Transtornos mentais comuns em pacientes transplantados com células-tronco hematopoéticas: revisão de escopo

RESUMO

Objetivo:

mapear os transtornos mentais comuns recorrentes em pacientes submetidos ao transplante de células-tronco hematopoéticas.

Métodos:

trata-se de revisão de escopo realizada em janeiro de 2022 em bases de dados eletrônicas e repositórios de dissertações e tese. Foram incluídas publicações que respondessem à questão de pesquisa, atendessem ao objetivo do estudo e que estivessem disponíveis na íntegra em meio eletrônico, em qualquer idioma.

Resultados:

a amostra foi composta por 28 estudos, dos quais 14 foram publicados nos Estados Unidos da América. Os transtornos mentais comuns encontrados foram os transtornos depressivos, de ansiedade, estresse pós-traumático e de humor. Foram citados 20 sintomas, entre os mais prevalentes estão a fadiga e distúrbios do sono/insônia.

Conclusões:

evidenciaram-se a dificuldade e a importância de realizar o diagnóstico diferencial desses transtornos, uma vez que seus sintomas podem ser confundidos com outros problemas de saúde e têm forte potencial para interferir na evolução do paciente.

Descritores:
Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas; Transplante de Medula Óssea; Transtornos Mentais; Saúde Mental; Revisão

ABSTRACT

Objective:

to map common recurrent mental disorders in patients undergoing hematopoietic stem cell transplantation.

Methods:

this is a scoping review carried out in January 2022 in electronic databases and repositories of dissertations and thesis. Studies that answered the research question, met the objective of the study and were available in full electronically, in any language, were included.

Results:

the sample consisted of 28 studies, 14 of which were published in the United States of America. The common mental disorders found were depressive, anxiety, post-traumatic stress and mood disorders. Twenty symptoms were mentioned, among the most prevalent are fatigue and sleep disorders/insomnia.

Conclusions:

the difficulty and importance of carrying out the differential diagnosis of these disorders were highlighted, since their symptoms can be confused with other health problems and have a strong potential to interfere with patients’ evolution.

Descriptors:
Hematopoietic Stem Cells Transplantation; Bone Marrow Transplantation; Mental Disorders; Mental Health; Review

RESUMEN

Objetivo:

mapear los trastornos mentales recurrentes comunes en pacientes sometidos a trasplante de células madre hematopoyéticas.

Métodos:

se trata de una revisión de alcance realizada en enero de 2022 en bases de datos electrónicas y repositorios de disertaciones y tesis. Se incluyeron publicaciones que respondieron a la pregunta de investigación, cumplieron con el objetivo del estudio y estaban disponibles en su totalidad en formato electrónico, en cualquier idioma.

Resultados:

la muestra estuvo compuesta por 28 estudios, 14 de los cuales fueron publicados en los Estados Unidos de América. Los trastornos mentales comunes encontrados fueron depresión, ansiedad, estrés postraumático y trastornos del estado de ánimo. Se mencionaron 20 síntomas, entre los más prevalentes se encuentran fatiga y trastornos del sueño/insomnio.

Conclusiones:

se destacó la dificultad e importancia de realizar el diagnóstico diferencial de estos trastornos, ya que sus síntomas pueden confundirse con otros problemas de salud y tienen un fuerte potencial de interferir en la evolución del paciente.

Descriptores:
Trasplante de Células Madre Hematopoyéticas; Trasplante de Médula Ósea; Trastornos Mentales; Salud Mental; Revisión

INTRODUÇÃO

O transplante de células-tronco hematopoéticas (TCTH) consiste na infusão de células progenitoras hematopoéticas, as quais se destacam pela indiferenciação e autorrenovação celular. É um procedimento que envolve a eliminação dos sistemas hematopoético e imunológico dos pacientes por meio de quimioterapia e/ou radioterapia, com substituição por células progenitoras hematopoéticas extraídas da medula óssea, por coleta de sangue periférico ou sangue de cordão umbilical e placentário, para o tratamento de doenças onco-hematológicas, imunológicas, autoimunes, alguns tumores sólidos, entre outras(¹).

O TCTH foi realizado pela primeira vez em 1957, e desde então estima-se que mais de 50.000 procedimentos sejam realizados anualmente em todo o mundo(²). Nos últimos anos, o número de TCTH realizados nos Estados Unidos da América (EUA) tem aumentado, chegando a mais de 22 mil procedimentos no ano de 2018(³).

O TCTH pode ser classificado em alogênico, com doador com antígeno leucocitário humano compatível, aparentado ou não; autólogo, em que são aplicadas células do próprio paciente; e singênico, no qual o doador e o receptor são gêmeos idênticos(⁴). Além disso, o TCTH é um tratamento que demanda cuidados da equipe multiprofissional a longo prazo, devido ao nível de complexidade, agressividade e envolvimento de riscos que predispõem o paciente a um amplo espectro de intercorrências, as quais necessitam ser manejadas a fim de que não ameacem sua vida ou afetem sua sobrevida e qualidade de vida(⁵).

Nesse sentido, o processo terapêutico causa alterações significativas no cotidiano do paciente para além das complicações físicas(¹). Soma-se a isso a complexidade, as intercorrências e o incômodo, causados pela doença e terapia. Assim, há a possibilidade de essas mudanças abruptas interferirem no domínio social e emocional do indivíduo e torná-lo suscetível ao desenvolvimento de transtornos mentais comuns (TMC)(⁶).

Os TMC são um conjunto sintomatológico que não preenche critérios para o diagnóstico de depressão ou ansiedade pelo Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM), registrados na Classificação Internacional de Doenças 10 (CID-10). Tais transtornos são caracterizados por sintomas não psicóticos, como irritabilidade, insônia, fadiga, dificuldade de concentração, problemas de memória, sentimentos de inutilidade e queixas somáticas, gerando sofrimento psíquico e prejuízos sociais para o indivíduo(⁷-⁸).

Essas manifestações podem ocorrer entre os pacientes submetidos ao TCTH, assim como diferentes formas de sofrimento mental, mesmo em pacientes sem histórico psiquiátrico anterior. Tal fato evidencia a importância do apoio socioemocional antes, durante e após a realização do TCTH(⁹-¹⁰).

Ao considerar essas comorbidades mentais, bem como a relevância de seu reconhecimento precoce para o início de uma abordagem efetiva multiprofissional, a presente pesquisa buscou responder à seguinte questão norteadora: quais os TMC mais recorrentes em pacientes submetidos ao TCTH?

