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Biomassa microbiana e matéria orgânica em solo de Caatinga, cultivado com melão na Chapada do Apodi, Ceará

Microbial biomass and organic matter in soil of Caatinga, cultivated with melon in Chapada do Apodi, Ceará State

Resumos

O uso contínuo, ao longo dos anos, do sistema convencional de preparo do solo pode alterar os atributos microbiológicos do solo, causando a redução da biomassa e da atividade microbiana. Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar, sob cultivo do melão (Cucumis melo L.), as alterações microbiológicas do solo, assim como as do teor de matéria orgânica, nas profundidades de 0 a 0,10, 0,10 a 0,20, 0,20 a 0,30 e 0,30 a 0,40 m, ao longo dos anos sob cultivo do melão, durante três, cinco e dez anos, em Cambissolo Háplico eutrófico, a fim de compará-los com os do solo da mata natural (Caatinga). As amostras foram coletadas, aleatoriamente, na Fazenda Melão Doçura, localizada no município de Quixeré, Ceará, e encaminhadas para o Laboratório de Análise de Solos, Água e Planta da UFERSA, Mossoró, Rio Grande do Norte. Determinaram-se os teores de matéria orgânica (MO), o de carbono da biomassa microbiana (CBM) e o quociente microbiano (qMIC). O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado (DIC), disposto em esquema fatorial 4 x 4 (Fator I, anos de cultivo; Fator II, causa de variação na profundidade), com três repetições. Os resultados mostraram que a matéria orgânica aumentou a partir dos cinco anos de cultivo do melão. O carbono da biomassa microbiana foi elevado nas camadas superficiais, independentemente do tempo de cultivo, por causa da maior disponibilidade da matéria orgânica, água e nutrientes, e o quociente microbiano diminuiu com o tempo, apresentando menor concentração no cultivo de dez anos do melão, discriminando as possíveis alterações decorrentes do uso agrícola do solo.

carbono microbiano; manejo do solo; carbono orgânico


The intensive use of the conventional system over the years of soil preparation may change the soil microbial attributes, causing a reduction of biomass and microbial activity. As so, the present study aimed to analyze, under melon (Cucumis melo L.) cultivation, the microbiological changes as well as soil organic matter content in the depth of 0-0.10, 0.10-0.20, 0.20-0.30 and 0.30-0.40 m over the years under melon cultivation during 3, 5 and 10 years in eutrophic Cambisol, in order to compare them with the natural forest (Caatinga). The samples were randomly collected at Fazenda Melão Doçura, located in the city of Quixeré, Ceará State and forwarded to the Laboratory of Analysis of Soil, Water and Plant of the UFERSA, Mossoró, Rio Grande do Norte State. The content of organic matter (MO), microbial biomass carbon (CBM) and microbial quotient (qMIC) were determined. The experiment was mounted on completely randomized design (DIC), arranged in a factorial scheme 4 x 4 (years of cultivation Factor I, Factor II cause of variation in depth) with three replications. The results showed that organic matter increased from five years of cultivation of the melon. The microbial biomass carbon was higher in the superficial layers independent of the culture period due increased availability of organic matter, water and nutrients and microbial quotient decreased with time, with lower concentration in the 10 years cultivation of the melon, detailing the possible changes arising from agricultural soil use.

microbial carbon; soil management; organic carbon


COMUNICAÇÃO

SOLOS E PRODUÇÃO DE PLANTAS

Biomassa microbiana e matéria orgânica em solo de Caatinga, cultivado com melão na Chapada do Apodi, Ceará

Microbial biomass and organic matter in soil of Caatinga, cultivated with melon in Chapada do Apodi, Ceará State

Humbelina Silva Siqueira LopesI; Monalisa Gurgel de MedeirosI; Joyce Reis SilvaII; Francisco Assis Medeiros JúniorI; Márcio Neres dos SantosIII; Rafael Oliveira BatistaIV

