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Trabalho e sofrimento mental dos enfermeiros da Região Amazônica do Brasil durante a pandemia de COVID-19

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a relação entre sintomas psicopatológicos e o perfil social, clínico e laboral dos enfermeiros da região Amazônica do Brasil durante a pandemia de COVID-19.

Métodos:

Realizou-se um estudo descritivo de corte transversal online com 261 enfermeiros em 2020. Utilizou-se a Escala de Avaliação de Sintomas-40.

Resultados:

A presença de doenças preexistentes à pandemia associou-se ao psicoticismo (p=0,044). Ter sofrido constrangimentos e/ou violências no trabalho durante a pandemia associou-se à somatização (p=0,025), e a carga horária de trabalho associou-se à ansiedade (p=0,025). Os enfermeiros manifestaram principalmente sintomas relacionados ao medo (33,7%), tensão (34,5%) e sensação de que algo está errado na mente (22,6%).

Conclusões:

Foi observada uma associação significativa entre a carga horária de trabalho e sintomas de ansiedade, o sofrimento de constrangimentos e/ou violências durante o trabalho no contexto da pandemia de COVID-19 e sintomas de somatização, bem como entre doenças preexistentes à COVID-19 e sintomas de psicoticismo.

Descritores:
COVID-19; Saúde Mental; Enfermagem; Ecossistema Amazônico; Sintomas Psicopatológicos

ABSTRACT

Objective:

To assess the relationship between psychopathological symptoms and the social, clinical, and occupational profile of nurses in the Amazon region of Brazil during the COVID-19 pandemic.

Methods:

A descriptive cross-sectional online study was conducted in 2020 with 261 nurses. The Symptom Assessment Scale-40 was utilized.

Results:

The presence of pre-existing conditions before the pandemic was associated with psychotism (p=0.044). Experiencing constraints and/or violence at work during the pandemic was associated with somatization (p=0.025), and working hours were associated with anxiety (p=0.025). Nurses predominantly exhibited symptoms related to fear (33.7%), tension (34.5%), and a sense that something is wrong in the mind (22.6%).

Conclusions:

A significant association was observed between working hours and anxiety symptoms, the experience of constraints and/or violence at work during the COVID-19 pandemic and somatization symptoms, as well as between pre-existing conditions and psychotism symptoms related to COVID-19.

Descriptors:
COVID-19; Mental Health; Nursing; Amazonian Ecosystem; Psychic Symptoms

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar la relación entre los síntomas psicopatológicos y el perfil social, clínico y ocupacional de las enfermeras en la región amazónica de Brasil durante la pandemia de COVID-19.

Métodos:

Se llevó a cabo un estudio descriptivo transversal en línea en 2020 con la participación de 261 enfermeras. Se utilizó la Escala de Evaluación de Síntomas-40.

Resultados:

Se encontró una asociación significativa entre la presencia de condiciones preexistentes antes de la pandemia y el psicoticismo (p=0,044). Experimentar restricciones y/o violencia en el trabajo durante la pandemia se asoció con la somatización (p=0,025), y las horas de trabajo se relacionaron con la ansiedad (p=0,025). En general, las enfermeras presentaron predominantemente síntomas relacionados con el miedo (33,7%), la tensión (34,5%) y la sensación de que algo no está bien en la mente (22,6%).

Conclusiones:

Se observó una asociación significativa entre las horas de trabajo y los síntomas de ansiedad, así como entre la experiencia de restricciones y/o violencia laboral durante la pandemia de COVID-19 y los síntomas de somatización. Además, se encontró una asociación entre las condiciones preexistentes y los síntomas de psicoticismo relacionados con COVID-19.

Descriptores:
COVID-19; Salud Mental; Ecosistema Amazónico; Enfermería; Síntomas Psíquicos

INTRODUÇÃO

Na região Amazônica, fatores como desigualdade, vulnerabilidade social, precariedade da rede de atenção à saúde e ausência histórica de políticas públicas eficientes, associados à pandemia da COVID-19, geraram uma crise profunda de saúde pública que resultou em altas taxas de mortalidade e saturação na assistência à saúde(11 Costa JS, Rodrigues LDS, Silva A, Castro GA, Abitbol R, Liberato MAR, et al. Water, sanitation and the COVID-19 in the Amazon. HOLOS. 2020;5:1-23. https://doi.org/10.15628/holos.2020.10803
https://doi.org/10.15628/holos.2020.1080...

2 Orellana JDY, Cunha GMD, Marrero L, Horta BL, Leite IDC. Explosão da mortalidade no epicentro amazônico da epidemia de COVID-19. Cad Saúde Pública. 2020;36(7):e001200202020. https://doi.org/10.1590/0102-311X00120020
https://doi.org/10.1590/0102-311X0012002...
-33 Rodrigues JC, Rodrigues JC. Condições de desigualdades e vulnerabilidades socioespaciais em cidades da Amazônia Paraense: elementos promovedores da expansão e dispersão da Covid-19? Hygeia. 2020;16:132-42. https://doi.org/10.14393/Hygeia0054603
https://doi.org/10.14393/Hygeia0054603...
).

