Barreiras para o uso da Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) ao HIV: uma revisão integrativa

RESUMO

Objetivos:

identificar e sintetizar as evidências científicas sobre as barreiras e dificuldades para o uso e adesão da Profilaxia Pré-exposição (PrEP) para o HIV.

Métodos:

revisão integrativa da literatura, utilizando as bases de dados MEDLINE/PubMed, Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Academic Search Premier e Scopus (Elsevier).

Resultados:

todos (100%) os artigos incluídos identificaram que os usuários da PrEP experimentam algum tipo de barreira estrutural relacionada aos serviços de saúde, como longa distância das unidades, logística subótima para retirada de pílulas e resistência profissional para prescrição da PrEP. Ademais, 63,21% identificaram barreiras sociais, como estigma sobre a sexualidade e HIV, além de barreiras individuais, como uso de álcool, efeitos adversos e preocupações com a toxicidade a longo prazo.

Conclusões:

multifatoriais são as barreiras para o uso da PrEP. Intervenções efetivas são necessárias para apoiar os usuários da PrEP no acesso, adesão e retenção nos serviços de saúde.

Descritores:
Profilaxia Pré-Exposição; Fármacos Anti-HIV; Prevenção de Doenças; Barreiras ao Acesso aos Cuidados de Saúde; Saúde Sexual

ABSTRACT

Objectives:

to identify and synthesize scientific evidence on the barriers and difficulties for Pre-exposure Prophylaxis (PrEP) use and compliance for HIV.

Methods:

an integrative literature review, using the MEDLINE/PubMed, Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Academic Search Premier and Scopus (Elsevier) databases.

Results:

all (100%) the articles included identified that PrEP users experience some type of structural barrier related to health services such as long distance from the units, suboptimal logistics for taking pills and professional resistance to prescribing PrEP. Furthermore, 63.21% identified social barriers, such as stigma about sexuality and HIV, in addition to individual barriers such as alcohol use, adverse effects, and concerns about long-term toxicity.

Conclusions:

the barriers to PrEP use are multifactorial. Effective interventions are needed to support PrEP users in accessing, complying with, and retaining health services.

Descriptors:
Pre-Exposure Prophylaxis; Anti-HIV Agents; Prevention and Control; Access to Health Services; Sexual Health

RESUMEN

Objetivos:

identificar y sintetizar evidencias científicas sobre las barreras y dificultades para el uso y la adherencia a la Profilaxis Pre-Exposición (PrEP) para el VIH.

Métodos:

revisión integrativa de la literatura, utilizando las bases de datos MEDLINE/PubMed, Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Academic Search Premier y Scopus (Elsevier).

Resultados:

todos (100%) de los artículos incluidos identificaron que los usuarios de PrEP experimentan algún tipo de barrera estructural relacionada con los servicios de salud, como la larga distancia de las unidades, la logística subóptima para la toma de pastillas y la resistencia profesional a prescribir la PrEP. Además, el 63,21% identificó barreras sociales, como el estigma sobre la sexualidad y el VIH, además de las barreras individuales como el consumo de alcohol, los efectos adversos y las preocupaciones sobre la toxicidad a largo plazo.

Conclusiones:

las barreras para el uso de la PrEP son multifactoriales. Se necesitan intervenciones eficaces para ayudar a los usuarios de la PrEP a acceder, adherirse y conservar los servicios de salud.

Descriptores:
Profilaxis Pre-Exposición; Fármacos Anti-VIH; Prevención de Enfermedades; Barreras de Acceso a los Servicios de Salud; Salud Sexual

INTRODUÇÃO

A infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) continua um problema de saúde pública mundial. Desde o surgimento da pandemia, 79,3 milhões de pessoas se infectaram com o HIV e 36,3 milhões morreram de doenças relacionadas à AIDS no mundo. Em 2020, especificamente, 1,5 milhões de pessoas foram diagnosticadas e 680 mil morreram de AIDS(¹).

Nos últimos anos, emergiram novas estratégias de prevenção ao HIV, sendo a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) considerada um dos mais importantes avanços biomédicos recentes na prevenção do HIV. O esquema com um comprimido combinado, contendo emtricitabina oral/tenofovir disoproxil fumarato (FTC/TDF), tem sido comprovado como estratégia de prevenção altamente eficaz para mulheres e homens, com proteção contra o HIV superior a 90% entre aqueles com altas taxas de adesão à medicação(²).

A PrEP é indicada para pessoas soronegativas para o HIV que estão sob maior risco de se infectar devido a vulnerabilidades e contextos sociais específicos e tem sido implementada mundialmente por políticas públicas de saúde voltadas à prevenção do HIV. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Joint UNAIDS tornaram a implementação da PrEP uma prioridade para as populações de maior risco, e vários países desenvolveram diretrizes e planos nacionais para sua implantação(³). O Brasil foi o primeiro país da América Latina a utilizar essa estratégia de prevenção, que ocorreu no Sistema Único de Saúde (SUS), em 2017, entre segmentos populacionais que concentram a maior prevalência de HIV no país, tais como gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH), pessoas transexuais, trabalhadores/as do sexo e casais sorodiferentes ao HIV(⁴).

Desde a implementação da PrEP no país, há 473 serviços dispensadores e 64.066 mil pessoas se beneficiaram com o uso da profilaxia, 24.843 mil descontinuaram seu uso e, atualmente, há aproximadamente 39.223 mil usuários ativos da PrEP. Dessa forma, observa-se que 39% das pessoas que iniciaram a PreP descontinuaram o uso da profilaxia em algum momento(⁵). Apesar de a eficácia estar bem estabelecida na literatura, a adesão e a retenção dos indivíduos em uso da PrEP nos serviços de referência são um desafio. Estudo realizado em São Francisco, nos Estados Unidos, mostrou que menos da metade das pessoas que iniciaram a PrEP ficaram retidas nos serviços clínicos(⁶).

Na literatura, pouco se sabe sobre as barreiras e facilitadores específicos para a adesão à PrEP, particularmente em algumas populações mais vulneráveis, como jovens negros de minorias sexuais e de gênero em ambiente real do uso da PrEP(⁷), sendo necessários mais estudos para um levantamento detalhado dessas lacunas.

Apesar de a PrEP ser uma tecnologia de prevenção altamente eficaz, se tomada de forma consistente, a adesão é, portanto, fundamental para o sucesso do método, e, por isso, a descontinuação precoce e as lacunas no uso limitam o impacto potencial da estratégia(⁸). São necessárias várias abordagens para compreender e enfrentar os complexos desafios à implementação da PrEP(⁹). Dessa forma, é necessário que profissionais de saúde informados sobre este desafio possam apoiar seus clientes com informações no início, bem como apoiá-los durante o uso da PrEP com estratégias de adesão personalizadas(⁹) para mitigar possíveis barreiras para o uso e adesão à profilaxia.

Diante desse cenário, por compreender a relevância da estratégia no contexto da prevenção combinada da infecção pelo HIV e diante dos dados oficiais do governo brasileiro sobre a alta taxa de descontinuidade de PrEP, propusemos este estudo a fim de reunir as evidências disponíveis atualmente sobre as barreiras relacionadas ao uso da PrEP. Esperamos que esta revisão possa contribuir com a prática assistencial baseada em evidências para o fornecimento da PrEP na vida real.

OBJETIVOS

Identificar e sintetizar as evidências científicas sobre as barreiras e dificuldades para o uso e adesão da PrEP para o HIV.

MÉTODOS

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que seguiu as seguintes etapas: identificação do tema e elaboração da questão de pesquisa; estabelecimento dos critérios de inclusão/exclusão; busca na literatura; extração e categorização dos dados; análise crítica das publicações selecionadas; interpretação dos resultados; e apresentação/síntese do conhecimento(¹⁰-¹¹).

