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Relação vítreo-retiniana: conceitos atuais

Vitreoretinal interface: current concepts

Resumos

Atualmente, uma avaliação mais apurada da interface vítreo-retiniana tem sido propiciada pela utilização da tomografia de coerência óptica, criada em 1995. Este tipo de imagem tecnológica tem possibilitado um melhor entendimento das alterações involucionais e patológicas que acometem a interface vítreo-retiniana. Os métodos semiológicos até então disponíveis (biomicroscopia, lentes fundoscópicas e ultrassonografia) eram limitados em suas resoluções e formulações de conceitos etiopatogênicos relacionados com modificações desta interface vítreo-retiniana. Este artigo faz breves considerações sobre tais métodos semiológicos e enfatiza a importância da tomografia de coerência óptica na avaliação da interface vítreo-retiniana.

Corpo vítreo; Retina; Descolamento do vítreo


Assessment of the vitreoretinal interface has been greatly aided by the development of optical coherence tomography, in 1995. This imaging technology has allowed us to study involutional and disease processes that were previously unrecognizable by biomicroscopy and ultrasonography alone.This article will review these studies and illustrate the usefulness of optical coherence tomography in the evaluation of the vitreoretinal interface.

Vitreous body; Retina; Vitreous detachment


ARTIGO DE REVISÃO

Relação vítreo-retiniana - Conceitos atuais

Vitreoretinal interface – Current concepts

Eduardo Cunha de Souza

Doutor em Oftalmologia pela Universidade de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP), Brasil

RESUMO

Atualmente, uma avaliação mais apurada da interface vítreo-retiniana tem sido propiciada pela utilização da tomografia de coerência óptica, criada em 1995. Este tipo de imagem tecnológica tem possibilitado um melhor entendimento das alterações involucionais e patológicas que acometem a interface vítreo-retiniana. Os métodos semiológicos até então disponíveis (biomicroscopia, lentes fundoscópicas e ultrassonografia) eram limitados em suas resoluções e formulações de conceitos etiopatogênicos relacionados com modificações desta interface vítreo-retiniana. Este artigo faz breves considerações sobre tais métodos semiológicos e enfatiza a importância da tomografia de coerência óptica na avaliação da interface vítreo-retiniana.

Descritores: Corpo vítreo; Retina; Descolamento do vítreo

ABSTRACT

Assessment of the vitreoretinal interface has been greatly aided by the development of optical coherence tomography, in 1995. This imaging technology has allowed us to study involutional and disease processes that were previously unrecognizable by biomicroscopy and ultrasonography alone.This article will review these studies and illustrate the usefulness of optical coherence tomography in the evaluation of the vitreoretinal interface

Keywords: Vitreous body;Retina;Vitreous detachment

Apesar do corpo vítreo ser considerado a maior estrutura interna do olho humano, o conhecimento sobre sua estrutura, função e patologia sempre foi desprezível se comparado com o de qualquer outra estrutura ocular. E quais seriam os motivos deste limitado conhecimento vítreo?

-Primeiramente, a dificuldade de sua visualização e avaliação clínica adequada. Seria, como afirmavam alguns autores, "prestar atenção no invisível".

-Em segundo lugar, a falta de uma técnica efetiva para sua recuperação e estudo em laboratório.

-E por último, a necessidade de uma abordagem oftalmológica sistemática de suas alterações involucionais e patológicas.