Os profissionais de enfermagem que estão na linha de frente da COVID-19 representam um grupo de maior risco de infecção e sofrimento psíquico severo(44 Nóbrega MPSS, Kogien M, Marcon SR, Souza AMG, Bittencourt MN, Pena JLC, et al. COVID-19 and the Mental Health of Nursing Professionals in Brazil: associations between Social and Clinical Contexts and Psychopathological Symptoms. Int J Environ Res Public Health. 2022;(19):10766. https://doi.org/10.3390/ijerph191710766
https://doi.org/10.3390/ijerph191710766...
). De acordo com o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), desde o início da pandemia até 6 de dezembro de 2022, a Região Amazônica registrou 5.722 casos de contaminação de um total de 30.502.501 casos no país, com 243 óbitos de um total de 872 casos(55 Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Profissionais infectados com COVID-19 informado pelos enfermeiros responsáveis técnicos/coordenadores[Internet]. 2020[cited 2022 Dec 6]. Available from: http://observatoriodaenfermagem.cofen.gov.br/
http://observatoriodaenfermagem.cofen.go...
).

Estudos prévios sobre o sofrimento mental dos profissionais de enfermagem durante a pandemia mostraram que essa nova realidade está associada ao aumento de sintomas psicopatológicos e níveis críticos de sofrimento, relacionados à faixa etária, carga horária elevada de trabalho, violência e falta de suporte psicológico nas instituições de trabalho(66 Baptista PCP, Lourenção DCA, Silva-Junior JS, Cunha AA, Gallasch CH. Indicadores de sofrimento e prazer em trabalhadores de saúde na linha de frente da COVID-19. Rev Latino-Am Enfermagem. 2022;30:e3555. https://doi.org/10.1590/1518-8345.5707.3555
https://doi.org/10.1590/1518-8345.5707.3...
-77 Alves JS, Gonçalves AMS, Bittencourt MN, Alves VM, Mendes DT, Nóbrega MPSS. Psychopathological symptoms and work status of Southeastern Brazilian nursing in the context of COVID-19. Rev Latino-Am Enfermagem. 2022;30:e3518. http://doi.org/10.1590/1518-8345.5768.3518
http://doi.org/10.1590/1518-8345.5768.35...
).

Embora sejam referências importantes, ambos retratam majoritariamente a realidade dos profissionais de enfermagem da região Sudeste do país, evidenciando a necessidade de estudos que revelem a perspectiva dos profissionais que atuam em uma região vulnerável, com baixa densidade tecnológica em termos de saúde pública, como é o caso da região Amazônica, que foi a primeira a colapsar e conta com um número reduzido de profissionais, representando apenas 8% (54.380) do total de enfermeiros do Brasil (678.146) (88 Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Enfermagem em Números [Internet]. 2022[cited 2022 Dec 07]. Available from: http://www.cofen.gov.br/enfermagem-em-numeros.
http://www.cofen.gov.br/enfermagem-em-nu...
).

No contexto da pandemia, a urgência na condução do trabalho, por vezes precarizado, trouxe desatenção, dificuldade para tomada de decisão e impactos ao bem-estar geral desses trabalhadores(99 Kang L, Li Y, Hu S, Chen M, Yang C, Yang BX, et al. The mental health of medical workers in Wuhan, China dealing with the 2019 novel coronavirus. Lancet Psychiatry. 2020;7(3):e14. https://doi.org/10.1016/S2215-0366(20)30047-X
https://doi.org/10.1016/S2215-0366(20)30...
). Rastrear sintomas psicopatológicos amplia o mapeamento das demandas emocionais dos enfermeiros brasileiros e o desenvolvimento de propostas institucionais de suporte.

OBJETIVO

Avaliar a relação entre sintomas psicopatológicos e o perfil social, clínico e laboral dos enfermeiros da região Amazônica do Brasil durante a pandemia de COVID-19.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo atendeu à Resolução 466/12 e foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Brasil. Todos os entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido online antes de sua inclusão no estudo.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo descritivo de corte transversal seguindo as diretrizes da ferramenta STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology)(1010 Cheng A, Kessler D, Mackinnon R, Chang TP, Nadkarni VM, Hunt EA, et al. Reporting Guidelines for Health Care Simulation Research. J Soc Simul Healthc. 2016;11(4):238-48. https://doi.org/10.1097/SIH.0000000000000150
https://doi.org/10.1097/SIH.000000000000...
). A coleta ocorreu de 22 de abril a 28 de novembro de 2020, período que foi caracterizado como a primeira onda da COVID-19 no Brasil.

População ou amostra, critérios de elegibilidade

Estudo conduzido por meio de amostra não probabilística, utilizando a técnica snowball (1111 Biernacki P, Waldorf D. Snowball sampling: problems and techniques of chain referral sampling. Sociol Methods Res. 1981;10(2):141-63.). Um total de 261 enfermeiros da região Amazônica do Brasil responderam ao questionário do Google® que foi amplamente divulgado e disponibilizado em redes sociais. Os critérios foram: estar exercendo a profissão em qualquer nível de atenção à saúde (assistência direta e/ou administrativa/gerencial durante a pandemia da COVID-19). Para manter a confiabilidade do estudo, foram realizadas as seguintes ações: recolhimento de e-mails para evitar duplicidade de respostas; eliminação de questionários incompletos ou parcialmente preenchidos; manutenção do último formulário enviado pelo participante; e extração e organização dos dados com supervisão de quatro pesquisadores.

