Acessibilidade / Reportar erro

Estudo clínico-epidemiológico do carcinoma epidermóide da base da língua

Clinical and epidemiological study of the squamous cell carcinoma of the base of the tongue

Resumos

INTRODUÇÃO: A evolução assintomática e a disseminação precoce justifica a análise de variáveis determinantes do prognóstico do carcinoma espinocelular de base de língua (CEC). OBJETIVO: estudo clínico-epidemiológico de pacientes portadores CEC de base de língua. FORMA DE ESTUDO: Retrospectivo. MATERIAL E MÉTODO: 290 pacientes com carcinoma epidermóide de base de língua (1977 a 2000), 259 homens (89,3%) e 31 mulheres (10,7%) - relação 8:1 -, 237 brancos (81,7%), 51 negros (17,6%) e 2 amarelos (0,7%) - relação 5:1. Houve predomínio da 6ª década (41,0%), 5ª e 7ª (22,7%), 8ª (3,4%) e 9ª (1,7%). Estas variáveis foram relacionadas com a profissão, hábitos e vícios (tabagismo e etilismo), estadiamento TNM, sintoma inicial, tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento. Para análise estatística, utilizamos testes não paramétricos: Wilcoxon (tempo de consumo de álcool e fumo para cada paciente), Kruskal Wallis (álcool e fumo e o estadiamento TNM para cada paciente), Kappa (concordância entre o grau de consumo do álcool e fumo para cada estádio TNM e para cada grupo de pacientes segundo a ocupação), e Mc Nemar (complementar ao Kappa - determinação das frequências acima e abaixo da diagonal de concordância). Como nível de rejeição da hipótese de nulidade, fixou-se como valor significante 0,05 ou 5%. RESULTADOS: Predominaram pacientes ligados à indústria (36,6%) seguido de comerciários e liberais (34,5%), agricultores (7,9%) e aposentados (7,3%). Houve predomínio do grupo dos 30 aos 59 anos (61,1%) e do tempo de queixa de até 180 dias (62,0%). A odinofagia (37,2%) foi a queixa principal, linfonodo metastático (21,8%), disfagia (14,5%), ferida na língua (9,0%), rouquidão (6,9%) corpo estranho (4,8%), otalgia (3,4%) outras (2,0%). Quanto aos hábitos, etilismo e tabagismo (83,8%), tabagismo (10,3%), etilismo (1,4%) e nenhum (4,5%). Houve relação de 9:1 dos estádios III e IV (avançados) em relação ao I e II (iniciais), sendo que todos I, II e IV eram tabagistas e ou etilistas, unanimidade não encontrada nos casos III, IVa, IVb e IVc (23,1%, 53,8% e 23,1% respectivamente). Quanto ao parâmetro T, 241 (83,1%) eram T3 e T4 e 49(16,9%) eram T1 e T2. Quanto ao N, 61(21,6%) eram N0, 39(13,4%) N1, 125(43,0%) N2 e 65(22,4%) N3, sendo o nível II (69,0%) o mais acometido, seguido do nível III - 57 casos (13,5%), do I - 49 casos (11,6%), do IV - 25 casos (15,9%). CONCLUSÕES: O carcinoma espinocelular de base de língua é mais freqüente no homem branco da 5ª a 6ª década, tendo como fatores de risco o álcool e o fumo, sendo predominante o emprego do tabagismo nas mulheres. O tempo de queixa foi referido nos 6 meses iniciais, com predomínio dos estádios III e IV, sendo que os casos I e II eram todos etilistas e/ou tabagistas.