A questão norteadora foi construída a partir do acrônimo PIO(¹²). Assim, estabeleceu-se: “população” (P) = usuários de PrEP; “intervenção” (I) = o uso da PrEP; e “outcome” (O) = barreiras e dificuldades para o uso, adesão e continuidade da PrEP. A questão de pesquisa, portanto, foi: quais são as barreiras e dificuldades que usuários de PrEP vivenciam para aderir e continuar o uso da profilaxia?

A busca dos estudos ocorreu em fevereiro de 2021, em quatro bases de dados, sendo elas: MEDLINE/PubMed, Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Academic Search Premier e Scopus (Elsevier). A estratégia de busca se constituiu por descritores e seus sinônimos, identificados nos Descritores em Ciência da Saúde (DeCS), seus equivalentes em inglês, identificados no Medical Subject Headings (MeSH) e no CINAHL headings. Os descritores utilizados foram PrEP, HIV, adesão ao tratamento e acesso aos serviços de saúde. Tendo em vista que a PrEP é uma estratégia recente, utilizamos filtros para limitar a busca de arquivos a partir do ano 2000 em algumas bases de dados.

Os critérios de inclusão foram estudos primários que tinham como o objetivo avaliar as barreiras, ou dificuldades, experiências e desafios sobre o uso da PrEP relatados pelas pessoas que estavam em uso da profilaxia ou que já fizeram uso dela em algum momento de suas vidas. Não houve restrições de idiomas na inclusão dos arquivos.

Além dos estudos que não atendiam aos critérios de inclusão, excluíram-se literatura cinzenta, estudos que avaliaram as barreiras para uso da PrEP entre participantes de ensaios clínicos ou que a entrega da PrEP não ocorreu em ambiente real. Os estudos com participantes mistos (participantes que já usaram a PrEP e participantes que nunca a utilizaram) foram excluídos, devido à impossibilidade de identificar quais barreiras foram experimentadas especificamente por quem já utilizou a PrEP.

Utilizamos a plataforma Rayyan(¹³) para a triagem dos estudos, e, para a extração dos dados, utilizamos um roteiro(¹⁴) que propõe os principais dados a serem considerados da publicação: autoria, país de realização do estudo, título do periódico, desenho do estudo (experimental, quase-experimental, observacional, estudos com abordagem qualitativa ou métodos mistos) e o nível de evidência, que foi classificado em cinco níveis(¹⁴-¹⁵).

Os dados também foram apresentados quanto à população do estudo, objetivo ou questão de investigação e principais resultados encontrados. Para analisar a avaliação do nível de evidência dos estudos, consideramos: nível 1 - metanálise de ensaios clínicos randomizados e controlados; nível II - ensaios clínicos randomizados e controlados; nível III - ensaios clínicos sem aleatorização; nível IV - estudos de caso-controle e coorte; nível V - revisões sistemáticas, estudos descritivos e qualitativos; nível VI - opiniões de autoridades e/ou parecer de comitês de especialistas(¹⁵-¹⁶).

Para descrever as barreiras identificadas, adotamos a análise temática, que é um método para identificar, analisar e relatar padrões (temas) dentro dos dados(¹⁷). As barreiras e dificuldades para o uso da PrEP foram agrupadas por similitude em três aspectos: barreiras individuais, que incluem aqueles que são comportamentais ou clínicos e são geralmente relacionadas à tomada de decisão, atitudes ou perspectivas de uma pessoa; barreiras sociais e interpessoais, definidas como aquelas que podem derivar do contexto social no qual o indivíduos está inserido; e barreiras estruturais e logísticas, que são além do controle do indivíduo, incluindo barreiras ao acesso a serviço e políticas de saúde e envolvem aspectos relacionados às instituições e ao meio ambiente(¹⁸-¹⁹).

RESULTADOS

A busca resultou em 2041 arquivos, que foram exportados para a plataforma Rayyan(¹³), onde passou pelo processo de exclusão de duplicados (n = 369). Em seguida, 1.672 artigos foram avaliados por título e resumo por dois revisores independentes. Nessa etapa, 1.563 artigos foram excluídos, restando 109 arquivos. Um terceiro revisor independente resolveu 68 conflitos, resultando em 58 arquivos para leitura na íntegra. Desses, 03 arquivos não foram resgatados. Finalmente, 55 arquivos foram lidos na íntegra e 23 foram incluídos nesta revisão, conforme Figura 1.

Figura 1
Fluxograma PRISMA do processo de pesquisa, identificação dos estudos e seleção da literatura, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, 2022

Dos 23 (100%) estudos incluídos nesta revisão, quinze (65,2%) eram qualitativos, cinco (21,73%), quantitativos, e três (13,04%), de métodos mistos. Do total, 16 (69,56%) foram realizados nos Estados Unidos(⁷,¹⁸-³²), cinco (21,73%), em países do continente africano(³³-³⁷), um (4,34%), na Alemanha(³⁸), e um (4,34%), no México(³⁹).

A categorização dos dados por similitude constituiu-se dos seguintes agrupamentos e número de artigos: barreiras individuais (15), barreiras sociais (15) e barreiras estruturais (22). Todos (100%)(⁷,¹⁸-³⁹) estudos identificaram que os usuários da PrEP experimentaram mais de uma barreira para o seu uso, adesão ou continuidade e, por isso, alguns estudos foram alocados em duas ou mais categorias desta revisão, conforme o Quadro 2.

Quadro 1
Estratégia de busca e bases de dados, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, 2022

Banco de dados	Estratégia de busca
MEDLINE /PubMed	#1 (pre-exposure prophylaxis OR “PrEP” OR “Pre Exposure Prophylaxis” OR “Pre-Exposure Prophylaxi” OR “Prophylaxis, Pre-Exposure” OR “Pre-Exposure Prophylaxis (PrEP)” OR “Pre Exposure Prophylaxis (PrEP)” OR “Pre-Exposure Prophylaxi (PrEP)” OR “Anti-HIV Agents” OR “Agents, Anti-HIV” OR “Anti HIV Agents” OR “Anti-AIDS Agents” OR “Agents, Anti-AIDS” OR “Anti AIDS Agents” OR “Anti-HIV Drugs” OR “Anti HIV Drugs” OR “Drugs, Anti-HIV” OR “AIDS Drugs” OR “Drugs, AIDS” OR “Anti-AIDS Drugs” OR “Anti AIDS Drugs”)
	#2 (HIV Infection [MeSH] OR HIV [MeSH] OR “Human Immunodeficiency Virus” OR “Immunodeficiency Virus, Human” OR “Immunodeficiency Viruses, Human” OR “Virus, Human Immunodeficiency” OR “Viruses, Human Immunodeficiency” OR “Human Immunodeficiency Viruses” OR “Human T Cell Lymphotropic Virus Type III” OR “Human T-Cell Lymphotropic Virus Type III” OR “Human T-Cell Leukemia Virus Type III” OR “AIDS Virus” OR “AIDS Viruses” OR “Virus, AIDS” OR “Viruses, AIDS”)
	#3 (medication adherence [MeSH] OR treatment adherence and compliance [MeSH] OR “Drug Adherence” OR “Adherence, Drug” OR “Medication Nonadherence” OR “Nonadherence, Medication” OR “Medication Noncompliance” OR “Noncompliance, Medication” OR “Medication Non-Adherence” OR “Medication Non Adherence” OR “Non-Adherence, Medication” OR “Medication Persistence” OR “Persistence, Medication” OR “Medication Compliance” OR “Compliance, Medication” OR “Medication Non-Compliance” OR “Medication Non Compliance” OR “Non-Compliance, Medication” OR “Drug Compliance” OR “Compliance, Drug” OR “Therapeutic Adherence and Compliance” OR “Treatment Adherence” OR “Adherence, Treatment” OR “Therapeutic Adherence” OR “Adherence, Therapeutic”)
	#4 (health services accessibility [MeSH] OR “Health Services Availability” OR “Accessibility of Health Services” OR “Accessibility, Health Services” OR “Access to Health Services” OR “Access to Health Care” OR “Access to Therapy” OR “Access to Therapies” OR “Therapy, Access to” OR “Access to Treatment” OR “Access to Treatments” OR “Treatment, Access to” OR “Health Services Geographic Accessibility” OR “Program Accessibility” OR “Accessibility, Program” OR “Access To Medicines” OR “Access To Medicine” OR “Access to Medications” OR “Access to Medication” OR “Medication, Access to” OR “Medication Access” OR “Access, Medication”))
	#1 AND #2 AND #3 AND #4
CINAHL	(pre-exposure prophylaxis or prep or preexposure prophylaxis) OR HIV pre exposure prophylaxis AND (healthcare or health care or hospital or health services or health facilities) AND (barriers or obstacles or challenges) AND (patient compliance or patient adherence)
Academic Search Premier	(pre-exposure prophylaxis or prep or preexposure prophylaxis) OR hiv pre exposure prophylaxis AND ( healthcare or health care or hospital or health services or health facilities ) AND ( barriers or obstacles or challenges ) AND ( patient compliance or patient adherence )
Scopus	(TITLE-ABS-KEY(“pre-exposure prophylaxis”) AND TITLE-ABS-KEY (“HIV”) AND TITLE-ABS-KEY (“Health Services Accessibility”) OR TITLE-ABS-KEY (“medication adherence”) OR TITLE-ABS-KEY (“treatment compliance”)) AND (LIMIT-TO(PUBYEAR, 2021) OR LIMIT-TO PUBYEAR, 2020) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2019) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2018) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2017) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2016) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2015) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2014) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2013) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2012) OR LIMIT-TO (PUBYEAR, 2011)) AND ( LIMIT-TO(DOCTYPE, “ar”))