Protocolo do estudo

O questionário foi composto por 44 questões relacionadas a dados sociodemográficos, laborais e de saúde, previamente validado e submetido a pré-teste por 13 professores doutores. As variáveis incluíram: idade, sexo, raça, estado civil, renda mensal, carga horária semanal de trabalho, doenças preexistentes, atuação profissional, natureza da instituição de trabalho, tempo de formação/atuação, situação de trabalho, atuação direta na assistência, experiência de sofrimento devido a constrangimentos e/ou violências durante o trabalho, recebimento e tipo de suporte/apoio psicológico/emocional da instituição de trabalho.

Para avaliar sintomas psicopatológicos, foi utilizada a Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40), adaptada e validada no Brasil(1212 Yoshida EMP, Silva, FRCS. Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40): validade e precisão em amostra não-clínica. Psicol Esc Educ. 2007;11(1):89-99. https://doi.org/10.1590/S1413-85572007000100009
https://doi.org/10.1590/S1413-8557200700...
). Essa escala rastreia, por meio de autorrelato, os sintomas relatados nos últimos sete a quinze dias. Ela foi escolhida devido à sua boa consistência interna (alfa de Cronbach entre 0,73 e 0,88) e estabilidade temporal regular entre 7 e 15 dias (r entre 0,40 e 0,82). A escala é composta por quatro subescalas, com 10 itens em cada uma: 1. Ansiedade, 2. Somatização, 3. Obsessividade/Compulsividade e 4. Psicoticismo. O padrão de resposta é do tipo Likert, com três níveis de intensidade: 0 = nenhum sintoma, 1 = sintoma leve e 2 = sintoma grave. Para calcular o escore bruto, os valores de 0 a 2 de cada item são somados e divididos pelo número de itens de cada dimensão. Caso o entrevistado não responda a algum item da escala, a divisão é feita pelo número de itens respondidos (1212 Yoshida EMP, Silva, FRCS. Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40): validade e precisão em amostra não-clínica. Psicol Esc Educ. 2007;11(1):89-99. https://doi.org/10.1590/S1413-85572007000100009
https://doi.org/10.1590/S1413-8557200700...
).

Análise dos resultados e estatística

Os dados foram tabulados no software Excel 2016, posteriormente foram realizados testes estatísticos no software IBM SPSS version 25. Foram calculadas as frequências absolutas e relativas, médias e desvio-padrão (DP). Foram aplicados os testes de comparação de Wilcoxon-Mann-Whitney e Teste Kruskal Wallis (teste F utilizado na ANOVA) e feitas análises univariadas e bivariadas para comparar os domínios da SCL-40-R com o perfil social e clínico. O intervalo de confiança de 95% e o nível de significância de 5% para todos os testes (p ≤ 0,05). A consistência interna da EAS-40 foi avaliada por meio do cálculo do coeficiente alfa de Cronbach.

RESULTADOS

Características da amostra

A amostra foi composta por 261 enfermeiros dos estados da região Amazônica do Brasil, sendo 220 (84,3%) mulheres, na faixa etária de 20 a 39 anos, 159 (60,9%) casados ou em união estável, 132 (50,6%) de raça parda, 83 (31,8%) brancos, 39 (14,9%) negros, com renda mensal inferior a um salário mínimo 14 (5,4%), de um a três salários mínimos 118 (45,3%), de quatro a seis salários mínimos 74 (28,4%) (Salário mínimo vigente no momento da coleta de dados: R$ 1.100,00 = U$ 231,46). A maioria dos profissionais, 159 (60,9%), são os principais cuidadores ou provedores financeiros do lar. A maioria se enquadra na categoria de trabalhadores formais, com carga horária semanal de pelo menos 40 horas ou mais, 158 (60,6%), como servidores públicos, 164 (62,8%), trabalhando na assistência direta ao paciente, 145 (55,6%).

Quanto ao perfil clínico, a maioria não possui doenças clínicas preexistentes à pandemia, 184 (70,5%), dos 77 (29,5%) que possuem, um em cada dez não realiza tratamento, 10 (13%). Quanto ao acompanhamento psicológico e/ou tratamento psiquiátrico, 38 (14,6%) e 36 (13,8%) realizam esse acompanhamento antes da pandemia, respectivamente, e 18 (6,9%) fazem uso de alguma medicação psiquiátrica sem prescrição médica. A maioria, 195 (74,7%), não está hospedada em local sem contato com a família, e teve amigos, familiares e colegas de trabalho contaminados ou falecidos devido à COVID-19, 231 (88,5%) e 145 (55,6%), respectivamente.

Apresentação de sintomas psicopatológicos

Os sintomas psicopatológicos são apresentados na Tabela 01 e demonstram que nos últimos 14 dias os enfermeiros estavam muito preocupados em “sentir medo”, 88 (33,7%), com as “dores musculares (dores no corpo)”, 87 (33,3%), em “sentir-se tenso ou travado”, 90 (34,5%) e com a “ideia de que há algo errado com sua mente”, 59 (22,6%).