OBJETIVO

Mapear os TMC recorrentes em pacientes submetidos ao TCTH.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Por se tratar de um estudo que utilizou dados de domínio público e não envolveu seres humanos, não houve necessidade de apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Porém cabe ressaltar que os estudo selecionados para a amostra final foram devidamente referenciados.

Desenho do estudo

Trata-se de revisão de escopo, desenvolvida com base nas orientações do Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR)(¹¹), orientada a partir do método do JBI Reviewer’s Manual(¹²), com o protocolo de pesquisa e a lista de referências dos estudos incluídos na amostra final, registrados no Open Science Framework (OSF) (https://doi.org/10.17605/OSF.IO/XMGAH).

Este tipo de estudo tem a finalidade de identificar, mapear, sintetizar as evidências e lacunas do conhecimento existentes em torno de um determinado objeto de estudo. O processo de elaboração conserva o rigor metodológico por meio do seguinte delineamento: identificação da questão de pesquisa; busca de estudos relevantes; seleção dos estudos; análise e extração de dados; síntese e apresentação dos dados(¹¹-¹²).

Período e local do estudo

O período da coleta de dados compreendeu janeiro de 2022. A seleção dos materiais nas bases de dados e na literatura cinzenta ocorreu pelo Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), a partir de buscas por meio da Comunidade Acadêmica Federada (CAFe), como forma de padronizar o procedimento de coleta nas bases de dados.

Esta revisão foi desenvolvida nas seguintes bases de dados: PubMed; Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL); Scopus; COCHRANE; Web of Science; PsycINFO; Science Direct; Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS); The Education Resources Information Center (ERIC); National Library of Australia’s Trobe (Trove); Academic Archive Online (DIVA); DART-Europe E-Theses Portal; Electronic Theses Online Service (EThOS); Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP); National ETD Portal; Theses Canada; Teses e Dissertações da América Latina da CAPES.

Critérios de inclusão e exclusão

Foram incluídas publicações que respondessem à questão de pesquisa, atendessem ao objetivo do estudo e que estivessem disponíveis na íntegra em meio eletrônico, por meio da CAFe. Não houve restrição de idiomas e nem de limite temporal. Excluíram-se estudos em formatos de editoriais, carta ao editor e artigos de opinião. Os documentos duplicados foram considerados apenas uma vez.

Protocolo do estudo

Para a execução da primeira etapa, utilizou-se a combinação mnemônica PCC (P: População - Pacientes; C: Conceito - TMC e C: Contexto - TCTH). Desse modo, foi definida a seguinte questão de pesquisa: quais os TMC mais recorrentes em pacientes submetidos ao TCTH?

Na segunda etapa, foram identificados os descritores que representam o objeto do estudo, mediante Medical Subject Headings (MeSH), para descritores em inglês, e Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), para descritores em português. Foram selecionados os seguintes descritores: Pacientes/Patients; Transtornos Mentais/Mental Disorders; Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas/Hematopoietic Stem Cell Transplantation; Transplante de Medula Óssea/Bone Marrow Transplantation.

Desse modo, para as combinações selecionadas, foram aplicados os operadores booleanos AND e OR. A partir disso, foi possível estruturar a estratégia de busca da seguinte forma em português: Pacientes OR (Paciente Onco-Hematológico) AND Transtornos Mentais OR (Transtornos Mentais Comuns OR Saúde Mental) AND Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas OR (Transplante de Medula Óssea); e em inglês: Patients OR (Onco-Hematological Patient) AND Mental Disorders OR (Common Mental Disorders OR Mental Health) AND Hematopoietic Stem Cell Transplantation OR (Bone Marrow Transplantation).

Após a seleção dos descritores, foi feita uma busca prévia por protocolos na OSF, bem como no International prospective register of systematic reviews (PROSPERO), nas bases de dados da Cochrane Library, PubMed e também no Google Acadêmico, com o intuito de investigar a possiblidade de revisões publicadas sobre o tema, mas não foi encontrado.

A terceira etapa foi realizada por quatro pesquisadoras independentes, e as divergências foram analisadas por um quinto avaliador. Os estudos passaram por uma pré-seleção a partir da leitura de títulos e resumos, de forma a examinar a coerência com os critérios de elegibilidade elencados.

Na quarta etapa, foi realizada a leitura integral dos textos, determinando se esses cumpriam de fato os critérios de inclusão e de exclusão.

Análise dos resultados

A coleta de dados foi orientada por um formulário pré-testado por pesquisadores com expertise em onco-hematologia e revisão de escopo para extração das seguintes variáveis: base de dados; idioma; ano de publicação; país de desenvolvimento do estudo; objetivo do estudo; desenho metodológico; nível de evidência; e TMC mais recorrentes em pacientes submetidos ao TCTH. Assim, os dados foram organizados e digitalizados em planilhas eletrônicas, disponíveis no programa Microsoft Excel^® 2017. Foram realizadas a estatística descritiva e frequências dos dados encontrados.

RESULTADOS

As buscas nas bases de dados identificaram 8.718.532 estudos. Foi utilizado um único filtro para selecionar os que estavam disponíveis na íntegra e gratuitamente, que resultou em 6.805.343 estudos, dos quais 1.913.189 foram excluídos. Após isso, ocorreu a leitura dos títulos e resumos, na busca de encontrar nesses tópicos a temática sobre TMC recorrentes em pacientes submetidos ao TCTH. Portanto, 6.805.258 estudos não abordaram nenhum dos termos em seu título ou resumo, e foram excluídos nessa etapa, e 85 foram selecionados para serem lidos na íntegra.

Ao serem submetidos aos critérios de elegibilidade, 33 estudos não responderam à questão de pesquisa. Desses estudos, quanto à estratégia PCC, 25 foram excluídos, sendo que: três não corresponderam à população adequada; 15 possuíam um conceito inadequado, os quais tinham enfoque nos transtornos mentais diagnosticáveis em detrimento dos TMC ou falavam do sofrimento psíquico do paciente, mas não especificavam sua relação com o fenômeno do TCTH; e sete possuíam um contexto inadequado, pois alguns estudos abordavam os TMC em onco-hematologia, mas não no contexto do TCTH. Foram excluídos oito estudos nos formatos de editoriais, carta ao editor e artigos de opinião. Assim, 16 estudos estavam duplicados nas bases de dados, os quais foram excluídos no processo de seleção. Ao total, 28 estudos responderam aos critérios de elegibilidade e compuseram a amostra final deste estudo. Não foi realizada uma busca reversa na lista de referências da amostra. Todo o processo de seleção dos estudos está apresentado no fluxograma da Figura 1.