Quadro 2
Síntese dos estudos incluídos na revisão de acordo com o ano de publicação e nível de evidência, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, 2022

Autores, ano e país de estudo	Objetivo do estudo	População estudada/amostra	Método/estratégia utilizada	Principais achados	NE*
Arnold et al., 2017(18)/ EUA	Explorar os fatores estruturais, sociais, comportamentais e clínicos que afetam o uso da PrEP e a retenção nos cuidados.	HSH jovens (n= 30)	Qualitativo/ entrevistas individuais	Os principais fatores que afetam o uso e a retenção da PrEP nos cuidados com a PrEP incluem fatores estruturais (custo, assistência com consulta médica e pagamentos de medicamentos), estigma HIV e status de relacionamento status de HIV do parceiro, comportamentos sexuais de risco e fatores clínicos (efeitos colaterais).	V
Ellison et al., 2019(20)/ EUA	Avaliar as barreiras a PrEP oral e influências de características sociodemográficas e comportamentos sexuais na escolha de novas formulações do medicamento.	HSH (n=108)	Quantitativo, transversal/ entrevistas individuais	As barreiras elencadas foram esquema diário de PrEP, dificuldade de acesso a profissionais prescritores de PrEP, dificuldade em marcar consulta, de pegar prescrições e conversar com profissionais de saúde prescritor de PrEP, diferenças raciais e étnicas (homens negros e hispânicos enfrentam mais barreiras, em comparação aos brancos e asiáticos).	IV
Hunt et al., 2019(21)/ EUA	Examinar os desafios de acesso e adesão à PrEP e avaliar a utilidade de monitorar objetivamente a adesão à PrEP através da urina.	Adultos jovens (entre 18-34 anos) em uso de PrEP (n=40)	Quantitativo, transversal, descritivo	Os participantes relataram poder acessar a PrEP rapidamente, mas as barreiras notáveis relatadas incluíram a falta de vontade do provedor em prescrever a PrEP. Em relação à adesão, a barreira mais frequente foi lembrar de tomar o medicamento.	V
Park et al., 2019(22)/ EUA	Caracterizar o caminho para a captação e continuação da PrEP.	Mulher negras ou latinas heterossexuais cisgênero (n=14)	Qualitativo/ entrevistas individuais semiestruturadas	Desinformação sobre a PrEP entre profissionais de saúde, preocupações com a segurança da medicação, dificuldade em preencher e retirar a PrEP nas farmácias, custos de saúde desembolsados.	V
Rice et al., 2019(23)/ EUA	Examinar as percepções de acesso à PrEP.	Homens que fazem uso de PrEP (n=44)	Qualitativo/ entrevistas individuais	As principais barreiras foram normas culturais e sociais que silenciam a discussão sobre sexualidade, falta de conscientização e divulgação sobre a PrEP, estigma relacionado à sexualidade, preocupações com a adequação e qualidade técnica dos serviços de PrEP. As estruturais foram longas distâncias dos serviços de saúde, conflitos de horários para consultas, custos da medicação, falta de recursos do seguro saúde, falta de conhecimento da PrEP pelos profissionais de saúde, baixo risco percebido de HIV, preocupação com efeitos colaterais.	V
Schwartz et al., 2019(24)/ EUA	Compreender melhor as experiências de HSH na adoção da PrEP.	HSH (n=38)	Qualitativo/ entrevistas individuais	Estigma sobre a PrEP proveniente dos próprios profissionais de saúde que fornecem a PrEP, estigma dos profissionais de saúde sobre a homossexualidade, estigma social sobre o uso de a PrEP estar relacionada à promiscuidade, percepção de desconforto dos profissionais de saúde em conversar sobre saúde sexual com homens gays.	V
Sun et al., 2019(25)/ EUA	Identificar barreiras e facilitadores do acesso à PrEP.	Homens gays e cisgênero (n=27)	Qualitativo	Longas distâncias para ter acesso à PrEP, residir em zona rural, dificuldade de se conectar a um profissional prescritor de PrEP, custos para comprar o medicamento e interrupções no fornecimento da PrEP nas farmácias, longas distâncias para ter acesso à PrEP, residir em zona rural, dificuldade de se conectar a um profissional prescritor de PrEP, custos para comprar o medicamento e interrupções no fornecimento da PrEP nas farmácias.	V
Wood et al., 2019(7)/ EUA	Identificar barreiras e facilitadores da adesão à PrEP ao HIV.	HSH e mulheres trans (n=31)	Método misto aninhado com um coorte prospectivo	Estigma relacionado a ser confundido com alguém de sorologia positiva para o HIV, homofobia relacionada ao HIV, estigma relacionado à cor da pele, medo de ter a sexualidade revelada para a família, inacessibilidade dos sistemas de saúde, efeitos colaterais, estressores relacionados à rotina de vida e baixa percepção de risco de HIV.	IV
Laborde et al., 2020(26)/ EUA	Interpretar as dificuldades na persistência da PrEP em um contexto de barreiras estruturais, bem como experiências clínicas, farmacêuticas e interpessoais.	Adultos usuários de PrEP (n=25) e profissionais de saúde prescritores de PrEP (n=18)	Qualitativo/ entrevistas individuais	Estigma relacionado à sexualidade, desconfiança médica, dificuldade de atender aos requisitos de acompanhamento de PrEP, como agendamento e comparecimento a consultas de rotina e exames laboratoriais, instabilidade habitacional, uso de substâncias, saúde mental, dificuldade de comunicação com os provedores. Obter recargas de farmácias foi inconveniente e alienante para alguns participantes.	V
Nieto et al., 2020(27)/ EUA	Explorar as razões para a descontinuação da PrEP.	HSH negros e latinos e mulheres trans negras e latinas (n=22)	Qualitativo/ entrevistas com roteiro semiestruturado	Menor risco percebido de HIV relacionado a mudanças no comportamento sexual, perda ou mudança do seguro saúde, longas distâncias dos serviços de saúde, dificuldade de comparecer as consultas de rotina, efeitos adversos da medicação previstos e experimentados, medo da interação da PrEP com hormônios ou da sobrecarga do organismo com muitas medicações.	V
Nieto et al., 2020(28)/ EUA	Identificar barreiras e motivadores para a adoção da PrEP.	Mulheres trans negras e latinas (n=18)	Qualitativo/ entrevistas semiestruturadas individuais	Barreiras estruturais, logísticas, linguísticas e culturais para o envolvimento médico, falta de atendimento transgênero competente e priorização da terapia hormonal sobre o uso da PrEP.
Owens et al., 2020(29)/ EUA	Levantar barreiras e facilitadores ao uso da PrEP.	HSH e que vivem na zona rural (n=34)	Quantitativo/ entrevistas semiestruturadas	Falta de disseminação rural de informações sobre a PrEP, o profissional de saúde não informar sobre a PrEP, preocupação com os efeitos colaterais e adversos da medicação, custo da adesão e envolvimento da PrEP, falta de acesso aos cuidados e qualidade do cuidado de PrEP, especialmente em ambiente rural.	IV