IEngenheiros-Agrônomos. Mestrandos da Universidade Federal Rural do Semi-Árido, Avenida Francisco Mota, 572, Bairro Costa e Silva, 59625-900, Mossoró, Rio Grande do Norte, Brasil. humbelinas@hotmail.com; monalisa_gurgel@hotmail.com; juniortib@msn.com

IITecnóloga em fruticultura. Mestranda da Universidade Federal Rural do Semi-Árido, Avenida Francisco Mota, 572, Bairro Costa e Silva, 59625-900, Mossoró, Rio Grande do Norte, Brasil. joytareis@hotmail.com

IIIEngenheiro-Agrônomo, Doutor. Departamento de Solos, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, Avenida Francisco Mota, 572, Bairro Costa e Silva, 59625-900, Mossoró, Rio Grande do Norte, Brasil. marcioneres@gmail.com

IVEngenheiro Agrícola, Doutor. Departamento de Ciências Ambientais e Tecnológicas, Universidade Federal Rural do Semi-Árido, Avenida Francisco Mota, 572, Bairro Costa e Silva, 59625-900, Mossoró, Rio Grande do Norte, Brasil. rafaelbatista@ufersa.edu.br (autor para correspondência)

RESUMO

O uso contínuo, ao longo dos anos, do sistema convencional de preparo do solo pode alterar os atributos microbiológicos do solo, causando a redução da biomassa e da atividade microbiana. Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar, sob cultivo do melão (Cucumis melo L.), as alterações microbiológicas do solo, assim como as do teor de matéria orgânica, nas profundidades de 0 a 0,10, 0,10 a 0,20, 0,20 a 0,30 e 0,30 a 0,40 m, ao longo dos anos sob cultivo do melão, durante três, cinco e dez anos, em Cambissolo Háplico eutrófico, a fim de compará-los com os do solo da mata natural (Caatinga). As amostras foram coletadas, aleatoriamente, na Fazenda Melão Doçura, localizada no município de Quixeré, Ceará, e encaminhadas para o Laboratório de Análise de Solos, Água e Planta da UFERSA, Mossoró, Rio Grande do Norte. Determinaram-se os teores de matéria orgânica (MO), o de carbono da biomassa microbiana (CBM) e o quociente microbiano (qMIC). O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado (DIC), disposto em esquema fatorial 4 x 4 (Fator I, anos de cultivo; Fator II, causa de variação na profundidade), com três repetições. Os resultados mostraram que a matéria orgânica aumentou a partir dos cinco anos de cultivo do melão. O carbono da biomassa microbiana foi elevado nas camadas superficiais, independentemente do tempo de cultivo, por causa da maior disponibilidade da matéria orgânica, água e nutrientes, e o quociente microbiano diminuiu com o tempo, apresentando menor concentração no cultivo de dez anos do melão, discriminando as possíveis alterações decorrentes do uso agrícola do solo.

Palavras-chave: carbono microbiano, manejo do solo, carbono orgânico.

ABSTRACT

The intensive use of the conventional system over the years of soil preparation may change the soil microbial attributes, causing a reduction of biomass and microbial activity. As so, the present study aimed to analyze, under melon (Cucumis melo L.) cultivation, the microbiological changes as well as soil organic matter content in the depth of 0-0.10, 0.10-0.20, 0.20-0.30 and 0.30-0.40 m over the years under melon cultivation during 3, 5 and 10 years in eutrophic Cambisol, in order to compare them with the natural forest (Caatinga). The samples were randomly collected at Fazenda Melão Doçura, located in the city of Quixeré, Ceará State and forwarded to the Laboratory of Analysis of Soil, Water and Plant of the UFERSA, Mossoró, Rio Grande do Norte State. The content of organic matter (MO), microbial biomass carbon (CBM) and microbial quotient (qMIC) were determined. The experiment was mounted on completely randomized design (DIC), arranged in a factorial scheme 4 x 4 (years of cultivation Factor I, Factor II cause of variation in depth) with three replications. The results showed that organic matter increased from five years of cultivation of the melon. The microbial biomass carbon was higher in the superficial layers independent of the culture period due increased availability of organic matter, water and nutrients and microbial quotient decreased with time, with lower concentration in the 10 years cultivation of the melon, detailing the possible changes arising from agricultural soil use.

