Acessibilidade / Reportar erro

Comparação da fáscia lata, faixa de silicone e fio de polipropileno na cirurgia de suspensão frontal para correção de ptose palpebral grave

Comparison of fascia lata, silicone sling and polypropylene suture in frontalis suspension

RESUMO

Objetivo

Comparar a eficácia, a durabilidade e as intercorrências pós-operatórias da cirurgia de suspensão frontal com o uso de fáscia lata autóloga, faixa de silicone ou fio de polipropileno.

Métodos

Estudo descritivo analítico, observacional e retrospectivo de pacientes portadores de ptose grave submetidos à cirurgia de suspensão frontal durante o período de 2 anos. Os dados analisados foram a distância margem-reflexo comparativa, a fenda palpebral e as intercorrências.

Resultados

A fáscia lata foi o material que proporcionou os melhores resultados de distância margem reflexo e fenda palpebral na análise pós-operatória, após 1 ano de cirurgia. Além disso, apresentou a menor taxa de intercorrências (10%) e nenhum caso de infecção. Em seguida, os materiais que apresentaram melhor resultado pós-operatório foram a faixa de silicone (5% de infecção e 5% de reincidência), seguida pelo fio de polipropileno (15% de hipocorreção e 5% de reincidência).

Conclusão

A fáscia lata mostrou-se superior aos outros materiais em relação à durabilidade do efeito e à melhora da ptose, bem como menor taxa de intercorrências.

Blefaroptose; Procedimentos cirúrgicos oftalmológicos; Fascia lata; Silicones

ABSTRACT

Objective

To compare efficacy, durability and postoperative complications of frontal suspension with the use of autologous fascia lata, silicone sling or polypropylene suture.

Methods

A descriptive, analytical, observational and retrospective study of patients with severe ptosis who underwent frontalis suspension, during a 2-year period. Data analyzed included comparative margin to reflex distance, palpebral fissure, and complications.

Results

Fascia lata was the material that provided the best results of margin to reflex distance and palpebral fissure in the postoperative analysis after one year. In addition, it had the lowest rate of complications (10%) and no cases of infection. Silicone sling ranked second in best results (5% of infection and 5% of recurrence), followed by polypropylene suture (15% of undercorrection and 5% of recurrence).

Conclusion

Fascia lata was shown to be superior to other materials regarding durability of the effect and improvement of ptosis, as well as lower rate of complications.

Blepharoptosis; Ophthalmic Surgical Procedures; Fascia Lata; Silicones

INTRODUÇÃO

De acordo com a classificação etiopatogênica, as ptoses podem ser de causa neurogênica, miogênica, aponeurótica e mecânica. As ptoses de origem neurogênica incluem a paralisia do terceiro par craniano, migrânea oftalmoplégica, esclerose múltipla, trauma e síndrome de Horner. Já as ptoses miogênicas derivam de defeitos no músculo levantador da pálpebra superior, como miastenia gravis, distrofias musculares ou mau desenvolvimento congênito. Por outro lado, a ptose aponeurótica é causada por falha na atuação do músculo levantador da pálpebra superior. Isso pode ocorrer, geralmente, devido ao envelhecimento, por defeitos congênitos ou trauma. Por fim, a ptose mecânica se deve ao excesso de massa palpebral, devido a tumores, dermatocálase, blefarocálase ou cicatriz tecidual. O tratamento é direcionado à correção específica da etiologia da ptose.11. Nesi FA, Lisman RD, Levine MR, editors. Smith’s ophthalmic plastic andre- constructive surgery. St. Louis: Mosby; 1998.

2. Ahmad SM, Della Rocca RC. Blepharoptosis: evaluation, techniques, and complications. Facial Plastic Surg. 2007; 23(3):203-15.

3. Pochat VD, Ribeiro EB, Maltez G, Teles SD, Meneses JV. Utilização do suspensor de silicone pré-moldado para correção de ptose palpebral: análise crítica de uma série de casos operados no HUPES-UFBA. Rev Bras Cir Craniomaxilofac. 2011;14(3):149-54.

4. Matayoshi S, Pereira IC, Rossato LA. Tratamento cirúrgico da blefaroptose congênita. Rev Bras Oftalmol. 2014(73):202-9.
-55. Frueh BR. The mechanistic classification of ptosis. Ophthalmology. 1980;87(10):1019-21.