epidemiologia; carcinoma epidermóide; base de língua


INTRODUCTION: The asymptomatic evolution and early dissemination of squamous cell carcinoma (SCC) of the base of the tongue justify this report. AIM: clinical and epidemiological study of patients with SCC of the base of the tongue. STUDY DESIGN: Retrospective. MATERIAL AND METHOD: 290 patients with SCC of the base of the tongue (1977 to 2000), being 259 men (89,3%) and 31 women (10,7%) - relation 8:1; concerning race, 237 white (81,7%), 51 black (17,6%) and 2 yellow (0,7%) - relation 5:1. About age, the prevalence of 6th decade (41,0%) followed by 5th to 7th (22,7%), 8th (3,4%) and 9th (1,7%). These parameters were related to occupation, habits (tobacco and alcohol), TNM staging. For statistical analysis, were employed non-parametric tests: Wilcoxon, Kruskal Wallis, Kappa and McNemar. RESULTS: patients from industries (36,6%), trading, and high level education (34,5%), agriculture (7,9%) retired (7,3%) - with predominance of 30 to 59 years (61,1%) and time of complaint of 180 days (62,0%), the main symptom was odinophagia (37,2%), metastatic lymphonode (21,8%), disphagia (14,5%), tongue lesion (9,0%), hoarseness (6,9%), and others (10,2%). About habits, alcohol and tobacco (83,8%), tobacco alone (10,3%), alcohol (1,4%) and nobody (4,5%). Predominance of stages III and IV in relation to I and II - 9:1, being stages I, II and IV tobacco or alcohol addicts in 100%, followed by III, IVa, IVb and IVc (23,1%, 53, 8% and 23,1% respectively). About T, 241(83,1%) were T3 and T4, and 49 (16,9%) T1 and T2. For N, 61(21,6%) were N0, 39 N1(13,4%, 125 N2 (43,0%) and 65 N3 (22,4%), being level II(69,0%), followed by level III (13,5), I (11,6%) and IV (15,9%). CONCLUSIONS: The SCC of the base of the tongue is more usual in white men from 5th to 6th decade, having as risk factors alcohol and tobacco, tobacco among women, and the six initial months was prevalent concerning the complaint time is stages III and IV, being all cases I and II alcohol and tobacco users.

epidemiology; squamous cell carcinoma; base of the tongue


ARTIGO ORIGINAL

Estudo clínico-epidemiológico do carcinoma epidermóide da base da língua

Clinical and epidemiological study of the squamous cell carcinoma of the base of the tongue

Francisco de Souza Amorim Filho; Josias de Andrade SobrinhoI; Abrão RapoportI; Neil Ferreira Novo; Yara JulianoII

ICirurgião do Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Otorrinolaringologia, Hosphel, São Paulo

IIEstatístico do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Santo Amaro, São Paulo

Departamento de Cirurgia de Cabeçae Pescoço e Otorrinolaringologia do Hospital Heliópolis, Hosphel, São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Abrão Rapoport Rua Iramaia, nº 136 Jd. Europa Cep: 01450-020 São Paulo Tel: (0xx11)273-8223 E-mail: cpgcp.hosphel@attglobal.net

RESUMO

INTRODUÇÃO: A evolução assintomática e a disseminação precoce justifica a análise de variáveis determinantes do prognóstico do carcinoma espinocelular de base de língua (CEC).

OBJETIVO: estudo clínico-epidemiológico de pacientes portadores CEC de base de língua.

FORMA DE ESTUDO: Retrospectivo.

MATERIAL E MÉTODO: 290 pacientes com carcinoma epidermóide de base de língua (1977 a 2000), 259 homens (89,3%) e 31 mulheres (10,7%) – relação 8:1 –, 237 brancos (81,7%), 51 negros (17,6%) e 2 amarelos (0,7%) – relação 5:1. Houve predomínio da 6a década (41,0%), 5a e 7a (22,7%), 8a (3,4%) e 9a (1,7%). Estas variáveis foram relacionadas com a profissão, hábitos e vícios (tabagismo e etilismo), estadiamento TNM, sintoma inicial, tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento. Para análise estatística, utilizamos testes não paramétricos: Wilcoxon (tempo de consumo de álcool e fumo para cada paciente), Kruskal Wallis (álcool e fumo e o estadiamento TNM para cada paciente), Kappa (concordância entre o grau de consumo do álcool e fumo para cada estádio TNM e para cada grupo de pacientes segundo a ocupação), e Mc Nemar (complementar ao Kappa – determinação das frequências acima e abaixo da diagonal de concordância). Como nível de rejeição da hipótese de nulidade, fixou-se como valor significante 0,05 ou 5%.

