem, possibilitando o feedback adequado.

Quanto à análise de similitude, esta conduziu à composição de três núcleos centrais representados pelas palavras Processo, Conhecimento e Supervisor, que denotam a percepção dos enfermeiros sobre a estratégia da supervisão clínica na melhoria dos índices de positividade da qualidade da assistência de enfermagem resultantes das auditorias (Figura 3 - Análise de similitude dos conceitos de Supervisão Clínica e do Modelo de Auditoria).

Figura 3
Análise de similitude dos conceitos de Supervisão Clínica e do Modelo de Auditoria, Lisboa, Portugal, 2021

A ramificação entre os núcleos demonstra termos fortemente interligados entre si, os quais levam à ideia de que o supervisor clínico é um profissional reconhecido pela equipe, detentor de características específicas, conhecimentos e competências que lhe permitem, mediante o feedback construtivo, partilhar e acompanhar os seus pares em procedimentos da prática assistencial.

No núcleo Processo, os ramos com maior conexidade são auditoria, acompanhamento, feedback e avaliar, que se interligam com o núcleo Supervisor. Surge, ainda, uma conexidade homogênea com os termos integração, evidência e cuidar, reforçando o Processo Supervisivo na integração, desenvolvimento e acompanhamento dos pares.

No núcleo Conhecimento, os ramos que apresentam maior conexidade são competência e enfermagem; e com uma conexidade homogênea, surgem os termos transmitir e orientação.

O núcleo Supervisor apresenta maior conexidade nos ramos característica, equipe, par e aprendizagem e de forma homogênea para os termos reconhecer, promover, partilhar e acompanhar. Assim emergem para o exterior dois subgrafos com os termos implementação e obstáculo bem como orientar, estratégia e melhorar, levando a concluir que o supervisor deve adotar estratégias e implementar processos de supervisão no sentido de ultrapassar os obstáculos e melhorar as práticas assistenciais.

DISCUSSÃO

Os resultados da percepção dos enfermeiros dão visibilidade à importância da implementação de processos de supervisão clínica de enfermagem na melhoria dos índices de positividade das auditorias, ao contribuírem para o aumento dos indicadores da qualidade da assistência de enfermagem.

Os enfermeiros do estudo, no que diz respeito à qualidade assistencial de enfermagem, consideram que esta é uma constante no cumprimento de normas e padrões pré-definidos assentes em conhecimento e competências técnico-científicas consonantes com as expectativas e necessidades do paciente e família, como observado na Classe 1- Qualidade dos cuidados e corroborado na literatura(¹,⁷,¹²).

Relativamente ao modelo e processo de auditoria em uso, os enfermeiros os consideram ferramentas transversais e contextualizadas da prática assistencial que, mediante índices de positividade, identificam fragilidades. Isso possibilita desenvolver ações de melhoria contextualizada e sustentar os indicadores de qualidade adotados, como observado na Classe 2 Processo de Auditoria e Classe 5- Modelo de Auditoria.

Simultaneamente, atribuem importância à normalização continuada da prática assistencial de enfermagem com impacto direto na qualidade e segurança dos pacientes, o que vem ao encontro do descrito na literatura(³,¹²).

É relatado na literatura que a supervisão, quando realizada como um processo interativo de acompanhamento de uma atividade de acordo com um referencial, permite assegurar a qualidade das ações centradas na intervenção, assim como a partilha do conhecimento entre os diferentes intervenientes(⁷,¹⁵,¹⁷-¹⁸,²⁶-²⁷). Isso foi informado pelos enfermeiros do estudo, que mencionam a supervisão clínica e o processo supervisivo como um dever e uma competência desenvolvida por pares, com base na partilha de conhecimento visando à melhoria dos processos da prática assistencial.

