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Associações entre bullying e risco de transtornos alimentares em adolescentes

RESUMO

Objetivos:

analisar as associações entre o perfil de participação no bullying (vítimas, agressores e vítimas-agressoras) e o risco de transtornos alimentares em adolescentes.

Métodos:

estudo transversal realizado com 491 estudantes, com idades entre 10 e 18 anos. Os dados foram coletados por meio da aplicação da Escala de Vitimização e Agressão entre Pares e do Eating Attitudes Test, e foram analisados estatisticamente por meio de análises de variância (ANOVA) e correlação de Spearman.

Resultados:

o risco de transtornos alimentares foi maior para o perfil de vítima, tanto para meninos quanto para meninas. Para ambos os sexos, a vitimização física, a vitimização verbal e a vitimização relacional associaram-se significativamente às variáveis de risco de transtornos alimentares. Para os meninos, também houve associações significativas relacionadas à agressão.

Conclusões:

os estudantes vítimas, especialmente os meninos, são mais vulneráveis às consequências do bullying em relação ao risco de transtornos alimentares.

Descritores:
Bullying; Transtornos da Alimentação e da Ingestão de Alimentos; Adolescente; Risco; Associação

ABSTRACT

Objectives:

to analyze the associations between bullying participation profiles (victims, bullies, and bully-victims) and the risk for eating disorders in adolescents.

Methods:

a cross-sectional study was conducted with 491 students, aged 10 to 18 years. Data were collected through the application of the Peer Victimization and Aggression Scale and the Eating Attitudes Test, and were statistically analyzed using analysis of variance (ANOVA) and Spearman correlation.

Results:

the risk for eating disorders was higher for the victim profile, both for boys and girls. For both sexes, physical victimization, verbal victimization, and relational victimization were significantly associated with variables related to the risk for eating disorders. For boys, there were also significant associations related to aggression.

Conclusions:

student victims, especially boys, are more vulnerable to the consequences of bullying in relation to the risk for eating disorders.

Descriptors:
Bullying; Feeding and Eating Disorders; Adolescent; Risk; Association

RESUMEN

Objetivos:

analizar las asociaciones entre los perfiles de participación en el acoso escolar (víctimas, agresores y víctimas-agresores) y el riesgo de trastornos alimentarios en adolescentes.

Métodos:

estudio transversal con 491 estudiantes de 10 a 18 años. Los datos se recopilaron mediante la aplicación de la Escala de Victimización y Agresión entre Pares y el Test de Actitudes Alimentarias, y se analizaron estadísticamente mediante análisis de varianza (ANOVA) y correlación de Spearman.

Resultados:

el riesgo de trastornos alimentarios fue mayor en el perfil de víctima, tanto en niños como en niñas. Tanto para ambos sexos, la victimización física, la victimización verbal y la victimización relacional se asociaron significativamente con variables relacionadas con el riesgo de trastornos alimentarios. En el caso de los niños, también se observaron asociaciones significativas relacionadas con la agresión.

Conclusiones:

los estudiantes que son víctimas, especialmente los niños, son más vulnerables a las consecuencias del acoso escolar en relación con el riesgo de trastornos alimentarios.

Descriptores:
Acoso Escolar; Trastornos de Alimentación y de la Ingestión de Alimentos; Adolescente; Riesgo; Asociación

INTRODUÇÃO

O bullying ocorre quando uma ou mais pessoas agridem intencional e repetidamente outras pessoas, em interações marcadas por desequilíbrio de poder(11 Borgen NT, Olweus D, Kirkebøen LJ, Breivik K, Solberg ME, Frønes I, et al. The potential of anti-bullying efforts to prevent academic failure and youth crime: a case using the Olweus Bullying Prevention Program (OBPP). Prev Sci. 2021;22:1147-58. https://doi.org/10.1007/s11121-021-01254-3
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). Trata-se de um tipo de violência entre pares que pode ocorrer em diferentes ambientes, mas é muito comum na escola(22 Zequinão MA, Medeiros P, Silva JL, Pereira BO, Cardosos FL. Sociometric status of participants involved in school bullying. Paidéia (Ribeirão Preto). 2020;30:e3011. https://doi.org/10.1590/1982-4327e3011
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). Na escola, os estudantes podem praticar as agressões (agressores), ser alvo dos atos agressivos (vítimas) ou praticar e sofrer a violência ao mesmo tempo (vítimas-agressoras)(33 Silva JL, Komatsu AV, Zequinão MA, Pereira B, Wang GY, Silva MAI. Bullying, social skills, peer acceptance, and friendship among students in school transition. Estud Psicol. 2019;36:e180060. https://doi.org/10.1590/1982-0275201936e180060
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). As agressões podem ser físicas (socos, empurrões, chutes, etc.), verbais (xingamentos, deboches, risadas, por exemplo) ou relacionais (ameaçar, isolar socialmente o colega, entre outros)(44 Alencastro LCS, Silva JL, Komatsu AV, Bernardino FBS, Mello FCM, Silva MAI. Theater of the Oppressed and bullying: nursing performance in school adolescent health. Rev Bras Enferm. 2020;73(1):1-7. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0910
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).