RESULTADOS: Predominaram pacientes ligados à indústria (36,6%) seguido de comerciários e liberais (34,5%), agricultores (7,9%) e aposentados (7,3%). Houve predomínio do grupo dos 30 aos 59 anos (61,1%) e do tempo de queixa de até 180 dias (62,0%). A odinofagia (37,2%) foi a queixa principal, linfonodo metastático (21,8%), disfagia (14,5%), ferida na língua (9,0%), rouquidão (6,9%) corpo estranho (4,8%), otalgia (3,4%) outras (2,0%). Quanto aos hábitos, etilismo e tabagismo (83,8%), tabagismo (10,3%), etilismo (1,4%) e nenhum (4,5%). Houve relação de 9:1 dos estádios III e IV (avançados) em relação ao I e II (iniciais), sendo que todos I, II e IV eram tabagistas e ou etilistas, unanimidade não encontrada nos casos III, IVa, IVb e IVc (23,1%, 53,8% e 23,1% respectivamente). Quanto ao parâmetro T, 241 (83,1%) eram T3 e T4 e 49(16,9%) eram T1 e T2. Quanto ao N, 61(21,6%) eram N0, 39(13,4%) N1, 125(43,0%) N2 e 65(22,4%) N3, sendo o nível II (69,0%) o mais acometido, seguido do nível III – 57 casos (13,5%), do I – 49 casos (11,6%), do IV – 25 casos (15,9%).

CONCLUSÕES: O carcinoma espinocelular de base de língua é mais freqüente no homem branco da 5a a 6a década, tendo como fatores de risco o álcool e o fumo, sendo predominante o emprego do tabagismo nas mulheres. O tempo de queixa foi referido nos 6 meses iniciais, com predomínio dos estádios III e IV, sendo que os casos I e II eram todos etilistas e/ou tabagistas.

Palavras-chave: epidemiologia, carcinoma epidermóide, base de língua.

SUMMARY

INTRODUCTION: The asymptomatic evolution and early dissemination of squamous cell carcinoma (SCC) of the base of the tongue justify this report.

AIM: clinical and epidemiological study of patients with SCC of the base of the tongue.

STUDY DESIGN: Retrospective.

MATERIAL AND METHOD: 290 patients with SCC of the base of the tongue (1977 to 2000), being 259 men (89,3%) and 31 women (10,7%) – relation 8:1; concerning race, 237 white (81,7%), 51 black (17,6%) and 2 yellow (0,7%) – relation 5:1. About age, the prevalence of 6th decade (41,0%) followed by 5th to 7th (22,7%), 8th (3,4%) and 9th (1,7%). These parameters were related to occupation, habits (tobacco and alcohol), TNM staging. For statistical analysis, were employed non-parametric tests: Wilcoxon, Kruskal Wallis, Kappa and McNemar.

RESULTS: patients from industries (36,6%), trading, and high level education (34,5%), agriculture (7,9%) retired (7,3%) – with predominance of 30 to 59 years (61,1%) and time of complaint of 180 days (62,0%), the main symptom was odinophagia (37,2%), metastatic lymphonode (21,8%), disphagia (14,5%), tongue lesion (9,0%), hoarseness (6,9%), and others (10,2%). About habits, alcohol and tobacco (83,8%), tobacco alone (10,3%), alcohol (1,4%) and nobody (4,5%). Predominance of stages III and IV in relation to I and II – 9:1, being stages I, II and IV tobacco or alcohol addicts in 100%, followed by III, IVa, IVb and IVc (23,1%, 53, 8% and 23,1% respectively). About T, 241(83,1%) were T3 and T4, and 49 (16,9%) T1 and T2. For N, 61(21,6%) were N0, 39 N1(13,4%, 125 N2 (43,0%) and 65 N3 (22,4%), being level II(69,0%), followed by level III (13,5), I (11,6%) and IV (15,9%).

