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Prevalência dos fatores de risco para hemorragia pós-parto primária em um hospital universitário

RESUMO

Objetivos:

identificar os fatores de risco associados à hemorragia pós-parto primária em um hospital universitário.

Métodos:

estudo transversal realizado com 277 puérperas que receberam assistência durante o parto ou cesárea no período de junho a agosto de 2020. Os dados foram coletados por meio de um questionário previamente estruturado, aplicado após 24 horas do nascimento. Para a análise dos fatores associados à hemorragia pós-parto, utilizou-se a Regressão de Poisson.

Resultados:

a hemorragia pós-parto foi observada em 30% da amostra do estudo. O Índice de Choque e a distensão uterina foram estatisticamente associados à hemorragia pós-parto. Puérperas com Índice de Choque ≥ 0,9 apresentam uma prevalência 61% maior de hemorragia pós-parto (RP=1,61; IC 95%: 1,07 - 2,43) e com distensão uterina 134% (RP=2,34; IC 95%: 1,63 - 3,36).

Conclusões:

o reconhecimento desses fatores subsidia melhorias na prática clínica, visto que possibilitam a previsão de sua ocorrência e alertam para o manejo adequado, prevenindo desfechos indesejáveis.

Descritores:
Hemorragia Pós-Parto; Período Pós-Parto; Fatores de Risco; Prevalência; Saúde Materna

ABSTRACT

Objectives:

to identify the risk factors associated with primary postpartum hemorrhage in a university hospital.

Methods:

a cross-sectional study was conducted with 277 postpartum women who received care during childbirth or cesarean section between June and August 2020. Data were collected using a pre-structured questionnaire administered 24 hours after delivery. Poisson Regression was employed to analyze the factors associated with postpartum hemorrhage.

Results:

postpartum hemorrhage was observed in 30% of the study sample. Shock Index and uterine distension were found to be statistically associated with postpartum hemorrhage. Postpartum women with a Shock Index ≥ 0.9 had a 61% higher prevalence of postpartum hemorrhage (PR=1.61, 95% CI: 1.07 - 2.43), while those with uterine distension had a 134% higher prevalence (PR=2.34, 95% CI: 1.63 - 3.36).

Conclusions:

recognizing these factors contributes to improvements in clinical practice, as they enable the prediction of their occurrence and call for appropriate management, thereby preventing unfavorable outcomes.

Descriptors:
Postpartum Hemorrhage; Postpartum Period; Risk Factors; Prevalence; Maternal Health

RESUMEN

Objetivos:

identificar los factores de riesgo asociados con la hemorragia posparto primaria en un hospital universitario.

Métodos:

se realizó un estudio transversal con 277 mujeres posparto que recibieron atención durante el parto o la cesárea entre junio y agosto de 2020. Los datos se recopilaron mediante un cuestionario preestructurado administrado 24 horas después del parto. Se empleó una Regresión de Poisson para analizar los factores asociados con la hemorragia posparto.

Resultados:

se observó hemorragia posparto en el 30% de la muestra del estudio. El índice de choque y la distensión uterina se encontraron estadísticamente asociados con la hemorragia posparto. Las mujeres posparto con un índice de choque ≥ 0,9 tenían una prevalencia de hemorragia posparto un 61% mayor (PR=1,61, IC del 95%: 1,07 - 2,43), mientras que aquellas con distensión uterina tenían una prevalencia un 134% mayor (PR=2,34, IC del 95%: 1,63 - 3,36).

Conclusiones:

reconocer estos factores contribuye a mejoras en la práctica clínica, ya que permiten predecir su ocurrencia y requieren una gestión adecuada, previniendo así resultados desfavorables.

Descriptores:
Hemorragia Posparto; Periodo Posparto; Factores de Riesgo; Prevalencia; Salud Materna

INTRODUÇÃO

A Hemorragia Pós-Parto (HPP) é uma emergência obstétrica apontada como uma das principais causas de morte materna em países de baixa renda e a principal causa de quase um quarto de todas as mortes maternas no nível global(11 World Health Organization (WHO). Recommendations for the prevention of postpartum haemorrhage [Internet]. Geneva: WHO; 2012 [cited 2022 Mar 28]. Available from: https://www.who.int/reproductivehealth/publications/maternal_perinatal_health/9789241548502/en/.
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). Dessa forma, uma das metas brasileiras dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável é, até o ano de 2030, reduzir a mortalidade materna global para no máximo 30 mortes por 100 mil nascidos vivos(22 Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Metas Nacionais dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): Agenda 2030 [Internet]. Brasília, DF: IPEA, 2018 [cited 2021 May 21]. p. 77-81. Avalaible from: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/180801_ods_metas_nac_dos_obj_de_desenv_susten_propos_de_adequa.pdf
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).

A HPP é definida pela perda sanguínea de 500 ml ou mais em partos vaginais e de 1000 ml ou mais em cesáreas nas primeiras 24 horas após o parto, ou qualquer perda sanguínea pelo trato genital que possa causar instabilidade hemodinâmica. É considerada maciça quando o volume do sangramento for maior que 2000 ml nas primeiras 24 horas após o parto, quando há necessidade de transfusão mínima de 1200 ml de concentrado de hemácias ou quando resulta na queda de hemoglobina ≥ 4g/dl ou em distúrbio de coagulação(33 Bonomi IBA, Cunha SM, Triqueiro MC, Lobato ACL, Tavares RP. Prevenção e manejo da hemorragia pós-parto. Rev Med (Minas Gerais) [Internet]. 2012[cited 2022 Mar 28];22(2):70-7. https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/biblio-910093
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-44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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).

A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) classifica a HPP como primária quando o sangramento acontece nas primeiras 24 horas após o parto e como secundária quando ocorre após as 24 horas e até seis semanas após o parto(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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). A maioria dos óbitos por HPP ocorre durante as primeiras 24 horas após o parto, o que pode ser evitado por meio da administração de uterotônicos profiláticos durante a terceira fase do parto e da assistência adequada em tempo hábil(11 World Health Organization (WHO). Recommendations for the prevention of postpartum haemorrhage [Internet]. Geneva: WHO; 2012 [cited 2022 Mar 28]. Available from: https://www.who.int/reproductivehealth/publications/maternal_perinatal_health/9789241548502/en/.
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).