Tabela 1
Caracterização da Escala de Avaliação de Sintomas-40-R (SCL-40-R) - respondidos por enfermeiros da região Amazônica do Brasil, N: 261, Brasil, 2020

A Tabela 2 detalha o resultado da consistência interna, por item da EAS-40, e mostrou que os 4 domínios alcançaram índice maior que 0,70 e 0,76, e por item da escala, que ficou entre 0,6 e 0,7.

Tabela 2
Análise detalhada da consistência interna das questões da EAS-40 respondidos por enfermeiros da região Amazônica do Brasil, N:261, Brasil, 2020

A Tabela 3 apresenta os resultados referentes aos sintomas psicopatológicos da SCL-40-R e as variáveis sociodemográficas e laborais. Houve comparação significativa entre as variáveis “presença de doenças preexistentes à pandemia” e o domínio Psicoticismo (p=0,044). A variável “sofreu constrangimentos e/ou violências no percurso de seu trabalho desde o início da pandemia COVID-19” com o domínio da Somatização (p=0,025) e a variável “carga horária de trabalho” e o domínio da Ansiedade (p=0,025).

Tabela 3
Análise de comparação entre os escores da SCL-40-R e dados sociodemográficos, clínicos e laboratoriais de enfermeiros da região Amazônica do Brasil. N: 261, Brasil, 2020

DISCUSSÃO

Este estudo foi conduzido com enfermeiras casadas, pardas, com idades entre 20 e 39 anos e renda salarial de até três salários mínimos, trabalhando 40 horas ou mais por semana, na região amazônica brasileira. Essa região sofreu duramente as consequências da pandemia, com três de seus estados apresentando maior incidência de casos de COVID-19, tornando-se um epicentro da crise de saúde pública devido à desigualdade social e à ausência de políticas públicas eficazes, além da falta dos principais recursos para o atendimento das pessoas afetadas pela doença (11 Costa JS, Rodrigues LDS, Silva A, Castro GA, Abitbol R, Liberato MAR, et al. Water, sanitation and the COVID-19 in the Amazon. HOLOS. 2020;5:1-23. https://doi.org/10.15628/holos.2020.10803
https://doi.org/10.15628/holos.2020.1080...
-22 Orellana JDY, Cunha GMD, Marrero L, Horta BL, Leite IDC. Explosão da mortalidade no epicentro amazônico da epidemia de COVID-19. Cad Saúde Pública. 2020;36(7):e001200202020. https://doi.org/10.1590/0102-311X00120020
https://doi.org/10.1590/0102-311X0012002...
,1313 Mendonça FD, Rocha SS, Pinheiro DLP, Oliveira SV. North region of Brazil and the COVID-19 pandemic: socioeconomic and epidemiologic analysis. J Health NPEPS. 2020;5(1):20-37. https://doi.org/10.30681/252610104535
https://doi.org/10.30681/252610104535...
).

É importante destacar que não foi identificada correlação entre idade, cor, estado civil ou renda mensal e os sintomas psicopatológicos. No entanto, a predominância em relação à idade, sexo e estado civil está de acordo com outros estudos realizados, inclusive durante a pandemia (1414 Araujo MAN, Lunardi Filho WD, Alvarenga MRM, Oliveira RD, Souza JC, Vidmantas S. Perfil sociodemográfico dos enfermeiros da rede hospitalar. Rev Enferm UFPE. 2017;11(supl.11):4716-25. https://doi.org/10.5205/reuol.11138-99362-1-SM.1111sup201723
https://doi.org/10.5205/reuol.11138-9936...

15 Gomes MP, Barbosa DJ, Gomes AMT, Souza FBA, Paula GS. Perfil dos profissionais de enfermagem que estão atuando durante a pandemia do novo coronavírus. J Nurs Health. 2020;10(4). https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.18921
https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.189...

16 Grillo LP, Albuquerque NR, Vieira NC, Mezadri T, Lacerda LLV. Fatores de risco e proteção para o desenvolvimento de doenças crónicas em profissionais de enfermagem. Rev Enferm Ref. 2018;4(18):63-71. https://doi.org/10.12707/RIV18007
https://doi.org/10.12707/RIV18007...
-1717 Padilha KG, Barbosa RL, Andolhe R, Oliveira EM, Ducci AJ, Bregalda RS, et al. Carga de trabalho de enfermagem, estresse/burnout, satisfação e incidentes em unidade de terapia intensiva de trauma. Texto Contexto Enferm. 2017;26(3). https://doi.org/10.1590/0104-07072017001720016
https://doi.org/10.1590/0104-07072017001...
). Esses resultados relacionados ao estado civil levam a uma reflexão sobre as dificuldades que essas profissionais podem enfrentar ao equilibrar o trabalho e as responsabilidades em casa, incluindo o medo de transmitir a doença para suas famílias. Isso pode resultar no distanciamento familiar e, consequentemente, ter um impacto psicológico nesses profissionais (1515 Gomes MP, Barbosa DJ, Gomes AMT, Souza FBA, Paula GS. Perfil dos profissionais de enfermagem que estão atuando durante a pandemia do novo coronavírus. J Nurs Health. 2020;10(4). https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.18921
https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.189...
).