A altura palpebral é uma medida crucial na avaliação pré-operatória de pacientes com ptose.66. Martin TJ, Yeattls RP. Abnomalities of eyelid position and function. Semin Neurol. 2000;20(1):31-42.,77. Finsterer J. Ptosis causes presentation and management. Aesth Plast Surg. 2003;27:193-204. A distância margem-reflexo (DMR1, sigla do inglês margin reflex distance) é a distância da margem palpebral superior ao reflexo de luz na córnea 22. Ahmad SM, Della Rocca RC. Blepharoptosis: evaluation, techniques, and complications. Facial Plastic Surg. 2007; 23(3):203-15.. A faixa normal para DMR1 é de 2,5mm a 5,5mm.77. Finsterer J. Ptosis causes presentation and management. Aesth Plast Surg. 2003;27:193-204.

8. Takahashi Y, Igal L, Hirohiko K. Frontalis suspension surgery in upper eyelid blepharoptosis. Open Ophthalmol Journal. 2010;4:91-7.
-99. Wong VA, Beckingsale PS, Oley CA, Sullivan TJ. Management of myogenic ptosis. Ophthalmology. 2002;109(5):1023-31.

A análise da função do músculo levantador é um fator adicional importante, que orienta a abordagem cirúrgica necessária.66. Martin TJ, Yeattls RP. Abnomalities of eyelid position and function. Semin Neurol. 2000;20(1):31-42.Medir o fenômeno de Bell, a secreção lacrimal e o grau de lagoftalmo pré-operatório é essencial para prever qualquer risco de exposição pós-operatória da córnea.88. Takahashi Y, Igal L, Hirohiko K. Frontalis suspension surgery in upper eyelid blepharoptosis. Open Ophthalmol Journal. 2010;4:91-7.,99. Wong VA, Beckingsale PS, Oley CA, Sullivan TJ. Management of myogenic ptosis. Ophthalmology. 2002;109(5):1023-31.

Um exame oftalmológico geral, que é feito antes da operação, pode revelar anisocoria na síndrome de Horner ou paralisia do terceiro nervo. Os distúrbios da motilidade ocular podem ser um sinal de paralisia do músculo elevador, síndrome de fibrose orbital, paralisia do terceiro nervo ou doença ocular da tireoide (Finsterer).1010. Kanski JJ, Bowling B. Oftalmologia clínica: uma abordagem sistêmica. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.,1111. Edmonson BC, Wulc AE. Ptosis evaluation and management. Otolaryngol Clin North Am. 2005;38(5):921-46.

O tratamento da ptose palpebral grave é cirúrgico, podendo envolver os músculos levantador da pálpebra superior (MLPS) e o músculo frontal.99. Wong VA, Beckingsale PS, Oley CA, Sullivan TJ. Management of myogenic ptosis. Ophthalmology. 2002;109(5):1023-31. A escolha da técnica cirúrgica é influenciada por severidade da ptose, função do MLPS, idade e presença de anormalidades oftalmológicas (ausência de Bell e olho seco severo) ou neurológicas associadas. As modalidades cirúrgicas mais utilizadas são reinserção do MLPS e suspensão frontal.1212. Liu HP, Shao Y, Li B, Yu X, Zhang D. Frontalis muscle transfer technique for correction of severe congenital blepharoptosis in Chinese patients: An analysis of surgical outcomes related to frontalis muscle function. J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2015;68(12):1667-74.

A técnica mais recentemente difundida de avanço frontal direto é denominada “transferência do frontal”. Ela é utilizada para a correção de blefaroptoses severas. O mecanismo dessa técnica envolve o uso da função do músculo frontal para substituir o levantador da pálpebra na elevação da pálpebra superior, por meio da transferência da tração produzida pelo músculo frontal na pálpebra. O resultado da cirurgia depende da função do músculo frontal, pois, quanto melhor sua funcionalidade, melhor o resultado pós-operatório. As vantagens dessa técnica são excelente formação da prega e do contorno palpebrais e ausência de formação de granuloma no pós-operatório. Além disso, ela facilita a diminuição da taxa de complicações por hipo ou hipercorreção.1313. Anderson RL, Dixon RS. Aponeurotic ptosis surgery. Arch Ophthalmol. 1979;97(6):1123-8.