A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) identificou uma prevalência de envolvimento em situações de bullying de 28% em uma amostra nacionalmente representativa de estudantes do nono ano do Ensino Fundamental no Brasil(55 Malta DC, Mello FCM, Prado RR, Sá ACMGND, Marinho F, Pinto IV, et al. Prevalência de bullying e fatores associados em escolares brasileiros, 2015. Ciênc Saúde Colet. 2019;24(4):1359-68. https://doi.org/10.1590/1413-81232018244.15492017
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). Devido à sua alta prevalência e às consequências negativas que provoca no desempenho escolar e no desenvolvimento psicossocial de crianças e adolescentes, o bullying é considerado um problema de saúde pública(66 Manuel D, Adams S, Mpilo M, Savahl S. Prevalence of bullying victimisation among primary school children in South Africa: a population-based study. BMC Res Notes. 2021;14(342):1-6. https://doi.org/10.1186/s13104-021-05747-w
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-77 Marcolino EM, Calvacanti AL, Padilha WWN, Miranda FAN, Clementino FS. Bullying: prevalence and factors associated with vitimization and aggression in the school quotidian. Texto Contexto Enferm. 2018;27(1):e5500016. https://doi.org/10.1590/0104-07072018005500016
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). Algumas de suas consequências são: ansiedade, baixa autoestima, depressão, baixo rendimento escolar, fobias e suicídio(88 Menestrel L. Preventing bullying: consequences, prevention, and intervention. J Youth Dev. 2020;15(3):8-26. https://doi.org/10.5195/jyd.2020.945
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).

O bullying também pode representar um risco para transtornos alimentares(99 Lie SØ, Bulik CM, Andreassen OA, Rø Ø, Bang L. The association between bullying and eating disorders: a case-control study. Int J Eat Disord. 2021;54(8):1405-14. https://doi.org/10.1002/eat.23522
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), que são síndromes psiquiátricas caracterizadas por alterações no comportamento alimentar. Os transtornos alimentares mais estudados são a anorexia nervosa, a bulimia nervosa e o transtorno da compulsão alimentar(1010 American Psychiatric Association (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5th ed. Porto Alegre: Artmed; 2014.). Eles ocorrem mais frequentemente em mulheres, especialmente em adolescentes e jovens adultas. A anorexia nervosa é caracterizada por um medo excessivo de ganhar peso, com uma grave distorção da imagem corporal. A bulimia nervosa envolve a ingestão compulsiva e excessiva de alimentos, seguida por sentimentos de culpa que levam a comportamentos compensatórios, como o vômito induzido. Já o transtorno da compulsão alimentar ocorre quando a pessoa consome grandes quantidades de alimentos em um curto período de tempo, de duas horas, mesmo quando não está com fome(1111 Bloc LG, Nazareth ACP, Melo AKS, Moreira V. Transtorno de compulsão alimentar: revisão sistemática da literatura. Rev Psicol Saúde. 2019; 11(1):3-17. https://doi.org/10.20435/pssa.v11i1.617
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).

Os transtornos alimentares podem ser causados e mantidos por fatores psicológicos, metabólicos, biológicos, familiares, escolares ou socioculturais(1212 Oliveira APG, Fonseca IR, Almada MORV, Acosta RJT, Silva MM, Pereira KB, et al. Transtornos alimentares, imagem corporal e influência da mídia em universitárias. Rev enferm UFPE. 2020;14:e245234. https://doi.org/10.5205/1981-8963.2020.245234
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). Especificamente em relação aos fatores escolares, o bullying relacionado à aparência física pode desencadear problemas relacionados à alimentação e à preocupação com o controle de peso(1313 Quintero-Jurado J, Moratto-Vásquez N, Caicedo-Velasquez B, Cárdenas-Zuluaga N, Espelage DL. Association between school bullying, suicidal ideation, and eating disorders among school-aged children from Antioquia, Colombia. Trends Psychol. 2021;30:58-72. https://doi.org/10.1007/s43076-021-00101-2
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). No entanto, existem evidências de que não apenas as agressões direcionadas à aparência influenciam o desejo de modificar o tamanho e a forma do corpo, mas que qualquer tipo de bullying está relacionado a problemas alimentares(1414 Lee KS, Vaillancourt T. Longitudinal associations among bullying by peers, disordered eating behavior, and symptoms of depression during adolescence. JAMA Psychiatry. 2018;75(6):605-12. https://doi.org/10.1001/jamapsychiatry.2018.0284
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). Por exemplo, um estudo identificou que adolescentes de 11 a 16 anos que foram vítimas de bullying físico, relacional ou virtual (cyberbullying) se preocupavam com a perda de peso, independentemente de seu peso real(1515 Lee K, Guy A, Dale J, Wolke D. Does psychological functioning mediate the relationship between bullying involvement and weight loss preoccupation in adolescents? a two-stage cross-sectional study. Int J Behav Nutr Phys Act. 2017;14(1):1-11. https://doi.org/10.1186/s12966-017-0491-1
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).