Em relação à cor, os resultados desta pesquisa diferem de outro estudo sobre profissionais de enfermagem (1818 Lombardi MR, CamposVP. A Enfermagem no Brasil e os contornos de gênero, raça/cor e classe social na formação no campo profissional. Rev ABET. 2018;17(1):28-46. https://doi.org/10.22478/ufpb.1676-4439.2018v17n1.41162
https://doi.org/10.22478/ufpb.1676-4439....
), que apontou uma presença majoritariamente branca e baixa representação de enfermeiros negros. Quanto à jornada de trabalho, observou-se que 60,6% dos profissionais trabalham 40 horas por semana ou mais. Essas informações também são encontradas na literatura, que destaca a frequente jornada dupla de trabalho das enfermeiras, o que resulta em menos tempo com a família, lazer e sobrecarga física e mental (1717 Padilha KG, Barbosa RL, Andolhe R, Oliveira EM, Ducci AJ, Bregalda RS, et al. Carga de trabalho de enfermagem, estresse/burnout, satisfação e incidentes em unidade de terapia intensiva de trauma. Texto Contexto Enferm. 2017;26(3). https://doi.org/10.1590/0104-07072017001720016
https://doi.org/10.1590/0104-07072017001...
,1919 Dias MO, Souza NVDO, Penna LHG, Gallasch CH. Percepção das lideranças de enfermagem sobre a luta contra a precarização das condições de trabalho. Rev Esc Enferm USP. 2019;53. https://doi.org/10.1590/S1980-220X2018025503492
https://doi.org/10.1590/S1980-220X201802...
).

Um fato relevante é que 159 (60,9%) dos profissionais são responsáveis por cuidar de suas famílias e prover estabilidade financeira. Isso, aliado à pressão social de gênero e à falta de tempo para a família, pode levar à insatisfação no trabalho (1414 Araujo MAN, Lunardi Filho WD, Alvarenga MRM, Oliveira RD, Souza JC, Vidmantas S. Perfil sociodemográfico dos enfermeiros da rede hospitalar. Rev Enferm UFPE. 2017;11(supl.11):4716-25. https://doi.org/10.5205/reuol.11138-99362-1-SM.1111sup201723
https://doi.org/10.5205/reuol.11138-9936...
,2020 Cui S, Zhang L, Yan H, Shi Q, Jiang Y, Wang Q, et al. Experiences and Psychological Adjustments of Nurses Who Voluntarily Supported COVID-19 Patients in Hubei Province, China. Psychol Res Behav Manag. 2020;13:1135-45. https://doi.org/10.2147/PRBM.S283876
https://doi.org/10.2147/PRBM.S283876...
-2121 Souza LPS, Souza AG. Enfermagem brasileira na linha de frente contra o novo Coronavírus: quem cuidará de quem cuida? J Nutr Health [Internet]. 2020;10:e20104005. https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.18444
https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.184...
). Além disso, a responsabilidade de ser o principal provedor também gera medo e incerteza, especialmente durante a pandemia, o que pode afetar a saúde mental dos profissionais e a qualidade da assistência que prestam (2020 Cui S, Zhang L, Yan H, Shi Q, Jiang Y, Wang Q, et al. Experiences and Psychological Adjustments of Nurses Who Voluntarily Supported COVID-19 Patients in Hubei Province, China. Psychol Res Behav Manag. 2020;13:1135-45. https://doi.org/10.2147/PRBM.S283876
https://doi.org/10.2147/PRBM.S283876...
-2121 Souza LPS, Souza AG. Enfermagem brasileira na linha de frente contra o novo Coronavírus: quem cuidará de quem cuida? J Nutr Health [Internet]. 2020;10:e20104005. https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.18444
https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.184...
).

É importante ressaltar que, quando esses profissionais precisam se ausentar devido ao sofrimento vivenciado, muitas vezes ocorre um desfalque na equipe, sobrecarregando os colegas. Isso torna a jornada de trabalho desses colegas mais difícil, resultando em insatisfação com o ambiente de trabalho (2121 Souza LPS, Souza AG. Enfermagem brasileira na linha de frente contra o novo Coronavírus: quem cuidará de quem cuida? J Nutr Health [Internet]. 2020;10:e20104005. https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.18444
https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.184...
).

Destaca-se neste estudo que todos os domínios da escala EAS-40 apresentaram escores elevados, independentemente do gênero, quando comparados a um estudo anterior (1212 Yoshida EMP, Silva, FRCS. Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40): validade e precisão em amostra não-clínica. Psicol Esc Educ. 2007;11(1):89-99. https://doi.org/10.1590/S1413-85572007000100009
https://doi.org/10.1590/S1413-8557200700...
). No que se refere ao domínio Psicoticismo, observou-se que os enfermeiros que possuíam doenças clínicas preexistentes apresentaram maior probabilidade de ter sintomas psicóticos.