Figura 1
Fluxograma do processo de seleção dos estudos para revisão de escopo, adaptado de PRISMA-ScR(¹²), 2022

Sobre os estudos encontrados, 26 são artigos e duas são dissertações. Com relação ao idioma, a maior parte estava publicada em inglês (26; 93%) e em português (2; 7%). Quanto aos países de desenvolvimento dos estudos, destacam-se os EUA, com 14 publicações (50%), seguido do Brasil, com quatro (15%), Inglaterra (7%), com dois, sendo um multicêntrico (3,5%), e os demais países como Itália, Irã, Canadá, Alemanha, Turquia, Polônia e Austrália, com uma publicação cada (3,5%).

A distribuição dos estudos segundo o ano se mostrou heterogênea, e foi possível observar o avanço de publicações na segunda década do século XXI em relação à primeira década. No período de 2002 a 2009, foram publicados quatro estudos (14%). Já entre 2010 e 2020, foi registrado um crescimento considerável, com o quantitativo de 24 estudos (86%).

Emergiram quatro diagnósticos de TMC: os transtornos depressivos citados por 19 estudos (68%), seguidos dos transtornos ansiosos (16; 57%), transtorno de estresse pós-traumático (5; 18%) e transtornos de humor (1; 4%). Foram destacados na amostra 20 sintomas de TMC, tais como fadiga, distúrbios de sono/insônia, alterações da memória, atenção, apetite, concentração e de autoestima, angústia, preocupação, confusão, sofrimento somático, ideação suicida, tristeza, nervosismo, medo, estresse pós-traumático, desamparo, transtorno de adaptação, culpa e desânimo, nos quais os mais prevalentes foram fadiga (9; 31%) e distúrbios do sono/insônia (8; 28%).

O Quadro 1 a seguir apresenta a distribuição dos estudos segundo o ano, país de desenvolvimento do estudo, desenho metodológico, nível de evidência e os principais diagnósticos de TMC e os sintomas de TMC apresentados pelos pacientes submetidos ao TCTH.

Quadro 1
Caracterização dos estudos quanto autoria, ano, país de desenvolvimento, delineamento metodológico, número de pacientes, intervenções, desfechos, diagnósticos dos transtornos mentais comuns, sintomas dos transtornos mentais comuns apresentados pelos pacientes submetidos ao transplante de células-tronco hematopoéticas e nível de evidência, 2022 (N=28)