CONCLUSIONS: The SCC of the base of the tongue is more usual in white men from 5th to 6th decade, having as risk factors alcohol and tobacco, tobacco among women, and the six initial months was prevalent concerning the complaint time is stages III and IV, being all cases I and II alcohol and tobacco users.

Key words: epidemiology, squamous cell carcinoma, base of the tongue.

INTRODUÇÃO

O aumento do número de casos de neoplasias malignas de alta morbidade diagnosticados e tratados determina o elevado índice de mortalidade das neoplasias malignas em geral e aquelas da base de língua em particular1. No Brasil, 305.300 novos casos de câncer foram diagnosticados em 2001 e 117.550 morreram da enfermidade no período2. Isto se deve, entre outros fatores, ao aumento da vida média da população mundial, aos resultados dos programas de promoção e recuperação da saúde, a fatores ambientais e de mudanças de comportamento, responsáveis pela carcinogênese. Diante das variáveis elencadas, ficou evidente a importância de fatores epidemiológicos e estatísticos no estabelecimento do diagnóstico precoce e de prevenção. Quanto às neoplasias malignas da cavidade oral (3%) e orofaringe (1%), esta última localização caracteriza-se pela evolução insidiosa e metástases cervicais uni ou bilaterais precoces3. Kanda (2001)4, de 1977 a 2000, observou predomínio do câncer da tonsila palatina (47,2%), seguida de base de língua (33,5%), palato mole (16,0%) e parede posterior (4,2%)4. Quanto às neoplasias de base de língua, 90 a 95% dos casos são de carcinoma espinocelular (CEC), predominantemente no sexo masculino na 5a década3-8, estando diretamente relacionados ao consumo do tabaco e álcool, dieta, ocupação, infecção viral e alterações genéticas9,10.

No Brasil, há 36 milhões de fumantes, dos quais 40% em São Paulo, sendo que ocorre um abandono do hábito em cifras de 3% ao ano, e, quanto ao álcool, 1,3 bilhões de litros de aguardente são produzidos anualmente11. Para a população de baixa renda, predominante na incidência desta neoplasia, o consumo de bebidas destiladas de má procedência é usual, nas quais são empregadas substâncias químicas carcinogênicas ausentes em produtos com controle de qualidade quando de sua fabricação. Ao lado disto, o carcinoma de orofaringe é de diagnóstico tardio pela ausência de sintomatologia precoce, pela sintomatologia pobre e pela falta de preparo dos profissionais (médicos e dentistas). Considerados estes fatos, o CEC de base de língua é diagnosticado nas fases avançadas (estádios III e IV), quando os procedimentos terapêuticos já são pouco efetivos.

À vista destas considerações iniciais, procuramos correlacionar os dados clínicos e epidemiológicos como forma de identificar os grupos de risco no desenvolvimento desta neoplasia, bem como contribuir na sua prevenção e no diagnóstico precoce do CEC de base de língua.

MATERIAL E MÉTODO

Foi realizado estudo descritivo retrospectivo de 290 pacientes portadores de CEC de base de língua, no Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Otorrinolaringologia do Hospital Heliópolis, Hosphel, São Paulo, de 1977 a 2000. Foram analisadas variáveis como idade, raça, profissão, queixa principal, tempo de queixa, hábitos e exposição (álcool e fumo), condições de higiene bucal, estadiamento clínico (TNM), tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento.

•

Sexo e Raça:

homens e mulheres, sendo consideradas as etnias branca, negra, amarela e outras.

•

Idade:

a partir da 4

a

década em faixas etárias e a partir dos 80 anos em um único grupo.