Para compreender essa relação, os autores afirmam que o exercício/trabalho na profissão de enfermagem implica em fatores de risco para doenças crônicas, que somados à presença de cansaço e estresse ocupacional, promovem a falta de tempo para atividades de autocuidado, o que propicia o surgimento de doenças e sintomas psicopatológicos (1616 Grillo LP, Albuquerque NR, Vieira NC, Mezadri T, Lacerda LLV. Fatores de risco e proteção para o desenvolvimento de doenças crónicas em profissionais de enfermagem. Rev Enferm Ref. 2018;4(18):63-71. https://doi.org/10.12707/RIV18007
https://doi.org/10.12707/RIV18007...
).

Acredita-se que a comparação significativa entre a variável de doenças clínicas preexistentes e a pontuação no domínio Psicoticismo pode ser explicada por estudos anteriores(1616 Grillo LP, Albuquerque NR, Vieira NC, Mezadri T, Lacerda LLV. Fatores de risco e proteção para o desenvolvimento de doenças crónicas em profissionais de enfermagem. Rev Enferm Ref. 2018;4(18):63-71. https://doi.org/10.12707/RIV18007
https://doi.org/10.12707/RIV18007...
,2222 Larré MC, Abud ACF, Inagaki ADM. A relação da Síndrome de Burnout com os profissionais de enfermagem: revisão integrativa. Nursing [Internet]. 2018 [cited 2022 Dec 07];21(237):2018-23. Available from: http://www.revistanursing.com.br/revistas/237-Fevereiro2018/A_relacao_da_sindrome_de_burnout.pdf
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). A enfermagem apresenta fatores de risco para o desenvolvimento de doenças crônicas, como excesso de peso e tabagismo, que são precursores dessas doenças. Além disso, a combinação de cansaço e estresse no trabalho faz com que os enfermeiros tenham pouco tempo para cuidar de sua saúde, o que pode resultar em sintomas como Burnout e psicoticismo.

Não obstante, pode estar associado o fato de que, no contexto da pandemia, a enfermagem vivenciou situações laborais insatisfatórias na prática assistencial, como a ausência de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e a ocorrência de agressões verbais, físicas e psicológicas, causando danos físicos, psíquicos, morais, discriminação e preconceito por parte de uma parcela da sociedade(2323 Robazzi MLCC, Terra FS, Martins JT, Silva ALO, Piagge CSLD, Bittencourt GKGD, Santos LD. Violência ocupacional antes e em tempos da pandemia da COVID-19: ensaio teórico e reflexivo. Braz J Health Rev. 2020;3(6):19042-64. https://doi.org/10.34119/bjhrv3n6-289
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24 Fontes ARS, Oliveira CER, Domingos ORS, Silva RAC, Maia LFS, Sanches AM, et al. Pandemia da COVID-19 e a violência ocupacional: uma reflexão à luz da literatura. Rev Remecs. 2021;1(esp):64-68, http://doi.org/10.24281/rremecs2021.1.esp.64-68
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-2525 Silva LO, Silva KTS, Costa BT, Ribeiro GFGBE, Casimiro FCC, Almeida BCR, et al. A violência sofrida pelos profissionais de enfermagem no ambiente de trabalho. Rev Eletrôn Acervo Saúde. 2021;13(8):e8321. https://doi.org/10.25248/reas.e8321.2021
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).

No domínio Psicoticismo, os enfermeiros lidam com problemas de natureza física, como dores nas costas e nos quadris (82, 31,4%), e emocionais, como o medo (88, 33,7%), aspectos que potencializam o sofrimento mental desses profissionais. Embora presentes em uma parcela da amostra, pensamentos sobre acabar com a própria vida (222, 85,1%), sentir-se sem importância (134, 51,3%) e não ter medo de sair de casa sozinhos (163, 62,5%) indicam tentativas de alcançar um equilíbrio biopsicossocial razoável que os enfermeiros buscam diante das circunstâncias, sugerindo que esses profissionais se esforçam para minimizar os riscos de adoecimento.

Quanto ao domínio Obsessividade-Compulsividade, houve uma comparação significativa entre as variáveis do estudo. Os enfermeiros lidam com preocupações relacionadas às dores musculares (185, 70,8%) e sentem falta de esperança em relação ao futuro (159, 60,9%).

Outro destaque do estudo refere-se à comparação significativa entre a variável de ter sofrido constrangimentos e/ou violências no decorrer do trabalho e a pontuação no domínio Somatização. Acredita-se que esses enfermeiros foram impactados negativamente pela violência sofrida da sociedade, devido ao medo vivenciado, à infodemia e às notícias falsas sobre os meios de transmissão da doença, com efeitos prejudiciais para a saúde mental dos enfermeiros(2626 Amaro AAS, Melo ESJ. Reflexões acerca da "infodemia" relacionada à COVID-19. Rev Min Enferm. 2021;25:e-1360. https://doi.org/10.5935/1415.2762.20210008
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).