A cirurgia de suspensão frontal é indicada para blefaroptose grave com função muscular levantadora (MLPS) deficiente ou pobre. A função ruim é definida como a função de elevador de 4mm ou menos, enquanto a função de elevador de 5mm a 7mm é considerada razoável, e uma função de 8mm ou mais é considerada boa.1414. Salour H, Aletaha M, Bagheri A. Comparison of Mersilene mesh and autogenous fascia lata in correction of congenital blepharoptosis: a randomized clinical trial. Eur J Ophthalmol. 2008;18(6):853-7.Um grande grau de avanço do músculo elevador durante sua ressecção pode resultar na redução do contato da pálpebra superior com a córnea e colocá-la em perigo.88. Takahashi Y, Igal L, Hirohiko K. Frontalis suspension surgery in upper eyelid blepharoptosis. Open Ophthalmol Journal. 2010;4:91-7.

Muitos materiais suspensores podem ser utilizados para a suspensão do MLPS ao músculo frontal, como materiais autólogos (fáscia lata, fáscia temporal e tendão palmar longo), fios sintéticos (fio de silicone, nylon, polipropileno Prolene® e politetrafluoretileno) ou malhas sintéticas (Mersilene® e Supramid®).1414. Salour H, Aletaha M, Bagheri A. Comparison of Mersilene mesh and autogenous fascia lata in correction of congenital blepharoptosis: a randomized clinical trial. Eur J Ophthalmol. 2008;18(6):853-7.,1515. Junceda-Moreno J, Suárez-Suárez E, Dos-Santos-Bernardo V. [Treatment of palpebral ptosis with frontal suspension: a comparative study of different materials]. Arch Soc Esp Oftalmol. 2005;80(8):457-61. Spanish.

Todavia, essa grande variabilidade de materiais disponíveis para a cirurgia de correção de ptose palpebral grave leva à dificuldade de escolha do material mais adequado para cada paciente. Além disso, há poucas evidências científicas comparando os resultados pós-operatórios de cada um dos materiais entre si, em relação à eficácia, segurança, durabilidade e intercorrências intra e pós-operatórias.

Os resultados dessas avaliações podem facilitar aos cirurgiões a escolha dos melhores resultados e proporcionar máxima eficácia a ser oferecida aos pacientes.

O objetivo deste estudo foi comparar a eficácia, a durabilidade e as intercorrências pós-operatórias da cirurgia de suspensão frontal com o uso de fáscia lata autóloga, faixa de silicone ou fio de polipropileno.

MÉTODOS

Desenho do estudo

Trata-se de estudo descritivo e retrospectivo realizado com 60 pacientes com ptose palpebral severa em um centro especializado de oftalmologia em São Luís (MA), no período de 2015 a 2017.

Foram avaliados e coletados do prontuário médico dados como sexo, cor da pele, idade, presença de fenômeno de Bell e da prega palpebral superior, DMR1 e altura da fenda palpebral, no pré e pós-operatório de 7 dias, 6 meses e 1 ano.

A amostra total foi subdividida em três grupos, de acordo com o material suspensor utilizado, sendo todos os grupos semelhantes entre si após realização de teste estatístico. O Grupo 1 contou com 20 pacientes operados com a fáscia lata autóloga do músculo quadríceps, média de idade de 28,5 anos, sexo masculino, DMR1 pré-operatória de 1,4mm, desvio-padrão (DP) ±0,7mm e função pobre do MLPS. O Grupo 2 foi formado por 20 pacientes operados com a faixa de silicone, média de idade de 23,9 anos, sexo masculino, DMR1 pré-operatória de 1,3mm, DP ±0,7mm e função pobre do MLPS. O Grupo 3 foi composto de 20 pacientes operados com fio polipropileno Prolene®, média de idade de 30 anos, sexo masculino, DMR1 pré-operatória de 1,4mm, DP ±0,7mm e função pobre do MLPS.

Os critérios de inclusão deste estudo foram todos os pacientes com ptose grave e função do MLPS pobre. Foram excluídos aqueles com dados incompletos no prontuário, crianças muito novas em que não foi possível retirar a fáscia lata e pacientes com doença sistêmica.

Esta pesquisa foi conduzida em conformidade com as resoluções nacionais 466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde, que norteiam a pesquisa envolvendo os seres humanos e o protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Ceuma, com CAAE 46261515.20000.5084.