Evidências sugerem que embora a maioria dos partos no Brasil aconteça em instituições de saúde que possuem tecnologia para atendimento aos casos de HPP, bem como políticas públicas de assistência à puérpera, o país tem um longo caminho para reverter os casos de morte materna por HPP, evidenciando a necessidade de aprimoramento dos protocolos de manejo do agravo, bem como ações que garantam o bem-estar materno no período pós-parto(55 Costa SAL, Marques LF, Rezende BES, Oliveira BMM, Parreiras BH, Belineli BF, et al. Maternal Mortality from Hemorrhage in Brazil. Braz J Health Rev. 2021;4(2):4333-42. https://doi.org/10.34119/bjhrv4n2-029.
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).

Quando são analisados os casos de óbito materno por HPP a nível global, observam-se lacunas no acesso das usuárias aos serviços de saúde de qualidade, nas intervenções obstétricas da hemorragia e nos problemas organizacionais e de estrutura dos locais de serviço de atenção à saúde. Todas essas situações, isoladamente ou associadas, contribuem com um atraso na assistência adequada do sangramento puerperal. Em contrapartida, a atuação de profissionais capacitados na assistência às emergências obstétricas, o diagnóstico precoce, a prevenção e o tratamento da HPP são fundamentais para a redução da morbimortalidade materna(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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).

O objetivo principal na hemorragia puerperal é garantir que o sangramento esteja controlado e que a paciente se recupere do choque em até 60 minutos após o diagnóstico - a chamada “Hora de Ouro”, em que a sobrevida é inversamente proporcional ao tempo que a paciente leva para se recuperar do quadro(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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).

Embora haja discussões sobre o diagnóstico e tratamento da HPP, ainda são poucos os estudos que abordam os fatores de risco para HPP no contexto brasileiro. Dentre os fatores reconhecidos, podem-se citar: pré-eclâmpsia, histórico prévio de hemorragia em partos anteriores, gestações múltiplas, cicatriz de cesárea anterior, multiparidade, terceiro estágio prolongado do trabalho de parto, episiotomias, parto operatório e macrossomia fetal(33 Bonomi IBA, Cunha SM, Triqueiro MC, Lobato ACL, Tavares RP. Prevenção e manejo da hemorragia pós-parto. Rev Med (Minas Gerais) [Internet]. 2012[cited 2022 Mar 28];22(2):70-7. https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/biblio-910093
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). A ocorrência desses fatores pode desencadear uma cascata de eventos que resultam em mortalidade materna, sendo que a análise desse indicador nos anos de 1997 a 2009 demonstrou mais de 22 mil mortes, sendo 14,2% relacionadas à hemorragia(55 Costa SAL, Marques LF, Rezende BES, Oliveira BMM, Parreiras BH, Belineli BF, et al. Maternal Mortality from Hemorrhage in Brazil. Braz J Health Rev. 2021;4(2):4333-42. https://doi.org/10.34119/bjhrv4n2-029.
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).

Mesmo com recomendações internacionais atualizadas, as taxas de HPP continuam elevadas e esta é a principal causa de morte materna no mundo(11 World Health Organization (WHO). Recommendations for the prevention of postpartum haemorrhage [Internet]. Geneva: WHO; 2012 [cited 2022 Mar 28]. Available from: https://www.who.int/reproductivehealth/publications/maternal_perinatal_health/9789241548502/en/.
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). Assim, pesquisas que abordem os fatores associados à HPP continuam sendo relevantes, uma vez que elas podem apresentar novas perspectivas e serem aprofundadas, especialmente em instituições de referência para o atendimento gravídico-puerperal de risco.

Considerando a importância da identificação precoce das puérperas com risco de HPP e o fato de que a qualificação da assistência pode contribuir para a redução da mortalidade materna, justifica-se o desenvolvimento deste estudo, uma vez que a HPP é indicada em um estudo recente como uma das principais causas de morbidade materna aguda grave(66 Kristufkova A, Borovsky M, Danis J, Dugatova M, Levayova B, Korbel M. Analyses of severe acute maternal morbidity in Slovakia during years 2012-2016. Bratislava Med J. 2019;120(9):690-94. https://doi.org/10.4149/BLL_2019_116
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).

Os achados deste estudo poderão subsidiar a proposição de readequação e melhorias nas condutas assistenciais voltadas para as práticas de prevenção da HPP, além de auxiliar na identificação das puérperas com maior risco de desenvolver essa complicação.

OBJETIVOS

Identificar os fatores de risco associados à hemorragia pós-parto primária em um hospital universitário.

MÉTODO

Aspectos éticos

O presente projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisado Hospital de Clínicas de Porto Alegre (CEP-HCPA). O desenvolvimento desta pesquisa seguiu todas as normas e diretrizes éticas, conforme estabelece a Resolução do Conselho Nacional de Saúde n° 466/12 sobre pesquisa com seres humanos.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo quantitativo, analítico, do tipo transversal, norteado segundo as recomendações do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE). Os dados foram coletados entre o período de 20 de junho de 2020 e estendeu-se até 25 de agosto de 2020. A coleta foi realizada a partir de prontuários provenientes da Unidade de Centro Obstétrico (UCO) e Unidade de Internação Obstétrica (UIO) de um hospital universitário do sul do Brasil.

Amostra; critérios de inclusão e exclusão

Para a realização do cálculo amostral da presente pesquisa, foi estimada uma prevalência de 16% de HPP, tendo como referência um estudo anterior que estimou a prevalência dessa complicação. Considerando uma margem de erro de 5 pontos percentuais e um nível de confiança de 95%, chegou-se ao tamanho mínimo da amostra de 277 pacientes. O programa estatístico WINPEPI versão 11.65 foi utilizado para realizar o cálculo amostral.

A seleção da amostra foi feita por conveniência. Foram selecionados os prontuários que atendiam aos critérios de inclusão e exclusão estabelecidos. Foram incluídos no estudo os prontuários de puérperas internadas na UIO (Unidade de Internação Obstétrica) e UCO (Unidade de Cuidados Obstétricos), independentemente da idade gestacional e via de parto, com pelo menos 24 horas de pós-parto, e que contivessem todas as informações necessárias para o preenchimento do instrumento de coleta de dados.

Foram excluídas as pacientes que estiveram internadas por prestadora de saúde privada (convênio) ou por custeio próprio (particular).

Protocolo do estudo

O desfecho estudado foi o diagnóstico de HPP, definido em conjunto com os registros de sangramento aumentado e/ou registros de condutas assistenciais para o controle da HPP, com base no protocolo assistencial da instituição.

As variáveis independentes englobaram dados sociodemográficos, histórico obstétrico, dados obstétricos atuais, informações sobre o parto e nascimento, e fatores de risco para HPP anteparto e intraparto.

