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Prevalencia de baixa acuidade visual em escolares

Resumo

Objetivo: Avaliar o perfil epidemiologico de disfuncao da acuidade visual (AV), possiveis disturbios oculares e a frequencia ao atendimento oftalmologico, de escolares do municipio de Itauna, Minas Gerais, Brasil. Posteriormente objetivou-se o encaminhamento ao especialista para correcao das anormalidades. Métodos: Estudo transversal, com populacao avaliada de 432 alunos da rede publica de ensino. Os individuos foram avaliados pelo metodo Snellen e a faixa etaria da amostra variou de 4 a 17 anos. Os dados foram colhidos e sistematizados. Foram encaminhados para o servico de Oftalmologia aqueles que possuiam AV ≤ 0,7 em pelo menos um dos olhos. Resultados: Dos 432 alunos avaliados neste estudo 14,5% apresentaram baixa AV, quando avaliados pelo teste de Snellen. Destes, 61,9 % pertenciam ao sexo feminino. A faixa etaria em que houve maior prevalencia de baixa visao foram escolares de 15 a 17 anos. A maioria apresentou alteracao em ambos os olhos e 60% dos alunos avaliados declararam nunca terem passado por uma consulta oftalmologica. Dos alunos que compareceram as consultas, a maioria foi diagnosticada com erros de refracao e necessitou de correcao otica. Conclusão: Os resultados encontrados demonstram que a parcela significativa dos individuos avaliados apresentou baixa visao e necessitou de encaminhamento oftalmologico. Alem disso, observou-se a inexistencia de consultas oftalmológicas anteriores em grande parte dos escolares. Esse fato reforca, diante dos orgaos publicos de saude, a necessidade de implantar sistemas de triagem visual nas escolas e oferecer assistencia a esses estudantes, objetivando melhorias em seu aprendizado e qualidade de vida.

Descritores:
Teste de Snellen; Acuidade visual; Saude ocular; Transtornos da visao; Triagem visual; Saude escolar; Crianca

ABSTRACT

Objective: To evaluate the epidemiological profile of visual acuity (VA) dysfunction, the possible ocular disorders and the frequency of ophthalmologic care of school children from the city of Itaúna, Minas Gerais, Brazil. Methods: A cross-sectional study with a population of 432 students in the public schools. The individuals were evaluated by the Snellen method and the sample age ranged from 4 to 17 years. Data were collected and systematized. Those who had VA ≤ 0.7 in at least one eye were referred to the ophthalmology service. Results: Of the 432 students evaluated in this study, 14.5% presented low VA, when evaluated by the Snellen test. Of these, 61.9% were female. The age group with the highest prevalence of low vision were schoolchildren aged 15 to 17 years. The majority presented alteration in both eyes and 60% of the evaluated students stated that they had never had an ophthalmological consultation. Of the students who attended the consultations, most were diagnosed with refractive errors and needed optical correction. Conclusion: The results showed that a significant portion of the individuals evaluated had low vision and required ophthalmologic referral. In addition, there was no previous ophthalmological consultation in most of the schoolchildren. This fact reinforces to public health agencies, the need to implement visual screening systems in schools and offer assistance to these students, with the aim of improvements in their learning and quality of life

Keywords:
Snellen Test; Visual acuity; Eye health; Vision disorders; Visual screening; School health; Child

INTRODUÇÃO

A visao e de fundamental importancia no desenvolvimento da crianca nos primeiros anos de vida. Ela esta intimamente ligada ao aprendizado e e responsavel pela maior parte das informacoes sensoriais que o individuo adquire do meio externo.(11 Alves MR, Kara-Jose N. Campanha “Veja Bem Brasil”. Manual de Orientação. São Paulo: Conselho Brasileiro de Oftalmologia; 1998.)

O desenvolvimento ocular ocorre progressivamente desde o nascimento ate 7 anos de idade, periodo no qual os estímulos visuais (luz e formas) constituem condicoes fundamentais para sua efetivacao. Quando os olhos são privados dos estímulos visuais nos periodos de seu desenvolvimento, este estaciona ou ate mesmo regride. O individuo evolui, entao, para um quadro de baixa acuidade visual (AV).(11 Alves MR, Kara-Jose N. Campanha “Veja Bem Brasil”. Manual de Orientação. São Paulo: Conselho Brasileiro de Oftalmologia; 1998.,22 Figueiredo RM, Santos EC, Jesus IA, Castilho RM, Santos EV. Proposição de Procedimento de Detecção Sistemática de Perturbações Oftalmológicas em Escolares. Rev Saúde Pública. 1993;27(3):204-9.)