Key words: microbial carbon, soil management, organic carbon.

INTRODUÇÃO

O melão (Cucumis melo L.) é o fruto de uma olerícola de grande importância econômica no Brasil, em especial na região nordeste. Uma das principais vantagens do cultivo no semiárido são as condições edafoclimáticas, nas quais temperatura, luminosidade, umidade relativa e a pequena ocorrência de chuvas favorecem a baixa incidência de doenças e a melhor qualidade dos frutos, tornando, assim, os pólos Assu-Mossoró (RN) e baixo Jaguaribe (CE) os maiores produtores do Brasil. Sua principal área de produção dá-se na Chapada do Apodi, coberta por formações montanhosas e localizada na divisa dos Estados do Rio Grande do Norte e Ceará. A chapada funciona como divisor de águas entre as bacias hidrográficas dos rios Apodi e Jaguaribe, caracterizada por predomínio de Cambissolos derivados de rochas calcárias.

O uso intensivo de modernas tecnologias na produção de melão no semiárido vem aumentando, a cada ano, em consequência das exigências do mercado interno e externo por produtos de qualidade. Esse crescimento tecnológico da agricultura, sobretudo a partir da segunda metade do século XX, incorporou um conjunto de tecnologias avançadas, as quais aumentaram a produção e alteraram as relações sociais no campo (Schons & Miorin, 2007). Porém, a incorporação dessas novas tecnologias ao meio rural brasileiro ocorreu, muitas vezes, de forma inadequada realidade do meio, com consequências altamente negativas sobre o ambiente natural (Rocha et al., 2009). Para Rocha et al. (2009), com a modernização da agricultura e a expansão do agronegócio no mundo, o uso desregrado do solo gerou sérios problemas de erosão, reduzindo a espessura e a fertilidade dos solos e diminuindo drasticamente a produtividade em algumas áreas. Com o manejo inadequado e intensivo do solo, pode-se ocasionar um estado de degradação que, caso seja reversível, requer muito tempo e recurso para a sua recuperação (Mendes et al., 2002). Assim, faz-se necessária a preservação do solo, manejando de forma sustentável, mantendo a qualidade e continuidade da produção.

A manutenção da produtividade dos ecossistemas agrícolas e florestais depende, em grande parte, do processo de transformação da matéria orgânica e, por conseguinte, da biomassa microbiana (Gama-Rodrigues et al., 2008). Segundo Trannin et al. (2007), a atividade microbiana do solo é responsável pela decomposição dos compostos orgânicos, pela ciclagem de nutrientes e pelo fluxo de energia do solo. A biomassa microbiana e sua atividade têm sido apontadas como as características mais sensíveis s alterações na qualidade do solo, causadas por mudanças de uso e por práticas de manejo. Estudos elaborados por Venzke Filho et al. (2008) mostraram que a quantidade e a composição da biomassa microbiana podem ser influenciadas por diversos fatores, entre eles o sistema de cultivo, a rotação de cultura e a textura do solo.

A quantidade de matéria orgânica (MO) está relacionada com os aportes de resíduos orgânicos e formação de biomassa vegetal, a qual, por sua vez, depende do nível de fertilidade do solo. Para Salcedo & Sampaio (2008), a MO deve ser conservada e manejada de forma equilibrada de forma que permita o desenvolvimento de uma agricultura sustentável, pelo uso de métodos adequados de manejo de solo, compreendendo sistemas de preparo, rotação de culturas, adubação, estabelecimento de sistemas integrados lavoura-pastagem, dentre outros. Suas funções no solo, especialmente sob condições tropicais e subtropicais, conferem estabilidade aos agregados e estrutura do solo, infiltração e retenção de água, resistência erosão, capacidade de troca de cátions (CTC), disponibilidade de nutrientes, aeração e atividade da biomassa microbiana (Rossato et al., 2004).