Avaliação oftalmológica

Os pacientes foram submetidos à avaliação oftalmológica completa, com medida da acuidade visual, reflexos pupilares, avaliação de motilidade ocular extrínseca, biomicroscopia de segmento anterior e posterior, pressão intraocular e fundoscopia, tanto no pré-tratamento como nas consultas subsequentes.

Para avaliação da posição palpebral, foram analisadas as seguintes variáveis: sexo, idade, cor da pele, lateralidade, presença do fenômeno de Bell e da prega palpebral superior, distância margem-reflexo, altura da fenda palpebral, material utilizado e intercorrências no perioperatório. Todas as medidas foram efetuadas de forma manual, por meio de régua milimetrada, com auxílio de lanterna, por um único examinador, na mesma altura do paciente. A intensidade de contração do músculo frontal durante a medida de DMR1 foi controlada. Também se pediu ao paciente para que ficasse ereto, em posição primária do olhar e sem contração da musculatura frontal. As medidas foram feitas no pré-operatório e no pós-operatório de 7 dias, 6 meses e 1 ano (lateralidade, olho, Bell, prega e intercorrências). As variáveis independentes foram sexo, faixa etária e material.

Procedimento cirúrgico: suspensão frontal

O procedimento cirúrgico escolhido para a correção da ptose palpebral de todos os casos foi a cirurgia de suspensão frontal. Nos adultos, realizou-se anestesia local com infiltração de Lidocaína a 2% e adrenalina 1:200.000 na região do subcutâneo da pálpebra superior.

Em alguns casos, foi necessária leve sedação endovenosa com opioide sintético. Em criança, foi realizada previamente anestesia geral com agente inalatório e, em seguida, anestesia local.

A técnica cirúrgica utilizada foi a descrita por Fox.22. Ahmad SM, Della Rocca RC. Blepharoptosis: evaluation, techniques, and complications. Facial Plastic Surg. 2007; 23(3):203-15., que consiste na confecção de cinco incisões de 3mm de comprimento, sendo duas incisões acima da linha dos cílios da pálpebra superior e tendo o limbo como referência; três incisões na região frontal, com duas delas próximas à margem do supercílio, e uma incisão superior cerca de 15mm a 20mm acima do supercílio, tendo a pupila como referência. As cinco incisões formam a figura de um pentágono.

Realizou-se a técnica do tipo fechada, em que as incisões cutâneas são aprofundadas até o tarso, sendo duas inferiores com extensão até o periósteo e três superiores na região acima do supercílio.

Os materiais suspensores foram colocados no plano pré-periostal em relação ao músculo frontal e no plano submuscular, na região pré-tarsal. As pontas do material foram exteriorizadas pela incisão superior e tracionadas até que a pálpebra se posicionasse levemente hipercorrigida. As aberturas foram fechadas por planos com fios absorvíveis internamente, e, por fim, a pele foi captada com sutura não absorvível. Vale ressaltar que, ao final do procedimento, a córnea foi protegida com sutura de Frost por 24 a 48 horas.

Para a técnica de retirada da fáscia lata do músculo quadríceps, realizou-se anestesia local, com diminutas incisões de 2cm equidistantes em 7cm, sendo extraídas pequenas faixas de 2mm x 60mm da fáscia lata da coxa não dominante.

O material de silicone utilizado foi uma faixa não absorvível, com 1mm de diâmetro, 70mm de extensão e 3,5mm de espessura, da marca Silastic™. O fio de polipropileno Prolene® utilizado foi do tipo monofilamentar, não absorvível, em agulha de 2,5cm, com espessura 3-8c e diâmetro 4-0.

Finalizada a cirurgia, procedeu-se à aplicação de pomada antibiótica e compressa gelada sobre as pálpebras. No pós-operatório, as orientações foram repouso, evitar manipular o local cirúrgico, uso de anti-inflamatório oral por 7 dias, além de pomada oftálmica antibiótica por 14 dias, associada a colírio lubrificante por 30 dias.