O instrumento de coleta foi criado pela pesquisadora e estruturado com base nas variáveis do estudo. Para verificar a adequabilidade do instrumento de coleta de dados, foi realizado um estudo piloto, com a aplicação do instrumento em 10 prontuários.

O acesso ao sistema de informações foi realizado de forma remota, após liberação da instituição, devido ao período de pandemia causado pela Covid-19. Após o acesso aos prontuários, os dados de interesse para a pesquisa eram captados e inseridos no instrumento criado para esse fim.

Análise dos resultados e estatística

Os dados obtidos foram organizados em um banco de dados. A análise foi realizada utilizando o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 21.0. As variáveis quantitativas foram descritas por média e desvio padrão, e as variáveis categóricas, por frequências absolutas e relativas.

Em relação à estatística analítica, para a comparação de proporções entre os grupos, foram utilizados os testes qui-quadrado de Pearson ou exato de Fisher. Para controlar fatores de confusão, foi aplicado o modelo multivariado de Regressão de Poisson. Todas as variáveis que apresentaram um valor p<0,20 na análise bivariada foram inseridas no modelo multivariado. O nível de significância adotado foi de 5% (p≤0,05).

RESULTADOS

Das 277 participantes do estudo, a maioria estava na faixa etária de 24 a 34 anos, eram brancas e tinham ensino médio completo. Considerando o desfecho em estudo, 30% (n=83) das puérperas tiveram HPP primária, com base no registro da conduta e análise do registro. Na Tabela 1, são apresentadas as variáveis condizentes com a caracterização das puérperas estudadas.

Tabela 1
Análise bivariada sobre as características das puérperas na amostra total (N=277) e conforme Hemorragia Pós-Parto, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2020

Dentre as 176 participantes multíparas do estudo, 45 apresentaram alguma complicação em gestações prévias, o que corresponde a 33,3% (n=15) com pré-eclâmpsia, 17,7% (n=8) com HPP e 15,5% (n=7) submetidas à curetagem.

A Tabela 2 apresenta a análise bivariada para demonstrar as variáveis relacionadas à ocorrência de HPP. O parto vaginal (p=0,047), o uso de soro intravenoso (IV) com ocitocina no pós-parto (p<0,001), o Índice de Choque (IC) ≥ 0,9 (p=0,028) e a curetagem (p=0,046) mostraram associação significativa com o desfecho.

Tabela 2
Análise bivariada para a gestação atual e parto conforme a ocorrência de Hemorragia Pós-Parto, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2020

A ocitocina no pós-parto imediato é um fármaco utilizado para prevenção da HPP. Das 277 puérperas, 235 receberam ocitocina IV e, dentre essas, 82 apresentaram HPP. Das que tiveram parto vaginal, cinco passaram por retenção placentária e curetagem. O uso de ocitocina intramuscular ocorreu em 164 (59,2%) das participantes, sendo que 182 (65,7%) delas possuíam prescrição deste fármaco após o parto. Considerando as puérperas com diagnóstico de HPP (n=83), identificou-se que 66,3% destas fizeram uso de ocitocina IM e também de soro com ocitocina IV no pós-parto.

No que se refere às complicações presentes na gestação atual, das 277 participantes do estudo, constatou-se: infecção do trato urinário em 20,9%; diabetes mellitus em 18,8%; exame de Strepto B positivo em 10,5%; e elevação nos níveis pressóricos em 10,1%. Não houve associação estatisticamente significativa entre os tipos de complicações na gestação atual e a ocorrência de HPP.

Com relação aos fatores de risco para a ocorrência da HPP, houve associação significativa entre a distensão uterina e a elevação dos níveis pressóricos durante a gestação, conforme demonstrado na Tabela 3.

Tabela 3
Análise bivariada sobre fatores de risco anteparto e intraparto para Hemorragia Pós-Parto, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2020

Das 277 participantes da amostra, 29 não apresentaram registro de estratificação de risco para HPP. Das restantes, 248 tiveram a estratificação de risco para HPP no momento da internação, sendo que 54,4% (n=135) foram classificadas como verde, ou seja, apresentavam baixo risco para o desenvolvimento da HPP, 44,4% (n=110) como amarelo, médio risco, e 1,2% (n=3) como vermelho, alto risco para o desenvolvimento da HPP. Considerando as puérperas que tiveram HPP, 48,2% foram estratificadas como verde, 38,6% como amarelo e não houve estratificação em 13,3% dos casos. A estratificação de risco não esteve associada estatisticamente à ocorrência de HPP.

Quanto à ocorrência de sangramento, observou-se que este estava aumentado em 23,1% (n=64) das participantes, sendo que duas (0,7%) precisaram de transfusão sanguínea. A diminuição do tônus muscular foi observada em 11,9% (n=33).

No que se refere às condutas utilizadas no manejo da HPP, a administração de ocitocina foi a mais prevalente, ocorrendo em 98% dos casos (n=82). O misoprostol foi utilizado em 55,4% (n=46) dos casos; a metilergometrina, em 28,9% (n=24); o ácido tranexâmico, em 18,1% (n=15); a massagem uterina, em 27,7% (n=23); e a sutura uterina compressiva utilizando a técnica B-Lynch, em 2,4% (n=2).

Na Tabela 4, são apresentadas as variáveis relacionadas ao nascimento. Houve associação significativa entre a ocorrência de HPP e a classificação do peso do recém-nascido. Em mães cujos recém-nascidos foram classificados como grandes para a idade gestacional, houve maior frequência de HPP.

Tabela 4
Análise bivariada das variáveis relacionadas ao nascimento e características dos recém-nascidos na amostra total e conforme a presença da Hemorragia Pós-Parto, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2020

As variáveis que apresentaram um valor p < 0,20 na análise bivariada foram inseridas no modelo de Regressão de Poisson Multivariado (Tabela 5).

Tabela 5
Análise de Regressão de Poisson Multivariada para avaliar fatores independentemente associados com Hemorragia Pós-Parto, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2020

Vale ressaltar que as variáveis “uso de fórceps” (p=0,146) e “retenção placentária” (p=0,113) não foram incluídas na análise multivariada, pois foram consideradas apenas em puérperas que tiveram seus filhos via parto vaginal. O “uso de soro (IV) com ocitocina no pós-parto” (p<0,001), “uso de ocitocina (IM) no pós-parto” (p=0,090), “prescrição de ocitocina (IM)” (p=0,170) e “curetagem” (p=0,046) também não foram incluídos na análise multivariada, considerando que essas variáveis se referem a possíveis condutas assistenciais para o manejo da HPP. A variável “classificação do peso do recém-nascido” (p=0,023) também não foi incluída na análise multivariada, considerando que todas as participantes que tiveram seus recém-nascidos classificados como GIG tiveram a variável de distensão uterina positiva, sendo esta incluída na análise multivariada.