A violência gera revolta e sofrimento, sentimento de culpa, preocupação, tensão, estresse, desespero, raiva, medo, tristeza, frustração e desinteresse em atuar na área, sentimentos que, a longo prazo, geram repercussões negativas para a saúde mental dos enfermeiros e causam a redução do número de profissionais (2525 Silva LO, Silva KTS, Costa BT, Ribeiro GFGBE, Casimiro FCC, Almeida BCR, et al. A violência sofrida pelos profissionais de enfermagem no ambiente de trabalho. Rev Eletrôn Acervo Saúde. 2021;13(8):e8321. https://doi.org/10.25248/reas.e8321.2021
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).

A violência gera revolta e sofrimento, sentimento de culpa, preocupação, tensão, estresse, desespero, raiva, medo, tristeza, frustração e desinteresse em atuar na área (2727 Nebesniak E. Violência psicológica contra profissionais de enfermagem: percepções antes e após a pandemia COVID-19[Dissertação]. Guarapuava: Centro Universitário Guairacá; 2020.-2828 Silva Junior RM. Autoconsciência em adolescentes e adultos e indicadores psicopatológicos: análise sincrônica e diacrônica de suas relações [Tese]. Recife: Universidade Federal de Pernambuco; 2019.). Esses sentimentos podem, a longo prazo, gerar repercussões negativas para a saúde dos profissionais de enfermagem, bem como causar a redução do número de profissionais. Além disso, a somatização dos efeitos negativos do ambiente de trabalho pode levar a diversas problemáticas, incluindo distúrbios musculoesqueléticos (2727 Nebesniak E. Violência psicológica contra profissionais de enfermagem: percepções antes e após a pandemia COVID-19[Dissertação]. Guarapuava: Centro Universitário Guairacá; 2020.,2929 Shoji S, Souza NVDO, Farias SNP. Impacto do ambiente laboral no processo saúde doença dos trabalhadores de enfermagem de uma unidade ambulatorial especializada. REME Rev Min Enferm. 2015;19(1):43-8. https://doi.org/10.5935/1415-2762.20150004
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) e a diminuição na qualidade da assistência à saúde devido aos sentimentos de insatisfação e medo experimentados pelos profissionais (2727 Nebesniak E. Violência psicológica contra profissionais de enfermagem: percepções antes e após a pandemia COVID-19[Dissertação]. Guarapuava: Centro Universitário Guairacá; 2020.-2828 Silva Junior RM. Autoconsciência em adolescentes e adultos e indicadores psicopatológicos: análise sincrônica e diacrônica de suas relações [Tese]. Recife: Universidade Federal de Pernambuco; 2019.,3030 Martins BS, Pereira MC. Violência ocupacional na enfermagem. Res, Soc Dev. 2021;10(7):e50910717246-e50910717246. https://doi.org/10.33448/rsd-v10i7.17246
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).

No que se refere ao domínio Somatização, os enfermeiros enfrentam dificuldade de concentração (82, 31,4%) e sentem-se tensos (90, 34,5%). Considerando essas manifestações no cotidiano e a carga horária de trabalho elevada (158, 60,6%), eles convivem com a iminência de cometer erros na condução do processo de trabalho de enfermagem. Ao mesmo tempo, fisicamente podem estar dispostos quando não sentem fraqueza em partes do corpo (125, 47,9%) e não sentem peso nos braços e nas pernas (136, 52,1%). Emocionalmente, não se sentem desconfortáveis quando as pessoas os observam ou falam sobre eles (153, 58,6%) e não têm desejo de quebrar ou destruir coisas (189, 72,4%). Esses aspectos podem remeter a um perfil de resistência intrínseca ao trabalho, mas também são influenciados pelas demandas do momento que estão enfrentando, numa tentativa de serem resilientes.

A comparação significativa entre a pontuação do domínio Ansiedade e a variável carga horária de trabalho se destacou neste estudo. Pesquisas mostram que a carga de trabalho intensa no cuidado de pacientes com COVID-19 contribui para o sofrimento psicológico dos enfermeiros (3131 Appel AP, Carvalho ARS, Santos RP. Prevalência e fatores associados à ansiedade, depressão e estresse numa equipe de enfermagem COVID-19. Rev Gaúcha Enferm. 2021;42(1):e20200403. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2021.20200403
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-3232 Avanian JZ. Mental Health Needs of Health Care Workers Providing Frontline COVID-19 Care: Editor's Comment COVID-1. JAMA [Internet]. 2020[cited 2020 May 13]. Available from: https://jamanetwork.com/channels/health-forum/fullarticle/2764228
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), e quanto maior o tempo de serviço, menor será o descanso e o convívio familiar, levando ao estresse físico e mental (1515 Gomes MP, Barbosa DJ, Gomes AMT, Souza FBA, Paula GS. Perfil dos profissionais de enfermagem que estão atuando durante a pandemia do novo coronavírus. J Nurs Health. 2020;10(4). https://doi.org/10.15210/jonah.v10i4.18921
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).

No domínio Ansiedade, os enfermeiros enfrentam a carga horária de trabalho, o que repercute em preocupações retratadas em ondas de terror ou pânico (97, 37,2%) e em sentimentos de solidão (125, 47,9%) e de que há algo errado em sua mente (118, 45,2%), em função da emergência da situação vivida na região Amazônica.