•

Profissão:

1. Profissionais ligados à agricultura e afins; 2. Profissionais ligados à fabricação de produtos com substâncias inalantes, madeira, química e mecânica; 3. Profissionais ligados ao comércio e liberais; 4. Profissionais do lar; 5. Aposentados.

•

Queixa principal:

primeira queixa e tempo de evolução.

•

Hábitos:

foram analisados tipo, quantidade e tempo de consumo: 1. Tabagismo, sendo (-) para não fumantes e (+) para fumantes a cada 10 cigarros de papel ou 2 de palha ou charuto ou cachimbo/dia.

•

Etilismo:

sendo (-) para o não-consumidor e (+) para cada dose de destilado ou 1 garrafa de cerveja de 600cc ou ½ garrafa de vinho/dia.

•

Classificação TNM:

empregada a versão de 1998 associada à determinação palpatória de níveis linfonodais I (submento-mandibular); II (júgulo-carotídeo alto); III (júgulo- carotídeo médio); IV (júgulo carotídeo baixo) e V (triângulo posterior do pescoço).

Quanto ao estadiamento, foram diagnosticados no Estádio I: 4 pacientes (1,4%); II: 45(15,5%); III: 94(32,5%). IV: 147 (50,6%).

•

Tempo entre o diagnóstico e o tratamento:

houve registro de tempo entre o diagnóstico através da biópsia e o início da terapêutica (cirúrgica e/ou radioterápica).

Método estatístico

Para análise dos resultados, foram utilizados testes não paramétricos, levando-se em consideração a natureza das variáveis estudadas.

•

Teste de Wilcoxon

(SIEGEL; CASTELLAN JR1988): com o objetivo de comparar, para cada paciente, os tempos de hábito do fumo e do álcool. Este teste foi aplicado, individualmente, para cada um dos estádios considerados.

•

Análise de variância por postos de Kruskal-Wallis

(Siegel; Castellan Jr., 1988): com o objetivo de comparar os diferentes estádios do tumor em relação aos tempos de hábito do fumo e do álcool separadamente.

•

Teste Kappa de concordância

(Landis; Kock, 1977): com o propósito de estudar as concordâncias entre os graus de consumo do álcool e do tabaco. Este teste foi aplicado separadamente para cada um dos estádios e para cada grupo de pacientes de acordo

Teste de Mc Nemar

(Remington; Schork, 1970): como complemento do teste de Kappa, foi utilizado para comparar as freqüências situadas acima e abaixo da diagonal de concordância do Teste de Kappa.

Em todos os testes aplicados, fixou-se em 0.05 ou 5% o nível para rejeição da hipótese de nulidade, assinalando-se com asterisco (*) os valores significantes.

RESULTADOS

Do universo de 290 pacientes portadores de CEC de base de língua, 259 eram do sexo masculino e 31 do feminino (relação 8:1), sendo 237 brancos (81,7%), 51 negros (17,6%) e 2 amarelos (0,7%). Quanto à distribuição por faixa etária houve o predomínio da 6a década (41,0%), seguida pela 5a e 7a (22,7%) – Tabela 1.

Quanto à relação com o histórico ocupacional, houve o predomínio de pacientes ligados à indústria, comércio e liberais (71,1%) – Tabela 2.

Para análise do tempo (dias) entre o diagnóstico e o início do tratamento, houve maior número de casos que o iniciaram em até 30 dias (62,0%) – Tabela 3.

No que diz respeito ao tempo de queixa em meses, foi menor que 6(62,0%), de 6 a 12 (25,9%) e acima de 12 meses (24,1%). O sintoma principal foi odinofagia (37,2%), linfonodo metastático (21,8%), disfagia (14,5%), ferida na língua (9,0%), rouquidão (6,9%), corpo estranho (4,8%), otalgia reflexa (3,4%) e outras (2,0%) – Tabela 4.

A seguir, foram analisados as relações das quantidades de álcool e fumo (teste de Kappa e Mc Nemar), o estádio clínico e a profissão: (Tabela 5), ocorrendo valores significantes e não significantes para as diferentes variáveis analisadas.