Como os participantes do bullying podem apresentar problemas alimentares, sua saúde física e mental pode ser prejudicada por longos períodos, uma vez que a maioria dos adolescentes com transtornos alimentares continua apresentando sintomas mesmo dez anos depois(1616 Pearson CM, Miller J, Ackard DM, Loth KA, Wall MM, Haynos AF et al. Stability and change in patterns of eating disorder symptoms from adolescence to young adulthood. Int J Eat Disord. 2017;50(7):748-57. https://doi.org/10.1002/eat.22692
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). Considerando que os transtornos alimentares geralmente começam na adolescência, período em que o bullying também pode ocorrer com mais frequência, é importante realizar estudos com adolescentes para obter conhecimentos que possam subsidiar políticas e programas voltados para a prevenção ou redução do bullying escolar. Nesse sentido, embora haja estudos que associem o bullying a sintomas de transtornos alimentares, são poucos aqueles que exploram as diferenças entre os perfis dos participantes, a fim de identificar se as associações são mais fortes para vítimas, agressores ou vítimas-agressoras(1717 Copeland WE, Bulik CM, Zucker N, Wolke D, Lereya ST, Costello EJ. Does childhood bullying predict eating disorder symptoms? a prospective, longitudinal analysis. Int J Eat Disord. 2015;48(8):1141-49. https://doi.org/10.1002/eat.22459
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).

OBJETIVOS

Analisar as associações entre o perfil de participação no bullying (vítimas, agressores e vítimas-agressoras) e risco para transtornos alimentares em adolescentes.

MÉTODOS

Aspectos éticos

A coleta de dados foi iniciada após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa. A pesquisa foi autorizada pela direção de uma escola pública e a autorização dos pais/responsáveis foi obtida mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Os adolescentes assinaram o Termo de Assentimento. Em todas as etapas do estudo foram seguidas as recomendações da resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo exploratório, analítico, de corte transversal, com abordagem quantitativa, o qual seguiu os critérios do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE)(1818 Von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Vandenbroucke JP, STROBE Initiative. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. J Clin Epidemiol. 2008;61(4):344-9. https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2007.11.008
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). Os dados foram coletados no mês de setembro de 2019 em uma escola pública da cidade de Passos, Estado de Minas Gerais, Brasil.

População e critérios de inclusão e exclusão

Todos os 1600 estudantes matriculados do 6º ano do Ensino Fundamental II à 3ª série do Ensino Médio foram convidados a participar da pesquisa, 491 aceitaram. Os critérios de inclusão foram: ser frequente às aulas, estar presente no dia da aplicação dos questionários, ter entre 10 e 19 anos (faixa etária da adolescência definida pela Organização Mundial da Saúde)(1919 Spezzia, S. O papel da odontohebiatria na saúde bucal dos adolescentes. Rev Fac Cienc Med (Sorocaba). 2021;22(1):41-42. https://doi.org/10.23925/1984-4840.2020v22i1a10
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) e possuir autorização de um responsável se tivesse menos de 18 anos.

Protocolo do estudo

A escolha da escola para a realização da pesquisa ocorreu de forma não probabilística, por acessibilidade. Todos os estudantes convidados receberam informações sobre a pesquisa e, para aqueles que demonstraram interesse em colaborar com o estudo, foram seguidas as exigências éticas a fim de garantir a autonomia na participação e o sigilo das informações fornecidas.

A definição dos perfis de participação no bullying (vítimas, vítimas-agressoras e agressores), o perfil de não envolvido, bem como a quantidade e o tipo de agressão praticada ou sofrida pelos estudantes (física, verbal ou relacional), foram obtidas por meio da aplicação da Escala de Vitimização e Agressão entre Pares - EVAP(2020 Cunha JM, Weber LND, Steiner Neto P. Escala de Vitimização e Agressão entre Pares (EVAP). In: Weber LND, Dessen MA, (Eds.). Pesquisando a família: instrumentos para coleta e análise de dados. Curitiba: Juruá; 2009. p. 103-14.). O risco para transtornos alimentares foi mensurado pelo Eating Attitudes Test (EAT-26)(2121 Bigheti F, Santos CB, Santos JE, Ribeiro RPP. Tradução e avaliação do Eating Attitudes Test em adolescentes do sexo feminino de Ribeirão Preto. J Bras Psiquiatr [Internet]. 2004[cited 2022 Jan 5];53(6):339-46. Available from: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lil-403090
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), que forneceu escores que foram utilizados para calcular as médias dos grupos em relação ao total do teste e subescalas: dieta, bulimia e preocupação com alimentos, e autocontrole oral.