Análise estatística

Os dados coletados foram analisados pelo programa estatístico IBM Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0. Foi utilizado o teste Shapiro-Wilk, para detectar a normalidade das variáveis, e, em seguida, foi utilizado teste não paramétrico de Kruskal-Wallis. A comparação post hoc 2 a 2 foi feita com o teste de Student-Newman-Keuls, nas variáveis quantitativas. Nas variáveis nominais, aplicou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney. Para avaliar a evolução das variáveis DMR1 e fenda palpebral dentro de cada técnica, nos quatro momentos (pré, 7 dias, 6 meses e 1 ano), foi aplicado o teste não paramétrico de Friedman.

O teste do qui-quadrado de independência foi utilizado para observar a associação entre as variáveis dependentes e independentes. O nível de significância aplicado em todos os testes foi de 95%, ou seja, considerado significativo quando p<0,05.

RESULTADOS

A amostra total do estudo foi de 60 pacientes com ptose palpebral severa, na qual 34 foram unilaterais e 26 bilaterais; 35 eram do sexo masculino, com faixa etária de 20 a 29 anos e média de 28,6 anos de idade. A cor parda foi a de maior prevalência (53,3%).

Com relação aos dados oftalmológicos, a média da DMR1 pré operatória foi de 1,3 mm e DP ± 0,7mm, fenda palpebral pré-operatória de 4mm com DP ± 0,8 mm e todos os pacientes com função pobre do MLPS.

Com relação ao dado DMR1 e à fenda palpebral no pré e pós-operatório de 7 dias, 6 meses e 1 ano de cirurgia, observou-se que houve melhora funcional com os três materiais no tocante à abertura palpebral, porém, apenas na fáscia lata houve relevância estatística em 1 ano (Figuras 1 e 2).

Figura 1
Comparação da distância reflexo margem pré-operatória e pós-operatória (7 dias, 6 meses e 1 ano) dos três materiais.

Figura 2
Comparação da fenda palpebral pré-operatória e pós-operatória (7 dias, 6 meses e 1 ano) dos três materiais.

Considerando DMR1 e fenda palpebral, observou-se, no pós-operatório de 1 ano, que a fáscia lata foi superior em relação à estabilidade quando comparada ao Prolene®, com significância estatística comprovada, porém não houve diferença com o silicone (Tabela 1).

Tabela 1
comparação entre a média, mediana e DP da fáscia lata, silicone e Prolene® no pré-operatório e no pós-operatório de 7 dias, 6 meses e 1 ano.

Com relação às intercorrências, verificaram-se apenas dois pacientes no Grupo 1 (fáscia lata). Já nos demais Grupos 2 (silicone) e 3 (prolene), observaram-se quatro intercorrências em cada um deles. As diferenças entre eles não foram estatisticamente significativas (Tabela 2)

Tabela 2
Intercorrência da fáscia lata, silicone e Prolene®

DISCUSSÃO

No presente estudo, observou-se melhora mais significativa na DMR1 e fenda palpebral no pós-operatório de 1 ano da fáscia lata em relação ao silicone e ao Prolene®.

No estudo de Salour, a fenda palpebral aumentou 3,13mm± 1,72mm, e a DMR1 aumentou 2,87mm±1,36mm no grupo da fáscia lata.1515. Junceda-Moreno J, Suárez-Suárez E, Dos-Santos-Bernardo V. [Treatment of palpebral ptosis with frontal suspension: a comparative study of different materials]. Arch Soc Esp Oftalmol. 2005;80(8):457-61. Spanish.

Junceda-Moreno et al.,1616. Ben Simon GJ, Macedo AA, Schwarcz RM, Wang DY, McCann JD, Goldberg RA. Frontalis suspension for upper eyelid ptosis: evaluation of different surgical designs and suture material. Am J Ophthalmol. 2005;140(5):877-85.ao compararem os materiais na suspensão frontal em 60 pálpebras operadas, mostraram a fáscia lata autóloga satisfatória em 89% e silicone em 80% dos casos, com diferença estatisticamente significante.

Dois estudos comparativos recentes mostraram que o uso da fáscia lata é mais eficaz do que outros materiais, exceto para Gore-Tex®.1616. Ben Simon GJ, Macedo AA, Schwarcz RM, Wang DY, McCann JD, Goldberg RA. Frontalis suspension for upper eyelid ptosis: evaluation of different surgical designs and suture material. Am J Ophthalmol. 2005;140(5):877-85.,1717. Wasserman BN, Sprunger DT, Helveston EM. Comparison of materials used in frontalis suspension. Arch Ophthalmol. 2001;119(5):687-91.Outro estudo recente mostrou que a taxa de sucesso funcional com a fáscia lata foi alta (94%) em 18 meses.1818. Yoon JS, Lee SY. Long-term functional and cosmetic outcomes after frontalis suspension using autogenous fascia lata for pediatric congenital ptosis. Ophthalmology. 2009;116(7):1405-14.