ID*	Autores/Ano	País	Delineamento/ número de pacientes	Intervenções	Desfechos	Diagnósticos de TMC†	Sintomas dos TMC†	Nível de evidência
A1‡	Harder H, Cornelissen JJ, Gool ARV, Duivenvoorden HJ, Eijkenboom WMH, Bent MJ(13)/2002	Estados Unidos da América	Coorte prospectiva/40	Mini Exame do Estado Mental, Escala de Desempenho de Karnofsky, The Groninger Intelligence Test, The National Adult Reading Test, Word Fluency Test, California Verbal Learning Test, Rey Complex Figure Test, Digit Span of the Wechsler Adult Intelligence Scale, Trail Making Test, Stroop Color Word Test, Finger Tapping Task, Reaction Time Task, Questionnaires of QOL and Mood States.	O teste de triagem do estado mental não revelou anormalidades (89,8%). Comprometimento cognitivo leve a moderado foi encontrado, e a qualidade de vida entre transplantados em longo prazo (até 10 anos) ainda apresenta uma ampla gama de queixas persistentes.	-	Fadiga; distúrbios do sono (não especificado); alterações da memória; alterações da atenção; alterações da concentração	III§
A2‡	Fann JR, Alfano CM, Roth-Roemer S, Katon WJ, Syrjala KL(14)/2007	Estados Unidos da América	Coorte prospectiva/90	Os pacientes completaram uma bateria avaliando qualidade de vida, angústia e funcionamento neuropsicológico. Delirium foi avaliado três vezes por semana usando a Delirium Rating Scale e a Memorial Delirium Assessment Scale de sete dias antes do transplante até 30 dias após o transplante.	Os pacientes com neoplasia maligna que apresentaram delirium durante o transplante mieloablativo apresentaram habilidades neurocognitivas prejudicadas e sofrimento persistente 80 dias após o transplante.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	Fadiga; angústia	III§
A3‡	Bevans MF, Mitchell SA, Marden S(15)/2008	Estados Unidos da América	Longitudinal prospectivo/76	A ocorrência de sintomas, angústia e agrupamentos foi determinada com base nos 11 sintomas da Symptom Distress Scale.	Os pacientes de TCTHII alogênico apresentam múltiplos sintomas e alto desconforto nos dias 0 e 30 após o condicionamento do transplante. No dia 100, a experiência é caracterizada por poucos sintomas e baixo nível de sofrimento.	-	Fadiga; Insônia; Preocupação; Alterações do apetite	III§
A4‡	Chang G, Meadows ME, Orav EJ, Antin JH(16)/2009	Inglaterra	Coorte prospectiva/106	Aplicação das escalas General Social Survey prestige scales, Shipley Institute of Living Scale, Estimate a Full-Scale Intelligence Quotient Medical Outcomes Study 36-Item Short Form, Brief Profile of Mood State e testes neuropsicológicos.	O tempo e o diagnóstico podem ser fatores importantes na avaliação de alterações neurocognitivas, com melhora dos sintomas de TMC† ao longo dos 18 meses.	-	Alterações da memória; confusão	III§
A5‡	Wingard JR, Huang IC, Sobocinski KA, Andrykowski MA, Cella D, Rizzo JD, et al.(17)/2010	Estados Unidos da América	Coorte prospectiva/655	A saúde física autorreferida foi medida com a pontuação do Physical Component Summary score e do Medical Outcomes Study 36-Item Short Form Health Survey.	Os fatores clínicos e psicossociais melhoraram entre transplantados jovens, com boa renda financeira, que não tiveram complicações no tratamento e menos comorbidades ao longo de seis anos pós-TCTHII.	Transtorno de ansiedade	-	III§
A6‡	Basinski JR, Alfano CM, Katon WJ, Syrjala KL, Fann JR(18)/2010	Multicêntrico	Coorte prospectiva/52	Os pacientes completaram uma avaliação da angústia, qualidade de vida e funcionamento neuropsicológico subjetivo antes de receber seu primeiro TCTHII, bem como aos seis meses e um ano após o transplante.	O grupo que apresentou delirium teve mais fadiga e angústia no tratamento e pior funcionamento neuropsicológico em 6 meses pós-TCTHII, em comparação com pacientes que não tiveram um episódio de delirium.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	Fadiga; angústia; confusão	III§
A7‡	Sun CL, Francisco L, Baker KS, Weisdorf DJ, Forman SJ, Bhatia S(10)/2011	Estados Unidos da América	Coorte prospectiva/1065	O estado de saúde psicológico foi avaliado por meio do Brief Symptom Inventory-18.	A proporção de sobreviventes relatando sofrimento somático pós TCTHII diminuiu significativamente ao longo do tempo (ao longo de 10 anos). Por outro lado, a proporção de sobreviventes com ansiedade ou depressão permaneceu inalterada durante esse período.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	Sofrimento somático	III§
A8‡	Tecchio C, Bonetto C, Bertani M, Cristofalo D, Lasalvia A, Nichele I, et al.(19)/2013	Itália	Longitudinal prospectivo/ 107	Ansiedade e depressão foram avaliadas pelas State-Trait Anxiety Inventory e Self-rating Depression Scale.	Um décimo dos pacientes sofria de ansiedade e sintomas depressivos na admissão. Embora a porcentagem de pacientes deprimidos tenha aumentado mais do que o dobro após 2 semanas de isolamento pré-TCTHII, a de pacientes ansiosos não mudou significativamente ao longo do tempo.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	-	III§
A9‡	Hoodin F, Zhao L, Carey J, Levine JE, Kitko C(20)/2013	Estados Unidos da América	Caso-controle/101	O grupo experimental respondeu ao Questionário de Saúde do Paciente brevemente, focado em diagnóstico para avaliar transtornos depressivos, ansiedade, abuso de substâncias e problemas no funcionamento ocupacional ou interpessoal antes da consulta com seu médico e discussão desses sintomas. Já o grupo controle teve acesso após a consulta.	A prevalência de depressão no período de 5 anos pós-TCTHII foi significativa, além de que a ansiedade (14%) ou ideação suicida (8%) não diferiu entre os 2 grupos. Os pacientes do grupo experimental foram significativamente mais propensos a discutir sintomas psicológicos do que os do grupo controle.	Transtorno de ansiedade; transtornos do humor (não especificado)	Ideação suicida	III§
A10‡	Crooks M, Seropian S, Bai M, Mcorkle R(21)/2014	Inglaterra	Coorte prospectiva/ 80	Foram entregues aos participantes um questionário demográfico, termômetro de socorro de estresse emocional e a lista de problemas. Os formulários foram compartilhados com diferentes membros da equipe e, após essa etapa, foram aplicados novamente o termômetro e a lista de problemas na alta, e três e seis meses após a alta do TCTHII.	Os pacientes tiveram uma média de 4,35 no nível de estresse emocional na conversa sobre transplante antes à admissão; 4,42, na alta; 3,54, em sua visita clínica de três meses; e 1,75, aos seis meses. Em média, as respostas dos pacientes revelaram níveis baixos a moderados de sofrimento psicossocial ao longo do tempo, e seu sofrimento diminuiu em 3 e 6 meses pós-TCTHII.	-	Fadiga; distúrbios do sono (não especificado); tristeza; nervosismo; preocupação; alterações do apetite; medo	III§
A11‡	Masule MS, Arbabi M, Ghaeli P, Hadjibabaie M, Torkamandi H(22)/2014	Irã	Longitudinal prospectivo/21	Foi utilizado o questionário Hospital Anxiety and Depression Scale e Wechsler Memory Scale dentro de 72 horas após a internação e um mês após o TCTHII.	Observou-se que a ansiedade foi significativamente menor no pós-transplante, em comparação com o nível pré-transplante. No entanto, nenhuma diferença significativa foi encontrada entre a depressão prée pós-TCTHII.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo; transtorno de estresse pós-traumático	-	IV¶
A12‡	Pillay B, Lee SJ, Katona L, Burney S, Avery S(23)/2014	Austrália	Coorte retrospectiva/122	Uma série de medidas foi completada como parte da avaliação psicológica aos pacientes que iriam se submeter ao transplante. Foram aplicadas a Mental Adjustment to Cancer Scale, the Brief Symptom Inventory-18 e World Health Organization Quality of Life-BREF.	Neste estudo, 12% e 14% da amostra apresentaram níveis significativos de sintomas depressivos e ansiosos; metade da relatou qualidade de vida física prejudicada; e 40% citaram a qualidade de vida psicológica e social ruim.	Transtornos depressivos; transtornos ansiosos	Preocupação; desamparo	IV¶
A13‡	Artherholt SB, Hong F, Berry DL, Fann JR(24)/2014	Estados Unidos da América	Coorte prospectiva/192	Os participantes foram avaliados pré-transplante e novamente 6 a 7 semanas após. As medidas avaliadas incluíram a Symptom Distress Scale, o EORTC core quality of life questionnaire, para qualidade de vida, uma questão de intensidade de dor de item único e o Patient Health Questionnaire-9, para medição de depressão.	Apesar de poucos pacientes (6%) preencherem os critérios para depressão moderada ou alta antes do transplante, quase um terço (31%) preencheu os critérios para depressão moderada ou alta quando avaliados seis a sete semanas após o transplante.	Transtorno depressivo	-	III§
A14‡	Rocha V, Kalinke LP, Felix JVC, Mantovani MF, Maftum MA, Guimarães PRB(25)/2015	Brasil	Longitudinal analítico/25	A coleta dos dados ocorreu por meio dos questionários de dados sociodemográficos e clínicos, do Quality of Life Questionnaire-C30 (versão 3.0, português, Brasil) e do Functional Assessment Cancer Treatment-Bone Marrow Transplantation (versão 4.0, português, Brasil).	Demonstraram piora estatisticamente significativa na qualidade de vida global escalas funcionais, função física, social e familiar, desempenho pessoal e preocupações adicionais nos períodos basal, pancitopenia e pré-alta hospitalar.	-	Fadiga; insônia	III§