A integridade da visao e essencial para o aprendizado da crianca. Com o ingresso na escola, passa-se a desenvolver mais intensamente as habilidades intelectuais e sociais e, tais habilidades sao diretamente associadas as capacidades psicomotoras, de desenvolvimento cognitivo e de desempenho de atividades de autocuidado, locomocao e comunicacao.(33 Malta J, Endriss D, Rached S, Moura T, Ventura L. Desempenho funcional de crianças com deficiência visual, atendidas no departamento de estimulação visual da Fundação Altino Ventura. Arq Bras Oftalmol. 2006;69(4):571-4.,44 Celano M, Hartmann EE, Dubols LG, Drews-Botsch C; Infant Aphakia Treatment Study Group. Motor skills of children with unilateral visual impairment in the infant aphakia treatment study. Dev Med Child Neurol. 2016;58(2):154-9.)

Dessa forma, a idade ideal para a deteccao e tratamento de deficiencias oftalmologicas situa-se entre 0 e 6 anos, quando se completa o desenvolvimento visual. De acordo com estudos, quanto maior o retardamento para deteccao das deficiências visuais, menores sao as chances de recuperacao da visao. Alem disso, estudos indicam que os erros de refracao nao corrigidos sao a principal causa de baixa AV entre as criancas no Brasil.(55 Kara-José N, Ventura R, Kara-Jr N. Erro refrativo. In: Rodrigues ML, Kara-José N (eds) Perfil epidemiológico das principais causas de cegueira no Brasil. Rio de Janeiro: Cultura Médica; 2012. p.9-20.

6 Ferraz FH, Corrente JE, Opromolla P, Schellini S.A. Influence of uncorrected refractive error and unmet refractive error on visual impairment in a Brazilian population. BMC Ophthalmol. 2014; 14:84.
-77 Kedir J, Girma A. Prevalence of refractive error and visual impairment among rural school-age children of Goro District, Gurage Zone, Ethiopia. Ethiopian J Health Sci. 2014;24(4):353-8.)

Dados publicados pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia estimam que, no Brasil, cerca de 29 mil criancas são cegas devido as disfuncoes oculares que poderiam ter sido evitadas ou corrigidas de forma precoce. Porem, as condicoes economicas e sociais, podem dificultar o acesso da crianca ao exame oftalmologico antes de seu ingresso na escola. Portanto, programas de triagem visual realizados nas escolas sao importantes, por preencherem essa lacuna.(88 Ávila M, Alves MR, Nishi M. Condições de saúde ocular no Brasil. São Paulo: Conselho Brasileiro de Oftalmologia; 2015.,99 Gianini RJ, Mais E, Coelho EC, Oréfice FR, Moraes RA. Prevalence of low visual acuity in public school’s students from Brazil. Rev Saúde Pública. 2004;38(2):201-8.)

A triagem oftalmologica, por possibilitar a detecção de doencas e, consequentemente, a prevencao da cegueira infantil, permite tambem avaliar o perfil de erros refracionais na populacao, sendo de grande relevancia do ponto de vista de saude publica. Os disturbios visuais levam a onerosos danos ao Estado e a sociedade, por restricoes ocupacionais, economicas, sociais e psicologicas desses individuos,(66 Ferraz FH, Corrente JE, Opromolla P, Schellini S.A. Influence of uncorrected refractive error and unmet refractive error on visual impairment in a Brazilian population. BMC Ophthalmol. 2014; 14:84.) sendo sua deteccao e tratamento precoce de grande valia. A deteccao de problemas visuais em escolares e uma abordagem preventiva que visa a impedir a evolucao da doenca e melhorar o aproveitamento e o aprendizado escolar.(44 Celano M, Hartmann EE, Dubols LG, Drews-Botsch C; Infant Aphakia Treatment Study Group. Motor skills of children with unilateral visual impairment in the infant aphakia treatment study. Dev Med Child Neurol. 2016;58(2):154-9.,1010 Leone JF, Gole GA, Mitchell P, Kifley A, Pai AS-I, Rose KA. Visual acuity testability and comparability in Australian preschool children: The Sydney Paediatric Eye Disease Study. Eye (Lond). 2012;26(7):925-32.)