Quanto ao tempo (anos) de consumo de álcool e fumo e sua relação com o estádio (Teste de Wilcoxon), ver Tabela 6.

Nos estádios I, II e IVc (pequena amostra) não foi possível análise estatística, sugerindo, todavia, que o tempo de tabagismo deva ser mais significante que o do álcool. Para o estudo relação do tempo de consumo de álcool e fumo e o estádio, empregamos o teste de Kruska & Wallis (análise de variança) – Tabelas 7 e 8. Quanto ao estadiamento TNM (UICC 1998), verificamos o predomínio dos casos avançados (Tabela 9).

DISCUSSÃO

A definição do perfil epidemiológico do carcinoma espinocelular da base da língua passa pela determinação dos fatores de risco. Assim, há unanimidade quanto ao predomínio do sexo masculino5,6,12, fato este observado em nossa casuística onde a relação foi de 8:1. Quanto à etnia, há resultados discordantes, pois ocorreram relatos do predomínio da raça negra9,13, contrapondo-se com outros onde a raça branca predominou14,15como ocorreu neste estudo, quando aferimos a relação de 5:1. No que diz respeito à faixa etária, a mais acometida foi a 6a década (41,0%), seguida pela 5a e 7a (22,7%), não ocorrendo nenhum registro abaixo da 3a década, coincidente com a literatura16,17(Tabela 1).

Quanto à atividade profissional (Tabela 2), houve predomínio de pacientes ligados à indústria (36,6%), seguido de comerciários e liberais (34,5%), agricultores (17,9%) e aposentados (7,3%). Estes dados devem ser encarados com ressalvas, considerada a ausência de amostras populacionais brasileiras relevantes no que diz respeito à distribuição das neoplasias e a profissão. Isto foi coincidente com relatos em instaladores de carpete14, contato com pó de madeira, produtos de carvão e cimento18. Para o intervalo de tempo entre o aparecimento de sintomas e a procura do médico para o início do tratamento, houve maior freqüência (62,0%) do período de 0 a 6 meses (Tabela 3), semelhante aos achados de literatura1,12,15,19.

Quanto à sintomatologia inicial (Tabela 4), odinofagia foi predominante (37,6%), seguida de linfonodo metastático (21,7%) e disfagia (14,5%). Percebe-se escassa sintomatologia inicial, quiescente e insidiosa1,19,20, sendo o seu diagnóstico indicadores de neoplasia em fase avançada (estádios III e IV), invadindo estruturas anatômicas adjacentes e regionais (Tabela 5).

No que diz respeito ao tempo de consumo do tabaco e do álcool, é o dado mais relevante da pesquisa, visto que nos diferentes estádios, todos os pacientes dependentes apresentavam tempo de consumo médio de 35 a 40 anos nos estádios avançados (estádios III e IV) para o tabaco e 31 a 32 anos (estádios III e IV) para o álcool (Tabela 6, 7 e 8), o que permite afirmar que o tabagismo é um fator relevante na morbidade destas afecções. Quanto à associação de ambos, esta ocorreu em 83,8% dos casos, 11,7% de um ou outro e 4,5% de nenhum. Portanto, esta associação aferida é coincidente com as demais séries3,21,22, não sendo detectadas diferenças quantitativas nos diferentes estádios. No que diz respeito ao estadiamento TNM (UICC, 1988), 50,7% eram T4, 32,4% T3, 14,5% T2 e 1,4% T1, sendo que 21% N0, 13,4% N1, 43% N2 e 22,4% N3 (Tabela 9). Portanto, percebe-se que a metástase ipsilateral é um fator prognóstico relevante, considerando a história natural do CEC da base da língua, estando presente em 79% da casuística, concordante com a literatura21,22. Isto permite aferir a agressividade clínica onde predominam os estádios clínicos III e IV em comparação aos iniciais I e II. Ao lado disto, os parâmetros lesão primária T e disseminação metastática regional uni ou bilateral N demonstram a evolução da doença – a neoplasia epidermóide de base de língua se caracteriza pelo tempo relativamente curto, avanço insidioso do tumor primário e comprometimento linfonodal, para a qual os resultados de sobrevida demonstram pouca eficácia tanto dos tratamentos cirúrgico quanto do radioterápico, isolados ou associados entre si e à quimioterapia. Fica evidente ainda que, através das características epidemiológico-clínicas destas neoplasias, e de sua associação ao tabagismo e/ou etilismo, que a morbidade e mortalidade das mesmas é alta, decorrentes de sintomatologia insidiosa, estadiamento avançado, quando a escolha da terapêutica praticamente é irrelevante.