D1**	Proença SFFS(26)/2015	Brasil	Longitudinal analítico/25	Foram aplicados os questionários com pacientes adultos oncológicos após 100 dias da realização do TCTHII: dados sociodemográficos e clínicos, versão 2.0; EORTC core quality of life questionnaire, validado para o Brasil para avaliação da qualidade de vida geral; e Functional Assessment of Cancer Therapy Bone Marrow Transplantation, versão 4.0, português, validado para o Brasil, específico para avaliação da qualidade de vida no transplante.	Foi possível observar que, ao final da hospitalização, o paciente possui a qualidade de vida com maior comprometimento na função física, desempenho pessoal, sintomas (fadiga, perda de apetite, náusea e vômito), bem-estar social e familiar, bem-estar funcional, preocupações adicionais, e 100 dias após o transplante, o paciente recupera os valores basais, com exceção do bem-estar funcional.	-	Fadiga; insônia	III§
D2**	Marques ACB(5)/2016	Brasil	Longitudinal analítico/45	Os dados foram coletados utilizando os seguintes instrumentos: dados sociodemográficos e clínicos; atualização dos dados sociodemográficos e clínicos; qualidade de vida global; EORTC core quality of life questionnaire; e Functional Assessment of Cancer Therapy Bone Marrow TransplantationII, versão 4.0.	Os resultados expressam as alterações na qualidade de vida dos pacientes, que se traduz em sintomatologias que vão além das complicações físicas, pois revelam fragilidades emocionais e sociais presentes durante o tratamento e que possuem potencial incapacitante e influenciam negativamente esses pacientes, especialmente nas primeiras fases do tratamento. Em contrapartida, a análise dos resultados também evidenciou que os pacientes sobreviventes consideram sua qualidade de vida satisfatória após um ano de transplante.	-	Fadiga; insônia	III§
A15‡	El-Jawahri A, Vandusen H, Traeger L, Fishbein JN, Keenan T, Gallagher ER et al.(27)/2016	Estados Unidos da América	Longitudinal prospectivo/90	Foram aplicados questionários como o Functional Assessment of Cancer Therapy-Bone Marrow Transplantation, Posttraumatic Stress Disorder Checklist, Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão e o Questionário de Saúde do Paciente.	Houve um declínio na qualidade de vida e um aumento nos sintomas depressivos seis meses após a hospitalização para o TCTHII.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	-	III§
A16‡	Ghazikhanian SE, Dorfman CS, Somers TJ, O’Sullivan ML, Fisher HM, Edmond SN, et al.(8)/2017	Estados Unidos da América	Longitudinal prospectiva/138	Foram aplicados questionários prée pós-TCTHII que avaliaram problemas de sono e cognitivos, bem como sintomas comumente concomitantes, como sintomas depressivos, fadiga e dor.	Os problemas de sono estão associados e podem contribuir para problemas cognitivos em pacientes ao longo dos seis meses pós-TCTHII.	Transtornos depressivos	Fadiga; distúrbios do sono (não especificado)	III§
A17‡	Kroemeke A, Kwissa Gajewska Z, Sobczyk-Kruszelnicka M(28)/2018	Polônia	Transversal/290	Escala de Depressão do Center for Epidemiological Studies, Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão, qualidade de vida, EORTC core quality of life questionnaire, New General Self-Efficacy Scale e avaliação de transplante foram avaliadas nos participantes.	Foram identificados quatro perfis latentes de bem-estar: bom funcionamento (51%, maior bem-estar em todos os aspectos); disfuncional (10%, funcionamento mais fraco em todos os aspectos); 2 perfis com qualidade de vida moderada e alta (5,6%) ou baixa (33,4%); e ansiedade e sintomas depressivos no período pré-TCTHII.	Transtornos depressivos; transtorno de ansiedade	-	IV¶
A18‡	Penalba V, Asvat Y, Deshields TL, Vanderlan JR, Chol N(29)/2018	Estados Unidos da América	Transversal/351	Foram aplicados questionários para avaliar angústia, ansiedade, depressão e qualidade de vida por meio de instrumentos validados, como o Functional Assessment of Cancer Therapy-General.	O subconjunto de pacientes que se apresentaram para avaliação psicossocial pré-transplante utilizou posteriormente serviços de psicoterapia, e esses relataram baixos níveis de sofrimento, depressão ou ansiedade.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo; transtorno de estresse pós-traumático	-	IV¶
A19‡	El-Jawahri A, Pidala J, Khera N, Wood WA, Arora M, Carpenter PA, et al.(30)/2018	Multicêntrico	Coorte prospectiva/482	Foi examinada a relação entre sintomas de depressão ou ansiedade autorrelatados (medidos pela Lee Symptom Scale) e a qualidade de vida dos pacientes (Functional Assessment of Cancer Therapy-General e a Physical Component Scale do Short-Form Health Survey de 36 itens), funcionamento físico (medido pelo perfil de atividade humana), estado funcional (medido pelo teste de caminhada de 2 minutos) e sobrevida global.	Os achados sugerem que pacientes com sintomas de depressão ou ansiedade autorrelatados apresentam prejuízos substanciais em seu funcionamento físico, estado funcional e qualidade de vida geral no período pós-TCTHII e que desenvolveram doença do enxerto contra o hospedeiro.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	-	III§
A20‡	Esser P, Kuba K, Ernst J, Mehnert-Theuerkauf A(31)/2019	Alemanha	Transversal/300	Foram aplicados os instrumentos: Structured Clinical Interview, European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire, Depressive and Anxious Symptomatology, General Distress (Distress Thermometer), Fear of Progression, Comorbidity, Adjustment Disorder Symptomatology, Posttraumatic Stress Disorder Symptomatology, Posttraumatic Growth Inventory, Experiential Avoidance.	Verificada a prevalência de distúrbios relacionados a estressores e ao nível de angústia entre pacientes com câncer hematológico em diferentes configurações do tratamento.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo; transtorno de estresse pós-traumático	Dificuldade de adaptação	IV¶
A21‡	Nelson AM, Juckett MB, Coe CL, Costanzo ES(32)/2019	Estados Unidos da América	Longitudinal prospectivo/332	Os participantes completaram medidas de percepção da doença (crenças sobre as consequências e curso do câncer, controle pessoal e de tratamento sobre o câncer e compreensão do próprio câncer) antes do transplante. As práticas de saúde (dieta, atividade física e uso de álcool) e saúde mental (depressão, ansiedade e bem-estar psicológico) foram avaliadas antes do transplante e aos 1, 3, 6 e 12 meses após o transplante.	Modelos de regressão linear de efeitos mistos revelaram que os receptores de TCTHII que perceberam as consequências de seu câncer como mais graves experimentaram mais depressão e ansiedade, menos bem-estar, e fizeram uma dieta mais saudável, mas foram menos ativos fisicamente durante o ano após o transplante.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	-	III§
A22‡	Erden S, Kuşkonmaz BB, Çetinkaya DU, Ünal F, Özsungur B(33)/2019	Turquia	Transversal/30	Todas as crianças foram entrevistadas usando o Kiddie Schedule for Affective Disorders and Schizophrenia, Inventário de Depressão Infantil, Inventário de Ansiedade Traço-Estado para Crianças, Inventário de Ansiedade Traço-Estado e Escala de Autoestima de Rosenberg.	Durante o processo de transplante, as crianças apresentaram maior prevalência de depressão, transtorno de ansiedade e de déficit de atenção/hiperatividade, e irmãos não doadores apresentaram maior prevalência de transtorno depressivo, de ansiedade e de déficit de atenção/hiperatividade, em comparação com a sociedade em geral.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	Alterações da autoestima	III§
A23‡	Azevedo IC, Ferreira Júnior MA, Flores VGT, Gonçalves EAP, Frota OP, Cardoso MP, et al.(9)/2019	Brasil	Transversal/43	Avaliação dos prontuários de 43 pacientes que realizaram TCTHII.	Entre 43 pacientes com distúrbios psicológicos, 51,16% eram do sexo feminino. Observou-se que o paciente apresentava sofrimento psíquico desde o diagnóstico da neoplasia hematológica até o final do tratamento.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo	-	III§
A24‡	Liang J, Lee SJ, Storer BE, Shaw BE, Chow EJ, Flowers ME, et al.(34)/2019	Estados Unidos da América	Transversal/1024	Os pacientes preencheram medidas de autorrelato de informações sociodemográficas. Variáveis ​​clínicas foram capturadas no banco de dados de transplante.	Pacientes ou cuidadores que tiveram transtorno de estresse pós-traumático relataram sofrimento significativamente maior relacionado a incerteza, tensão familiar, demandas médicas, finanças, identidade e sobrecarga de saúde no período pós-TCTHII (7 a 10 anos).	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo; transtorno de estresse pós-traumático	Distúrbios do sono (não especificado)	IV¶
A25‡	Amonoo HL, Brown LA, Scheu CF, Harnedy LE, Pirl WF, El-Jawahri A, et al.(35)/2020	Estados Unidos da América	Estudo qualitativo/21	As entrevistas exploraram os sintomas de sofrimento psicológico no hospital e durante os primeiros 100 dias após o transplante, juntamente com o impacto percebido desses sintomas em sua recuperação.	Das experiências emocionais negativas relatadas, sentir-se preso, medo, culpa, desânimo e impotência foram frequentemente expressos no período pós-TCTHII.	Transtorno depressivo	Medo; culpa; desânimo	IV¶
A26‡	Lemieux C, Ahmad I, Bambace NM, Bernard L, Cohen S, Delisle JS, et al.(36)/2020	Canadá	Coorte retrospectiva/47	Foram utilizados os instrumentos EQ-5D, para avaliar mobilidade, autocuidado, atividades habituais, dor/desconforto e ansiedade/depressão, e o Functional Assessment of Cancer Therapy-Bone Marrow Transplant, para avaliação física, social/familiar, bem-estar emocional e funcional e preocupações específicas do transplante.	Os resultados dos questionários EQ-5D e Functional Assessment of Cancer Therapy-Bone Marrow Transplant demonstram que a idade avançada no transplante não é um fator que impacta a qualidade de vida em pacientes pós-TCTHII para tratamento de linfoma.	Transtorno de ansiedade; transtorno depressivo; transtorno de estresse pós-traumático	-	IV¶

