Acessibilidade / Reportar erro

Catarata em árvore de Natal

RESUMO

A catarata em árvore de Natal é um tipo raro de opacificação do cristalino caracterizado por depósitos policromáticos em forma de agulhas no córtex profundo e no núcleo do mesmo, que podem ser isolados ou associados a outras opacidades. Neste estudo relatamos e registramos, por meio de fotografias, dois casos deste tipo de opacidade cristaliniana.

Descritores:
Catarata; Cristalização; Opacidades; Cristalino/metabolismo; Relatos de casos

ABSTRACT

The Christmas tree cataract is a rare type of lens opacification characterized by deposits of needle-shaped polychromatic cortex deep in the core, that can be isolated or associated with other opacities. We report and record, through photographs, two cases of this type of lens opacity.

Keywords:
Cataract; Crystallization; Opacities; Lens, crystalline/metabolism; Case reports

INTRODUÇÃO

A catarata em árvore de Natal, também chamada de catarata estrelada, é um tipo raro de opacificação do cristalino caracterizada por depósitos policromáticos em forma de agulhas no córtex profundo e no núcleo do mesmo que podem ser isolados ou associados a outras opacidades(11 Brown NP, Bron AJ. Lens disorders: a clinical manual of cataract diagnosis. 3rd ed. Oxford: Butterworth-Heinemann; 1996.). Apresenta-se unilateralmente ou assimetricamente de forma bilateral(22 Kobayashi Y, Suzuki T. The aging lens: ultrastructural changes in cataract. In: Bellows JG, editor. Cataract and abnormalities of the lens. New York: Grune & Stratton; 1975. p. 313-43.).

Existem controvérsias em relação à composição dessas opacidades. Hayes e Fisher(33 Hayes BP, Fisher RF. Ultrastructural appearances of a lens with marked polychromatic lustre: evidence for diffraction as a cause. Br J Ophthalmol. 1984;68(12):850-8.)referem que as imagens formadas são resultados da difração da luz quando reflete nas células do cristalino. Pau e Förster(44 Pau H, Förster H. [Double refraction of crystals in the lens (spheroliths, 'Christmas tree ornaments') and in the vitreous body (scintillatio nivea)]. Graefes Arch Clin Exp Ophthalmol. 1982;219(6):295-7. German.)sugerem que a composição das opacidades seriam em sua maior parte de colesterol. Já Shun-Shin et al.(55 Shun-Shin GA, Vrensen GF, Brown NP, Willekens B, Smeets MH, Bron AJ. Morphologic characteristics and chemical composition of Christmas tree cataract. Invest Ophthalmol Vis Sci. 1993;34(13):3489-96.) propuseram a cistina como a substância relacionada à formação das opacidades típicas da catarata em árvore de Natal.

O objetivo deste trabalho foi descrever dois casos de catarata em árvore de Natal atendidos no Instituto de Olhos de Goiânia em janeiro de 2012.

RELATO DE CASO

Foram selecionados 2 casos de catarata em árvore de Natal atendidos no Instituto de Olhos de Goiânia.

Caso 1 - A.M.G, sexo feminino, 81 anos, com queixa de baixa acuidade visual associada a lacrimejamento. AVCC: OD: 20/40-1, OE: 20/80. Refração dinâmica: OD=+1,50/-1,00; 100=20/40-1. OE=+1,75/-2,50; 55=20/80. Biomicroscopia: OD: catarata cortical nuclear +2/+4. OE: opacidades finas e difusas no córtex do cristalino no qual estão disseminados corpos refrativos multicoloridos.

Caso 2 -A.P.P, sexo masculino, 69 anos com queixa de baixa acuidade visual.AVCC em OD: 20/60-1, OE:20/60. Refração dinâmica: OD + 0,75esf -1,50cil x 20° = 20/80-1; OE = +1,00esf -0,75cil x 100° = 20/60. Biomicroscopia: OD: catarata cortico nuclear +2/ +4, córtex de cristalino com cristais multicoloridos iridescentes sugestivos de catarata em árvore de Natal; em OE: catarata corticonuclear +2/+4.

Em março de 2012 foram obtidas fotografias do olho do paciente de caso 2 em midríase, com tropicamida 10% (Mydriacyl® - Alcon - Brasil) e fenilefrina 10% (Fenilefrina® -Allergan - Brasil), com câmara digital Pro-Pix DC-200 em lâmpada de fenda Shin-NIPPON (Japão) que documentaram a veracidade do exame descrito. Na figura 1 sem aumento: opacidade cristalina policromática em forma de agulhas;Na figura 2, em lâmpada de fenda com aumento 6,5X: presença de cristais iridescentes no córtex do cristalino. Na figura 3, em lâmpada de fenda com aumento 16X: maior nitidez dos corpos refrativos multicoloridos com predominância das cores vermelho e verde.

Figura 1
Cristalino com depósitos policromáticos
Figura 2
Cristais iridescentes no córtex do cristalino
Figura 3
Corpos refrativos multicoloridos com predominância das cores vermelho e verde

DISCUSSÃO

A catarata em árvore de Natal é uma forma rara de opacificação do cristalino na qual pode-se evidenciar imagens semelhantes a agulhas multicoloridas altamente refringentes cruzando as fibras nas camadas profundas do córtex.

Este tipo de alteração já foi tema de diversas discussões clínicas e a composição dessas opacidades ainda é controversa(33 Hayes BP, Fisher RF. Ultrastructural appearances of a lens with marked polychromatic lustre: evidence for diffraction as a cause. Br J Ophthalmol. 1984;68(12):850-8.