Dessa forma, o presente estudo teve como objetivo avaliar a prevalencia da baixa AV em escolares da rede publica do municipio de Itauna, identificando e direcionando para tratamento adequado, os alunos com baixa AV.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo transversal em uma população de jovens estudantes (entre 4 a 17 anos), advindos de escolas da rede publica de Itauna, Minas Gerais (MG). A amostra estudada consistiu de 432 escolares. Os dados foram colhidos de junho a agosto de 2016, atraves de visitas regulares nas Escolas Estadual de Itauna, Escola municipal Augusto Goncalves e Escola Estadual Leonardo Goncalves Nogueira.

Os oito pesquisadores que colheram os dados foram treinados simultaneamente, por um medico oftalmologista titulado, e seguiram um protocolo preestabelecido para a coleta dos dados. O estudo foi realizado com a previa autorizacao das instituicoes e dos responsaveis dos estudantes avaliados. Alem da avaliacao oftalmologica, foi tambem aplicado um questionário que averiguava acerca de consultas oftalmologicas previas, dentre os individuos estudados, bem como presenca de doenças oftalmologicas pre-existentes e tratamentos pregressos. Os alunos que nao encaminharam a autorizacao aos responsaveis nao foram incluidos na pesquisa.

Para medir a AV foram utilizados os seguintes materiais: escala optometrica de Snellen, cartao oclusor, cadeira, fita métrica e impresso para anotacao de resultados. Como local do exame foram utilizadas as salas de aula, com boa iluminacao (diurna entre 13 e 14 horas), vindo de janelas laterais ao examinado.

A escala foi posta de tal maneira que evitasse reflexo e em uma parede a uma distancia de cinco metros do aluno. A preparacao para o teste era feita coletivamente, isto e, para todos os alunos da sala, e apos individualmente, para que nao restassem duvidas. O examinador explicou e demonstrou o que iria fazer. Colocava-se a crianca na cadeira, a uma distancia de 5 metros da escala e pedia-se que a mesma indicasse a letra correspondente. As letras indicadas eram iluminadas individualmente na tabela pelo controle que se encontrava com o examinador. Cobria-se o olho da crianca sem comprimi-lo, lembrando ao examinando que, mesmo sob o oclusor, os dois olhos deveriam estar abertos. Os alunos que utilizavam lentes de correcao e as portavam no momento deveriam fazer o teste utilizando as mesmas.

A AV registrada foi aquela encontrada na menor linha da tabela optometrica de Snellen, em que o aluno tivesse dois ou tres erros na leitura das letras. Os encaminhamentos medicos das criancas que apresentaram disfuncoes ao exame foram entregues a escola. Os criterios para encaminhamento ao oftalmologista adotados na pesquisa foram: valores de acuidade visual ≤ 0,7 na escala de Snellen em um ou ambos os olhos.

O atendimento medico oftalmologico foi realizado por três oftalmologistas, que participaram voluntariamente na pesquisa, atendendo em seus consultorios os individuos identificados com baixa visao. Quando se confirmou a necessidade de uso/aquisição de oculos, os mesmos foram doados por entidades sociais.

RESULTADOS

Neste estudo foram avaliados 432 alunos regularmente matriculados na Escola Estadual de Itauna, Escola Municipal Augusto Goncalves e Escola Estadual Leonardo Goncalves Nogueira. Dos alunos examinados verificou-se que 43,7% (n=189) pertenciam ao sexo masculino e 56,2% (n=243) ao sexo feminino, enquanto a idade do grupo estudado variou de 4 a 17 anos. Porem, a maioria dos individuos pertencia a faixa etaria dos 4 a 8 anos, correspondendo a 58,3% dos alunos avaliados. Dos 432 alunos avaliados neste estudo 14,5% (n=63) apresentaram baixa AV (menor ou igual a 0,7 em pelo menos um dos olhos), quando avaliados pelo teste de Snellen.

Como pode ser observado na figura 1, dos alunos identificados com baixa AV, 61,9 % (n=39) pertenciam ao sexo feminino, o que corresponde a 16,04% das meninas avaliadas. Do total de meninos 12,69% (n=24) apresentaram baixa AV, necessitando de encaminhamento.