Ainda, acrescentam que o processo supervisivo permite a interação por meio do feedback com impacto na construção intrapessoal e profissional e orienta para a corresponsabilização, compreensão e partilha de experiências como observado na Classe 6 - Supervisão Clínica, o que acrescenta efetividade à supervisão e promove o desenvolvimento de competências e saberes, também corroborado na literatura(²⁶-²⁸).

Relativamente às características do supervisor clínico, os enfermeiros consideram-no como o profissional reconhecido pelos pares e pela organização, detentor de conhecimento concreto e sistematizado no domínio da supervisão clínica e da disciplina da profissão, demonstrado na Classe 4- Perfil do Supervisor. Destacam ainda como características positivas: a assertividade, a comunicação e a liderança enquanto base da relação de confiança, respeito, partilha e consolidação das relações interpessoal; bem como a orientação e planejamento de ações de melhoria como referido na literatura(⁸,¹¹-¹²,¹⁴-¹⁵,¹⁸).

Identificam, por último, que o supervisor deve fomentar a reflexão entre pares para a gestão emocional e competências de autoconsciência, autocrítica e autoavaliação, a fim de que ocorra a mudança e cooperação no processo supervisivo assente no desenvolvimento de competências promotoras de novas aprendizagens com ganhos organizacionais. Nesse sentido, a literatura refere que o supervisor deve ter competências teóricas, pedagógicas e clínicas de acordo com o domínio do saber teórico-cognitivo, do saber-fazer experiencial e do relacional que levem à reflexão sobre a ação em conformidade com uma cultura organizacional(¹²,¹⁷).

Limitações do estudo

Considerando que a pesquisa foi desenvolvida em apenas uma unidade de saúde privada com internamento de pacientes do foro médico-cirúrgico em Portugal, a aplicação do modelo de supervisão não deverá ser generalizada; e sim, contextualizada e adaptada às necessidades da organização e dos pacientes.

No entanto, a metodologia poderá ser replicada em outras unidades hospitalares e serviços com características similares às dos participantes, possibilitando o cruzamento de dados e a discussão do fenômeno.

Contribuições para a área da enfermagem

Espera-se que os resultados aqui apresentados subsidiem novas pesquisas direcionadas para a continuidade do estudo acerca da pertinência da supervisão clínica de enfermagem como estratégia no ganho de competências pessoais e profissionais, com impacto direto no paciente e na melhoria de indicadores de qualidade da prática assistencial de enfermagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo possibilitou: aprofundamento sobre a percepção dos enfermeiros no tocante ao conceito de auditoria e conceito de supervisão clínica de enfermagem; e mensuração do impacto nos indicadores da qualidade na assistência de enfermagem.

Podemos afirmar que as auditorias são uma ferramenta essencial na implementação de processos de melhoria contínua com influência direta nos pacientes. Além disso, ao se desenvolver um modelo contextualizado de supervisão clínica de enfermagem por pares, é possível refletir com base em evidências sobre a prática, orientar na monitorização de indicadores, implementar ações de melhoria conforme os resultados, estabelecer feedback de proximidade e induzir à tomada de decisão responsável, fundamental no desenvolvimento profissional e organizacional.

Este modelo parece ser o fio condutor para a mudança de comportamentos, pois a supervisão influencia direta e significativamente as competências em nível pessoal e profissional, sendo um processo que vai para além das teorias e conceitos de enfermagem.

Conclui-se que a pesquisa realizada fundamenta a percepção dos pesquisadores sobre a aplicação da supervisão clínica em enfermagem, como estratégia na melhoria dos indicadores de qualidade na assistência de enfermagem resultantes dos índices de positividade. Tem-se a consciência de que a mudança capacita os enfermeiros para a construção da identidade profissional e interpessoal ao longo do tempo, fortalecendo a prática reflexiva com consequência na assistência de enfermagem nas equipes, na organização e na Enfermagem enquanto disciplina.

AGRADECIMENTO

A todos os enfermeiros que colaboram na concretização da pesquisa.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Jules Teixeira

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Ago 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  16 Out 2022
• Aceito
  17 Jan 2023