Ambos os instrumentos (EVAP e EAT-26) foram aplicados na escola, de forma coletiva, durante o horário de aula. Anteriormente à aplicação, os pesquisadores explicavam aos estudantes como preenchê-los e, no decorrer da aplicação, ficavam de prontidão para o esclarecimento de dúvidas. A coleta de dados em cada sala de aula levou em média 20 minutos.

Análise dos resultados e estatística

Os três perfis de participação no bullying (vítima, vítima-agressora e agressor) e o perfil de não envolvido foram definidos mediante análises de agrupamento (cluster) pelo método hierárquico de Ward(2222 Seidel EJ, Moreira Júnior FJ, Ansuj AP, Noal MRC. Comparação entre o Método Ward e o Método k-médias no agrupamento de produtores de leite. Ciênc Nat. 2008;30(1):7-15. https://doi.org/10.5902/2179460X9737
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), que constrói agrupamentos visando a mínima variância interna. Análises de variância (ANOVA) foram utilizadas para localizar diferenças nas variáveis dependentes em função do perfil de participação no bullying, seguidas de pós-teste de Bonferroni para identificar os grupos em que as diferenças estatísticas foram encontradas. Coeficientes de correlação de Spearman foram calculadas para examinar as relações entre os perfis e a variável risco para transtorno alimentar. Todas as análises foram realizadas no programa R 4.1.2, adotando-se um nível de significância de 5% (p<0,05).

RESULTADOS

A idade dos participantes (N=491) variou entre 10 e 18 anos, média de 14,3 anos (DP=1,7 anos). Em relação ao sexo, 276 (56,2%) eram do sexo feminino e 215 (43,8%) do sexo masculino. O envolvimento em situações de bullying foi de 61,1% (n=300), subdividido nos perfis de vítimas-agressoras (29,3%, n=144), agressores (18,1%, n=89) e vítimas (13,7%, n=67).

Os resultados referentes ao risco para transtorno alimentar estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição do risco para transtorno alimentar segundo o sexo e o perfil de participação no bullying, Passos, Minas Gerais, Brasil, 2019

Um total de 126 participantes, 25,7% da amostra total, apresentaram risco para o desenvolvimento de transtorno alimentar. O grupo das vítimas apresentou o maior percentual de risco (41,8%) e o grupo dos não envolvidos o menor (16,8%), com diferença significativa (p<0,001). Em relação ao sexo, em todos os perfis de participação no bullying, as meninas apresentaram maior proporção de risco para transtorno alimentar em relação aos meninos, conforme demonstrado na Tabela 1.

A Tabela 2 apresenta as comparações por sexo entre os estudantes não envolvidos em bullying e os estudantes envolvidos (vítima, vítima agressora e agressor) em relação ao EAT total e às subescalas de risco para transtornos alimentares.

Tabela 2
Comparação por sexo entre os estudantes envolvidos e não envolvidos no bullying em relação ao Eating Attitudes Test total e às subescalas de risco para transtornos alimentares, Passos, Minas Gerais, Brasil, 2019

Na Tabela 2, a análise de variância revelou a existência de diferenças significativas nas médias do teste EAT para os grupos de meninos (F=7,6, p<0,001) e meninas (F=4,3, p=0,005). O pós-teste de Bonferroni indicou que a diferença significativa para os meninos ocorreu entre o grupo das vítimas (com média mais alta) e os grupos não envolvidos (p<0,001), vítimas-agressoras (p=0,002) e agressores (p=0,015). Para as meninas, houve diferença significativa apenas entre o grupo das vítimas e o grupo das não envolvidas no bullying (p=0,014).

Em relação à subescala Dieta, houve diferença significativa entre as médias dos grupos de meninos (F=3,8, p=0,011), mas apenas entre as vítimas (com média mais alta) e os não envolvidos (p=0,006). Na subescala Controle Oral, apenas os grupos de meninos apresentaram diferenças significativas (F=3,5, p=0,010). As diferenças foram encontradas entre os meninos vítimas (com média mais alta) em relação aos não envolvidos (p=0,003) e às vítimas-agressoras (p=0,03). Foram identificadas diferenças significativas nas subescalas Bulimia e Preocupação com Alimentos para meninos (F=9,6, p<0,001) e meninas (F=4,1, p=0,007). Para os meninos, as diferenças significativas ocorreram entre o grupo das vítimas (com média mais alta) e os grupos não envolvidos (p<0,001), vítimas-agressoras (p<0,001) e agressores (p=0,006). A única diferença encontrada para as meninas foi entre o grupo das vítimas e o grupo das não envolvidas no bullying (p=0,014) (Tabela 2).