Figura 1
Frequencia de baixa acuidade visual por sexo

Em relacao a faixa etaria, foi verificado que nas crianças com 4 anos, 20% apresentaram deficit visual, enquanto que nos escolares de 5 anos, o percentual de baixa AV foi de 17,8%. Na faixa etaria dos 6 anos de idade, foi encontrado um percentual de 13,41 %, enquanto que, nas criancas de 7 anos, 8,69% apresentaram deficiencias. Tal achado foi semelhante ao encontrado na faixa dos 8 anos, cujo percentual foi de 9.67%. Nos alunos de 9 a 12 anos, 9,25% apresentaram baixa AV. Dos alunos de 13 a 17 anos o percentual de baixa AV foi de 23,90%. A prevalencia de baixa acuidade visual por faixa etaria se encontra na tabela 1.

Tabela 1
Prevalência de baixa acuidade visual por faixa etária

Em relacao ao acometimento ocular, observou-se variação entre o lado acometido (Tabela 2). Dos indivíduos acometidos, 23,8% (n=15) apresentaram baixa visao apenas no olho direito, 19.05% (n=12) apenas no olho esquerdo e 57,14% (n=36) em ambos os olhos.

Tabela 2
Prevalência de comprometimento ocular

Dos alunos identificados com baixa AV (n=63), apenas 25 responsaveis compareceram as reuniões convocadas nas escolas e todos estes foram encaminhados ao oftalmologista. Em parceria com tres oftalmologistas de Itauna, as consultas foram fornecidas gratuitamente e 16 alunos compareceram as consultas.

Dos escolares que compareceram as consultas, 68,75% foram identificados com algum tipo de erro de refracao, e destes, mais de 90% necessitaram de correcao otica. Em relacao aos diagnosticos (Tabela 3) observou-se que 18,75% dos indivíduos estudados apresentaram miopia, 25% apresentaram astigmatismo, 25% foram diagnosticados com ambas as patologias, 18,75% nao apresentavam alteracoes significativas e 12,5% foram encaminhados ao neurologista com possivel diagnostico de disturbio de atencao.

Tabela 3
Relação de prevalência entre os diagnósticos

Entre os alunos examinados, 91,2% (n=394) referiram não fazer uso de lentes corretivas, enquanto que apenas 8,8% (n=38) relataram uso de oculos previamente a triagem e nenhum relatou uso de lente de contato. Dos alunos examinados 4 eram portadores de estrabismo.

Ao indagar sobre a frequencia com que sao avaliados por oftalmologistas, dos 432 alunos avaliados, 259 afirmaram que nunca realizaram consultas oftalmologicas anteriores, 30 foram examinados ha menos de um ano, 121 ha mais de um ano e 22 alunos nao responderam ao questionario, como pode ser observado na figura 2.

Figura 2
Frequencia as consultas oftalmologicas dos escolares

DISCUSSÃO

A avaliacao oftalmologica e a atencao aos problemas oculares devem comecar na infancia. A maturacao do sistema visual ocorre ate o oitavo ou decimo ano de vida aproximadamente, sendo que os cinco primeiros anos são os mais importantes. Caso nao ocorra a correcao antes dessa idade o cortex occipital se adapta ao tipo de visao ao qual esta submetido, tornando o quadro de baixa acuidade visual da crianca irreversivel. Dessa forma, quanto mais precoce a deteccao e correcao do problema, melhor sera a capacidade laborativa futura daquela crianca.(1111 Preslan MW, Novak A. Baltimore Vision Screening Project. Ophthalmology.1996;103(1):105-9.,1212 Greenwald, MJ. Desenvolvimento visual no lactente e na infância. In: Nelson LB. Simpósio sobre Oftalmologia Pediátrica. Clín Pediátr Am Norte Interam. 1983;6:1053-70.)