Após o ajuste, apenas o IC e a distensão uterina permaneceram estatisticamente associados à HPP. Puérperas com IC ≥ 0,9 apresentam uma prevalência 61% maior de HPP (RP=1,61; IC 95%: 1,07 - 2,43). Além disso, puérperas com distensão uterina têm uma prevalência 134% maior de HPP (RP=2,34; IC 95%: 1,63 - 3,36), mostrando-se como fatores de risco intraparto e anteparto, respectivamente, para a ocorrência de HPP.

DISCUSSÃO

Uma parcela significativa de puérperas incluídas neste estudo apresentou o diagnóstico de HPP. Entre as variáveis analisadas, a distensão uterina e o IC > 0,9 estiveram associados ao desenvolvimento da HPP primária. Como mencionado, a HPP é considerada uma das principais causas de óbito materno no Brasil, ficando atrás apenas das síndromes hipertensivas(77 Costa ES, Oliveira RB, Lopes GS. As principais causas de morte maternas entre mulheres no Brasil. Rev Eletrôn Acervo Saúde. 2021;13(1):e5826. https://doi.org/10.25248/reas.e5826.2021
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). Esses achados destacam a importância de uma observação cuidadosa da HPP e, quando os fatores de risco forem identificados, a equipe pode trabalhar em conjunto para prevenir agravamentos dessa emergência obstétrica.

A identificação de fatores de risco para HPP é uma medida crucial a ser realizada continuamente durante a assistência obstétrica(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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), uma vez que a condição clínica da puérpera pode se modificar(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
https://iris.paho.org/bitstream/handle/1...
). A estratificação de risco utilizada neste estudo foi feita no momento da internação hospitalar e não está relacionada ao diagnóstico da HPP. É importante ressaltar que a evolução do trabalho de parto, bem como situações adversas durante o parto, podem desencadear a HPP. Com a identificação precoce de novos fatores de risco, será possível um novo planejamento da assistência, o que pode proporcionar a adoção precoce de medidas preventivas para a HPP.

Na região nordeste do Brasil, a HPP é a segunda principal causa de admissão de puérperas em Unidades de Terapia Intensiva Obstétricas, e o choque hemorrágico esteve presente em 27,1% das pacientes hospitalizadas(88 Amorim MMR, Katz L, Valença M, Araújo DE. Severe maternal morbidity in an obstetric ICU in Recife, Northeast of Brasil. Rev Assoc Med Bras. 2008;54(3):261-6. https://doi.org/10.1590/s0104-42302008000300021
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). Ao analisar os casos de HPP em partos vaginais em outra região do Brasil, um estudo realizado no Hospital da Mulher, localizado em Campinas, São Paulo (SP), constatou que 31% das puérperas tiveram sangramento superior a 500 ml, enquanto 8,2% tiveram sangramento superior a 1.000 ml. A medição da perda sanguínea foi feita somando o volume coletado no campo cirúrgico, usando um coletor de sangue, ao peso das gazes, compressas e absorventes utilizados nas 24 horas após o parto(99 Borovac-Pinheiro A, Ribeiro FM, Pacagnella RC. Risk Factors for postpartum hemorrhage and its severe forms with blood loss evaluated objectively: a prospective cohort study. Rev Bras Ginecol Obstet. 2021;43(2):113-8. https://doi.org/10.1055/s-0040-1718439
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). Esses achados apresentam semelhanças com os resultados do presente estudo, em que 30% da amostra apresentou HPP primária, de acordo com os registros dos prontuários.

Os achados deste estudo e os dados nacionais que retratam o cenário da HPP, quando comparados a dados internacionais, destacam a urgência de melhorias no Brasil. Ao analisar a prevalência de HPP em três hospitais localizados na região Sul da Etiópia, identificou-se uma taxa de 16,6% de HPP primária(1010 Kebede BA, Abdo RA, Anshebo A, Gebremariam BM. Prevalence and predictors of primary postpartum hemorrhage: an implication for designing effective intervention at selected hospitals, Southern Ethiopia. Plos One. 2019;14(10):1-11. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0224579
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). Um estudo de caso-controle realizado em um hospital do Peru, com 932 casos e 2.779 controles, em um total de 42.594 partos atendidos no período de 2000 a 2015, encontrou uma prevalência de 2,19% de HPP entre as puérperas(1111 Quijada BPR, Paniagua KC, Lugán SK. Prevalencia y perfil epidemiológico de puérperas con hemorragia postparto: Ayacucho 2000-2015. Rev Colomb Salud Libre. 2017;12(1):7-14. https://doi.org/10.18041/1900-7841/rcslibre.2017v12n1.1411
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).

Índices de prevalência considerados baixos também foram encontrados na cidade de Guayaquil, no Equador, entre os anos de 2017 e 2018, em que, dos 2.352 nascimentos registrados durante o ano de 2017, 7% tiveram HPP(1212 Castro JVJ. Prevalencia de hemorragia puerperal en pacientes del hospital Matilde Hidalgo de Guayaquil. Guayaquil. [Tese] [Internet]. Universidad de Guayaquil; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: http://repositorio.ug.edu.ec/bitstream/redug/31020/1/CD%202397-%20JAMBAY%20CASTRO%20JESSICA.pdf
http://repositorio.ug.edu.ec/bitstream/r...
). Além disso, na Suíça, a HPP ocorreu em 3,1% das puérperas que tiveram parto entre janeiro de 1993 e dezembro de 2014. A análise desse indicador foi realizada por meio de um banco de dados com informações de aproximadamente 40% de todos os nascimentos na Suíça(1313 Kaelin Agten A, Passweg D, von Orelli S, Ringel N, Tschudi R, Tutschek B. Temporal trends of postpartum haemorrhage in Switzerland: a 22-year retrospective population-based cohort study. Swiss Med Wkly. 2017;147:w14551. https://doi.org/10.4414/smw.2017.14551
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).

Em uma análise de um banco de dados dos Estados Unidos que acompanha estimativas nacionais de internações hospitalares, pesquisadores evidenciaram a ocorrência de HPP em cesáreas de 2011 a 2012. A HPP não grave estava presente em 15,7 por 1.000 internações; a HPP que necessitou de transfusão sanguínea em 5,0 por 1.000 internações; e a HPP que necessitou de procedimentos para controle da HPP em 3,4 por 1.000 internações(1414 Ahmadzia HK, Grotegut CA, James AH. A national update on rates of postpartum haemorrhage and related interventions. Blood Transfusion 2020;247-53. https://doi.org/10.2450/2020.0319-19
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).

