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Extrusão do anel intra-estromal corneano e vascularização do túnel

Extrusion and vascularization of the intrastromal corneal ring tunnel

Resumos

O objetivo deste trabalho é relatar e discutir os aspectos de um caso clínico em que foi observada a formação de neovascularização no túnel do anel intra-estromal corneano. Trata-se de paciente com ectasia corneana 4 anos após LASIK, comprovada pela paquimetria e topografia, e submetido ao implante de anel intra-estromal corneano. No terceiro ano de acompanhamento após implante do anel intraestromal, com o paciente em uso de lente de contato gelatinosa, verificou-se extrusão de um segmento e neovascularização no túnel. Removeu-se o segmento afetado, realizou-se fotocoagulação vascular, observando-se regressão completa do quadro neovascular.

Estroma corenano; Estroma corneano; Neovascularização da córnea; Próteses e implantes; Córnea; Fotocoagulação; Relato de casos


The purpose of this paper is to describe the clinical aspects of one case with deep corneal vascularization after corneal ring implantation to treat corneal ectasia due to LASIK 4 years before. The corneal ectasia diagnostic was performed by corneal pachimetry and topography. Intrastromal corneal ring segment was implanted. On the third year of follow-up, extrusion of one segment was noted and deep corneal neovascularization was found. The segment was removed, laser photocoagulation was applied and complete vascular regression was observed.

Corneal stroma; Corneal stroma; Corneal neovascularization; Prostheses and Implants; Cornea; Light coagulation; Case reports


RELATO DE CASO

Extrusão do anel intra-estromal corneano e vascularização do túnel

Extrusion and vascularization of the intrastromal corneal ring tunnel

Larissa CasteluberI; Jaquison Furtado da SilvaI; Hilton Arcoverde Gonçalves de MedeirosII

IMédico-oftalmologista da Clínica de Olhos Dr. João Eugenio Brasília (DF), Brasil

IIDoutor em Oftalmologia pela UFG, Médico-oftalmologista da Clínica de Olhos Dr. João Eugenio Brasília (DF), Brasil

RESUMO

O objetivo deste trabalho é relatar e discutir os aspectos de um caso clínico em que foi observada a formação de neovascularização no túnel do anel intra-estromal corneano. Trata-se de paciente com ectasia corneana 4 anos após LASIK, comprovada pela paquimetria e topografia, e submetido ao implante de anel intra-estromal corneano. No terceiro ano de acompanhamento após implante do anel intraestromal, com o paciente em uso de lente de contato gelatinosa, verificou-se extrusão de um segmento e neovascularização no túnel. Removeu-se o segmento afetado, realizou-se fotocoagulação vascular, observando-se regressão completa do quadro neovascular.

Descritores: Estroma corenano/physiopathologia; Estroma corneano/cirurgia; Neovascularização da córnea; Próteses e implantes Córnea/patologia; Fotocoagulação; Relato de casos [Tipo de publicação]

ABSTRACT

The purpose of this paper is to describe the clinical aspects of one case with deep corneal vascularization after corneal ring implantation to treat corneal ectasia due to LASIK 4 years before. The corneal ectasia diagnostic was performed by corneal pachimetry and topography. Intrastromal corneal ring segment was implanted. On the third year of follow-up, extrusion of one segment was noted and deep corneal neovascularization was found. The segment was removed, laser photocoagulation was applied and complete vascular regression was observed.

Keywords: Corneal stroma/physiopathology; Corneal stroma/surgery; Corneal neovascularization; Prostheses and Implants; Cornea/pathology; Light coagulation; Case reports [Publication type]

INTRODUÇÃO

O Anel intra-estromal é uma órtese que tem como objetivo regularizar a curvatura corneana e, assim sendo, diminuir os erros refracionais decorrentes da irregularidade das córneas ectásicas, podendo melhorar o efeito da correção ótica com óculos ou lentes de contato (1-2).

O anel é fabricado a partir do PMMA (polimetilmetacrilato), material comprovadamente inerte e biocompatível que é utilizado há décadas na fabricação de implantes intra-oculares (3). É indicado principalmente aos portadores de ceratocone com baixa acuidade visual, intolerância às lentes de contato, e indicação de transplante de córnea (1-4). Este tratamento cirúrgico tem sido utilizado também nos casos de ectasia corneana secundária a cirurgia fotorrefrativa com excimer laser (5).

Estudos demonstram que este é um método seguro e efetivo, com bons resultados visuais e topográficos, principalmente nos casos não avançados de ectasia (até 60 D) (5-7).

A incidência de complicações varia entre os estudos. Entre as principais complicações descritas estão: deslocamento do segmento do anel intraestromal; extrusão; posicionamento assimétrico; ceratite infecciosa; hidropsia aguda; depósitos no interior do túnel estromal; além dos sintomas visuais como halos e glare (8).

Neste artigo descrevemos a ocorrência da vascularização de parte do túnel estromal associada à extrusão do segmento, e conduta terapêutica empregada.