Na Tabela 3, são apresentadas as correlações entre os tipos de vitimização e agressão e as variáveis de risco para transtornos alimentares.

Tabela 3
Correlações entre as variáveis de risco para transtorno alimentar e os tipos de agressão e vitimização, Passos, Minas Gerais, Brasil, 2019

Na Tabela 3, o coeficiente de correlação de Spearman indicou que, para os meninos, a vitimização física, a vitimização verbal e a vitimização relacional se correlacionaram significativamente com todas as variáveis de transtornos alimentares. A agressão física apresentou correlação significativa com todas as variáveis das subescalas do EAT-26 (transtorno alimentar), enquanto a agressão verbal se correlacionou significativamente apenas com bulimia e preocupação com alimentos. A agressão relacional se correlacionou com o EAT total, dieta, bulimia e preocupação com alimentos. Nos meninos, as correlações foram positivas, indicando que quanto maior o nível de vitimização ou agressão, maior o nível de transtornos alimentares e vice-versa.

Nas meninas, as correlações significativas ocorreram na vitimização e também foram positivas. Os três tipos de vitimização se correlacionaram significativamente com o EAT total e a bulimia e preocupação com alimentos. Além disso, nas meninas, a vitimização física e a vitimização verbal apresentaram correlações significativas com a dieta. A vitimização verbal e a vitimização relacional se correlacionaram significativamente com o autocontrole oral. Não foram encontradas correlações significativas nas meninas para nenhuma das variáveis relacionadas à agressão e às dimensões dos transtornos alimentares analisadas.

DISCUSSÃO

Nosso estudo aponta que as vítimas de bullying apresentam maior risco para o desenvolvimento de transtornos alimentares. Resultados semelhantes foram identificados em estudos realizados na Colômbia(2323 Giraldo NIB, Castrillón JJC, Cañón SC, Acevedo JAG, Echeverri LM, Pacheco SS, et al. Frecuencia y factores asociados al acoso escolar en colegios de Chinchiná (Colombia), 2014. Psicol Caribe [Internet]. 2016[cited 2022 Jan 5];33(2):312-32. Available from: http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0123-417X2016000300312&lng=es&nrm=iso&tlng=es
http://www.scielo.org.co/scielo.php?scri...
), Chile(2424 Carmona-Torres JA, Cangas AJ, Langer AI, Aguilar-Parra JM, Gallego J. Acoso escolar y su relación con el consumo de drogas y trastornos alimentarios: comparación entre adolescentes de Chile y España. Psicol Conductual [Internet]. 2015[cited 2022 Jan 5];23(3):507-27. Available from: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/ibc-151203
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), Espanha(2424 Carmona-Torres JA, Cangas AJ, Langer AI, Aguilar-Parra JM, Gallego J. Acoso escolar y su relación con el consumo de drogas y trastornos alimentarios: comparación entre adolescentes de Chile y España. Psicol Conductual [Internet]. 2015[cited 2022 Jan 5];23(3):507-27. Available from: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/ibc-151203
https://pesquisa.bvsalud.org/portal/reso...
) e Estados Unidos(1717 Copeland WE, Bulik CM, Zucker N, Wolke D, Lereya ST, Costello EJ. Does childhood bullying predict eating disorder symptoms? a prospective, longitudinal analysis. Int J Eat Disord. 2015;48(8):1141-49. https://doi.org/10.1002/eat.22459
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). Uma possível explicação é que as vítimas geralmente estão acima do peso e, por isso, se tornam alvos dos agressores, pois muitas situações de bullying ocorrem devido à incompreensão e intolerância em relação às diferenças entre as pessoas, especialmente em relação à aparência do corpo(2525 Russo LX. Associação entre vitimização por bullying e índice de massa corporal em escolares. Cad Saude Publica. 2020;36(10):e00182819. https://doi.org/10.1590/0102-311X00182819
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). Isso pode estar relacionado, entre outros fatores, à padronização do corpo pela mídia e pela sociedade, em que a vítima é agredida por não se encaixar no estereótipo de corpo ideal associado à magreza para as meninas ou à definição muscular para os meninos(2626 Santos MA, Oliveira VH, Peres RS, Risk EM, Leonidas C, Oliveira-Cardoso EA. Corpo, saúde e sociedade de consumo: a construção social do corpo saudável. Saude Soc. 2019;28(3):239-52. https://doi.org/10.1590/S0104-12902019170035
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).