Os achados de HPP primária no cenário internacional são menores em comparação com os do Brasil e com os desta pesquisa. Essa variabilidade nas taxas de ocorrência de HPP ao compararmos diferentes países ou até mesmo diferentes regiões do mesmo país pode estar relacionada às iniquidades expostas ou então às barreiras que limitam o acesso aos serviços de saúde. Fatores como dificuldade no acesso aos serviços de saúde, baixo nível socioeconômico e assistência ao parto por profissionais não qualificados(1515 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Folha informativa: mortalidade materna [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2021 May 13]. Available from: https://www.paho.org/pt/node/63100
https://www.paho.org/pt/node/63100...
) podem estar intimamente relacionados a resultados desfavoráveis, como é o caso da HPP.

A ocorrência de HPP pode resultar em diferentes desfechos. No entanto, destaca-se o diagnóstico e o manejo precoces a fim de evitar agravos e até mesmo óbito materno. Em um estudo multicêntrico realizado em 27 centros de saúde do Brasil, foram utilizados 9.555 casos de morbidade materna grave, evidenciando que 12,5% das puérperas tiveram complicações decorrentes da HPP. No geral, a HPP foi responsável por 23,5% dos casos de near miss materno e 21,4% das mortes maternas. Os dados sobre desfecho materno grave (definido como a soma de morte materna e near miss materno) foram de 2,6 por 1.000 nascidos vivos em puérperas que apresentaram HPP, sendo que idade materna, tempo de gestação, cesárea e cicatriz uterina anterior foram identificados como principais fatores de risco para o desfecho materno grave secundário à HPP(1616 Rocha Filho EA, Costa ML, Cecatti JG, Parpinelli MA, Haddad SM, Pacagnella RC, et al. Severe maternal morbidity and near miss due to postpartum hemorrhage in a national multicenter surveillance study. Int J Gynecol Obstetric. 2014;128(2):131-6. https://doi.org/10.1016/j.ijgo.2014.08.023
https://doi.org/10.1016/j.ijgo.2014.08.0...
). Esses resultados vão ao encontro do que foi evidenciado no estudo em questão, uma vez que, na análise de fatores como cesárea ou cesárea prévia, não houve associação com a ocorrência de HPP.

No que tange às causas de near miss materno, a HPP foi considerada a principal em um estudo realizado na China durante o período de 2012 a 2017, em 18 hospitais da província de Zhejiang, estando presente em 76,3% dos registros. Os autores do estudo defendem que os casos de near miss materno apresentaram associação altamente significativa com gestações de fetos múltiplos(1717 Ma Y, Zhang L, Wang X, Qiu L, Hesketh T, Wang X. Low Incidence of maternal near-miss in Zhejiang, a developed Chinese province: a cross-sectional study using the WHO approach. Clin Epidemiol. 2020;12:405-14. https://doi.org/10.2147/clep.s243414
https://doi.org/10.2147/clep.s243414...
), corroborando os achados do presente estudo, que evidenciou que puérperas com distensão uterina apresentam uma prevalência 134% maior de HPP.

Nos Estados Unidos, por meio de um estudo que analisou um banco de dados com registros das internações em nível nacional, foi possível evidenciar que os casos de HPP por atonia uterina aumentaram 60%, comparando-se um período de tempo (2001-2002 a 2011-2012). Em cesáreas, também houve aumento na prevalência de HPP com necessidade de transfusão sanguínea, passando de 2,1 para 5,0 por 1.000 hospitalizações complicação(1414 Ahmadzia HK, Grotegut CA, James AH. A national update on rates of postpartum haemorrhage and related interventions. Blood Transfusion 2020;247-53. https://doi.org/10.2450/2020.0319-19
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).

Os resultados do estudo chamam a atenção dos médicos e da instituição de saúde para a importância de compreender melhor essa emergência obstétrica. A identificação dos fatores de risco e a atuação da equipe multidisciplinar podem auxiliar a reverter o aumento no número de casos de HPP, prevenindo o aparecimento dessa complicação(1414 Ahmadzia HK, Grotegut CA, James AH. A national update on rates of postpartum haemorrhage and related interventions. Blood Transfusion 2020;247-53. https://doi.org/10.2450/2020.0319-19
https://doi.org/10.2450/2020.0319-19...
). Pesquisas como esta, que trazem dados de acompanhamento de um acontecimento durante um período de tempo, são importantes, pois conseguem retratar um comportamento levando em consideração a temporalidade.

Conforme ao pior desfecho da HPP - o óbito -, observou-se entre os anos de 1996 e 2016 a taxa de mortalidade materna no Brasil segundo regiões, a saber: Nordeste, 34,5%; Sudeste, 31,0%; Sul, 16,5%; Norte, 10,8%; e Centro-Oeste, 7,2%(1818 Lima TC. Mortalidade por hemorragia pós-parto no Brasil de 1996 a 2016 [Dissertação] [Internet]. Brasília. Faculdade de Ciências da Educação e da Saúde; 2019 [cited 2021 Apr 27]. Available from: https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstream/prefix/13606/1/21505170.pdf
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). Na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais, o perfil epidemiológico da mortalidade materna, baseado na análise das Fichas Resumo de Investigação Confidencial do Óbito Materno, evidenciou que 14,1% de todas as mortes maternas ocorridas durante o período de 2005 a 2015 foram decorrentes de choque hipovolêmico(1919 Martins ACS, Silva LS. Epidemiological profile of maternal mortality. Rev Bras Enferm. 2018;71(1):677-83. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0624
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0...
). Nesse sentido, alguns autores defendem que a maioria dos fatores envolvidos na mortalidade materna está relacionada à HPP, a doenças hipertensivas e a doenças desenvolvidas durante o período gravídico-puerperal, sendo que a maioria desses fatores poderia ser evitada mediante assistência em saúde adequada(2020 Silva JVCP, Santos LA, Pontes LTA, Vasconcelos TH, Teodósio DO, Melo GB. Fatores de risco e complicações relacionados à mortalidade materna. Ciênc Biol Saúde Unit [Internet]. 2020[cited 2021 May 13];6(2):87-100. Available from: https://periodicos.set.edu.br/fitsbiosaude/article/view/7491/4290
https://periodicos.set.edu.br/fitsbiosau...
).