Nota:
• ^*
  ID - Identificação;
• ^†
  TMC - Transtorno Mental Comum; ^†A - Artigo;
• ^§II
  I - Evidências de estudo de coorte, longitudinal prospectivo, estudo observacional analítico ou estudo de grupo-controle;
• ^II
  TCTH - Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas;
• ^¶
  IV - Evidências de revisão de literatura, estudo transversal, revisão sistemática, estudo narrativo ou estudo retrospectivo; ^**D - Dissertação.

DISCUSSÃO

Historicamente, os profissionais de saúde observaram a carga física e psicológica que os pacientes submetidos ao TCTH carregam, e definiram como um fenômeno esperado e não modificável, pois esses enfrentam um alto nível emocional durante os períodos do tratamento que pode resultar em ansiedade, depressão ou até mesmo ambos(⁷).

Nesse contexto, o presente estudo evidenciou a predominância de transtornos depressivos(⁸-¹⁰,¹⁴,¹⁸-¹⁹,²²-²⁴,²⁷-³⁶) e de ansiedade(⁹-¹⁰,¹⁴,¹⁷-²⁰,²²-²³,²⁷-³³), como os diagnósticos de TMC mais recorrentes entre os pacientes do TCTH. Uma variedade de sintomas físicos e psicológicos desses diagnósticos, muitas vezes inespecíficos, pode ser confundida com reações comuns ao tratamento e, por isso, passam despercebidos(⁷).

Os EUA se destacaram entre os países com maior prevalência de TMC, apontando como principais causas a internação hospitalar prolongada, o isolamento social, o medo da terminalidade da vida e da recidiva da doença(¹⁰,¹⁷,³⁴-³⁵). Sua prevalência está relacionada ao histórico de transtornos mentais e ao sexo feminino. Os achados deste estudo evidenciaram a presença de TMC em pacientes na faixa etária de 18 a 50 anos de idade(⁵,¹⁰,¹³-¹⁴,¹⁷,²⁰,³¹). Na perspectiva de gênero, pode-se observar a presença dos sintomas dos TMC na população feminina, evidenciado principalmente por um estudo italiano(¹⁹), um estadunidense(¹⁰) e quatro brasileiros(⁵,⁹,²⁵-²⁶). As estimativas variam entre as regiões, de um mínimo de 2,6% em homens na região do Pacífico Ocidental a 7,7% entre mulheres nas Américas(³⁷).