Em relação ao sexo, tanto as meninas quanto os meninos que são vítimas apresentaram risco significativo para transtornos alimentares. Esse resultado, além de confirmar a hipótese de que as agressões ocorrem devido ao peso ou aparência corporal das vítimas(2626 Santos MA, Oliveira VH, Peres RS, Risk EM, Leonidas C, Oliveira-Cardoso EA. Corpo, saúde e sociedade de consumo: a construção social do corpo saudável. Saude Soc. 2019;28(3):239-52. https://doi.org/10.1590/S0104-12902019170035
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), pode estar relacionado aos efeitos psicológicos da vitimização. As vítimas podem desenvolver percepções negativas em relação ao próprio corpo e, como resultado, buscar maneiras de alterar sua aparência(1717 Copeland WE, Bulik CM, Zucker N, Wolke D, Lereya ST, Costello EJ. Does childhood bullying predict eating disorder symptoms? a prospective, longitudinal analysis. Int J Eat Disord. 2015;48(8):1141-49. https://doi.org/10.1002/eat.22459
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), como preocupação com alimentos, dietas ou suplementação nutricional, adotando comportamentos compensatórios como vômitos e uso de laxantes, o que as torna mais vulneráveis a transtornos alimentares.

Os resultados em relação às vítimas são consistentes com estudos anteriores que também não encontraram diferenças de gênero(1515 Lee K, Guy A, Dale J, Wolke D. Does psychological functioning mediate the relationship between bullying involvement and weight loss preoccupation in adolescents? a two-stage cross-sectional study. Int J Behav Nutr Phys Act. 2017;14(1):1-11. https://doi.org/10.1186/s12966-017-0491-1
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,1717 Copeland WE, Bulik CM, Zucker N, Wolke D, Lereya ST, Costello EJ. Does childhood bullying predict eating disorder symptoms? a prospective, longitudinal analysis. Int J Eat Disord. 2015;48(8):1141-49. https://doi.org/10.1002/eat.22459
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,2727 Borges F, Barreto MS, Reis P, Vieira CS, Marcon SS. Percepções e atitudes de crianças que vivenciam a obesidade. Rev Rene. 2018;19(1):32-61. https://doi.org/10.15253/2175-6783.2018193261
https://doi.org/10.15253/2175-6783.20181...
). No entanto, um resultado diferente deste estudo foi o fato de que os agressores do sexo masculino também apresentaram risco de transtornos alimentares, contrariando as expectativas de que eles sejam menos afetados pelas consequências negativas da violência que praticam. Um estudo realizado na Colômbia concordou com esses resultados, identificando associações significativas entre o agressor e os transtornos alimentares(2323 Giraldo NIB, Castrillón JJC, Cañón SC, Acevedo JAG, Echeverri LM, Pacheco SS, et al. Frecuencia y factores asociados al acoso escolar en colegios de Chinchiná (Colombia), 2014. Psicol Caribe [Internet]. 2016[cited 2022 Jan 5];33(2):312-32. Available from: http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0123-417X2016000300312&lng=es&nrm=iso&tlng=es
http://www.scielo.org.co/scielo.php?scri...
). Talvez a culpa e o arrependimento pela prática de agressões contra seus colegas levem os agressores a desenvolverem comportamentos alimentares desordenados como uma forma de lidar com esses sentimentos ambivalentes, ou eles podem ter uma maior preocupação com suas características físicas para evitar receberem de volta as agressões que praticam com as vítimas(2828 Oliveira MR, Machado JSA. O insustentável peso da autoimagem: (re)apresentações na sociedade do espetáculo. Ciênc Saúde Colet. 2021;26(7):2663-72. https://doi.org/10.1590/1413-81232021267.08782021
https://doi.org/10.1590/1413-81232021267...
). Esses resultados indicam que os agressores também precisam de cuidados para que o risco de transtornos alimentares não se torne um problema clínico.

Em relação à dieta, apenas as vítimas do sexo masculino, em comparação com as vítimas-agressoras, agressoras e não envolvidas em bullying, apresentaram médias significativamente mais altas, indicando que evitam alimentos de alto valor energético e têm uma preocupação intensa com a forma física. É possível que busquem um “corpo ideal” que esteja mais de acordo com as expectativas de seu grupo de pares, o que pode resultar em maior aceitação social e menos agressões sofridas(2828 Oliveira MR, Machado JSA. O insustentável peso da autoimagem: (re)apresentações na sociedade do espetáculo. Ciênc Saúde Colet. 2021;26(7):2663-72. https://doi.org/10.1590/1413-81232021267.08782021
https://doi.org/10.1590/1413-81232021267...
). As críticas relacionadas ao corpo no contexto de pares, como ocorre nas situações de bullying, podem intensificar a preocupação com o peso corporal e levar à adoção de dietas restritivas. Portanto, o transtorno alimentar no sexo masculino pode estar relacionado à necessidade de se sentir no controle, mesmo que seja apenas do peso. No caso dos homens, as dietas podem não visar apenas a perda de peso, mas, em certos casos, o ganho de peso ou aumento da massa muscular, uma vez que na cultura ocidental, o corpo masculino musculoso é considerado ideal(2929 Silva AMB, Machado WAL, Bellodi AC, Cunha KS, Enumo SRF. Jovens insatisfeitos com a imagem corporal: estresse, autoestima e problemas alimentares. Psico USF. 2018;23(3):483-95, 2018. https://doi.org/10.1590/1413-82712018230308
https://doi.org/10.1590/1413-82712018230...
).