Considerando que a morte materna geralmente apresenta causas que poderiam ser prevenidas durante o período gravídico-puerperal, pode-se observar que os números de morte materna são discrepantes quando comparados entre países desenvolvidos (1 em 100.000 nascimentos) e países em desenvolvimento (1 em 1.000 nascimentos), demonstrando a influência da estrutura disponível para o cuidado e atenção à saúde(2121 Federación Latinoamericana de Obstetricia y Ginecología (FLASOG). Hemorragia Postparto: donde estamos y hacia dónde vamos? [Internet]. 2018 [cited 2022 Mar 28]. Available from: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2018/09/Hemorragia-Postparto-17OCTUBRE.pdf
https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz...
).

Alguns países podem ilustrar tal disparidade, a exemplo da Turquia, onde, no período de 2012 a 2015, a RMM (razão de mortalidade materna) foi de 19,7 por 100.000 nascidos vivos(2222 Gulumser C, Engin-Ustun Y, Keskin L, Celen S, Sanisoglu S, Karaahmetoglu, et al. Maternal mortality due to hemorrhage: population-based study in turkey. J Matern Fetal Neonatal Med. 2018;32(23):3998-4004. https://doi.org/10.1080/14767058.2018.1481029
https://doi.org/10.1080/14767058.2018.14...
). No Brasil, um estudo traz uma comparação de indicadores de RMM e seu comportamento ao longo dos anos, sendo que em 1990, a RMM era 143,2 por 1.000 nascidos vivos, já em 2015, houve um declínio deste indicador, passando para 59,7 por 1.000 nascidos vivos(2323 Leal MC, Szwarcwald CL, Almeida PVB, Aquino EML, Barreto ML, Barros F, et al. Saúde reprodutiva, materna, neonatal e infantil nos 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Ciênc Saúde Coletiva. 2018;23(6):1915-28. https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.03942018
https://doi.org/10.1590/1413-81232018236...
).

Quanto aos fatores de risco, pode-se observar que a distensão uterina apresentou resultado estatisticamente significante, sendo considerado um grande fator de risco para a ocorrência da HPP. Evidências já demonstraram que a distensão uterina predispõe à ocorrência de atonia uterina(2424 Wormer KC, Jamil RT, Bryant SB. Hemorragia aguda pós-parto [Internet]. Statpearls Publishing. 2021 [cited 2022 Mar 28]. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK499988/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK49...
), sendo considerada a principal causa de HPP(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
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). A distensão uterina durante a gestação pode ocorrer em casos de múltiplos fetos, em crianças grandes para a idade gestacional (GIG) ou quando há aumento do líquido amniótico (polidrâmnio)(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
https://iris.paho.org/bitstream/handle/1...
).

Reforçando os achados do presente estudo, uma pesquisa realizada na Espanha ilustra essa associação entre fetos com peso superior a 4000g e a ocorrência de HPP(2525 Álvarez-Silvares E, García-Lavandeira S, Rubio-Cid P. Fatores de evolução da evolução da hemorragia pós-parto a hemorragia pós-parto vários: estudo de casos e controles. Ginecol Obstet Mex [Internet]. 2015[cited 2022 Mar 28];83(07):437-46. Available from: https://www.medigraphic.com/pdfs/ginobsmex/gom-2015/gom157h.pdf
https://www.medigraphic.com/pdfs/ginobsm...
). Uma coorte retrospectiva realizada no Peru, durante o período de 2015 a 2017, evidenciou que a gestação gemelar é um fator de risco para HPP: 19% das gestações gemelares tiveram HPP por atonia uterina, comparando-se a 7% de HPP por atonia uterina em gestações únicas, concluindo que o risco de desenvolver HPP por atonia uterina é 2,75 vezes maior em puérperas com gestação gemelar, se comparado ao de gestação única(2626 Rodríguez EAP, Ascón RAA. Embarazo múltiple como factor de riesgo para hemorragia postparto por atonía uterina en el hospital Belén de Trujillo. Acta Médica Orreguiana Hampi Runa [Internet]. 2020[cited 2022 Mar 28];19(1):43-8.Available from: http://journal.upao.edu.pe/HAMPIRUNA/article/view/1453
http://journal.upao.edu.pe/HAMPIRUNA/art...
).

A gravidez múltipla mostrou-se como fator de risco para a ocorrência de HPP grave também na Noruega, onde foram identificados 1.064 casos graves de HPP (definida como perda de sangue ≥1500 ml ou necessidade de transfusão de sangue no pós-parto) de 2008 a 2011. A etiologia mais comum para HPP grave foi a presença de atonia uterina, relatada em 60,4% dos casos, e complicações placentárias, presentes em 36%(2727 Nyfløt LT. Risk factors for severe postpartum hemorrhage: a case-control study. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(17):1-9. https://doi.org/10.1186/s12884-016-1217-0
https://doi.org/10.1186/s12884-016-1217-...
).

Independentemente da via de parto, a atonia uterina também foi considerada a principal causa de HPP em um estudo conduzido em um hospital do Peru, onde também se observou associação entre a macrossomia fetal e a HPP(1111 Quijada BPR, Paniagua KC, Lugán SK. Prevalencia y perfil epidemiológico de puérperas con hemorragia postparto: Ayacucho 2000-2015. Rev Colomb Salud Libre. 2017;12(1):7-14. https://doi.org/10.18041/1900-7841/rcslibre.2017v12n1.1411
https://doi.org/10.18041/1900-7841/rcsli...
). Em Suriname, alguns autores analisaram os partos hospitalares ocorridos em 2017 e identificaram a gestação múltipla e a macrossomia fetal como fatores de risco para HPP grave (perda de sangue ≥1.000 ml ou ≥500 ml associada a hipotensão ou transfusão de pelo menos três unidades de produtos sanguíneos)(2828 Kodan LR, Verschueren KJC, Prüst ZD, Zuithoff NPA, Rijken MJ, Browne JL, et al. Postpartum hemorrhage in Suriname: a national descriptive study of hospital births and an audit of case management. Plos One. 2020;15(12):1-15. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0244087
https://doi.org/10.1371/journal.pone.024...
).

A gestação múltipla e a macrossomia fetal foram mencionadas como o segundo e terceiro fatores de risco mais prevalentes para HPP entre todos os partos vaginais ocorridos entre outubro e dezembro de 2003 e outubro e dezembro de 2005 em 19 maternidades públicas na Argentina e no Uruguai. Observou-se uma taxa de 10,8% de HPP moderada (perda de sangue de pelo menos 500 ml) e 1,9% de HPP grave (perda de sangue de pelo menos 1.000 ml)(2929 Sosa CG, Althabe F, Belizán JM, Buekens P. Risk factors for postpartum hemorrhage in vaginal deliveries in a latin-american population. Obstetric Gynecol. 2009;113(6):1313-9. https://doi.org/10.1097/aog.0b013e3181a66b05
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).

