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Todo império perecerá: teoria das relações internacionais

INFORMAÇÃO

RESENHAS

Carlos Federico Domínguez Avila

DUROSELLE, Jean-Baptiste. Todo império perecerá. Teoria das relações internacionais. Tradução de Ane Lize Spaltemberg de Seiqueira Magalhães, Brasília: Edunb, 2000; 483 p. Coleção Relações Internacionais.

Como um instrumento de grande utilidade, recebemos a edição brasileira de Tout empire périra, do destacado historiador e professor francês Jean-Baptiste Duroselle. Para muitos autores, trata-se do melhor texto sobre aspectos teóricos e metodológicos da história das relações internacionais, bem como de uma densa teoria das relações internacionais.

Para iniciar nosso comentário, parece importante ter presente que Duroselle é um dos autores mais influentes da escola francesa de história das relações internacionais, fundada pelo grande mestre Pierre Renouvin, durante o decênio de 1930. Efetivamente, Duroselle recebe de Renouvin duas categorias centrais do paradigma francês: forças profundas e homens de Estado. Porém, Duroselle, também introduz novas categorias com fim de renovar suas pesquisas e interpretações, propor novas, úteis e pertinentes ferramentas de trabalho, assim como novos problemas de estudo em uma temática complexa, ampla e diversa como é a evolução das relações internacionais.

A estrutura interna de Todo império perecerá consta de Introdução, 17 capítulos e 3 artigos em Anexos. Na introdução, o autor afirma que a história – e outras disciplinas humanas – não podem utilizar a mesma racionalidade das ciências naturais. Recomenda, particularmente aos historiadores, concentrar-se na compreensão e interpretação de acontecimentos únicos e datados. Desse modo, o autor, categoricamente, afirma que "o estudo científico das relações internacionais só pode ser baseado na matéria fornecida pela história..." (p. 23). Seguidamente, Duroselle afirma que sua intenção é "expor minha própria teoria, cuja característica é ser baseada na história, fundada sobre a coletânea de acontecimentos concretos – logo uma teoria empírica – sobre suas sucessões – logo evolutiva – e sobre as analogias e as regularidades – logo metódica" (p. 40).

A obra sugere quatro grandes tópicos que encaminham a análise das relações internacionais:

a) Componentes ou fundamentos: Exploram três noções básicas das relações internacionais: primeiro, as características psicológicas, jurídicas, sócio-políticas ou econômicas do estrangeiro; segundo, a natureza e a evolução das fronteiras; e, terceiro, as condições e possibilidades de convivência social dos seres humanos, seja em pequenas comunidades ou em grandes Estados modernos.

b) Sistema de finalidade: Concentra sua atenção na vontade e nos objetivos que os indivíduos ou grupos reais de poder político legítimo (governos ou homens de Estado) definem como desígnios fundamentais em sua intervenção nacional e internacional. Para tanto, é preciso estudar detalhadamente: i) os agentes nas relações internacionais, isto é, agentes de decisão (autoridades de alto nível) e "executores" (diplomatas, militares, propagandistas, empresários, etc.); ii) a qualidade e quantidade da informação sobre aspectos gerais ou específicos desse sistema internacional; e, sobretudo, iii) o cálculo estratégico ou processo de tomada de decisões, isto é, a articulação dos objetivos, meios e riscos que os responsáveis pela política exterior de um Estado devem considerar para obter uma condição ou situação desejada.

c) Sistema de causalidade: Também denominado "forças profundas e organizadas", compreende um conjunto estruturado e dinâmico de relações econômicas, sociais, demográficas, geopolíticas, culturais e ideológicas internas que afetam – mas não determinam por si – a conduta dos homens de Estado e sua política exterior. Duroselle recomenda-nos analisar com muito cuidado a natureza, o jogo (dinâmica) e a eficácia daquelas forças.

d) Movimento: Compreende diferentes características das relações internacionais empíricas, Duroselle introduz as noções de ondas, criações técnicas, diferentes tipologias e características das relações internacionais pacíficas, conflituosas e a guerra. Também se classificam os movimentos das relações internacionais de acordo com sua temporalidade: estruturais, conjunturais ou circunstanciais.

Na quinta parte, Duroselle oferece sua proposta concreta, intitulada convenientemente "A Teoria (Vida e Morte dos Impérios)". Aqui, o autor reitera que as ciências humanas devem concentrar-se na observação e compreensão de regularidades, regras temporárias e receitas. No esquema de Duroselle, "a regularidade é a existência de uma longa série de semelhanças que parecem transcender as épocas e, conseqüentemente, ser ligadas à própria natureza do homo sapiens" (p. 358). Em termos operativos, as regularidades expressam analogias e semelhanças entre acontecimentos ou conjuntos de acontecimentos através da história das civilizações.

As regras temporárias expressam traços característicos de períodos históricos específicos. As receitas podem ser entendidas como recomendações para estudar ou atuar eficientemente no sistema internacional, por exemplo: fazer uso adequado da informação disponível sobre o sistema internacional, ser criativo, manter a iniciativa, estimular a confiança e melhorar permanentemente a arte da negociação.

Nos capítulos 16 e 17, Duroselle analisa magistralmente o nascimento, vida e morte dos impérios. Na sua opinião, o dado básico das relações internacionais é o poder ou, exatamente, a potência, posto que, no seu esquema, o sistema internacional está composto da interação de Estados com diferentes graus de potencialidade. Alguns, com grande potencialidade, transformam-se em grandes impérios econômicos, políticos e ideológicos. Lógica e afortunadamente, como todo poder se desgasta, eventualmente, todo império perecerá...

Para concluir, parece-nos evidente que a publicação deste importantíssimo livro de Duroselle pela Edunb é uma contribuição sumamente significativa para a formação acadêmica de especialistas em uma temática desafiante como a evolução das relações internacionais contemporâneas. Com certeza, a presente proposta teórico-metodológica é útil, convincente, apropriada e pertinente, tanto desde a perspectiva epistemológica, como desde a lógica burocrática dos estrategistas responsáveis pela política exterior de qualquer Estado moderno. Os especialistas e estudantes brasileiros de relações internacionais têm nessa obra uma alternativa de análise à influência de autores de vertente anglo-saxônica.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 2000
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