Estudo multicêntrico realizado no Brasil evidenciou a presença de TMC principalmente em mulheres em todas as cidades do país(³⁸). A população feminina acometida pelas neoplasias hematológicas que são submetidas ao TCTH vivencia preocupações relacionadas não só ao seu problema de saúde e tratamento, mas ao distanciamento social, de sua família e filhos ou até mesmo sobre a possibilidade de ficarem inférteis. Tais sentimentos influenciam negativamente na sua qualidade de vida e continuidade do tratamento(⁵).

O TCTH gera sofrimento psicológico significativo em pacientes, devido à ameaça de mortalidade, por se submeter frequentemente a quimioterapias pesadas e aos efeitos colaterais de curto e longo prazo relacionados às etapas do tratamento e, principalmente, ao isolamento social ocasionado pela internação hospitalar(³⁵). Além disso, a verificação de estresse pós-traumático em pacientes transplantados está relacionada à angústia devido à incerteza, à tensão familiar, aos problemas financeiros, à sobrecarga de saúde e ao uso de medicamentos psicotrópicos para transtornos ansiosos, depressivos e de sono(³⁴).

O TCTH pode ser considerado um evento traumático por quem o vivencia, visto que se trata de um tratamento agressivo que expõe o paciente a procedimentos invasivos, imunossupressores, que comprometem a qualidade de vida do paciente, internações prolongadas, associadas ao isolamento social, sobrecarga familiar e do cuidador, condições emocionais e psicológicas, bem como medo e ameaça de morte. Os sintomas de estresse pós-traumático são comumente relatados nesse contexto, principalmente nos seis meses pós-TCTH, seja no transplante autólogo ou alogênico(³⁴,³⁹).

Frente a esses fatores preditores para o surgimento de TMC durante o TCTH, estudo desenvolvido na Flórida, EUA, estudou a relação das estratégias de enfrentamento com a sintomatologia dos TMC. O coping é definido como uma estratégia de enfrentamento que gerencia o estresse por meio de esforços cognitivos, que podem ser adaptativos, quando o indivíduo se envolve com o problema de maneira construtiva ou mal adaptativo, como fugir do problema ou colocar a culpar em outras pessoas. Portanto, foi evidenciado que os pacientes submetidos ao TCTH que possuem boas estratégias de enfrentamento e apoio familiar demonstram resiliência psicológica, mesmo quando experimentam situações negativas ou foram detectados sintomas de TMC(⁴⁰).

O número de indivíduos com TMC está aumentando globalmente, principalmente em países de baixa renda, devido ao aumento populacional e de expectativa de vida(³⁷). A prevalência dos TMC é alta entre países de baixa e média renda, especialmente o Brasil. Contudo, é considerada uma morbidade psiquiátrica vivenciada também por países desenvolvidos, como os europeus(³⁸).

O transtorno depressivo é definido por um período de pelo menos duas semanas de humor deprimido, quase sempre acompanhado por desinteresse ou prazer em atividades que antes eram consideradas agradáveis. Um conjunto de manifestação de sintomas pode acompanhar essas características-chave da depressão, como alteração de apetite, distúrbios do sono, agitação ou retardo psicomotor, fadiga, desânimo, sentimentos de culpa e inutilidade excessivos, concentração diminuída e ideação suicida(⁴¹).

Já o transtorno de ansiedade se manifesta pelo medo excessivo, preocupação, ansiedade, alteração comportamental, fadiga, falta de concentração, irritabilidade, distúrbios do sono, como insônia e concentração prejudicada^. O surgimento desses sintomas pode estar atribuído a diversos fatores, como história anterior do paciente, processo atual de adoecimento e tratamentos(⁴¹).

Além disso, os sintomas dos TMC, como angústia e preocupação, são reações emocionais naturais para todo esse processo enfrentado pelo paciente, mas que, quando expressadas de maneira excessiva e recorrente, podem representar sofrimento mental. Além desses, existem ainda os sentimentos de medo, desamparo e desespero, os quais, apesar de ocorrerem em menor frequência, são também considerados manifestações de TMC(⁷,¹⁵).

Há ainda inúmeras outras expressões de sofrimento mental causadas pelo processo do transplante. Impaciência, dificuldades emocionais e mudanças de humor foram também encontrados durante as pesquisas, assim como ideação suicida, a qual pode ser observada em resposta a estressores intensos, comumente acompanhada de outros sintomas, e pode ser relacionada principalmente a recidiva e transtorno psiquiátrico prévio(³²,⁴⁰).

O TCTH é demarcado por três fases, pré-TCTH, Dia Zero e pós-TCTH, sendo esse último o período mais propício para o desenvolvimento de TMC. No TCTH autólogo, a primeira fase corresponde ao pré-TCTH, isto é, antes da infusão das células-tronco hematopoéticas (CTH) e condicionamento das CTH coletas. O Dia Zero consiste na infusão das CTH. O pós-TCTH é dividido em imediato, considerado até 100 dias após a enxertia das CTH, e tardio, que corresponde à alta do paciente(⁴²).

No que se refere ao TCTH, os sintomas dos TMC podem surgir em qualquer momento do tratamento, especialmente entre os primeiros 100 dias da realização do procedimento até 10 anos após a realização do transplante(¹³-¹⁸,²⁰,²²-²³,²⁵-²⁷,³⁰,³²,³⁴-³⁶), e estão relacionados a um risco até três vezes maior de óbito nessa fase(⁷).

Entretanto, o período de condicionamento é responsável por causar os maiores níveis de ansiedade entre os pacientes, originada pelo isolamento, inseguranças sobre o transplante e as respostas físicas, pelo medo de recidiva, assim como pela saudade da família, amigos, quebra da rotina, entre muitas outras preocupações(⁷,⁹).

A ocorrência de TMC, mais especificamente o transtorno de estresse pós-traumático, no período pós-TCTH, está relacionado às experiências que o paciente vivenciou durante as internações ao longo do tratamento. As toxicidades ocorridas durante o período de TCTH e as hospitalizações possuem repercussões significativas a curto e longo prazo que afetam a qualidade de vida, bem-estar físico e psicológico dos pacientes(²⁷).