Neste estudo, outro fator estatisticamente associado à HPP foi o IC, um parâmetro clínico que pode ser utilizado para avaliar o impacto da perda volêmica obstétrica e, consequentemente, auxiliar na escolha das condutas assistenciais diante da HPP. O IC é calculado com base na proporção entre a frequência cardíaca e a pressão arterial sistêmica, refletindo o estado hemodinâmico. Considerado um método de fácil realização, é útil para prever a necessidade de transfusão maciça. Valores de IC ≥ 0,9 sugerem grande perda sanguínea e a possibilidade de necessidade de transfusão sanguínea durante o manejo da HPP(44 Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica [Internet]. Brasília: OPAS; 2018[cited 2022 Mar 28]. Available from: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/34879/9788579671241-por.pdf?sequence=1&isAllowed=y.
https://iris.paho.org/bitstream/handle/1...
,3030 Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Protocolo de hemorragia puerperal: Saúde da Família [Internet]. Belo Horizonte: SUS; 2016 [cited 2021 Feb 16]. Available from: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2018/documentos/publicacoes%20atencao%20saude/hemorragia-puerperal.pdf
https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/defa...
).

Valores de IC ≥ 0,9 podem ser utilizados para identificar puérperas que necessitam urgentemente de cuidados de alto nível. O IC mostra-se mais útil na avaliação do estado hemodinâmico e do comprometimento do sistema cardiovascular quando comparado à avaliação isolada dos sinais vitais (frequência cardíaca e pressão arterial sistólica)(3131 Nathan H, Ayadi AE, Hezelgrave NL, Seed P, Butrick E, Miller S, et al. Shock index: an effective predictor of outcome in postpartum haemorrhage?. BJOG. 2014;122(2):268-75. https://doi.org/10.1111/1471-0528.13206
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). Destaca-se que IC > 0,9 pode ser um preditor da necessidade de transfusão sanguínea e pode prever resultados adversos da HPP(3232 Lee S-Y, Kim H-Y, Cho G-J, Hong S-C, Oh M-J; Kim H-J. Use of the shock index to predict maternal outcomes in women referred for postpartum hemorrhage. BJOG. 2018;144(2):221-4. https://doi.org/10.1002/ijgo.12714
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). A estimativa visual da perda sanguínea e os sinais vitais isolados não são úteis no reconhecimento da HPP, uma vez que os métodos de identificação da HPP devem ser de fácil aplicação e incluir achados clínicos da paciente, auxiliando no diagnóstico precoce e no tratamento oportuno. O IC mostra-se útil para auxiliar na identificação precoce de puérperas com risco de alterações no sistema cardiovascular, oferecendo melhor previsão dessas alterações em comparação com outros sinais vitais isolados. É considerado um parâmetro fácil de ser calculado, utiliza os sinais clínicos da paciente e torna-se um indicador precoce de agravo, embora seja necessária a avaliação adicional nos casos de HPP(3333 Borovac-Pinheiro A, Pacagnella RC, Cecatti JG, Miller S, Ayadi AM, Souza JP, et al. Postpartum hemorrhage: new insights for definition and diagnosis. Am J Obstetric Gynecol. 2018;219(2):162-8. https://doi.org/10.1016/j.ajog.2018.04.013
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).

Um estudo baseado na revisão dos prontuários clínicos de 105 puérperas diagnosticadas com hemorragia obstétrica em uma Unidade de Terapia Intensiva determinou que o IC obstétrico ≥ 0,9 foi relacionado a uma média de perda sanguínea de 3.000 ml. Das pacientes incluídas no estudo, 65 (61%) apresentaram um resultado de IC superior a 0,9, e 38 (58%) necessitaram de transfusão maciça. O valor do IC ≥ 0,9 predispôs a complicações graves, como insuficiência renal aguda e processos infecciosos(3434 Leon MCG, Escárcega-Ramos LR, Gonzáles-Días ÓA, Palomares-Leal A, Gutiérrez-Aguirre CH. Utilidad del índice de choque como valor predictivo para el requerimiento de trasfusión en hemorragia obstétrica. Ginecol Obstet Mex. 2018;86(10):665-74. https://doi.org/10.24245/gom.v86i10.2346
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). Nesta pesquisa, 2,4% das puérperas com diagnóstico de HPP necessitaram de transfusão sanguínea, demonstrando uma divergência em relação à pesquisa anterior.

A ocorrência de transfusão sanguínea é uma das medidas indispensáveis para conter a HPP, embora a definição do tipo e quantidade de hemocomponentes necessários possa não ser tão fácil. Essa dificuldade decorre das alterações fisiológicas nos níveis de pressão, no tônus vascular e no volume circulante vivenciadas pelas gestantes, o que pode interferir no diagnóstico precoce e no reconhecimento das manifestações de hemorragia, e é nesse grupo que o cálculo do IC se torna indispensável(3434 Leon MCG, Escárcega-Ramos LR, Gonzáles-Días ÓA, Palomares-Leal A, Gutiérrez-Aguirre CH. Utilidad del índice de choque como valor predictivo para el requerimiento de trasfusión en hemorragia obstétrica. Ginecol Obstet Mex. 2018;86(10):665-74. https://doi.org/10.24245/gom.v86i10.2346
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).

Uma coorte realizada em Campinas avaliou a perda sanguínea por meio da pesagem do campo, das compressas e dos absorventes utilizados nas primeiras 24 horas após o parto. Os dados mostraram que 44,5% das puérperas sangraram mais de 500 ml nas primeiras 24 horas pós-parto; contudo, esse sangramento não teve repercussão clínica nas pacientes. O estudo apontou que o parâmetro do IC mostrou alta especificidade, mas baixa sensibilidade, sugerindo que esses sinais vitais (frequência cardíaca e pressão arterial sistólica) são limitados em sua capacidade de identificar rapidamente o aumento do sangramento. No entanto, com a alta especificidade do IC, valores inferiores aos pontos de corte definidos podem ser usados para descartar sangramento vaginal aumentado, e os valores superiores podem ser usados como alerta sobre o aumento do sangramento pós-parto, a fim de identificar puérperas que necessitam de maior atenção ou encaminhamento para tratamentos adicionais quando o parto ocorre em unidades de nível inferior(3535 Borovac-Pinheiro A, Cecatti JG, Pacagnella RC. Ability of shock index and heart rate to predict the percentage of body blood volume lost after vaginal delivery as an indicator of severity: results from a prospective cohort study. J Global Health. 2019;9(2):1-8. https://doi.org/10.7189/jogh.09.020432
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).