O objetivo deste trabalho foi avaliar as alterações microbiológicas do solo, assim como o teor de matéria orgânica nas profundidades 0-0,10, 0,10-0,20, 0,20-0,30 e 0,30-0,40 m, sob o cultivo do melão, durante três, cinco e dez anos, em Cambissolo Háplico eutrófico, a fim de compará-los com os da mata natural de predomínio local, a Caatinga.

MATERIAL E MÉTODOS

As coletas foram realizadas na fazenda Melão Doçura, localizada no município de Quixeré, Ceará. O município encontra-se sob as coordenadas geográficas latitude -05º 04'27''S, longitude -37º59'19''W e altitude 25 m. Apresenta clima tropical quente semiárido, com temperatura média variando entre 26 e 28 ºC e precipitação de 857,7 mm (FUNCEME, 2009).

As amostras de solo foram retiradas, nas profundidades de 0-0,10, 0,10-0,20, 0,20-0,30 e 0,30-0,40 m, de um Cambissolo Háplico eutrófico (Embrapa, 2006), em áreas sob mata natural (Caatinga) e de áreas sob cultivo do melão,durante três, cinco e dez anos. Na área sob cultivo, o solo foi preparado com o uso de grade aradora, subsolador, grade niveladora, adubadora e, entre outras operações, como pulverizações, cultivo mecânico e uso de carroções para transporte dos frutos, seguindo-se o mesmo preparo do solo para todos os anos de cultivo. No período de entressafra, utilizou-se milho (Zea mays L.), sorgo (Sorghum bicolor L.) e mucuna (Mucuna pruriens L.) em rotação de culturas e para incorporação de massa verde, respecivamente. Na Tabela 1, estão apresentadas as característica físicas e químicas do Cambissolo Háplico eutrófico, coletado, na profundidade de 0 a 0,10 m.

As amostras foram secas ao ar, posteriormente destorroadas e passadas por peneira de malha 2 mm. A quantificação de carbono da biomassa microbiana foi realizada em extrato de amostras de solos fumigadas e não fumigadas, após período de 24 horas de ativação de micro-organismos, com solos saturados em recipiente fechado. A fumigação foi feita em aparelho de micro-ondas, por 4,5 minutos; e, em seguida, fez-se a extração. Utilizou-se como extrator sulfato de potássio 0,5 M, a pH 6,5, na relação 1:2,5 (solo:extrator), tanto para amostras fumigadas quanto para as não fumigadas, usando-se método proposto por Vance et al. (1987) e descrito por De-Polli & Guerra (1999). Foram feitos a extração e fracionamento da matéria orgânica do solo (Duarte, 1994) e a quantificação do carbono microbiano, utilizando-se o método de colorimetria, descrito por Bartlett & Ross (1988). Foi feita a leitura da absorbância da curva padrão e das amostras, em espectrofotômetro, utilizando-se um comprimento de ondas de 495 nm. O cálculo da concentração de carbono foi feito, utilizando-se a equação de reta obtida a partir da curva padrão:

C = concentração de Carbono; Abs = absorbância da amostra, a = intercepto da reta encontrada na curva, b = coeficiente de declividade da reta, V = volume usado na extração, P = massa seca do solo e f = fator de diluição da curva. O quociente microbiano (qMIC) foi calculado pela razão entre o carbono da biomassa microbiana e o carbono orgânico do solo, afim de refletir os aportes de carbono e a conversão de substratos orgânicos para o carbono da biomassa microbiana (Sparling, 1997). Para Wardle et al. (1994), este quociente pode avaliar a qualidade da matéria orgânica, enquanto, para Ferreira (2008), trata-se de um indicador da sua dinâmica, expressando a eficiência da biomassa em utilizar C e N.