Camp & Saberi, 2021(30)/ EUA	Entender os facilitadores e as barreiras para o uso da PrEP por demanda e a preferências para regimes de PrEP, os desafios para uso da PrEP durante a pandemia.	HSH (n=140)	Transversal, quantitativo, com coleta de dados online	Encontros sexuais não planejados, dificuldade em lembrar a dosagem, despreparo do profissional em prestar cuidados de PrEP, a pandemia de COVID-19 (dificuldade em realizar/obter testes laboratoriais, obter recargas de PrEP, receber uma prescrição de recarga de um profissional de saúde, não conseguir obter um profissional de saúde consulta e não conseguir se comunicar com seu profissional de saúde).	V
Felsher et al., 2021(31)/ EUA	Descrever o contexto das vidas pessoas usuárias de drogas e os desafios da adesão à PrEP.	Mulheres cisgênero que usam drogas injetáveis (n=23)	Qualitativo/ entrevistas individuais com roteiro semiestruturado	Dificuldade de atender às necessidades básicas de sobrevivência decorrentes da intersecção do transtorno por uso de opioides, insegurança econômica e instabilidade habitacional, esquecimento de tomar a medicação regularmente, falta de armazenamento seguro de pílulas, perda ou roubo de pílulas, baixa autoeficácia, fatores estruturais incapacitantes (mercado de medicamentos prescritos, instituição para tratamento de drogas ou instalações carcerárias).	V
Jackson-Gibson et al., 2021(33)/ Quênia	Explorar os facilitadores e barreiras para a implementação, aceitação e persistência da PrEP.	Meninas adolescentes e mulheres jovens (n=40)	Qualitativo/ entrevistas individuais e grupos focais	Efeitos colaterais (falta de apetite, tonturas, náuseas, vômitos e dores de estômago), estigma da comunidade relacionada à PrEP, distância geográfica até a unidade de saúde, uso da PrEP associado ao aumento da promiscuidade, profissionais do sexo comerciais e pessoas infectadas pelo HIV.	V
Kadiamada-Ibarra et al., 2021(39)/ México	Identificar as barreiras e facilitadores de um programa de adesão à PrEP.	Trabalhadores do sexo masculinos (n=8)	Quali-quanti/ entrevistas individuais + grupos focais	Falta de estratégias com foco correto para alcançar os homens profissionais do sexo, estigma relacionado ao HIV, ao uso da PrEP e de populações-chave, distância geográfica das unidades que fornecem PrEP, falta de informações sobre onde conseguir a PrEP e os custos, falta de políticas públicas, limitação de fornecimento de PrEP em locais do ImPrEP e em estudos de implementação.	V
Kimani et al., 2021(34)/ Quênia	Explorar os motivos para a persistência da PrEP.	Mulheres e homens trans que fazem sexo com homens (n=53)	Estudo misto/etapa qualitativa com entrevista semiestruturada	Esquema de dosagem diária foi um incômodo. Retirada de pílulas para 90 dias, reações negativas de parceiros e serviços de saúde estigmatizantes foram consideradas barreiras.	V
Koppe et al., 2021(38)/ Alemanha	Analisar os fatores associados à interrupção da PrEP, barreiras que podem impedir as pessoas de continuar a PrEP e investigar o comportamento sexual após a interrupção da PrEP.	Adultos que usaram ou estavam em uso de PrEP (n=4.848)	Transversal, quantitativo/ coleta de dados online	As barreiras descritas são muitas vezes modificáveis. Foram referidas como barreiras mudança de parceria sexual, satisfação com outras estratégias de prevenção, menor percepção de risco de adquirir o HIV, efeitos colaterais, não querer tomar uma substância química, medo de efeitos colaterais de longo prazo. Barreiras logísticas foram dificuldades de obtenção da PrEP, dificuldade em encontrar um médico que prescreve a PrEP, encargo financeiro e a falta de cobertura de seguro de saúde.	V
Ogunbajo et al. 2021(19)/ EUA	Compreender as barreiras à adesão experimentadas para uso da PrEP.	Mulheres trans negras e hispânicas/latinas e indivíduos não binários (n=30)	Qualitativo/ entrevista individual	Preocupações com custos, problemas de saúde mental, uso de substâncias e preocupações sobre os efeitos colaterais da PrEP, incluindo interação hormonal, influência de parceiros íntimos/românticos e o impacto da comunicação paciente-profissional, estigma e opiniões negativas da comunidade relacionadas a PrEP, experiências negativas em ambientes de saúde, transporte não confiável, emprego e insegurança habitacional.	V
O’Rourke et al., 2021(35)/ Cidade do Cabo	Explorar o as vivencias de uso da PrEP, incluindo experiências de adesão e persistência ou descontinuação.	Meninas adolescentes e mulheres jovens (n=22)	Coorte prospectivo qualitativo	Desafios em tomar a pílula, oposição social ou evento traumático/inesperado. Sensação de desapontamento/fracasso em relação à incapacidade de continuar o uso da PrEP, estigma relacionado à PrEP, diminuição da motivação, questões culturais, como conflito com as tradições de um ritual de iniciação de maioridade, falta de apoio familiar.	V
Sack et al., 2021(36)/ Moçambique	Explorar as perspectivas, atitudes e experiências de parceiros sorodiscordantes do HIV que tomam PrEP.	Pessoas em relacionamentos sorodiscordantes para o HIV (n=19)	Qualitativo/ entrevistas semiestruturadas individuais	Os fatores que influenciam a adesão à PrEP foram divididos em individuais, interpessoais e organizacionais. Os fatores individuais foram amor pelo parceiro, conhecimento sobre a PrEP e a crença de que o medicamento é eficaz, e o medo do estigma do HIV e da PrEP. Os fatores interpessoais que afetam a absorção da PrEP foram desejo de proteger a família, apoio do parceiro e força de relacionamento, superando o medo do estigma para buscar apoio da família e amigos, e abordagens de adesão de gênero.	V
Stoner et al., 2021(37)/ Cidade do Cabo	Compreender os padrões de declínio da adesão à PrEP em um estudo de coorte longitudinal prospectivo.	Meninas adolescentes e mulheres jovens (n=22)	Coorte prospectivo qualitativo	Falta de apoio da família ou do parceiro, eventos traumáticos e mudanças na parceria. Diminuição da motivação, barreiras logísticas relacionadas ao serviço de saúde, dificuldade com a rotina de PrEP, esquecimento, estar ocupado, adoecer, mudar de residência, cuidar de crianças, participação em atividades culturais e dificuldade em comparecer às consultas clínicas.	IV
Willie et al., 2021(32)/ EUA	Entender os fatores multiníveis que influenciam a persistência da PrEP.	Mulheres negras cisgênero (n=8)	Qualitativo/ entrevistas individuais	Acessibilidade e os custos aos serviços de PrEP, efeitos colaterais da medicação (dor de estômago, prisão de ventre, taquicardia e enjoo matinal).	V

• ^*
  NE - Nível de evidência.