As principais desvantagens de um reparo cirúrgico com fáscia lata autógena são a necessidade de um segundo sítio cirúrgico para retirada da fáscia com os possíveis riscos ao sítio doador1919. Hersh D, Martin FJ, Rowe N. Comparison of silastic and banked fascia lata in pediatric frontalis suspension. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2006;43(4):212-8. e o fato de a fáscia lata poder causar contratura cicatricial da parte superior da pálpebra, que não pode ser facilmente reparada.2020. Manners RM, Tyers AG, Morris RJ. The use of Prolene as a temporary suspensory material for brow suspension in young children. Eye (Lond). 1994;8(Pt 3):346-8.

As principais vantagens da sutura de polipropileno são o baixo risco de cicatrizes e complicações de partes moles, a fácil remoção e não intervenção no uso futuro de fáscia lata autógena.2121. Hildreth HR, Silver B. Physiologic approach to frontalis lid suspension. Trans Am Acad Ophthalmol Otolaryngol. 1970;74(2):427-8. A sutura de Prolene®, entretanto, pode, às vezes, quebrar-se, produzir linhas de tensão de sutura visíveis e causar deformidade da margem palpebral. A natureza monofilamentar desse material impede a integração do tecido, causando deslizamento e recorrência da ptose.2222. Leone CR Jr, Shore JW, Van Gemert JV. Silicone rod frontalis sling for the correction of blepharoptosis. Ophthalmic Surg. 1981;12(12):881-7.

A vantagem mais valiosa do silicone é sua elasticidade, que permite o fechamento palpebral completo e altura adequada da pálpebra superior.2323. Carter SR, Meecham WJ, Seiff SR. Silicone frontalis slings for the correction of blepharoptosis: indications and efficacy. Ophthalmology. 1996;103(4):623-30. O silicone pode, portanto, ser mais apropriado para pacientes com fenômeno de Bell deficiente.2424. Kemp EG, MacAndie K. Mersilene mesh as an alternative to autogenous fascia lata in brow suspension. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2001;17(6):419-22. No entanto, esse material não se integra ao tecido fibrovascular, podendo, escorregar2525. Lee MJ, Oh JY, Choung HK, Kim NJ, Sung MS, Khwarg SI. Frontalis sling operation using silicone rod compared with preserved fascia lata for congenital ptosis a three-year follow-up study. Ophthalmology. 2009;116(1):123-9. e resultando na recorrência da ptose. A taxa de recorrência relatada com o fio de silicone é de até 50% no estudo de Hersh et al.1919. Hersh D, Martin FJ, Rowe N. Comparison of silastic and banked fascia lata in pediatric frontalis suspension. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2006;43(4):212-8.

No estudo de Lee et al. com 123 pacientes com ptose congênita, que receberam haste de silicone ou fáscia lata preservada, os resultados cosméticos foram semelhantes entre seus grupos em 6 meses, mas o grupo da haste de silicone teve melhores resultados cosméticos em 1, 2 e 3 anos após a cirurgia. As taxas de recorrência em 3 anos também foram melhores no grupo de silicone.2626. Morax S, Herdan ML, Hurbli T, Cadion D. Temporalis fascia suspension in the treatment of ptosis. Orbit. 1991(10):193-201.

Tal resultado da superioridade deste estudo da fáscia lata pode estar relacionada ao fato de ser um material autólogo, sólido, não absorvível, bem tolerado, com menos reações adversas, com bom resultado funcional e estético, sendo considerado por muitos cirurgiões o material de escolha para realizar a cirurgia de suspensão frontal. Entretanto, os três materiais analisados no estudo permaneceram estáveis estatisticamente quando feita a comparação do pré-operatório com pós-operatório de 7 dias, 6 meses e 1 ano.