O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado (DIC), disposto em esquema fatorial 4 x 4, com três repetições. O Fator I foi a causa de variação na profundidade (0 a 0,10m, 0,10 a 0,20 m, 0,20 a 0,30 m e 0,30 a 0,40 m) e, o Fator II, os anos de cultivo (0, 3, 5 e 10 anos). Os dados foram submetidos análise de variância, sendo as médias comparadas pelo teste Scott-Knott, a 5% de probabilidade. Todas as análises foram realizadas com o auxílio do software SISVAR 4.3 (Ferreira, 2003).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na interação profundidade/tempo, verificou-se diferença significativa de 5%, pela análise de variância, da variação da matéria orgânica (MO). Porém, para a variação do carbono da biomassa microbiana (CBM) e do quociente microbiano (qMIC), as diferenças foram significativas, a 1% somente para profundidade e tempo respectivamente, não havendo diferença significativa na interação dos fatores avaliados pelo teste de Scott-knott.

Observou-se, na Figura 1, maior destaque para a camada superficial na mata natural, apresentando valores mais altos, devidos presença de cobertura morta, nessa área, e ao decréscimo desta, medida que os pontos de coleta tornaram-se mais profundos. A concentração de MO nas profundidades de 0 a 0,10 m e 0,10 a 0,20 m, encontraram-se elevadas, durante todos os anos de cultivo do melão. As maiores concentrações são detectadas na camada superficial do solo, em razão do aporte de resíduos nesta camada.


No cultivo do melão durante dez anos, foi possível observar, nas profundidades 0,20 a 0,30 m e 0,30 a 0,40 m, acréscimo significativo de MO, quando comparada com a da Caatinga, evidenciando-se acúmulo de MO nessas profundidades. Em vista da carência de estudos que correlacionem o tempo de cultivo com o sistema de manejo, esses fatos podem ser explicados pelo uso adequado do manejo, acúmulo de resíduos vegetais durante os anos de pousio, o tempo de cultivo e rotação de culturas, como milho, sorgo e mucuna, como, também, a incorporação desta ao solo, proporcionando o que se chama de acréscimo significativo de MO em profundidade, visualizável a partir dos cinco anos de cultivo (Figura 1).

Addiscot (1992) assinala, em seu estudo que, na natureza, o solo comporta-se como um sistema aberto, trocando matéria orgânica e energia com o meio, e o sistema atinge um estado estável quando as taxas de adição e de perdas equivalem-se. Mielniczuk (2008) relata que o declínio da matéria orgânica ao longo do tempo indica erro no sistema de manejo, como baixa fertilidade, baixa produção de resíduo, excesso de revolvimento, erosão acelerada, dentre outros problemas.

O carbono da biomassa microbiana foi significativo em profundidade, a 1% de probabilidade, pelo teste de Scott-Knott, e apresentou efeito não significativo na interação profundidade/tempo.

O solo Caatinga revelou carbono microbiano mais elevado que o das demais áreas analisadas, podendo esse fato ser atribuído maior concentração de MO na camada superior do solo (Figura 2). O valor mais elevado de carbono da biomassa microbiana no solo, sob a mata natural, deve-se ao aporte contínuo e diversificado de matéria orgânica incorporada ao solo, principalmente via deposição pelas plantas. Segundo Matsuoka et al. (2003), a diversidade florística das áreas nativas e a presença da vegetação durante todo ano influenciam a quantidade e qualidade da serrapilheira, fato este que pode ter contribuído para um maior acúmulo de carbono pela biomassa microbiana, e, consequentemente, para melhores condições de desenvolvimento da microbiota (Figura 2).