Barreiras individuais

As barreiras individuais identificadas foram relacionadas com a ingestão subótima da PrEP relacionada com a dificuldade de usar os medicamentos por via oral(²⁶-²⁷,³⁵), esquecimento de tomar o medicamento diariamente(²¹), falta de armazenamento seguro das pílulas(³¹) e não querer tomar uma substância química por longo tempo(²⁶,³⁸). Ademais, o consumo de bebidas alcoólicas e outras drogas(¹⁹,³¹), o estilo de vida e os estressores concorrentes que envolvem a necessidade de conciliar a rotina da vida pessoal e do trabalho com o uso da PrEP também interferiram diretamente na adesão(⁷,¹⁹,²¹,³⁵,³⁷).

Os efeitos adversos da medicação foram identificados como uma barreira de adesão. A maioria dos participantes que experimentaram efeitos adversos relatou uma apresentação passageira de dores de cabeça e náuseas, que se resolveram logo após alguns dias de uso da PrEP(⁷,³⁵,³⁸). Demais efeitos relatados, como falta de apetite, tonturas, vômitos e dores de estômago, foram motivo para a descontinuação e abandono da profilaxia(²⁶,³³,³⁸), principalmente quando esses efeitos envolveram níveis elevados de creatinina(²⁷-²⁸).

Preocupações sobre futuros efeitos colaterais da PrEP, toxicidade do medicamento a longo prazo(⁷,¹⁸,²³,²⁷-²⁸,³⁸) e interação hormonal entre pessoas transexuais foram referidos como motivos para descontinuar a profilaxia. Três estudos identificaram que mulheres transexuais em terapia hormonal manifestaram medo da interação da PrEP com os hormônios e medo de uma sobrecarga prejudicial dos fármacos no organismo(¹⁹,²⁷-²⁸).

A baixa percepção de vulnerabilidade ao HIV resultou no uso esporádico, adesão subótima, descontinuação da PrEP, ou uso do medicamento apenas em finais de semana ou em períodos de mudanças no comportamento sexual(⁷,²³,²⁷-²⁸,³⁵,³⁸). Ademais, o status de relacionamento que leva à crença e confiança no parceiro foi relatado como barreira para uso da PrEP em relacionamentos monogâmicos de longo prazo(¹⁸).

A presença de problemas relacionados com a saúde mental (por exemplo, depressão, ansiedade) é desafio que afeta a motivação para adesão sustentada à profilaxia, tornando-a menos prioritária(¹⁹,²²). Não obstante, o uso sustentado de substâncias psicoativas, em especial de drogas opioides, constitui-se uma barreira importante.

Em contextos de uso de drogas associado à insegurança econômica e instabilidade habitacional, atender às necessidades básicas de sobrevivência se torna prioridade que ofusca a regularidade do uso da profilaxia e, por isso, configura-se como barreira para sua adesão(¹⁹,³¹). O movimento diário de suprir as necessidades humanas básicas, como alimentação, higiene, moradia, e a busca de meios de conseguir as substâncias psicoativas foram relatados como prioritários, deixando a dedicação em usar a PrEP em um patamar distante do prioritário(³¹).

Barreiras foram descritas entre indivíduos que usaram a profilaxia conhecida como PrEP “sob demanda”, “episódica”, “baseada em eventos” ou “orientada em eventos” e foram relacionadas com encontros sexuais não planejados, resultando na falta da dose de PrEP antes da atividade sexual e dificuldade em lembrar a dosagem após a dose dupla do medicamento(³⁰).

Em contrapartida, o esquema de PrEP diária foi relatada como desafiador em alguns estudos(²⁰,³⁴), e, por isso, muitos usuários expressaram o desejo de ter formulações de ação prolongada. O reabastecimento de PrEP por 90 dias foi levantado como desanimador pelos usuários que se sentiam sobrecarregados, com a sensação de ter um longo trajeto a percorrer, o que resultou em sensação de impotência para lidar com o uso regular de todas aquelas pílulas por longo período de tempo(³⁴,³⁷).

Barreiras sociais e interpessoais

Apesar das inúmeras barreiras individuais levantadas, o uso e a continuidade da PrEP foram mais impactadas por desafios externos, tornando a descontinuidade não intencional em diversos estudos. Barreiras interpessoais incluíam a influência de parceiros íntimos/românticos na capacidade de iniciar e permanecer aderente, pois os parceiros estavam hesitantes sobre o uso da PrEP, que foi percebido como falta de confiança e lealdade dentro do relacionamento(¹⁸-¹⁹). A motivação do parceiro para o uso e persistência na PrEP foi relatada como fator primordial para a adesão, sendo que a diminuição ou desaprovação do uso da profilaxia pelos mesmos levou à descontinuidade da PrEP por muitos participantes(¹⁹,³⁵).

Em relação às barreiras sociais, o estigma foi uma barreira citada para a adesão em diferentes estudos e está descrito de múltiplas formas(⁷,¹⁸-²⁰,²³-²⁸,³¹,³³-³⁶,³⁸). Identificou-se um estigma sobre o uso da PrEP, pautado em percepções negativas da comunidade que erroneamente julgavam que a profilaxia está vinculada a comportamentos sexuais, como a promiscuidade(⁷,¹⁸-²⁰,²³-²⁸,³¹,³³-³⁶,³⁹).

O estigma relacionado ao HIV também é uma barreira proeminente ao acesso à PrEP e aos serviços de saúde(⁷,¹⁸,³³,³⁶,³⁹). O estigma foi sentido no nível individual, relacionado ao medo de conhecer seu status de HIV, que impede que os indivíduos procurem serviços preventivos, e no nível social, com a preocupação do estigma potencial que enfrentam por membros da comunidade e outros trabalhadores do sexo masculinos, se eles foram vistos recebendo serviços relacionados ao HIV(³⁹), que associam o uso da PreP com o tratamento do HIV devido à aparência e embalagem semelhantes dos comprimidos(³³).

Importante ressaltar que, além dessas pressões sociais, o medo de ter a sexualidade revelada para familiares ou na comunidade(⁷,³⁹), além do medo de ter a condição sorológica dos parceiros HIV positivo revelada(³⁶), foram barreiras relevantes elencadas por diversos usuários de PrEP.

Outro aspecto interessante diz respeito às normas sociais que silenciam a discussão sobre sexualidade e favorecem o julgamento sobre a orientação sexual como potenciais barreiras(²³). Em mais de um dos estudos realizados no continente Africano, os usuários de PrEP descontinuaram a profilaxia devido às tradições culturais(³⁵,³⁷). Nesse caso, os rituais para se tornarem um curandeiro tradicional da comunidade geraram um conflito de identidade dos usuários que optaram em descontinuar a profilaxia, por medo de interferir nos rituais de iniciação a essa atividade cultural(³⁵).

Outra barreira encontrada foi vivenciar eventos traumáticos, como o luto. Lidar com a perda física de familiares e pessoas próximas, inclusive daquelas envolvidas no apoio emocional para o uso da PrEP, foi precursor da descontinuidade da profilaxia(³⁵).

Barreiras estruturais

As barreiras estruturais, em sua maioria, foram relacionadas ao tempo de espera prolongado por uma consulta com os prescritores e dificuldades de comunicação com esses profissionais, atrasos administrativos do sistema de saúde, falta de medicamentos em algumas unidades de saúde e o custo dos medicamentos (diferente do Brasil, em alguns países, a PrEP não é gratuita), desconhecimento e/ou resistência de alguns profissionais de saúde em prescrever a PrEP, estigma da equipe de saúde e dificuldade de acesso aos serviços de saúde(⁷,¹⁸-³⁹).

