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Hechos y ficciones de la globalización: Argentina y Mercosur en el sistema internacional

INFORMAÇÃO

RESENHAS

Soraia Martino Peres

FERRER, Aldo. Hechos y ficciones de la globalización – Argentina y Mercosur en el sistema internacional. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 1997, 140 p.

A globalização econômica, ao contrário do enfoque amplamente difundido nos meios acadêmicos, não anularia a liberdade dos países em desenvolvimento de estabelecerem e implementarem suas políticas de inserção ativa no sistema internacional. Essa é a proposição principal defendida por Aldo Ferrer quando analisa o comportamento da Argentina e do Mercosul frente à economia mundial, no livro Hechos y ficciones de la globalizácion – Argentina y el Mercosur en el sistema internacional.

Existiriam, basicamente, duas visões sobre o fenômeno da globalização. A primeira, denominada fundamentalista, sugere que o problema clássico do desenvolvimento não mais existe, uma vez que caberia aos agentes transnacionais, e não aos Estados, o poder de decisão sobre o destino da economia e das finanças. A inserção dos países nesse sistema dar-se-ia de forma passiva por meio da adoção de políticas neoliberais. Tais políticas permitem o mínimo de interferência estatal no mercado pois defendem as privatizações, a abertura econômica e a desregularização dos mercados. A visão fundamentalista refletiria a racionalização dos interesses em jogo dos centros de poder. Os países em desenvolvimento teriam que manter políticas amistosas com o mercado mundial sob o risco de sofrerem uma fuga maciça de capitais especulativos de curto prazo e de verem sua credibilidade abalada. No plano interno, haveria a exigência de flexibilização dos sistemas de seguridade social, o equilíbrio macroeconômico e a estabilidade dos preços. As resistências à ratificação de tais medidas são tidas como uma manifestação de ingovernabilidade democrática. O enfoque fundamentalista seria uma poderosa ferramenta de colonização cultural imposta aos países periféricos.

A segunda visão, chamada realista, considera que, ao contrário do que defende a corrente fundamentalista, a globalização experimentada nas últimas décadas seria mais uma forma de manifestação de um fenômeno antigo. Portanto, os desafios do desenvolvimento ainda se fazem presentes e devem ser solucionados pelos próprios Estados. Tais assertivas decorrem dos esclarecimentos de mitos criados em torno da globalização, quais sejam: as transações econômicas interestatais representariam, na verdade, apenas 20% da produção mundial, uma vez que o restante da produção seria destinado aos mercados internos dos países; esses mercados consumidores seriam responsáveis por grande parte da demanda por empregos em âmbito nacional; o mercado financeiro mundial só permitiria a grande movimentação de capitais graças à ausência de regulação de suas atividades pelo conjunto dos países; os fatores políticos é que determinariam o comportamento do mercado financeiro internacional; seriam os países, e não as empresas, que competiriam no cenário internacional, pois seriam os Estados de origem os responsáveis pelas condições econômicas, sociais e políticas oferecidas às corporações transnacionais. Logo, o desafio do desenvolvimento repousaria na solução de problemas endógenos dos países. Cabe ao Estado manter a estabilidade de suas instituições, o equilíbrio macroeconômico, capacitar recursos humanos e incentivar as inversões privadas. A percepção correta do fenômeno da globalização seria, portanto, determinante para o sucesso da integração ativa dos países em desenvolvimento no sistema internacional.

Tais visões têm sido capazes de nortear o processo de tomada de decisões em países em desenvolvimento em momentos alternados de suas histórias. A constituição do Mercosul teve em sua origem uma forte vertente endógena estabelecida pela política de aproximação entre Argentina e Brasil iniciada em 1985 com a Declaração de Foz do Iguaçu. Em acontecimentos subseqüentes, a visão predominante continuou sendo a realista que, no âmbito do Mercosul, é manifestada pela integração sustentável. Esse conceito defende que a integração entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai deve orientar-se por políticas conjuntas que visem à diminuição das assimetrias regionais, a harmonização macroeconômica e a melhoria da qualidade de vida de seus povos. A estabilidade dos preços seria obtida por meio de um equilíbrio fiscal, aumento de exportações e crescimento interno. O modelo de integração sustentável sofreu influência das estratégias de desenvolvimento empregadas pelos Tigres Asiáticos. Em um segundo momento, com a assinatura do Tratado de Assunção em 1991, o autor apontou a mudança de orientação do curso de integração. Nesse período, a visão fudamentalista passou a influenciar o processo. Esta recebeu a denominação de "Consenso de Washington". O Consenso de Washington é uma estratégia elaborada após a crise da dívida externa e apoiada por organismos financeiros e por autoridades norte-americanas e defende as privatizações, a abertura e a desregularização financeira, o equilíbrio fiscal e a reforma do Estado. Os planos econômicos implementados no Brasil e na Argentina seguiram tais orientações mas, apesar de possibilitarem a estabilidade dos preços, tornaram as respectivas economias vulneráveis e dependentes de capitais de curto prazo devido à autonomia dos mercados em decidir onde serão alocados os recursos. A geração de riquezas ficou comprometida pois a excessiva valorização das moedas nacionais dificultou a geração de recursos por meio das exportações, ao mesmo tempo em que, incrementou das importações. A ausência de políticas desenvolvimentistas coordenadas tenderiam à perpetuação das assimetrias dentro do domínio geográfico do Mercosul. O futuro desse bloco regional depende, portanto, da leitura feita sobre a globalização e das estratégias a serem formuladas, a partir de então, pelos seus membros, em especial , pela Argentina e pelo Brasil.

O trabalho do professor Aldo Ferrer tem o mérito de estimular o debate sobre a questão do desenvolvimento econômico. Ele aponta alternativas para que a inserção dos países periféricos no sistema internacional ocorra de forma ativa. Quando analisa o Mercosul, identifica as forças que atuam nesse sistema. Entretanto, fundamenta alguns argumentos no modelo de desenvolvimento dos Tigres Asiáticos ainda como uma receita de sucesso para os demais países, o que não chega a comprometer a validade de seu trabalho. Ao contrário, suas observações a respeito da necessidade de se administrar a globalização tornam-se bastante oportunas. A visão da integração sustentável defendida pelo autor identifica-se com a proposição de que todo o processo de integração regional, para que tenha chances de sucesso, precisa fazer com que seus integrantes percebam nele possibilidades de ganhos justos e reais.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 1998
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