As profundidades mais favoráveis ao crescimento do CBM foram observadas na camada superficial, de 0 a 0,10 m e 0,10 a 0,20 m, durante todos os anos de cultivo; entretanto, na profundidade de 30-40 cm, nos períodos de cultivo de cinco e dez anos, os resultados observados estiveram próximos aos da Caatinga. Esses fatos poderiam ser explicados pela grande demanda de MO nessas profundidades, como pelo tipo de manejo utilizado, já que a biomassa microbiana é extremamente sensível ao manejo dado ao solo.

Segundo Powlson et al. (1987), a biomassa microbiana é sensível s alterações nas formas de carbono orgânico do solo, em função das mudanças no manejo ou uso do solo. Para o mesmo autor, após as alterações serem introduzidas, a biomassa microbiana sofrerá flutuações, até atingir um novo equilíbrio. Estudos elaborados por Perez et al. (2004); Conceição et al. (2005) e Ferreira et al. (2007) mostraram que o teor de carbono da biomassa microbiana mantiveram-se significativamente maiores na camada de 0 a 0,10 m de profundidade, independentemente das características das áreas estudadas. Reduções do carbono da biomassa microbiana foram observadas em estudos realizados por Matsuoka et al. (2003) em solos do Cerrado, nos quais verificaram-se diminuições nos teores em profundidades maiores, estando, na camada superficial, os seus maiores teores. Teores mais elevados de CBM implicam maior imobilização temporária de nutrientes e, consequentemente, menores perdas de nutrientes no sistema solo-planta (Mercante, 2004).

O quociente microbiano (qMIC) foi significativo para o fator tempo, a 1% de probabilidade pelo teste de Scott-Knott, e apresentou efeito não significativo na interação profundidade/tempo.

Observa-se, na Figura 3, o aumento significativo do qMIC, sob a Caatinga, nas profundidades 20-30 e 30-40 cm. De acordo com Anderson & Domsch (1989), um maior qMIC representa maior ciclagem de nutrientes e, portanto, menor acúmulo de carbono. Além disso, os maiores valores da proporção indicam a maior conversão do COT em CBM (Marchiori Júnior & Mello, 2000) (Figura 3).


As mudanças na relação qMIC refletem o padrão de entrada de MO nesses solos, a eficiência da conversão do C microbiano, as perdas do C do solo e a estabilização do C orgânico pela fração mineral do solo (Sparkling, 1992). O nível da relação do qMIC pode indicar se o carbono está em equilíbrio, se está acumulando ou diminuindo (Insam, 1990).

Na Figura 3, observa-se, também, que, durante os anos de cultivo, houve decréscimo do qMIC, com o tempo, e oscilações em profundidade; porém, dez anos de cultivo do melão apresentou menor qMIC. Trabalhos têm demonstrado que os quocientes microbianos (qMic) e metabólicos (qCO2) são sensíveis aos efeitos ambientais e antropogênicos sobre a comunidade microbiana do solo, podendo-se constituir indicadores das perturbações dos ecossistemas (Andréa et al., 2004; Harris, 2003).

Wardle et al (1994) afirma que os baixos teores de qMIC podem ocorrer por estar a microbiota sob algum fator de estresse, ou, como propõem Gama-Rodrigues et al. (2008), por causa da baixa qualidade nutricional da matéria orgânica, fazendo com o que a biomassa microbiana torne-se incapaz de utilizar totalmente o carbono orgânico total.

CONCLUSÕES

Houve aumento significativo da matéria orgânica, em profundidade, a partir dos cinco anos de cultivo do melão.

O carbono da biomassa microbiana aumentou nas camadas superficiais do solo, independentemente dos anos de cultivo, por causa da maior disponibilidade da matéria orgânica, água e nutrientes.

O quociente microbiano diminuiu com o tempo, apresentando menor concentração no cultivo de dez anos do melão, discriminando as possíveis alterações decorrentes do uso agrícola do solo.

Recebido para publicação em 20/01/2011 e aprovado em 16/08/2012.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Set 2012
  • Data do Fascículo
    Ago 2012

Histórico

  • Recebido
    20 Jan 2011
  • Aceito
    16 Ago 2012
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