Quanto à incidência de intercorrências no perioperatório da amostra estudada, apenas dois (10%) dos pacientes tiveram intercorrências com a fáscia lata. Morax et al.2727. Elsamkary MA, Roshdy MM. Clinical trial comparing autogenous fascia lata sling and Gore-Tex suspension in bilateral congenital ptosis. Clinical Ophthalmol. 2016;10:405-9.consideram a fáscia lata o material de escolha e padrão-ouro para a cirurgia de ptose palpebral, pois possui características que permitem um bom resultado funcional, com risco mínimo de infecção, extrusão e ruptura, além de maior tempo de viabilidade e compatibilidade. Porém, tem como desvantagens a necessidade de outro sítio cirúrgico, repouso após a cirurgia e exige que o paciente tenha, pelo menos, 3 anos de idade.1616. Ben Simon GJ, Macedo AA, Schwarcz RM, Wang DY, McCann JD, Goldberg RA. Frontalis suspension for upper eyelid ptosis: evaluation of different surgical designs and suture material. Am J Ophthalmol. 2005;140(5):877-85.

Wasserman et al. demonstraram que a fáscia lata apresentou baixo índice de complicações, como infecções, extrusão, quebra e formação de granuloma.1717. Wasserman BN, Sprunger DT, Helveston EM. Comparison of materials used in frontalis suspension. Arch Ophthalmol. 2001;119(5):687-91.

Elsamkary, em seu estudo com 55 pacientes, expôs três recorrências no grupo da fáscia lata, mas também revelou resultados bons ou satisfatórios em aproximadamente 78% da amostra. Um participante desenvolveu uma infecção.2828. Zweep HP, Spauwen PH. Evaluation of expanded polytetrafluoroethylene (e-PTFE) and autogenous fascia lata in frontalis suspension. A comparative clinical study. Acta Chir Plast. 1992;34(3):129-37.

A taxa de recorrência de ptose após a suspensão frontal com materiais sintéticos é geralmente maior do que com fáscia lata autógena. Além disso, apresentam maior risco de extrusão, infecção, formação de granuloma e quebra após trauma.29

Vale a pena ressaltar que o estudo apresentou número limitado de pacientes, e somente os três materiais mais acessíveis no hospital foram escolhidos, em detrimento de outros materiais disponíveis no mercado.