As vítimas do sexo masculino também apresentaram um controle significativamente maior em relação à comida, ou seja, uma maior sensação de pressões ambientais e sociais relacionadas à ingestão de alimentos, o que pode estar relacionado ao resultado da dieta, que por sua vez pode decorrer da maior violência sofrida em relação ao peso e à aparência física. Para os meninos, todos os tipos de vitimização por bullying (física, verbal e psicológica) se correlacionaram com o controle oral, enquanto que para as meninas não houve correlação com a vitimização física. Isso pode significar que os meninos, além de serem alvo de depreciação no contexto do bullying, também sofrem agressões físicas, como socos, murros, chutes, entre outros(44 Alencastro LCS, Silva JL, Komatsu AV, Bernardino FBS, Mello FCM, Silva MAI. Theater of the Oppressed and bullying: nursing performance in school adolescent health. Rev Bras Enferm. 2020;73(1):1-7. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0910
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). Assim, como indicam os resultados, eles podem buscar com maior intensidade alterar seu peso corporal por meio de dietas e, consequentemente, sentir-se mais pressionados por seu grupo social, familiares ou amigos, a ingerirem alimentos.

Em relação à bulimia e preocupação com alimentos, tanto as vítimas do sexo feminino quanto do masculino apresentaram risco significativo de episódios de ingestão compulsiva de alimentos, seguidos de vômitos e outros comportamentos para evitar o ganho de peso. No estudo de Copeland et al.(1717 Copeland WE, Bulik CM, Zucker N, Wolke D, Lereya ST, Costello EJ. Does childhood bullying predict eating disorder symptoms? a prospective, longitudinal analysis. Int J Eat Disord. 2015;48(8):1141-49. https://doi.org/10.1002/eat.22459
https://doi.org/10.1002/eat.22459...
), as vítimas também foram mais vulneráveis a sintomas de bulimia.

No geral, os resultados indicam que, na amostra investigada, as vítimas de bullying do sexo masculino estão mais vulneráveis ao desenvolvimento de transtornos alimentares, o que é preocupante, pois a adolescência é considerada uma fase de alto risco para o desenvolvimento de distúrbios psicológicos, devido às várias transformações em curso: físicas, psicológicas e sociais, que influenciam diretamente a aceitação da própria imagem corporal(3030 Silva N, Silveira MF, Machado IC, Haikal DS, Oliveira e Silva CS, Silva RRV. Autoimagem e satisfação corporal em adolescentes escolares. Rev Bras Obes Nutr Emagrecimento [Internet]. 2019 [cited 2022 Jan 5]:12(75): 948-53. Available from: http://www.rbone.com.br/index.php/rbone/article/view/831
http://www.rbone.com.br/index.php/rbone/...
). Portanto, sofrer bullying pode aumentar os desafios enfrentados por alguns adolescentes, tornando-os ainda mais vulneráveis ao desenvolvimento de transtornos alimentares. Essa situação é especialmente preocupante para os meninos investigados, uma vez que, embora os homens atualmente estejam sendo encorajados a buscar tratamento para transtornos alimentares, as mulheres ainda são mais propensas a buscar ajuda(3131 Cobo B, Cruz C, Dick PC. Desigualdades de gênero e raciais no acesso e uso dos serviços de atenção primária à saúde no Brasil. Ciênc Saúde Colet. 2021;26(9):4021-32. https://doi.org/10.1590/1413-81232021269.05732021
https://doi.org/10.1590/1413-81232021269...
).

Nesse sentido, é importante destacar que a saúde dos homens é um campo ainda em desenvolvimento e a questão dos transtornos alimentares nessa população é geralmente subdiagnosticada, subtratada e pouco compreendida. Além disso, as agressões sofridas em relação ao tamanho ou formato do corpo podem levar os adolescentes a buscar soluções com resultados rápidos que podem ser prejudiciais à saúde, como dietas inadequadas(3232 Ministério da Saúde (BR). Passo a passo PSE. Programa Saúde na Escola: tecendo caminhos da intersetorialidade [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2011 [cited 2018 Jul 27]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/passo_a_passo_programa_saude_escola.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Limitações do estudo

O tamanho amostral utilizado limita a generalização dos nossos resultados. A natureza transversal do estudo não permite estabelecer relações de causalidade, embora as associações identificadas tenham grande relevância científica e clínica. Outra limitação é que os dados foram coletados por meio de instrumentos de autorrelato, o que pode envolver viés de memória ou resultar em menor envolvimento dos participantes ao responderem as questões apresentadas, especialmente os estudantes agressores que podem ter receios de serem reconhecidos de alguma forma, mesmo que não sejam identificados nos questionários. No entanto, esses instrumentos estão validados para a população brasileira e não temos motivos para considerar sua baixa relevância comunitária.