Relato do caso

Em agosto de 2004, foi atendido VJS, 24 anos, masculino, branco, com instabilidade visual mesmo em uso de lentes corretivas. Relata ter feito cirurgia refrativa há 4 anos (LASIK). Ao exame apresentava refração em OD: - 16.25 Esf - 3.00 Cil 56° = 20/80 e em OE: - 3.50 Esf -4.50 Cil 112° = 20/40. Paquimetria: OD: 0.343 mm OE: 0.391 mm. A topografia revela ectasia corneana bilateral com quadro avançado em OD (Figura 1).


Foi indicado para esse paciente o implante de anel intra-estromal em ambos os olhos. No pós-operatório imediato, os anéis encontravam-se muito bem posicionados e o paciente relatava uma melhora acentuada na acuidade visual. Sua refração após o implante do anel era: OD: -5.00 Esf -2.00 Cil 75° = 20/30, e OE: -1.25 Esf -2.00 Cil 180° = 20/30.

Em junho de 2005, retorna com quadro estável utilizando lentes de contato gelatinosas tóricas da marca Focus Toric® (Vifilcon A, CIBA Vision, USA), com acuidade visual permanecendo em 20/30 em ambos os olhos. As lentes de contato possuíam a seguinte graduação: OD = -4.50 Esf -1.75 Cil 90° e OE= - 1.25 Esf -1.75 Cil 180° e o paciente fazia uso diário das mesmas, removendo-as à noite.

Paciente retorna a esse serviço em maio de 2007, para uma revisão periódica, estando assintomático. No Figura 1: Topografia corneana prévia a colocação dos anéis estromais exame clínico verificou-se uma intensa neovascularização ao nível do túnel do anel intra-estromal, em OD com extrusão da extremidade medial do anel (Figuras 2 e 3). No OE não foi observada nenhuma alteração. A conduta nesse caso foi a retirada imediata do segmento do anel no OD, com realização de fotocoagulação com laser de argônio verde no vaso nutridor da neovascularização corneana.



Sob biomicroscopia, e utilizando-se de magnificação de 16x e retroiluminação, foi identificado o vaso aferente da neovascularização. Foi realizada a fotocoagulação, primeiro do vaso aferente, seguido pelo vaso eferente, utilizando-se os parâmetros e técnica definidos por Sharma et al. (9).

O paciente evoluiu com remissão completa da neovascularização em OD, porém com prejuízo da refração a qual estava em -18.50 - 3.25 174° = 20/80. Encontra-se hoje aguardando para tentar reposicionamento de anel com 6 meses.

DISCUSSÃO

O erro refracional causado por ectasia da córnea é inicialmente compensado por óculos ou lente de contato. Quando a ectasia progride a um ponto em que as lentes não promovem melhora satisfatória da visão, a intervenção cirúrgica pode ser considerada (8,10).

A ceratoplastia penetrante é a mais comum intervenção cirúrgica para a resolução da ectasia corneana, porém, está associada com complicações incluindo rejeição do botão doador, indução ao astigmatismo, complicações intra-oculares como o glaucoma, formação de catarata, descolamento de retina, edema macular cistóideo, endoftalmites e hemorragias expulsivas. Para contornar essas complicações, novos métodos como a ceratoplastia lamelar e o implante de segmentos intra-estromais corneanos foram desenvolvidos (7,11).

O tratamento do ceratocone e da ectasia pós-cirurgia refrativa com o uso do anel intra-estromal tem se revelado um bom método, pois promove o aplanamento central da córnea, possibilitando ao paciente o uso de óculos, lentes de contato gelatinosas tóricas, ou lentes gás-permeáveis. Assim sendo, permite postergar ou evitar o transplante de córnea (4,6,8).

Os anéis estromais são usados na correção de baixa miopia, no ceratocone e na ectasia pós-cirurgia refrativa com excimer laser.

Algumas complicações pós-implante foram relatadas, sendo de caráter benigno e reversíveis após a retirada do anel. As mais comuns foram a descentralização do segmento (2.7%), posicionamento assimétrico (5%), migração (5%), extrusão (13.8%), conjuntivite (2.7%), ceratite bacteriana (2.7%) e hidropsia (2.7%) (1).

A vascularização profunda do túnel do anel é uma das complicações possíveis. Normalmente não associada ao sítio da incisão, necessita sempre da remoção do segmento afetado. Nestes casos a regressão dos neovasos é a regra (12).

A fotocoagulação em neovasos corneanos é uma técnica segura e eficaz (9), capaz de diminuir a área da vascularização corneana em olhos com opacidades corneanas vascularizadas.

Apesar de o implante do anel intra-estromal ser um procedimento seguro, eficaz, e apresentar bons resultados, complicações podem existir e o paciente deve ser avaliado periodicamente, sendo que qualquer alteração deve ser tratada imediatamente, avaliando-se a necessidade da retirada do segmento (8).

Recebido para publicação em: 17/07/2007

Aceito para publicação em 6/12/2007

Trabalho realizado na Clínica de Olhos Dr. João Eugenio, Brasília (DF), Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Mar 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 2007

Histórico

  • Aceito
    06 Dez 2007
  • Recebido
    17 Jul 2007
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