CONCLUSÕES

O carcinoma espinocelular de base de língua é mais freqüente no homem branco da 5a a 6a década, tendo como fatores de risco o álcool e o fumo, sendo predominante o emprego do tabagismo nas mulheres. O tempo de queixa foi referido nos 6 meses iniciais, com predomínio dos estádios III e IV, sendo que os casos I e II eram todos etilistas e/ou tabagistas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Artigo recebido em 27 de setembro de 2002

Artigo aceito em 13 de fevereiro de 2003

  • 1
    Kowalski LP, Nishimoto IN. Epidemiologia do câncer de boca. In: Parise Júnior O. Câncer de boca aspectos básicos e terapêuticos. São Paulo: Sarvier; 2000. p.3-11.
  • 2
    MINISTÉRIO DA SAÚDE. INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER – INCA. Estimativas da incidência e mortalidade por câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2001.
  • 3
    Seikaly H, Rassekh CH. Oropharyngeal cancer. In: Bailey BJ, Calhoum KH, Deskin RW, Johnson JT, Kohut RF, Pillsbury III HC, Tardy Junior ME. Head and Neck Surgery: Otolaryngology. 2nd ed. Philadelphia: Lippincott-Raven, 1998.
  • 4
    Kanda JL. Epidemiologia, diagnóstico, patologia e estadiamento dos tumores da faringe. In: Carvalho MB ed. Tratado de cirurgia de cabeça e pescoço e otorrinolaringologia. São Paulo: Atheneu; 2001. p. 277-285.
  • 5
    Adamns, GL. Cancer of the oropharynx. In: McQuarrie DG, Adamns GL, Shons AR, Browne GA, eds. Head and neck cancer-clinical decisions and management principles. St. Louis: Mosby Year Book; 1986.
  • 6
    Civantos FJ, Goodwin Junior WJ. Cancer of the oropharynx. In: Myers EN, Suen JY, eds. Cancer of the head and neck. Philadelphia: W. B. Saunders; 1996.
  • 7
    Plasencia JD, Ramella ET, Ravello JÁ, Gavidia CG, Abanto WC, Acosta RV. Carcinoma epidermóide de cavidad oral y orofaringe. Diagnóstico 1996;35:14-21.
  • 8
    Schantz SP, Harrison IB, Forastiere AA. Oral cavity and oropharyngeal cancer. In: De Vitta Jr VT, Hellman S, Rosenberg SA., eds. Cancer: principles and practice of oncology. 5th ed. Philadelphia: Lippincott-Raven, 1997.
  • 9
    Day GL, Blot WJ, Austin DF, Bernstein L, Greenberg RS, Preston-Martin S, Schoenberg JB, Winn DM, Mclaughlin JK, Fraumeni Junior JF. Racial differences in risk of oral and pharyngeal cancer: alcohol, tobacco and other determinants. J Natl Cancer Inst 1993;85:465-473.
  • 10
    Boffettta P, Merletti F, Magnani C, Terracini B. A population-based study of prognostic factors in oral and oropharyngeal cancer. Oral Oncol Eur J Cancer 1994;30B:369-373.
  • 11
    Rosemberg J. Tabagismo panorama global. Jovem Médico 2001;1:14-17.
  • 12
    Franco EL, Kowalski LP, Oliveira BV, Curado, MP, Pereira RN, Silva ME, Fava AS, Torloni H. Risk factors for oral cancer in Brazil: a case control study. Int J Cancer 1989;43:992-1000.
  • 13