4 Pau H, Förster H. [Double refraction of crystals in the lens (spheroliths, 'Christmas tree ornaments') and in the vitreous body (scintillatio nivea)]. Graefes Arch Clin Exp Ophthalmol. 1982;219(6):295-7. German.
-55 Shun-Shin GA, Vrensen GF, Brown NP, Willekens B, Smeets MH, Bron AJ. Morphologic characteristics and chemical composition of Christmas tree cataract. Invest Ophthalmol Vis Sci. 1993;34(13):3489-96.). As cores variam com o ângulo da luz incidente e predominam as cores vermelho e verde, o que justifica sua nomenclatura, já que a luminosidade e diversidade das cores remetem aos enfeites que comumente decoram as árvores de Natal(33 Hayes BP, Fisher RF. Ultrastructural appearances of a lens with marked polychromatic lustre: evidence for diffraction as a cause. Br J Ophthalmol. 1984;68(12):850-8.).

Existem relatos de casos de associação da catarata em árvore de Natal com distrofia miotônica, também chamada de doença de Steinert, que é caracterizada por retardo do relaxamento muscular após um esforço voluntário (miotomia). É uma herança autossômica dominante e apresenta como achado oftalmológico comum, além da catarata estrelada de início precoce, a ptose. Outros achados oftalmológicos incomuns incluem oftalmoplegia externa, dissociação dos reflexos conjugados pupilares, retinopatia pigmentar leve e pressão intraocular reduzida(66 Kanski JJ. Oftalmologia clínica: uma abordagem sistemática. 5a ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2004. p. 161-91.). Os dois pacientes relatados não apresentavam nenhum sinal sistêmico ou oftalmológico de distrofia miotônica.

Existem outras formas raras de opacificação do cristalino como a catarata em lança e o cristalino coraliforme. Assim como outros tipos de catarata policromática como a catarata cerúlea, catarata nuclear, catarata traumática(77 Reggi JR, Dantas MC, Dantas PE, Borges MJ. Catarata traumática: estudo de 60 casos. Arq Bras Oftalmol. 1997;60(5):489-92.), catarata induzida por medicamentos(88 Paranhos FR. Estudo da incidência de catarata estelar em pacientes em uso de clorpromazina. Arq Bras Oftalmol. 1991;54(2):63-8.), catarata clássica do diabético e do paciente com uveíte anterior. Nos olhos estudados a aparência coincide com o descrito na literatura em relação à catarata em árvore de Natal.

Torna-se difícil registrar, por meio de fotografias, a verdadeira coloração da catarata em árvore de Natal, assim como a maioria das cataratas policromáticas, devido ao reflexo e à associação com outras opacidades. O flash que atravessa o sistema óptico elimina as colorações mais evidentes e torna a imagem menos real do que aparenta ser a olho nu. Por isso foram registradas fotografias sem flash para documentar de forma mais real o que foi constatado no exame clínico (figuras 1, 2 e 3).

Neste estudo foram relatados 2 casos com alterações típicas da catarata em árvore de Natal, na qual a frequência aumenta com a idade e isolada possui pouca participação na diminuição da acuidade visual(99 Stevens P, Swann PG. Christmas tree cataract. Clin Exp Optom. 1998;81(3):98-9.). É um tipo raro de catarata policromática que deve ser conhecida para não gerar surpresas no exame clínico ou durante o procedimento cirúrgico. Consequentemente, evita-se o prolongamento do tempo cirúrgico, já que os cristais são altamente refringentes e alteram de forma significante a visualização do procedimento pelo cirurgião.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Brown NP, Bron AJ. Lens disorders: a clinical manual of cataract diagnosis. 3rd ed. Oxford: Butterworth-Heinemann; 1996.
  • 2
    Kobayashi Y, Suzuki T. The aging lens: ultrastructural changes in cataract. In: Bellows JG, editor. Cataract and abnormalities of the lens. New York: Grune & Stratton; 1975. p. 313-43.
  • 3
    Hayes BP, Fisher RF. Ultrastructural appearances of a lens with marked polychromatic lustre: evidence for diffraction as a cause. Br J Ophthalmol. 1984;68(12):850-8.
  • 4
    Pau H, Förster H. [Double refraction of crystals in the lens (spheroliths, 'Christmas tree ornaments') and in the vitreous body (scintillatio nivea)]. Graefes Arch Clin Exp Ophthalmol. 1982;219(6):295-7. German.
  • 5
    Shun-Shin GA, Vrensen GF, Brown NP, Willekens B, Smeets MH, Bron AJ. Morphologic characteristics and chemical composition of Christmas tree cataract. Invest Ophthalmol Vis Sci. 1993;34(13):3489-96.
  • 6
    Kanski JJ. Oftalmologia clínica: uma abordagem sistemática. 5a ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2004. p. 161-91.
  • 7
    Reggi JR, Dantas MC, Dantas PE, Borges MJ. Catarata traumática: estudo de 60 casos. Arq Bras Oftalmol. 1997;60(5):489-92.
  • 8
    Paranhos FR. Estudo da incidência de catarata estelar em pacientes em uso de clorpromazina. Arq Bras Oftalmol. 1991;54(2):63-8.
  • 9
    Stevens P, Swann PG. Christmas tree cataract. Clin Exp Optom. 1998;81(3):98-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2015

Histórico

  • Recebido
    27 Ago 2012
  • Aceito
    02 Maio 2013
Sociedade Brasileira de Oftalmologia Rua São Salvador, 107 , 22231-170 Rio de Janeiro - RJ - Brasil, Tel.: (55 21) 3235-9220, Fax: (55 21) 2205-2240 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbo@sboportal.org.br