Contribuições para a área da Enfermagem, Saúde ou Política Pública

O estudo aborda um tema inserido nas propostas e iniciativas nacionais e internacionais de promoção de cultura de paz e saúde na escola, como, por exemplo, a Iniciativa Regional Escuelas Promotoras de la Salud en las Americas, Escolas Promotoras de Saúde e Programa Saúde na Escola(3232 Ministério da Saúde (BR). Passo a passo PSE. Programa Saúde na Escola: tecendo caminhos da intersetorialidade [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2011 [cited 2018 Jul 27]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/passo_a_passo_programa_saude_escola.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
). Nesse contexto, promover saúde na escola é também garantir a emancipação e o empoderamento individual e coletivo dos estudantes, sobretudo quando se contribui com o rompimento do preconceito, da discriminação e de ciclos de violência sistemáticas como o bullying.

A Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) também possui como um de seus objetivos prioritários a promoção da cultura da paz e da boa convivência, o que envolve, dentre outros aspectos, o favorecimento do respeito à diversidade e redução da violência(3333 Malta DC, Reis AAC, Jaime PC, Otaliba LMN, Silva MMA, Akerman M. O SUS e a Política Nacional de Promoção da Saúde: perspectiva resultados, avanços e desafios em tempos de crise. Ciênc Saúde Colet. 2018;23(6):1799-09. https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.04782018
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). Entretanto, esses são temas ainda pouco explorados na formação e atuação profissional do enfermeiro(3434 Silva JL, Oliveira WA, Mello FCM, Andrade LS, Bazon MR, Silva MAI. Anti-bullying interventions in schools: a systematic literature review. Ciênc Saúde Colet. 2017;22(7):2329-40. https://doi.org/10.1590/1413-81232017227.16242015
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). Estudos indicam que a atuação de profissionais da Atenção Primária à Saúde (APS) na área da violência contra crianças e adolescentes de forma articulada e intersetorial ainda se configura como um desafio(3434 Silva JL, Oliveira WA, Mello FCM, Andrade LS, Bazon MR, Silva MAI. Anti-bullying interventions in schools: a systematic literature review. Ciênc Saúde Colet. 2017;22(7):2329-40. https://doi.org/10.1590/1413-81232017227.16242015
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https://doi.org/10.1111/jocn.13692...
).

Assim, melhorias na qualidade das interações sociais dos estudantes podem ser desenvolvidas por enfermeiros e outros profissionais da saúde em atividades de promoção da saúde na escola como estímulo à boa convivência e ao estabelecimento de uma cultura de não violência, o que, além de prevenir e romper ciclos de violência entre os estudantes, também impede que outros desfechos negativos do bullying escolar ocorram, como o desenvolvimento de transtornos alimentares.

CONCLUSÕES

O risco de desenvolvimento de transtornos alimentares foi maior para o perfil de vítimas, tanto para o sexo masculino quanto para o sexo feminino. Também foram observadas associações entre os meninos e a prática de agressão. Os resultados indicam que as vítimas, especialmente os meninos, são mais vulneráveis às consequências negativas do bullying em relação ao risco de transtornos alimentares.

Considerando que os transtornos alimentares geralmente têm início na adolescência, período em que o bullying pode ocorrer com maior frequência, identificar fatores associados à ocorrência do bullying pode melhorar a compreensão desse tipo de violência e embasar a criação de intervenções anti-bullying e de prevenção de transtornos alimentares. Essas intervenções devem ser interdisciplinares, estimulando a não-violência e promovendo a saúde, com propostas e abordagens baseadas na integração de diferentes setores e na equidade, uma vez que o bullying afeta os estudantes de maneiras distintas, sejam eles vítimas, agressores, vítimas-agressoras ou testemunhas. Ao mesmo tempo, o cuidado oferecido aos casos de bullying e transtornos alimentares requer a definição de grupos-alvo, e este estudo pode auxiliar as equipes da Atenção Primária nesse processo.

DISPONIBILIDADE DE DADOS E MATERIAL

https://doi.org/10.48331/scielodata.AMEZXY

  • FOMENTO
    Este estudo foi financiado pelo processo nº 2018/04570-0 da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Carina Dessotte

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    08 Dez 2022
  • Aceito
    27 Jun 2023
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