De acordo a Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediatrica, o primeiro exame oftalmologico (conhecido como “teste do olhinho”) deve ser realizado ainda no bercario pelo pediatra. Apos essa avaliacao, indica-se um exame a cada seis meses nos primeiros dois anos de vida e, em seguida, em casos de normalidade, um exame anual ate os 8-9 anos de idade.(1313 Ferreira R. Exame da criança na fase pré-verbal e verbal [Internet]. Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica; 2015. [citado 2018 Mar 6]. Disponível em: http://www.sbop.com.br/webforms/Interna.aspx?secao_id=4&s=Dicas-para-os-pais-e-familiares&c=Exame-da-crian%C3%A7a-na-fase-pr%C3%A9-verbal-e-verbal&campo=74 .
http://www.sbop.com.br/webforms/Interna....
)

A frequencia de baixa acuidade visual encontrada nos escolares avaliados neste trabalho (14,5%), encontra-se em concordancia com os achados de Granzoto e Colaboradores. Os pesquisadores avaliaram a acuidade visual, atraves da Escala de Snellen, de 1502 escolares da rede publica do municipio de Pelotas, Rio Grande do Sul. Ao exame, 15,1% dos escolares apresentaram baixa acuidade visual em pelo menos um dos olhos.(1414 Granzotto JA, Ostermann CS, Brum LF, Pereira PG, Granzotto T. Avaliação da acuidade visual em escolares da 1ª série do ensino fundamental. Arq Bras Oftalmol. 2003;66(2):167-71.)

Por outro lado, resultados mais divergentes tambem foram encontrados em trabalhos conduzidos por Silva et al. e Neto et al., nos municipios de Curitiba, Parana, e Pouso Alegre, Minas Gerais. Estes estudos encontraram, respectivamente, 7,03% e 11,4% de criancas com baixa acuidade visual, resultados expressivamente menores em relacao aos achados no presente estudo. Tal discrepancia pode estar relacionada com a população avaliada por ambos os autores. Os dois estudos avaliaram uma populacao amostral muito menor do que a avaliada neste estudo

(respectivamente 201 e 242 escolares), o que poderia gerar viés nos resultados obtidos.(1515 Silva CM, Almeida DR, Bernardes RR, Bazzano FC, Mesquita Filho M, Magalhães CH, et al. Desempenho escolar: interferência da acuidade visual. Rev Bras Oftalmol. 2013;72(3):168-71.,1616 Moreira Neto CA, Moreira AT, Moreira LB. Relação entre acuidade visual e condições de trabalho escolar em crianças de um colégio do ensino fundamental de Curitiba. Rev Bras Oftalmol. 2014;73(4):2016-9.)

A alta prevalencia de baixa acuidade visual entre os alunos de 12 a 17 anos (25%) encontrada neste estudo aponta para a realidade brasileira, em que a grande maioria das criancas brasileiras em idade escolar nunca passou por exame oftalmologico,(1717 Taleb A, Faria MA, Ávila M, Mello PA. Cegueira e baixa visão no Brasil. São Paulo: Conselho Brasileiro de Oftalmologia; 2015.) sendo tal achado convergente com os resultados obtidos no presente estudo, onde 60% dos alunos avaliados nunca haviam realizado atendimento oftamologico.

Semelhante ao presente estudo, Granzotto encontrou resultados semelhantes em relacao a distribuicao de baixa acuidade visual por sexo. A prevalencia encontrada por Granzotto foi de 17% de baixa acuidade visual nas meninas e 13,3 % nos meninos avaliados. Moacir e colaboradores tambem encontraram resultados semelhantes em estudo realizado em 2003 onde a prevalencia foi de 23% para os meninos e 23,3% para as meninas. O maior numero de alunos foi do sexo feminino tanto neste estudo como no estudo de Moratelli Junior et al, o que difere do estudo de Granzotto em que a maioria dos alunos avaliados pertencia ao sexo masculino (51,5%).(1414 Granzotto JA, Ostermann CS, Brum LF, Pereira PG, Granzotto T. Avaliação da acuidade visual em escolares da 1ª série do ensino fundamental. Arq Bras Oftalmol. 2003;66(2):167-71.,1818 Moratelli Junior M, Gigante LP, Oliveira PR, Nutels M, Valle R, Amaro M, Teixeira C. Acuidade visual de escolares em uma cidade do interior de Santa Catarina. Rev AMRIGS. 2007;51(4):285-90.)