Atualmente, estas considerações se tornam ainda mais informativas ao se admitir que se sabia muito pouco sobre o evento involucional agudo mais fascinante do olho humano, que é a separação vítrea das camadas mais internas da retina ou descolamento do vítreo posterior (DVP). De acordo com os dados existentes na literatura, estudos de autópsia mostravam que o DVP, como diagnosticado antigamente, era raro em olhos normais de pacientes com menos de 50 anos, aumentando sua incidência a partir da sexta década. Estudos clínicos com todas as limitações citadas, também demonstravam uma baixa incidência de DVP em pacientes com menos de 50 anos, confirmando sua maior ocorrência como evento agudo em idosos, a partir dos 65 anos de idade. O DVP primário, ou involucional, é melhor definido como a separação "não anômala" da densa camada externa de fibras de colágeno tipo II (córtex vítrea posterior) da membrana limitante interna da retina (1). Até recentemente, sabia-se apenas que este tipo mais comum de DVP se desenvolvia em olhos sadios de pacientes idosos devido a um processo inicial e progressivo de liquefação vítrea posterior. Ao romper a hialóide junto à retina posterior, esta coleção líquida passaria passivamente para o espaço retrohialoideo determinando o DVP inicial, também conhecido como regmatogênico. Dados mais objetivos que pudessem confirmar esta alteração involucional vítreo-retiniana eram precariamente obtidos através de esquemas gráficos, lentes biomicroscópicas e ecografias tradicionais. Na prática, se contentava com a noção de que patologias maculares (membrana epimacular, tração vítreo-macular, buraco macular) e retinianas periféricas (rupturas, descolamento da retina) eram resultantes de uma "relação vítreo- retiniana anômala" do olho humano. Desde que foi desenvolvida em 1995, a tomografia de coerência óptica (OCT) (2) tem ocupado um papel divisor de águas na avaliação da dinâmica inicial do DVP, também conhecido como "oculto ou subclínico". Pela primeira vez, se confirma de forma clara e objetiva que o DVP se inicia seletivamente na área perifoveal, observado como um discreto sinal linear que determina a formação de um espaço retrohialoídeo plano convexo (Figura 1) (3). Sem causar sintomas e impossível de ser detectada biomicroscopicamente, esta separação vítrea na área foveal, de acordo com estudos tomográficos, se inicia preferencialmente em um dos quadrantes perifoveais (em geral, superior), podendo levar vários anos para se estender aos outros quadrantes. Portanto, como conceito atual e inusitado, deve ficar bem estabelecido que achados de tomografia ocular já evidenciaram que o DVP involucional se inicia em um quadrante perifoveal, sendo considerado um evento "não agudo" por levar vários anos para se desprender totalmente da fóvea e depois do nervo óptico. Por ser assintomático e não diagnosticado clinicamente, o DVP tomográfico tem sido observado em pacientes jovens (<50 anos), diferentemente do que se acreditava antigamente. Em sua evolução natural, o DVP tomográfico pode, ou não, se manifestar clínica e biomicroscopicamente ao se desprender das margens do nervo óptico, e retina periférica a seguir. Floaters (anel de Weiss), fotopsias, hemorragias e rupturas retinianas podem resultar de uma separação ou aderência "anômala" do vítreo nestes locais (Figura 2) (4). Entretanto, após sua separação completa da área perifoveal (360 graus), esta evolução natural do DVP pode não ocorrer em alguns pacientes (Figura 3, A, B, C e D)(3-5). Devido à resolução limitada dos tomógrafos oculares, a relação vítreo-retiniana na região equatorial e periférica não tem sido possível de uma avaliação adequada. Evidências indiretas, entretanto, através de biomicroscopia, achados ecográficos e intra-operatórios, indicam que o DVP involucional se estende espontaneamente para estes locais após seu desprendimento do nervo óptico. Segundo alguns autores, esta relação entre o vítreo e retina periférica exerce um papel fundamental em pacientes que persistem no estádio tomográfico de aderência vítreo foveal (Figura 4)(3-6). Permanecendo como tal, e não se desprendendo espontaneamente da região foveal (Figura 3A), a presença de um vítreo periférico aderido criaria condições para o desenvolvimento de uma tração foveal "mais contida", durante as sacádicas oculares, o que poderia desencadear a formação de um buraco macular primário (Figura 3D). Na presença de um vítreo periférico desprendido, esta aderência foveal ocorreria de forma "menos contida" nas sacádicas, o que poderia criar condições para um cenário tomográfico de tração vítreo foveal patológica (Figura 3C). A avaliação tomográfica da relação vítreo-retiniana deve se aprimorar ainda mais durante os próximos anos(7). Sua importância é imensurável e tem auxiliado o clínico e o especialista no entendimento e manuseio das diferentes alterações funcionais e patológicas do segmento posterior.





  • 1. Sebag J. The vitreous-structure, function, and pathobiology. New York: Springer-Verlag, 1989.
  • 2. Puliafito CA, Hee MR, Lin CP, Reichel E, Schuman JS, Duker JS, Izatt JA, Swanson EA, Fujimoto JG. Imaging of macular diseases with optical coherence tomography.Ophthalmology. 1995;102(2):217-29.
  • 3. Uchino E, Uemura A, Ohba N. Initial stages of posterior vitreous detachment in healthy eyes of older persons evaluated by optical coherence tomography.Arch Ophthalmol. 2001;119(10):1475-9.
  • 4. Akiba J, Ishiko S, Yoshida A. Variations of Weiss's ring. Retina. 2001;21(3):243-6.
  • 5. Mirza RG, Johnson MW, Jampol LM. Optical coherence tomography use in evaluation of the vitreoretinal interface: a review. Surv Ophthalmol. 2007 ;52(4):397-421. Review.
  • 6. Johnson MW. Tractional cystoid macular edema: a subtle variant of the vitreomacular traction syndrome. Am J Ophthalmol. 2005;140(2):184-92.
  • 7. Koizumi H, Spaide RF, Fisher YL, Freund KB, Klancnik JM Jr, Yannuzzi LA. Three-dimensional evaluation of vitreomacular traction and epiretinal membrane using spectral-domain optical coherence tomography. Am J Ophthalmol. 2008 ;145(3):509-517. Epub 2008 Jan 11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2008
  • Data do Fascículo
    Abr 2008
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