Alguns dos sintomas dos TMC encontrados estão relacionados à função neurocognitiva dos pacientes, como confusão mental, alterações de memória, da atenção e da concentração. Esse tipo de disfunção costuma ser percebido em cerca de 60% dos pacientes entre 22 e 82 meses após o TCTH, e está relacionado a uma maior morbimortalidade após o procedimento. Isso se justifica por maiores dificuldades em lidar com sintomas físicos e psicológicos após o transplante e de manter os processos de saúde de maneira independente e autônoma(⁷).

A persistência desses TMC, como transtorno de ansiedade, seguido de transtorno depressivo e manifestação de sintomas, como fadiga e distúrbios do sono, com a insônia, é capaz de influenciar fortemente a evolução clínica de um paciente. Estão relacionados a maior morbimortalidade após o TCTH e exigem atenção do serviço de saúde. A população submetida ao TCTH é susceptível aos TMC e a várias outras formas de sofrimento mental, e cabe à equipe de saúde estar preparada para identificar, tratar e manter acompanhamento desses pacientes(¹¹,¹⁷).

Nesse contexto, a enfermagem é considerada como a profissão que está mais próxima ao paciente durante todas as fases do TCTH. Oferece suporte emocional, conforto e possibilita a melhoria da qualidade de vida por meio da elaboração de planos de cuidados voltados para os pacientes em todas as fases do transplante(³⁹).

O interesse em pesquisar sobre a temática é emergente, como foi evidenciado por esta revisão, em que foi possível visualizar um aumento de publicações no século XXI, período que sucedeu a realização do primeiro TCTH. Porém foi no ano de 2019 que houve o maior número de estudos publicados sobre TCTH e os TMC.

A iniciativa em estudar a saúde mental dos pacientes oncohematológicos submetidos ao TCTH no ano de 2019 está concatenada com a iniciativa voltada para saúde mental lançada pela Organização Mundial da Saúde, a “The WHO special initiative for mental health (2019-2023): universal health coverage for mental health”, com o objetivo de que todas as pessoas possam alcançar o padrão mais alto de saúde mental e bem-estar. Dessa forma, pode ser impulsionada a realização de pesquisas relacionadas a essa temática(⁴³).

A carga substancial que os TMC ocasionam na vida do paciente submetido ao TCTH pode ser reduzida a partir de um cuidado multiprofissional que o apoie em todas as fases do tratamento. A remodelação da assistência pautada na promoção à saúde mental de grupos mais vulneráveis a desenvolver TMC impacta positivamente na melhora da qualidade de vida e enfrentamento das dificuldades e situações traumáticas(⁴¹).

Desse modo, intervenções individuais, como psicoterapia e grupais, encorajam a troca de experiência, fortalecimento de vínculos, melhora da saúde mental e dos TMC. Assim, essas ações devem ser iniciadas e estimuladas desde a entrada do paciente na internação e no período pós-TCTH, com o acompanhamento da Atenção Primária à Saúde devidamente capacitada para acolhê-los e oferecer esse suporte(⁴⁴).

Limitações do estudo

Esta revisão de escopo possui como principais limitações a inclusão de apenas estudos disponíveis publicamente na íntegra, uma vez que podem ter sido perdidos estudos relevantes por não se adequarem a esse critério, além do baixo nível de evidência (III e IV) dos estudos selecionados e sua fragilidade metodológica. Também não foi realizada uma busca reversa na lista de referências dos estudos selecionados para a amostra final.

Outra limitação encontrada está relacionada ao enfoque clínico explícito nas publicações, nas quais há um maior interesse de estudos sobre as repercussões que o TCTH acarreta fisicamente ao paciente em detrimento ao aspecto psicológico, além da incipiência de estudos desenvolvidos pela enfermagem nessa área.

Contribuições para a área da enfermagem

O presente estudo traz contribuições importantes para a área da saúde, em especial para os serviços de TCTH, ao apontar particularidades da saúde mental de pacientes fragilizados frente a um processo tão complexo e desgastante como o transplante. Mostra, ainda, como estão intrinsecamente ligadas à saúde física e mental e assistência à saúde prestada, que são interdependentes e, logo, demandam atenção e cuidado de qualidade.

A equipe de enfermagem presta cuidados diretamente ao paciente durante as 24 horas diárias. Logo, as evidências científicas elucidadas por esta revisão poderão fomentar a práxis da enfermagem nesse cenário, além de possibilitar aos profissionais identificar as alterações de evolução para a melhora ou piora do quadro de saúde-doença dos pacientes, apresentando algumas das relações causais entre as vivências experienciadas durante o todo o contexto do TCTH e o desenvolvimento de TMC.

Ademais, sugere-se que novos estudos de evidência científica forte (I e II) sejam desenvolvidos nessa área, de forma a investigar e relacionar os fatores desencadeadores para o desenvolvimento de TMC com o TCHT e, desse modo, planejar a assistência desses pacientes pautadas na promoção da saúde mental em todo o decorrer do tratamento.

CONCLUSÕES

O presente estudo concluiu que os pacientes submetidos ao TCTH constituem uma população vulnerável a desenvolver TMC, devido à complexidade terapêutica, fragilidade emocional e experiências traumáticas relacionadas ao tratamento. Frente a isso, mapeou os principais TMC mais prevalentes, entre eles os transtornos depressivos, ansiosos, estresse pós-traumático e de humor e seus sintomas associados, que ocorrem principalmente no período pós-TCTH.

Vale salientar que ficou evidenciado uma crescente produção de novos conhecimentos nessa temática, e que essa se constitui um problema de saúde pública não só brasileiro, mas de países de baixa, média e alta renda. Portanto, faz-se necessário elaborar um plano de cuidado voltado para as necessidades de cada paciente, assegurando o conforto e confiança ao longo de todas as fases do TCTH.

Dessa maneira, apresenta-se indispensável incluir a avaliação dos diversos aspectos da saúde mental dentro da consulta de enfermagem e qualificar profissionais para realizá-la adequadamente, visto que a enfermagem é a categoria profissional mais presente durante todo o processo do cuidado, possuindo oportunidades para identificar sinais e sintomas no paciente que possam estar relacionados aos TMC.

• FOMENTO
  Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Bolsa de Iniciação científica.
  Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Bolsa de Mestrado.

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Editado por

EDITOR ASSOCIADO: Dulce Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Luís Carlos Lopes-Júnior

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  08 Dez 2023
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  04 Dez 2022
• Aceito
  22 Set 2023