Apesar de estudos revelarem que a grande responsável pelo deficit na acuidade visual na infancia e a ambliopia, que chega a atingir 5% das criancas na fase pre-escolar,(1313 Ferreira R. Exame da criança na fase pré-verbal e verbal [Internet]. Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica; 2015. [citado 2018 Mar 6]. Disponível em: http://www.sbop.com.br/webforms/Interna.aspx?secao_id=4&s=Dicas-para-os-pais-e-familiares&c=Exame-da-crian%C3%A7a-na-fase-pr%C3%A9-verbal-e-verbal&campo=74 .
http://www.sbop.com.br/webforms/Interna....
) nao foram diagnosticadas criancas portadoras desta patologia no presente trabalho, provavelmente pela baixa prevalencia da doenca. Acerca das demais patologias oculares, Preslan e Novak e Lu et al. avaliaram que os principais disturbios oculares encontrados em alunos com baixa visao sao os erros de refracao, assim como os resultados obtidos neste trabalho.(1111 Preslan MW, Novak A. Baltimore Vision Screening Project. Ophthalmology.1996;103(1):105-9.,1919 Lu Q, Zheng Y, Sun B, Cui T, Congdon N, Hu A, Chen J, Shi J. A population-based study of visual impairment among pre-school children in Beijing: The Beijing Study of Visual Impairment in Children. Am J Ophthalmol. 2009;147(6):1075-81.)

Os disturbios oftalmologicos destacam-se como uma das causas mais frequentes de problemas de saúde entre escolares, observando-se estreita relacao entre os problemas visuais e o rendimento escolar.(1515 Silva CM, Almeida DR, Bernardes RR, Bazzano FC, Mesquita Filho M, Magalhães CH, et al. Desempenho escolar: interferência da acuidade visual. Rev Bras Oftalmol. 2013;72(3):168-71.) Em um estudo que envolveu 832 escolares de escola publica de nivel primario em Cali (Colombia), foi encontrado uma prevalencia significativamente maior de transtornos visuais entre alunos repetentes, comparado aos alunos nao repetentes, o que indica relacao entre transtornos visuais e o aproveitamento escolar.(2020 Guerrero VR, Martinez CC, Wooley L. Defectos de refracción y rendimiento académico en la escuela primaria. Colombia Méd. 1989;20(1):8-10.)

Nota-se que a implementacao dos programas de detecção de baixa acuidade visual e de prevencao de complicações oftalmologicas em paises desenvolvidos tem demonstrado que os custos dessas acoes são incomparavelmente mais baixos do que aqueles representados pelo atendimento a portadores de disturbios oculares.

Entretanto, devido aos fatores socioeconomicos e culturais de paises em desenvolvimento, como o Brasil, menos de 10% das criancas que ingressam na escola receberam exame oftalmológico previo. Alem disso, dados do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) mostram que 20% desses alunos apresentam alguma perturbação ocular.(88 Ávila M, Alves MR, Nishi M. Condições de saúde ocular no Brasil. São Paulo: Conselho Brasileiro de Oftalmologia; 2015.,1717 Taleb A, Faria MA, Ávila M, Mello PA. Cegueira e baixa visão no Brasil. São Paulo: Conselho Brasileiro de Oftalmologia; 2015.) Assim como ocorre no municipio de Itauna, em que o sistema de saude publico nao proporciona o

facil acesso das criancas a esse exame e nao oferece atendimento especializado aos escolares com baixa AV.

CONCLUSÃO

O desenvolvimento da visao nos primeiros anos de vida pode apresentar alteracoes que precisam ser corrigidas, mediante terapia adequada, durante os primeiros anos escolares. Este estudo proporcionou o conhecimento acerca da significativa taxa de baixa AV em escolares, dos quais um numero considerável apresentou baixa AV. Esta situacao, se nao tratada, poderia gerar desdobramentos negativos no que tange ao aprendizado e ao desenvolvimento cognitivo das criancas avaliadas.

A baixa AV implica em restricao da qualidade de vida decorrente de limitacoes intelectuais, sociais e psicologicas. A implementacao dos programas de triagem visual tem demonstrado, alem de custos incomparavelmente mais baixos, elevada eficácia na identificacao e no tratamento precoce de disturbios oftalmicos.

  • Instituição onde foi realizado o trabalho: Universidade de Itaúna.

AGRADECIMENTOS

Os pesquisadores da presente pesquisa gostariam de agradecer aos medicos, Dr. Daniel Avides Lopes Cancado de Faria, Dra. Julia Corradi de Faria Andrade e Dr. Marcelo Pinho Navarro, pelo atendimento gratuito prestado aos escolares, e a entidade beneficente Rotary de Itauna - Cidade Educativa, pela doacao dos oculos as criancas com baixa acuidade visual.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    29 Set 2017
  • Aceito
    30 Mar 2018
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