    Blot WJ, Mclaughlin JK, Winn DM, Austin DF, Greenberg RS, Preston-Martin S, Bernstein L, Schoenberg JB, Stemhagen A, Fraumeni Junior JF. Smoking and drinking in relation to oral and pharyngeal cancer. Cancer Res 1988;48:3282-3287.
  • 14
    Huebner WW, Schoenberg JB, Kelsey JL, Wilcox HB, Mclaughlin JK, Greenberg RS, Preston-Martin S, Austin DF, Stemhagen A, Blot WJ, Winn DM, Fraumeni Junior JF. Oral and pharyngeal cancer and ocupation: a case control study. Epidemiology 1992; 3:300-309.
  • 15
    Carvalho MB, Kanda JL, Andrade Sobrinho J, Kowalski LP, Rapoport A, Fava AS, Gois Filho JF, Chagas JFS. Estudo clínico dos tumores malignos da orofaringe. Rev Bras Cir Cab Pesc 1985;9:13-27.
  • 16
    Lipkin A, Miller RH, Woodson GE. Squamous cell carcinoma epidermóide of the oral cavity, pharynx and larynx in young adults. Laryngoscope 1985;95:790-793.
  • 17
    Hart AKE, Karakarakla, DW, Pitman KT, Adams JF. Oral and oropharyngeal squamous cell carcinoma in young adults: a report on 13 cases and review of the literature. Otolaryngol Head Neck Surg 1999;120:828-833.
  • 18
    Azevedo ALR, Dias FL, Spada MV, Santos TCRB, Noronha LHR, Kligerman, Freitas EQ. Levantamento epidemiológico sobre o câncer da boca e orofaringe do Serviço de Cabeça e Pescoço do Hospital do Câncer-INCA. Rev Bras Cir Cab Pesc 1996;20:5-12.
  • 19
    Maier H, Dietz A, Gewelke U, Heller WD. Occupation and risk for oral, pharyngeal and laryngeal cancer: a case control study. Laryngo-rhino-otologie 1991;70:93-98.
  • 20
    Durazzo MD, Magalhães RP, Tavares MR, Cernea CR, Cordeiro AC. Diagnóstico e tratamento do câncer da faringe. Rev Med (São Paulo) 1998; 77:143-8.
  • 21
    Dicker A, Harrison LB, Picken CA, Sessions RB, O'Malley BB. Oropharyngeal cancer. In: Harrison LB, Sessions RB, Ki Hong W, eds. Head and neck cancer: a multidisciplinary approach. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1999.
  • 22
    Batsakis JG. Pathology of tumors of oral cavity. In: Thawley SE, Panje WR, Batsakis JG, Lindberg RD, eds. Comprehensive management of head and neck tumors. 2nd ed. Philadelphia: W. B. Saunders; 1999.
  • 23
    Weiland LH, Batsakis JG. Pathology of pharyngeal tumors. In: Thawley SE, Panje WR, Batsakis JG, Lindberg RD; eds. Comprehensive management of head and neck tumors. 2nd ed. Philadelphia: W.B. Saunders; 1999.
  • Endereço para correspondência
    Abrão Rapoport
    Rua Iramaia, nº 136 Jd. Europa
    Cep: 01450-020 São Paulo
    Tel: (0xx11)273-8223
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Nov 2003
    • Data do Fascículo
      Mar 2003

    Histórico

    • Recebido
      27 Set 2002
    • Aceito
      13 Fev 2003
    ABORL-CCF Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial Av. Indianápolis, 740, 04062-001 São Paulo SP - Brazil, Tel./Fax: (55 11) 5052-9515 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@aborlccf.org.br