As incoerências em relação ao diagnóstico da HPP, por vezes, dificultam a estimativa de sua incidência. A estimativa clínica (pesagem de compressas e estimativa visual) não é precisa, podendo subestimar a perda sanguínea em partos vaginais e superestimar a perda sanguínea em cesáreas(3636 Wei Q, Xu Y, Zhang L. Towards a universal definition of postpartum hemorrhage: retrospective analysis of Chinese women after vaginal delivery or cesarean section. Medicine. 2020;99(33):1-6. https://doi.org/10.1097/md.0000000000021714
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).

O Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas recomenda a utilização de métodos quantitativos que mensuram a perda sanguínea durante o parto, visto que fornecem um dado mais preciso em comparação com a estimativa visual(3737 Committee Acog. Quantitative blood loss in obstetric hemorrhage. Obstet Gynecol. 2019;134(6):1368-69. https://doi.org/10.1097/aog.0000000000003565
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). No entanto, no presente estudo, considerou-se se foi ou não apresentada HPP, o registro de sangramento excessivo para o procedimento e a conduta da equipe assistencial para o controle da HPP, com base no protocolo assistencial, uma vez que os registros dos prontuários consultados não continham o diagnóstico fechado de HPP, o que causou imprecisão no registro.

Considerando as chances de ocorrência da HPP, as ações de suporte ao parto e as intervenções que possam ser necessárias, sugere-se que os profissionais e serviços de saúde tenham conhecimento e baseiem suas práticas em evidências que garantam resultados menos prejudiciais às puérperas. Ações educacionais diante da tecnologia mostram-se cada vez mais necessárias para a melhoria da prática clínica(3838 Rangel RCT, Souza ML, Bentes CML, Souza ACRH, Leitão, MNC, Lynn FA. Tecnologias de cuidado para prevenção e controle da hemorragia no terceiro estágio do parto: revisão sistemática. Rev Latino-Am Enferm. 2019;27:1-18. https://doi.org/10.1590/1518-8345.2761.3165
https://doi.org/10.1590/1518-8345.2761.3...
).

Limitações do estudo

O estudo apresenta limitações relacionadas à falta de padronização do registro dos casos de HPP nos prontuários das puérperas na referida instituição, o que causou dificuldades na classificação e categorização dos resultados. Acredita-se que esses efeitos foram minimizados à medida que as diferentes formas de registros foram analisadas e discutidas juntamente com especialistas da área, o que possibilitou o alinhamento sobre a categorização dos achados do prontuário. Além disso, ressalta-se que a coleta e a categorização dos dados ficaram sob responsabilidade da pesquisadora principal do estudo, evitando assim os viés confundidores e de interpretação.

Contribuições para a área da enfermagem

Este estudo possibilitou retratar a prevalência de HPP primária em um hospital universitário, identificar fatores de risco e identificar as diferentes formas de registro dessa complicação na instituição. Dados como esses poderão auxiliar os profissionais a refletirem sobre a importância do registro em sua prática cotidiana, buscando construir estratégias de padronização do registro. A qualificação de um registro objetivo e padronizado, que contemple as informações relacionadas às condições clínicas e o diagnóstico da HPP, com base na precisão da perda sanguínea pós-parto, poderia tornar mais efetiva a assistência em saúde prestada a essa população, além de fornecer subsídios para a continuidade do cuidado.

A prevalência da HPP primária encontrada foi alta quando comparada às evidências de outros estudos. Esse achado possibilitará uma ampla e relevante discussão na prática clínica acerca de questões que possam subsidiar a identificação precoce dos fatores de risco, definição de conduta e implementação dos cuidados preventivos, com potencial para qualificação da assistência e redução dos índices de morbimortalidade materna, ações essas em consonância com recomendações internacionais.

Mesmo na ausência de significância estatística, alguns fatores de risco não devem ser desconsiderados na prática clínica, visto que já foram citados em outros estudos. Além disso, as limitadas evidências sobre os fatores de risco relacionados ao desfecho estudado, bem como a ausência de um instrumento quantitativo que otimize a mensuração da perda sanguínea, tornam a temática pertinente para constante investigação.

CONCLUSÕES

Os achados evidenciaram uma alta prevalência de HPP em comparação com resultados de outros estudos. No entanto, salienta-se que a taxa de prevalência de HPP na população em análise foi definida em conjunto com os registros de sangramento aumentado e/ou registro de condutas assistenciais para controle da HPP, com base no protocolo assistencial da instituição.

Os fatores que apresentaram associação estatisticamente significativa no presente estudo foram a distensão uterina e o IC. Apesar de esses fatores já terem sido relacionados à ocorrência de HPP em diferentes pesquisas e contextos, sua reafirmação faz-se necessária, com o intuito de agregar e proporcionar melhorias na prática clínica, e lançar mão de recursos que consigam predizer sua ocorrência.

Ressalta-se que, embora a estratificação de risco seja um meio de avaliar as puérperas com risco maior de desenvolver HPP, essa variável não esteve associada estatisticamente com a ocorrência do desfecho na amostra em estudo.

Sugere-se a elaboração de um registro ou indicador padronizado para os casos de HPP, em conjunto com os gestores e equipe multiprofissional, visando uniformizar a identificação e, consequentemente, o registro dos casos de HPP, com base em evidências científicas. Os registros padronizados podem trazer informações que permitem a realização de pesquisas como esta, tornando-se exemplos para adequação dos registros hospitalares. A educação continuada é uma forma de capacitação da equipe assistencial sobre os modos de identificação da HPP e a importância dos registros, não somente nestes casos, mas em toda e qualquer assistência prestada durante a internação.

É preciso sensibilizar os profissionais acerca da importância de registros completos, homogêneos, qualificados e padronizados, a fim de evitar interferências na qualidade da assistência e na realização de estudos que utilizam os prontuários eletrônicos como base de dados.

DISPONIBILIDADE DE DADOS E MATERIAL

https://doi.org/10.48331/scielodata.PSGIMB

  • FOMENTO
    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)/Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

AGRADECIMENTO

Agradecemos a Ceres Oliveira pela colaboração na análise estatística.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Álvaro Sousa
EDITOR ASSOCIADO: Luís Carlos Lopes-Júnior

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2022
  • Aceito
    07 Maio 2023
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