A falta de educação sobre PrEP é uma grande barreira para o alcance da PrEP, particularmente entre populações altamente vulneráveis(³⁹). A desinformação dos profissionais de saúde com informações imprecisas ou limitada(²²-²³), o número insuficiente de profissionais de saúde qualificados para oferecer a PrEP(²³,²⁸-²⁹,³³,³⁸) e o estigma percebido proveniente dos próprios profissionais de saúde(⁷,²⁰-²¹,²³-²⁴) continuam sendo desafios na atual estratégia de implementação, dificultando o início, a adesão e a persistência da profilaxia.

A ausência de atendimento médico competente para pessoas transgênero(²⁸), o despreparo profissional para lidar com a diversidade de gênero, identidade sexual e comportamento sexual, bem como com o manejo clínico da PrEP(¹⁹-²⁵,²⁹-³⁰), foram levantados em diversos artigos como barreiras significativas para a PrEP. Inclusive, um dos estudos identificou que este contexto propiciou aos usuários experiências desconfortáveis e, às vezes, negativas com profissionais de saúde, que foram descritas como culturalmente insensíveis ou sem conhecimento sobre saúde de pessoas transgênero(¹⁹).

Os custos relacionados à PrEP, bem como com serviços de saúde auxiliares (ou seja, consultas médicas e testes laboratoriais), e falta de cobertura de seguro de saúde foram barreiras tanto para a aceitação quanto para a adesão(¹⁹,²³,²⁵,²⁹). Outros aspectos identificados foram a perda do seguro de saúde após a mudança para uma nova cidade ou o emprego, resultando em custos maiores para continuar com uma prescrição de PrEP(¹⁸,²⁵,²⁷-²⁸) e dificuldade de acompanhar os requisitos de acompanhamento, com consultas exames laboratoriais(²³,²⁶). Os recursos financeiros limitados nas unidades de saúde também dificultam o início e o monitoramento clínico dos efeitos colaterais. Isso incluiu incapacidade ou atrasos nos testes laboratoriais necessários, resultando em pular os testes para evitar atraso no início da PrEP(²³).

Não obstante, longas distâncias percorridas para chegar aos serviços de saúde, dificuldade para ter renovação de prescrição, para retirar medicação ou comparecer a consultas médicas de acompanhamento de rotina, além de longo período de espera para o reabastecimento das farmácias, também foram relatadas como barreiras para a PrEP em diversos artigos(¹⁸,²²-²³,²⁵,²⁷-²⁹).

Inclusive, residir em zona rural foi relatado como uma barreira significativa, não só pela longa distância dos serviços de saúde, mas também pela falta de divulgação da profilaxia entre a comunidade rural, mesmo quando essa se encontra em contato com profissionais de saúde. Isso fez com que a população soubesse da PrEP através de amigos e redes sociais, resultando na necessidade de pesquisar por si só para solicitar a prescrição aos profissionais de saúde(²⁹).

Finalmente, um dos estudos identificou o impacto da pandemia de COVID-19, o que trouxe barreiras importantes, sendo elas a dificuldade em realizar/obter testes laboratoriais, dificuldade para obter recargas de PrEP, em receber uma prescrição de recarga de um profissional de saúde, não conseguir uma consulta ou não conseguir se comunicar com o profissional de saúde(³⁰).

DISCUSSÃO

A PrEP é um avanço significativo para a prevenção do HIV, entretanto, nesta revisão, identificaram-se barreiras e dificuldades multifacetadas para o seu uso, adesão e continuidade.

Observam-se ainda muitas lacunas na identificação dessas barreiras entre populações de diferentes regiões, pois a maioria dos estudos foram realizados nos EUA(⁷,¹⁸-³²) e em países do continente Africano(³³-³⁷). Não se observou nenhum estudo com população de países latino-americanos, como o Brasil, no qual existem desigualdades e iniquidades sociais que podem se constituir fortes barreiras para o uso da PrEP.

Da mesma forma, destaca-se a necessidade de ampliar os estudos com foco em outras populações, visto que a maioria foi conduzida entre HSH(²⁰,²⁴,²⁹-³⁰,³⁴) e a população transgênero(⁷,¹⁹,²⁷,²⁸,³⁴). Esses achados podem estar relacionados com o fato de que a implementação da PrEP tem sido destinada especialmente a populações-chave. Entretanto, outros grupos populacionais que se encontram em risco de infecção por HIV, tais como meninas adolescentes, mulheres jovens, pessoas trabalhadoras do sexo, que fazem uso de drogas injetáveis e privados de liberdade, devem ser compreendidos sob uma perspectiva mais ampla que transcende apenas o grupo populacional dos HSH. A importância de cada uma dessas populações varia nas regiões de determinados países(³). Ademais, entre HSH, há grupos socialmente ainda mais marginalizados, como os HSH negros, que são desproporcionalmente acometidos pelo HIV e logo são considerados prioritários para a PrEP.

Nossos achados ilustram que o uso dessa medida preventiva é permeado por múltiplas barreiras. Todos os estudos identificaram que os usuários da PrEP experimentaram mais de uma barreira para o seu uso(⁷,¹⁸-³⁹), e esse dado é preocupante, uma vez que a eficácia está diretamente relacionada à adesão.

Muitas barreiras são modificáveis para uma mesma pessoa ao longo do tempo. O estudo de Koppe et al.(³⁸) mostrou que os usuários de PrEP de curto prazo eram mais propensos a interromper a profilaxia devido a preocupações com efeitos colaterais de longo prazo e por não querer tomar uma substância química. Em contraste, os usuários de longo prazo indicaram com mais frequência que sua situação de parceiro havia mudado, sendo esse o principal motivo de descontinuar.

Esse dinamismo é esperado, por se tratar de uma estratégia de prevenção que está diretamente relacionada com o comportamento sexual, o que pode assumir diversas nuances, e todo esse dinamismo influencia diretamente na adoção de medidas preventivas(⁴⁰). Entretanto, é de suma importância dar condições para garantir acesso digno e atendimento qualificado de prevenção à população, respeitando seus singulares momentos e contextos de vida. Dessa forma, compreender as barreiras envolvidas nesse movimento de prevenção é primordial para delinear estratégias eficazes de atenção à saúde de pessoas que buscam a PrEP.

A PrEP é uma estratégia preventiva utilizada por pessoas soronegativas ao HIV, e não para fins de tratamento, por isso, pode haver desafios únicos para motivar a adesão, inclusive a inconveniência de tomar a pílula diariamente, o que pode ser considerada uma das barreiras para seu uso(²⁰-³⁴). Além disso, muitas pessoas têm dificuldade de ingerir medicamentos, e aspectos relacionados com o sabor, cheiro e tamanho do comprimido também podem influenciar no uso da profilaxia(⁷,²⁶-²⁸,³⁵).

Estratégias alternativas de dosagem, como a PrEP sob demanda, podem ser mais aceitáveis e gerenciáveis para pessoas com dificuldade de aderir ao esquema de doses diárias(⁴¹). A formulação de antirretrovirais injetáveis, implantes subcutâneos de longa duração e anéis vaginais de liberação prolongada também estão sendo estudados para minimizar os efeitos da não adesão, e representam opções alternativas promissoras aos medicamentos orais(⁴²). Isso é importante, pois a adesão a estratégias preventivas está diretamente ligada à adequação e conveniência da mesma sobre o contexto e a preferência de quem a consome(⁴³).

Ademais, a PrEP sob demanda pode ter especial relevância para aqueles que têm atividade sexual pouco frequente, enquanto regimes diários podem se encaixar bem para aqueles cujos eventos sexuais são frequentes. No entanto, a complexidade nas instruções para seguir regimes não diários pode exigir atenção adicional, de forma que ferramentas e suportes específicos são necessários para apoiar o seu uso contínuo(⁴³).