Considerando que a amostra do presente estudo é composta majoritariamente por enfermeiras casadas, que trabalham mais de 40 horas semanais e provavelmente enfrentam demandas relacionadas ao apoio nos cuidados com suas famílias, além do medo de serem vetores da doença(3333 Rezio LDA, Oliveira E, Queiroz AM, Sousa ARD, Zerbetto SR, Marcheti PM, et al. Neoliberalism and precarious work in nursing in the COVID-19 pandemic: repercussions on mental health. Rev Esc Enferm USP. 2022;56:e20210257. https://doi.org/10.1590/1980-220X-REEUSP-2021-0257
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), a obrigação de fornecer cuidados de qualidade, juntamente com as responsabilidades inerentes à profissão e o trabalho precário a longo prazo(3434 Queiroz AM, Sousa AR, Moreira WC, Nóbrega MPSS, Santos MB, Barbosa LJH, et al. O ‘NOVO’ da COVID-19: impactos na saúde mental de profissionais de enfermagem? Acta Paul Enferm. 2021;34:eAPE02523. https://doi.org/10.37689/acta-ape/2021AO02523
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), somados à sobrecarga de trabalho, contribuem para o desequilíbrio emocional dessas profissionais(3535 Teixeira, CFS, Matos CS, Souza EA, Lisboa ES, Pinto ICM, Andrade RA, et al. A saúde dos profissionais de saúde no enfrentamento da pandemia de Covid-19. Ciênc Saúde Coletiva. 2020;25(9):3465-74. https://doi.org/10.1590/1413-81232020259.19562020
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).

No entanto, é necessário fazer uma crítica diante do colapso regional, da precariedade da rede de atenção à saúde e da condução política da pandemia na região Amazônica, condições que exigiram tanto dos enfermeiros a ponto de levá-los à exaustão física, emocional, medo e pânico ao cuidar de pessoas gravemente doentes, muitas vezes de seus próprios familiares e colegas de trabalho, e sem equipamentos de proteção individual. Além disso, eles tiveram que lidar com seu próprio sofrimento mental diante da falta de suporte psicológico.

Nesse sentido, estudos destacam a importância do acolhimento, do atendimento à crise e da criação de equipes de suporte psicológico, incluindo ações psicossociais presenciais ou online, que contribuem para minimizar o sofrimento psíquico dos enfermeiros. No ambiente de trabalho, medidas que permitem a reorganização do processo de trabalho, como a adoção de turnos mais curtos, a separação de equipes entre cuidadores e não cuidadores de pessoas com COVID-19 e a capacitação dos profissionais para a padronização do trabalho, são possíveis estratégias(3232 Avanian JZ. Mental Health Needs of Health Care Workers Providing Frontline COVID-19 Care: Editor's Comment COVID-1. JAMA [Internet]. 2020[cited 2020 May 13]. Available from: https://jamanetwork.com/channels/health-forum/fullarticle/2764228
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,3535 Teixeira, CFS, Matos CS, Souza EA, Lisboa ES, Pinto ICM, Andrade RA, et al. A saúde dos profissionais de saúde no enfrentamento da pandemia de Covid-19. Ciênc Saúde Coletiva. 2020;25(9):3465-74. https://doi.org/10.1590/1413-81232020259.19562020
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).

Limitações do Estudo

As limitações do estudo recaem na amostra não probabilística e na técnica snowball para a captação dos participantes, que podem interferir na generalização dos resultados. No entanto, vale ressaltar que, devido ao distanciamento social, essa foi a estratégia mais viável para a coleta de dados sobre a saúde mental dos enfermeiros da região. Além disso, o fato de a amostra ser majoritariamente feminina impossibilita a generalização dos dados para a população em geral.

Contribuições para a Área

Os enfermeiros da região Amazônica tiveram um papel fundamental na condução da atenção à saúde da população durante o auge da pandemia da COVID-19. Esses achados podem se traduzir em medidas de suporte para essa categoria em tempos presentes e futuros, para além do contexto pandêmico que ainda persiste. Sugere-se a realização de mais estudos que incluam um maior número de enfermeiros da região Amazônica, a fim de aprofundar os impactos na saúde mental diante de uma realidade em que os investimentos econômicos e políticos ainda não mudaram.

CONCLUSÕES

A pandemia de COVID-19 teve um impacto direto na saúde física e mental dos enfermeiros da região Amazônica. Foi observada uma associação significativa entre a carga horária de trabalho e sintomas de ansiedade, experiência de constrangimentos e/ou violências durante o trabalho no contexto da pandemia de COVID-19 e sintomas de somatização, bem como entre doenças preexistentes à COVID-19 e sintomas de psicoticismo.

  • EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
  • EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes
  • FOMENTO
    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e ao Ministério da Saúde (MS). Chamada MCTIC/CNPq/FNDCT/MS/SCTIE/Decit nº 07/2020 - Pesquisas para enfrentamento da COVID-19, suas consequências e outras síndromes respiratórias agudas graves, pelo apoio financeiro, Processo nº 4011002020.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Jan 2023
  • Aceito
    12 Maio 2023
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