CONCLUSÃO

O presente estudo teve relevância, por reforçar a qualidade e a segurança dos materiais mais comumente utilizados, com comprovação da superioridade da fáscia lata, dada sua menor taxa de intercorrências no pós-operatório tardio. Ressalta-se, ainda, que um acompanhamento mais longo seria essencial para analisar a durabilidade e a eficácia desses materiais a longo prazo.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Nesi FA, Lisman RD, Levine MR, editors. Smith’s ophthalmic plastic andre- constructive surgery. St. Louis: Mosby; 1998.
  • 2
    Ahmad SM, Della Rocca RC. Blepharoptosis: evaluation, techniques, and complications. Facial Plastic Surg. 2007; 23(3):203-15.
  • 3
    Pochat VD, Ribeiro EB, Maltez G, Teles SD, Meneses JV. Utilização do suspensor de silicone pré-moldado para correção de ptose palpebral: análise crítica de uma série de casos operados no HUPES-UFBA. Rev Bras Cir Craniomaxilofac. 2011;14(3):149-54.
  • 4
    Matayoshi S, Pereira IC, Rossato LA. Tratamento cirúrgico da blefaroptose congênita. Rev Bras Oftalmol. 2014(73):202-9.
  • 5
    Frueh BR. The mechanistic classification of ptosis. Ophthalmology. 1980;87(10):1019-21.
  • 6
    Martin TJ, Yeattls RP. Abnomalities of eyelid position and function. Semin Neurol. 2000;20(1):31-42.
  • 7
    Finsterer J. Ptosis causes presentation and management. Aesth Plast Surg. 2003;27:193-204.
  • 8
    Takahashi Y, Igal L, Hirohiko K. Frontalis suspension surgery in upper eyelid blepharoptosis. Open Ophthalmol Journal. 2010;4:91-7.
  • 9
    Wong VA, Beckingsale PS, Oley CA, Sullivan TJ. Management of myogenic ptosis. Ophthalmology. 2002;109(5):1023-31.
  • 10
    Kanski JJ, Bowling B. Oftalmologia clínica: uma abordagem sistêmica. Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.
  • 11
    Edmonson BC, Wulc AE. Ptosis evaluation and management. Otolaryngol Clin North Am. 2005;38(5):921-46.
  • 12
    Liu HP, Shao Y, Li B, Yu X, Zhang D. Frontalis muscle transfer technique for correction of severe congenital blepharoptosis in Chinese patients: An analysis of surgical outcomes related to frontalis muscle function. J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2015;68(12):1667-74.
  • 13
    Anderson RL, Dixon RS. Aponeurotic ptosis surgery. Arch Ophthalmol. 1979;97(6):1123-8.
  • 14
    Salour H, Aletaha M, Bagheri A. Comparison of Mersilene mesh and autogenous fascia lata in correction of congenital blepharoptosis: a randomized clinical trial. Eur J Ophthalmol. 2008;18(6):853-7.
  • 15
    Junceda-Moreno J, Suárez-Suárez E, Dos-Santos-Bernardo V. [Treatment of palpebral ptosis with frontal suspension: a comparative study of different materials]. Arch Soc Esp Oftalmol. 2005;80(8):457-61. Spanish.
  • 16
    Ben Simon GJ, Macedo AA, Schwarcz RM, Wang DY, McCann JD, Goldberg RA. Frontalis suspension for upper eyelid ptosis: evaluation of different surgical designs and suture material. Am J Ophthalmol. 2005;140(5):877-85.
  • 17
    Wasserman BN, Sprunger DT, Helveston EM. Comparison of materials used in frontalis suspension. Arch Ophthalmol. 2001;119(5):687-91.
  • 18
    Yoon JS, Lee SY. Long-term functional and cosmetic outcomes after frontalis suspension using autogenous fascia lata for pediatric congenital ptosis. Ophthalmology. 2009;116(7):1405-14.
  • 19
    Hersh D, Martin FJ, Rowe N. Comparison of silastic and banked fascia lata in pediatric frontalis suspension. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2006;43(4):212-8.
  • 20
    Manners RM, Tyers AG, Morris RJ. The use of Prolene as a temporary suspensory material for brow suspension in young children. Eye (Lond). 1994;8(Pt 3):346-8.
  • 21
    Hildreth HR, Silver B. Physiologic approach to frontalis lid suspension. Trans Am Acad Ophthalmol Otolaryngol. 1970;74(2):427-8.
  • 22
    Leone CR Jr, Shore JW, Van Gemert JV. Silicone rod frontalis sling for the correction of blepharoptosis. Ophthalmic Surg. 1981;12(12):881-7.
  • 23
    Carter SR, Meecham WJ, Seiff SR. Silicone frontalis slings for the correction of blepharoptosis: indications and efficacy. Ophthalmology. 1996;103(4):623-30.
  • 24
    Kemp EG, MacAndie K. Mersilene mesh as an alternative to autogenous fascia lata in brow suspension. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2001;17(6):419-22.
  • 25
    Lee MJ, Oh JY, Choung HK, Kim NJ, Sung MS, Khwarg SI. Frontalis sling operation using silicone rod compared with preserved fascia lata for congenital ptosis a three-year follow-up study. Ophthalmology. 2009;116(1):123-9.
  • 26
    Morax S, Herdan ML, Hurbli T, Cadion D. Temporalis fascia suspension in the treatment of ptosis. Orbit. 1991(10):193-201.
  • 27
    Elsamkary MA, Roshdy MM. Clinical trial comparing autogenous fascia lata sling and Gore-Tex suspension in bilateral congenital ptosis. Clinical Ophthalmol. 2016;10:405-9.
  • 28
    Zweep HP, Spauwen PH. Evaluation of expanded polytetrafluoroethylene (e-PTFE) and autogenous fascia lata in frontalis suspension. A comparative clinical study. Acta Chir Plast. 1992;34(3):129-37.
  • Instituição de realização do trabalho: Centro especializado de oftalmologia de São Luís-MA
  • Fonte de auxílio à pesquisa: não financiado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    3 Jan 2021
  • Aceito
    11 Jul 2021
Sociedade Brasileira de Oftalmologia Rua São Salvador, 107 , 22231-170 Rio de Janeiro - RJ - Brasil, Tel.: (55 21) 3235-9220, Fax: (55 21) 2205-2240 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rbo@sboportal.org.br