Diversos estudos desta revisão identificaram que o estilo de vida pode ser uma barreira para o uso da PrEP(⁷,¹⁹,²¹,³⁵,³⁷). Estressores, como mudanças no cotidiano, viagens duradouras, estar longe de casa(¹⁸,²⁵,²⁷-²⁸) e carga horária de trabalho exaustiva, estiveram associadas com o esquecimento/dificuldade em se lembrar de tomar pílulas, além de comparecer às consultas de rotina(⁷,¹⁹,²¹,³⁵,³⁷).

Assim, estratégias pessoais eficazes que ajudam na ingestão de medicamentos, tais como o uso de despertador do telefone, bilhetes, caixa organizadora de comprimidos, devem ser aconselhadas pela equipe de saúde e podem facilitar o uso dos medicamentos(⁴⁴). Ainda, há a necessidade de auxílio para que o usuário organize sua rotina, de forma a preservar o uso da profilaxia, mesmo quando houver a necessidade de viagens ou mudanças na rotina. No Brasil, a PrEP é disponibilizada pelo SUS, o que permite que as pessoas continuem tendo acesso a atendimento gratuito e dispensa de medicamentos, mesmo em situações de viagens ou mudança de cidade/estado, ainda que dentro do território nacional(⁴⁵).

Diversos estudos desta revisão identificaram que os custos relacionados com a medicação foram barreiras para continuar o uso da PrEP(¹⁹,²³,²⁵,²⁸-²⁹). Por isso, é importante frisar que a instituição da PrEP enquanto política pública no Brasil contribui na mitigação de potenciais barreiras relacionadas ao seu uso. Entretanto, é necessário identificar e superar diversas outras barreiras que permeiam o continuum do cuidado relacionado à PrEP.

A crença sobre os efeitos adversos e colaterais(⁷,¹⁷,²³,²⁷-²⁸,³⁵,³⁸), bem como vivenciá-los(⁷,²⁶,³³,³⁵,³⁸), foram importantes barreira para o uso e adesão à medicação. Para algumas pessoas, os efeitos adversos melhoraram com o tempo de uso(⁷,³⁵,³⁸), entretanto, para outras, foram o suficiente para descontinuar a profilaxia(²⁶,³³,³⁸).

De fato, a literatura descreve a presença de sintomas, como náusea, flatulência, diarreia, cefaleia e dor abdominal, que tendem a atingir o pico de frequência no primeiro mês após o início e costuma se resolver em três meses, chamada de “síndrome de start-up”, que acomete a minoria das pessoas em uso de PrEP(⁴⁶). Acontece que a tolerância do desconforto é diferente para cada indivíduo. Por isso, a equipe de saúde deve orientar que em geral os efeitos adversos tendem a diminuir com o uso regular dentro do primeiro mês de uso(⁴⁴) e implementar estratégias para o gerenciamento desses efeitos com a finalidade de auxiliar no enfrentamento sem desistir da terapêutica.

Além disso, a preocupação com a segurança terapêutica, o medo de possíveis efeitos coletareis em longo prazo (por exemplo, danos hepáticos)(⁷,¹⁸,²³,²⁷-²⁸,³⁸), bem como interações entre a PrEP e outros medicamentos, inclusive os que estão envolvidos em terapia hormonal(¹⁹,²⁷-²⁸), foram levantados como barreiras para o uso contínuo da PrEP.

O uso sustentado de substâncias psicoativas, em especial de drogas opioides, constitui uma barreira importante para o uso da PrEP. Em contextos de uso de drogas associado à insegurança econômica e instabilidade habitacional, atender às necessidades básicas de sobrevivência se torna prioridade que ofusca a regularidade do uso da PrEP, e, por isso, configuram-se como barreiras para o seu uso e adesão(¹⁹,³¹). Além disso, existe também o receio de interação da medicação com o álcool e as substâncias psicoativas(⁷,¹⁹). Apesar das inúmeras barreiras individuais levantadas, o uso e a continuidade da PrEP foram mais impactadas por desafios externos, tornando a descontinuidade da PrEP não intencional em diversos estudos(⁷,¹⁸,²⁴,²⁶,³³,³⁵-³⁶,³⁹). O contexto social pode constituir uma barreira para o uso da profilaxia. Intrigantemente, vivenciar eventos traumáticos pareceu assumir destaque no que se refere ao uso da PrEP. Vivenciar ações de violência e estupro motivou mulheres a buscarem e aderirem à profilaxia, o que foi apoiado por familiares e pessoas do reduto social. Entretanto, ao vivenciar o falecimento de familiares, culminou-se na diminuição na motivação do uso da PrEP, resultando na descontinuidade da mesma(³⁵).

Nesta revisão, quase metade dos estudos identificou algum tipo de estigma relacionado ao uso da PrEP como uma barreira para o seu uso, sendo mais da metade deles referente ao estigma sobre o HIV(⁷,¹⁸-¹⁹,²³-²⁴,²⁶,³³-³⁵,³⁹). Os casais sorodiscordantes para o HIV relataram medo constante de ter a sorologia de seus parceiros revelada na família ou na comunidade(³⁶). Além disso, o medo de que as pessoas em uso de PrEP sejam vistas como soropositivas ao HIV está centrado no próprio estigma do vírus(¹⁸,⁴³). A história da infecção pelo HIV e principalmente da AIDS foi marcada por uma construção social pautada na discriminação e estigma(⁴⁷-⁴⁸) que persistem até os dias atuais. Apesar de os usuários de PrEP serem soronegativos para o HIV, eles estão inseridos em um emaranhado de tensões relacionados ao vírus e, por isso, muitas vezes, experimentam situações semelhantes (como o estigma percebido) às das pessoas que vivem com o HIV.

Não obstante, o estigma associado à promiscuidade tem sido descrito por usuários da PrEP. A profilaxia tem sido percebida como uma medida de prevenção do HIV para indivíduos que desejam ter sexo sem o uso de preservativos, por exemplo, ou com múltiplos parceiros(as). Assim, alguns estudos referiram que a identidade social como usuário da PrEP é frequentemente associada a percepções negativas de que desejar sexo sem preservativo pode ser considerado promiscuidade(⁷,¹⁸-²⁰,²³-²⁸,³¹,³³-³⁷).

Combater o estigma social, promover, respeitar e proteger os direitos humanos é fundamental para o desenvolvimento humano e o fim da AIDS como uma ameaça à saúde pública. Dessa forma, o sucesso da implementação da PrEP como resposta para o enfrentamento do HIV deve usar abordagens baseadas em direitos e combate ao estigma generalizado e arraigado, à discriminação e a outras violações dos direitos humanos enfrentadas por pessoas que vivem com HIV, bem como por grupos populacionais que estão em maior risco de infecção(³,⁴⁹). Entretanto, a construção dos critérios de elegibilidade para o uso da profilaxia, especificamente sobre as identidades de gênero e preferências sexuais que se diferem da hegemonia heteronormativa, tem reforçado o estigma existente sobre alguns grupos populacionais e sobre a infecção do HIV(⁴⁹), alimentando crenças e percepções preconceituosas de que pessoas dentro dos padrões hetoronormativos estão distantes ou isentos do risco de adquirir o HIV e, por isso, não se enquadram nos critérios para a PrEP.

Nos EUA, um estudo identificou que as pessoas expressam menor apoio a políticas de financiamento e programas que possibilitam o acesso à PrEP para grupos estigmatizados (populações chave), em comparação com a população em geral(⁴⁹). Os autores reforçam que campanhas públicas de PrEP que visam especificamente às populações-chave correm o risco de perpetuar os estereótipos existentes de promiscuidade associados a esses grupos(⁴⁹).

Campanhas de divulgação e apoio à PrEP com mensagens que abrangem a população em geral, evitando nomear explicitamente grupos de alto risco, ajudam a evitar crenças preconceituosas(⁴⁹). É imprescindível que, em programas de PrEP, profissionais de saúde entendam como os usuários são percebidos dentro da comunidade e como essas percepções podem impedir a adoção de estratégias e suas consequências pessoais para o uso da PrEP.

Para as barreiras estruturais, as barreiras dos sistemas de saúde se concentram principalmente em questões de acessibilidade aos serviços clínicos ou de farmácia, devido ao seguro, transporte ou dificuldade de navegação em sistemas de saúde complexos(⁷,²⁰,²³,²⁵,²⁹,³²-³³,³⁹). Os fatores logísticos relacionados aos serviços de saúde(⁷,¹⁹-²⁰,²²-²⁴,²⁶-³⁰,³⁴,³⁷-³⁸) e aos seus profissionais(¹⁹-²⁵,²⁹-³⁰), levantados como barreiras para o uso da PrEP nesta revisão, suscitam um paradoxo da implementação da PrEP nos serviços de saúde. O despreparo estrutural (considerando aqui o despreparo profissional) dos serviços frente à demanda dessa estratégia se configura contramão de seu caráter inovador.

A qualidade dos serviços assistenciais influencia diretamente na captação e adesão à PrEP(²³,²⁹). Atendimentos hostis com resistência de prescrição da profilaxia(²⁰-²¹,³⁰), bem como a dificuldade de comunicação com a equipe, períodos prolongados de espera por consultas(¹⁹,²⁶,³⁰), foram identificados nesta revisão e evidenciam o despreparo profissional e institucional para esta nova estratégia preventiva.

O despreparo profissional cerne não apenas o manejo sobre a profilaxia, mas também o atendimento às pessoas transexuais(¹⁹-²⁵,²⁹-³⁰). Esse despreparo profissional e institucional pode estar relacionado com as normas da comunidade local e da convicção moral de seus profissionais de saúde sobre a sexualidade(²³). Pode haver uma transferência de responsabilidade na escolha das estratégias pelos profissionais de saúde influenciados pelo biopoder, reduzindo a autonomia das pessoas em optarem pela medida preventiva mais confortável para o seu contexto.

Além disso, o estigma e as discriminações de cunho sexual influenciam no acesso aos serviços de saúde. As desigualdades de gênero e a incriminação sobre o trabalho sexual impedem, na maioria das vezes, a população de HSH, travestis e transsexuais de buscarem a PrEP nos serviços de saúde. Garantir acesso para essas pessoas possibilitaria melhores autoavaliações de saúde, além da redução na transmissão do HIV. A escassez de profissionais na propagação dessa medida, sobrecarga de trabalho e ausência de capacitação da equipe no atendimento e incentivo a grupos específicos demonstraram importância no que se refere ao acesso à PrEP por parte dos usuários(⁷,¹⁹,²⁷-²⁸,³⁴).

Ademais, a PrEP tem sido recomendada e prescrita, majoritariamente, por profissionais de saúde que atuam na área de infectologia, inclusive envolvidos nos cuidados de pessoas que vivem com o HIV. Entretanto, é destinada a pessoas soronegativas para o vírus, configurando um “paradoxo de alcance” da profilaxia. Por isso, oferecer a PrEP em serviços não especializados à população que vive com o HIV pode oportunizar o alcance desta estratégia(²³,³²) e, consequentemente, diminuir algumas barreiras estruturais para o seu uso.

Estratégias específicas que aproximem a PrEP da população como um todo são importantes. Ao serem realizadas de forma dinâmica, como oficinas, atividades grupais, entre outras, a troca de saberes é estimulada. Dessa forma, acredita-se que profissionais de saúde devem realizar seus aconselhamentos sem preconceitos sobre sexualidade e/ou comportamento sexual. Ações educativas planejadas de acordo com o contexto dos indivíduos são totalmente possíveis e pertinentes no que se refere à prevenção de infecções sexualmente transmissíveis(²³).

Além disso, testes simplificados, pedidos permanentes para laboratórios, prescrições de PrEP válidas por até 90 dias, provisão proativa de apoio e aconselhamento para adesão à medicação também são estratégias plausíveis para começar a superar algumas barreiras estruturais(²⁶).

Durante as consultas, a adesão deve ser abordada largamente de forma simples e clara. Avaliar a ingestão dos medicamentos, reforçar que a efetividade está intimamente ligada à adesão, associar a tomada com eventos rotineiros diários, evitando esquecimentos(³¹,³⁷), observar os dados da farmácia referente à dispensação dos medicamentos e avaliar os manejos adversos são condutas que diminuem as barreiras(⁴⁹).

Permitir que profissionais de diversas especialidades passem a ofertar e prescrever PrEP, além da adoção de novas estratégias que incentivam a adesão, requer esforços a nível institucional e governamental. A formação permanente e treinamento adequado dos profissionais de saúde sobre PrEP(³⁸,⁴⁹) é crucial para garantir o sucesso da implementação de programas de prevenção do HIV.

Limitações do estudo

Os resultados desta revisão devem ser interpretados à luz de suas limitações. A maioria dos estudos foram realizados com HSH nos EUA e, por isso, as barreiras identificadas nesta revisão podem não ser aplicáveis para outros países, devido às diferenças na cultura, crença e sistemas de saúde. Ademais, outra limitação diz respeito às quatro bases utilizadas na estratégia de busca, o que pode ter influenciado os resultados. Entretanto, isso não invalida os nossos achados, uma vez que nossa busca contemplou bases de dados multidisciplinares, reconhecidas e utilizadas mundialmente. Não obstante, para a condução deste estudo, buscou-se realizar uma sistemática e rigorosa abordagem dos processos de uma revisão integrativa, particularmente da análise de dados, o que implica a diminuição de vieses e erros.

Contribuições para as áreas de enfermagem, saúde e políticas públicas

Os achados desta revisão fornecem evidências a respeito das barreiras para o uso da PrEP, contribuindo para a discussão sobre as estratégias de prevenção e combate à epidemia do HIV/AIDS. Levantar informações sobre as barreiras e potencialidades para o sucesso do uso da PrEP contribui para a formulação de políticas públicas como suporte para implementação de estratégias preventivas em locais com situação epidemiológica de altos índices de casos do HIV/AIDS, para a elaboração de atividades de capacitação profissional, bem como para a elaboração de protocolos assistenciais em unidades que implementaram a PrEP.

CONCLUSÕES

Os achados desta revisão evidenciam que usuários da PrEP vivenciam barreiras e dificuldades multifacetadas para uso e continuidade da profilaxia. Essas barreiras abrangem, desde aspectos individuais, como hábitos de vida e medo da segurança farmacológica da profilaxia, aspectos sociais, como o estigma relacionado ao HIV e à promiscuidade, até aspectos estruturais, como falhas e dificuldades relacionadas aos serviços de saúde.

Apesar das diversas barreiras individuais, o uso e a continuidade da PrEP são mais impactados por desafios externos que fogem ao controle do individuo, sendo elas barreiras sociais e especialmente estruturais que tornam a descontinuidade da profilaxia não intencional.

Superar essas barreiras exige uma variedade de abordagens para contemplar todas essas instâncias. Esforços institucionais e governamentais que apostam na educação permanente e capacitação profissional dos prestadores de cuidados são primordiais para superar as barreiras estruturais para o uso da profilaxia. Além disso, é necessário compreender e responder às barreiras ao uso da PrEP entre os usuários e membros de suas redes sociais.

• EDITOR CHEFE: Álvaro Sousa
• EDITOR ASSOCIADO: Luís Carlos Lopes-Júnior

• FOMENTO
  Os pesquisadores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa pelo auxilio recebido para o desenvolvimento do estudo. Programas Regulares / Auxílios a Pesquisa nº 2021/08247-1.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  26 Jun 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  17 Mar 2021
• Aceito
  07 Out 2022